quarta-feira, 27 de setembro de 2023

Sob Bolsonaro, Brasil ignorou metas trabalhistas da ONU

Num momento em que uma greve histórica assombra políticos e empresários nos Estados Unidos, foi a trajetória de líder sindicalista que levou o presidente Luiz Inácio Lula da Silva à agenda conjunta com o presidente Joe Biden em Nova York, no dia 20, para a divulgação do documento “Parceria pelos Direitos dos Trabalhadores e Trabalhadoras”. As metas são a criação de regras de proteção para trabalhadores de aplicativos, e a geração de empregos com direitos trabalhistas.

Mas a quase um ano das eleições, quando buscará a reeleição, Biden está preocupado com a escalada do sindicalismo, que patrocina uma paralisação inédita de quase duas semanas. Pela primeira vez, uma greve alcançou, de uma vez, as três principais montadoras: GM, Stellantis e Ford. O UAW (United Auto Workers), sindicato que representa quase 150 mil trabalhadores, exige um aumento de 36%, segundo agências internacionais. Leia também: Com a nova aquisição, WEG pretende fortalecer sua posição fora do Brasil

Não queremos obrigar trabalhador de aplicativo a ter carteira assinada, diz Lula Biden apresenta-se como o presidente mais “pró-sindicato” da história do país, mas não tem o apoio do UAW. Em contrapartida, até hoje Lula é respeitado e tem diálogo com lideranças sindicais americanas. Durante a prisão em Curitiba, ele recebeu a visita dos americanos Richard Trumka, presidente do sindicato AFL-CIO, e Stanley Gacek, ligado aos trabalhadores do comércio e indústria de alimentos.

É nessa conjuntura que Biden espera capitalizar eleitoralmente com a fotografia ao lado de Lula em um ato de defesa dos sindicatos e dos trabalhadores. Ainda no ato com Biden, Lula invocou o respeito ao “trabalho decente” – um dos 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS). Essa pauta foi citada por Lula no discurso de abertura da Assembleia Geral das Nações Unidas (ONU) em tom de alerta: “a mais ampla e mais ambiciosa ação coletiva da ONU voltada para o desenvolvimento – a Agenda 2030 – pode se transformar no seu maior fracasso”, advertiu.

“A maior parte dos objetivos de desenvolvimento sustentável caminha em ritmo lento”. Em síntese, os 17 objetivos representam um apelo global para acabar com a pobreza e a desigualdade, proteger o meio ambiente e o clima, garantir a transição para a energia limpa, e que as pessoas, em todos os lugares, tenham trabalho decente, e possam desfrutar de paz e prosperidade. É nesse contexto que, em paralelo à assembleia da ONU, a vice-secretária-geral da entidade, Amina Mohammed, coordenou a cúpula internacional dos ODS, na qual o ministro da Secretaria-Geral da Presidência, Márcio Macedo, representou o governo brasileiro.

Nesse palco, Macedo anunciou para uma plateia de chefes de Estado e de governo a retomada da agenda de ODS – que havia sido extinta pela gestão anterior – pelo atual governo. À coluna, Macedo explicou que a renovação desses compromissos resgata a credibilidade do Brasil nos palcos internacionais e nos órgãos multilaterais. Acrescenta que isso viabilizará que a ONU entre em campo como “facilitadora de investimentos” internacionais para a implementação desses objetivos no Brasil. “Há vários fundos internacionais que podem investir aqui”, citou. Em 2024, o governo brasileiro voltará a apresentar o relatório sobre a implementação dos 17 objetivos, algo que não ocorre há seis anos.

Nesse período, na ausência do Estado, organizações da sociedade civil reuniram-se para apresentar o Relatório Luz da Agenda 2030. A nova edição do documento foi divulgada nesta segunda-feira, avaliando a evolução das metas em 2022, mas o resultado foi desolador. O relatório apontou 102 metas (60,35%) em situação de retrocesso, 14 (8,28%) ameaçadas, 16 (9,46%) estagnadas, 29 (17,1%) com progresso insuficiente, apenas 3 (1,77%) com progresso satisfatório e 4 (2,36%) sem dados suficientes para classificação, sendo que 1 (0,59%) não se aplica ao Brasil.

