Só assim anda: CNJ e CNMP vão acompanhar apuração sobre assassinato de
Mãe Bernadete, na Bahia
Os processos judiciais em que se apuram os
assassinatos da líder quilombola Mãe Bernadete e do filho dela, Binho do
Quilombo, serão acompanhados pelo Observatório das Causas de Grande
Repercussão. O colegiado é formado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e
pelo Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP).
A determinação é da presidente do Supremo Tribunal
Federal (STF) e do CNJ, ministra Rosa Weber. Segundo o CNJ, "o
acompanhamento dos processos sobre as mortes de Mãe Bernadete e de seu filho,
ambos na cidade de Simões Filho (BA), responde à gravidade dos fatos noticiados
na Bahia e à representatividade da religiosa, que era ligada à defesa da causa
quilombola em território ainda sob conflito fundiário".
A ministra Rosa Weber determinou, ainda, a criação
de uma comissão executiva especial para acompanhar os trabalhos de apuração. Em
reunião com o governador do Estado, Jerônimo Rodrigues, e o presidente do
Tribunal de Justiça da Bahia (TJBA), desembargador Nilson Soares Castelo
Branco, ela enfatizou sua consternação e preocupação com a necessidade de
profunda apuração sobre os fatos.
O assassinato da Mãe Bernadete também está sendo
acompanhado pelo Observatório dos Direitos Humanos do Poder Judiciário e pelo
grupo de trabalho criado pelo CNJ para analisar questões relativas à
regularização dos territórios quilombolas.
• Encontro
Na semana passada, durante a sessão plenária do
conselho, a ministra Rosa Weber afirmou que não ia esquecer do assassinato da
líder quilombola e cobrou explicações. “Eu não esquecerei. E o Conselho
Nacional de Justiça vai continuar se empenhando e questionando no sentido do
esclarecimento deste bárbaro assassinato”, afirmou.
A ministra se emocionou ao lembrar do encontro que
teve com Mãe Bernadete em julho. “Tivemos conhecimento de todas as dificuldades
que estas comunidades enfrentam. No mesmo dia, em contato com o governador da
Bahia, externei a ele minha enorme preocupação com o que vira; com a pobreza e
com as dificuldades enfrentadas [por quilombolas]”, acrescentou.
Em julho, após conversar com lideranças quilombolas
da Bahia, a ministra anunciou a instalação de um grupo de trabalho do CNJ para
elaborar estudos e propostas de aperfeiçoamento da atuação do Poder Judiciário
em casos envolvendo a posse, propriedade e titulação envolvendo comunidades
quilombolas. O GT será presidido pelo conselheiro Vieira de Mello Filho.
“Em função desta portaria, quando percorri cinco
capitais fazendo o lançamento dos mutirões carcerários [do CNJ], fomos eu e a
equipe que me acompanhava visitar o Quilombo Quingoma, nas cercanias de
Salvador. […] Conheci a chamada mãe Bernadete, que nos relatou sua história, o
assassinato do seu filho. Uma defensora, uma lutadora pelos direitos humanos. E
que, inclusive, [estava], teoricamente, sob proteção, com câmeras de vídeo
instaladas em sua casa há alguns anos.”
Subsecretário
diz que polícia já sabe quem matou Mãe Bernadete: "Investigação bem
adiantada"
O subsecretário de Segurança Pública da Bahia,
Marcel de Oliveira, que é o secretário em exercício, afirmou que a investigação
sobre a morte de Mãe Bernadete está indo bem e que a polícia já sabe quem
cometeu o crime. Mãe Bernadete foi executada a tiros em Simões Filho, na Região
Metropolitana de Salvador, no dia 17 desse mês.
"A investigação está bem adiantada, com
autorias definidas, com prováveis motivações conhecidas. No entanto, a
investigação tramita em sigilo, mas pode ter certeza que a família vai ter o
resultado que ela precisa e merece receber em pouco tempo", disse Marcel
em entrevista à TV Globo.
• Crime
O quilombo onde Mãe Bernadete, 72 anos, foi
assassinada tem sete câmeras de segurança, mas apenas três estão realmente
funcionando. A líder quilombola estava em programa de proteção do estado por
conta das ameaças que sofria por defender os direitos humanos e,
principalmente, por lutar pela demarcação e titulação das terras de Pitanga dos
Palmares.
As câmeras deveriam ajudar na proteção dela e da
comunidade, só que mais da metade dos equipamentos estavam desligados, o que
pode dificultar o trabalho da investigação. Os familiares de