“Tais dados refletem a trajetória de um ciclo de destruição de políticas públicas, erosão dos orçamentos e de sistemas de monitoramento essenciais para o alinhamento nacional à Agenda 2030”, diz o Relatório Luz. Nesse cenário, Macedo cita outro dos 17 objetivos – “parcerias e meios de implementação” – para afirmar que espera uma ação conjunta entre governo, iniciativa privada e sociedade civil para recuperar o tempo perdido. “Uma parte disso será liderada pelo setor produtivo”, observou. Serão necessários investimentos para tocar obras de infraestrutura e alavancar políticas para reduzir a pobreza, gerar emprego e focar no desenvolvimento sustentável. Ele diz que o governo está fazendo sua parte ao aprovar o arcabouço fiscal, apoiar a reforma tributária e criar o “Desenrola” para melhorar a saúde financeira da população.

Outro dos 17 ODS é a “energia limpa e acessível”. Nesse ponto, o ministro não vê os estudos em andamento para a exploração de petróleo na foz do rio Amazonas como uma contradição a essa agenda. Até porque se fala em “transição”. “Nenhum país do mundo vai abrir mão de sua de sua autossuficiência energética e de utilizar os seus recursos naturais para ter autonomia”, afirmou. “Mas isso tem que ser feito pela legislação brasileira, com equilíbrio, com as compensações ambientais e a prevenção de riscos”, ponderou.

 

       Trabalho: as promessas da iniciativa Brasil-EUA. Por Allen Habert

 

A economia global está em crise. O esgotamento exponencial dos recursos naturais,o declínio da produtividade, o crescimento lento, o aumento do desemprego e o acentuar das desigualdadesforçam-nos a repensar os nossos modelos econômicos. Para onde vamos?

A crise climática que sucedeu o termo mudanças climáticas ganha a atenção da opinião pública mundial coroando a situação de incertezas que ronda as entranhas do mundo do trabalho, da economia e da vida.

Frente a isto lançou-se esta semana em Nova York, de forma inédita e aproveitando a abertura da 78º Assembléia Geral da ONU ,uma iniciativa histórica e impactante. O Brasil e os EUA, juntos pela primeira vez nesta área, apresentaram uma proposta inicial denominada “Coalizão Global pelo Trabalho”. Formatada por meio do ministério do Trabalho e do Emprego do Brasil, do departamento do Trabalho dos EUA, das centrais sindicais e organizações empresariais, das chancelarias, de congressistas e dos presidentes Lula e Biden a iniciativa tem como objetivo criar um roteiro audacioso, um caminho horizontal e crescente para enfrentar os desafios colocados pelo mundo do trabalho, do capital e dos governos.

Itens como a liberdade sindical, as garantias aos trabalhadores e trabalhadoras por aplicativo, a defesa dos direitos trabalhistas contra a precarização do trabalho em nível global e à luz da realidade do século 21, fazem parte da agenda. Ela baseia-a se numa compreensão comum de que a saída para as crises dependerá de uma integração e participação de cada agente econômico e social. Não haverá sucesso e futuro se se acreditar que as soluções virão por cima. Daí esta convocação para uma espécie de refundação das relações até aqui existentes para que todas as nações possam contribuir a esta plataforma dinâmica. A saída pelas guerras ou pela barbárie, sempre presentes e vivas, deve ser combatida e abolida pela construção de uma cultura da paz e um desenvolvimento sustentável.

A iniciativa conta com o apoio da OIT – Organização Internacional do Trabalho. Fundada em 1919, é entidade entre as nações mais antiga, em que o Brasil se integrou há 70 anos. Em junho último, a OIT formatou a Coalizão Global pela Justiça Social em torno da promoção do trabalho decente, proteção social, economia de plataformas e combate ao trabalho escravo e infantil.

A CNTU – Confederação Nacional dos Trabalhadores Liberais Universitários –, que reúne desde 2006 entidades sindicais e federações da engenharia, saúde e economia, apoia esta iniciativa inspiradora lançada pelos presidentes do Brasil e dos EUA. Quer incorporar a ela elementos fundamentais formulados pelos trabalhadores do conhecimento e saber de ambos os países e do mundo. No momento em que a engenharia, ciência, tecnologia e inovação ganham o centro do poder na geopolítica, os profissionais de nível universitário sofrem precarização, informalidade, desemprego, defasagem na educação permanente e na atualização tecnológica.

Os 800 milhões de profissionais de nível universitários do planeta e 18 milhões no Brasil têm um papel decisivo nas três grandes batalhas contra a desigualdade: a luta contra a fome, a criação de oportunidades de trabalho e emprego e a inclusão educacional, digital e cultural. O desenvolvimento sustentável une a todos e é o verdadeiro outro lado da paz.

 

       Haverá direitos para os assalariados do campo? Por France Júnior

 

Um decreto publicado no dia 16 de agosto pelo governo federal reconstitui a Comissão Nacional dos Trabalhadores Rurais Assalariados, órgão que havia sido extinto pelo ex-presidente Jair Bolsonaro em 2021, sepultando de vez a política nacional desenhada para essa categoria uma década atrás, mas cujas ações haviam sido descontinuadas já em 2016.

“Essa política tem princípios importantes para os assalariados rurais como a garantia de direitos e o diálogo social sobre questões de raça e gênero, saúde, educação e dignidade humana dos trabalhadores. O governo Lula tinha um compromisso de retomá-la”, explica Gabriel Bezerra dos Santos, recém-reeleito presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores Assalariados e Assalariadas Rurais (Contar), principal articuladora dos trabalhos que culminaram com o decreto.

Os trabalhadores rurais assalariados compõem um contingente de mais de 4 milhões de brasileiros, dos quais 2,5 milhões não têm carteira assinada – condição que leva mais de 80% dessas pessoas a receberem menos de um salário mínimo (41%, na verdade, recebem menos de meio salário), segundo estatísticas da Contar. Já dados do Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania indicam que 90% dos resgatados de condições análogas à escravidão são trabalhadores rurais.

Ampliar a formalização do vínculo empregatício, intensificar fiscalizações e melhorar as condições de trabalho decente para permanência de jovens no campo são alguns dos objetivos da política nacional. Mas, conforme o relatório de um grupo técnico de trabalho do governo federal, que recomendou a recriação da comissão nacional, as ações estavam paradas.

“O Plano Nacional dos Trabalhadores Rurais Empregados não só não teve revisão ou continuidade [previstas para 2016] como as instâncias de gestão da política nacional, como a Comissão Nacional dos Trabalhadores Rurais Empregados, foram revogadas pela administração anterior através do Decreto nº 10.854, de 10 de novembro de 2021”, assinala o documento, apresentado no dia 10 de agosto, no congresso da Contar, em Brasília.

Se os próximos passos detalhados na publicação também forem seguidos, a comissão deverá agora produzir um diagnóstico econômico, social e trabalhista dos assalariados rurais brasileiros, trabalhar para garantir o acesso prioritário às políticas públicas de educação, qualificação profissional e reforma agrária às vítimas de trabalho escravo provenientes do meio rural, além de desenvolver estratégia de combate ao uso irregular de agrotóxicos no meio rural, entre outras medidas.

“O governo do presidente Lula tem a tarefa de reverter o processo de enfraquecimento e precarização do trabalho constituído a partir da Reforma Trabalhista do governo de Michel Temer”, assegurou o ministro do Trabalho e Emprego, Luiz Marinho, cujo discurso abriu os trabalhos do 3° Congresso Nacional de Assalariados Rurais, da Contar, no início de agosto, em Brasília. No evento foi apresentado o relatório de um grupo técnico de trabalho do governo federal, que previu a recriação da comissão nacional, entre outras análises e recomendações ao governo.

•        Igualdade racial em pauta

Uma das novidades da recriação da Comissão Nacional dos Trabalhadores Rurais Empregados é a inclusão de dois novos ministérios em sua composição, entre eles o Ministério da Igualdade Racial, já que o trabalhadores rurais empregados são majoritariamente negros no Brasil. O Ministério da Fazenda também passa a integrar o colegiado.

“Estamos em um processo não só de reconstrução, mas também de novas proposições de políticas públicas”, observou Maria Fernanda Coelho, secretária-executiva da Secretaria-Geral da Presidência da República, que também esteve presente no congresso da Contar.

A Secretaria-Geral é o órgão da presidência que busca diálogo e articulação com a sociedade civil. Por isso, o tema da recriação de uma comissão nacional onde também têm assento sete representantes da sociedade civil foi marcante no 3º Congresso da Contar, que aconteceu em Brasília entre os dias 8 e 12 de agosto.

“Este é um espaço que possibilita discussões e debates das necessidades dos trabalhadores e permite que as pessoas façam uma profunda reflexão sobre os desafios que são impostos a essas pessoas”, assinalou Coelho.

No evento, trabalhadores e trabalhadoras assalariadas rurais de todas as partes do Brasil tiveram a oportunidade de debater temas diretamente relacionados às suas atividades em oficinas temáticas e formativas.

 

Fonte: Valor Econômico/Outras Palavras/Repórter Brasil

 

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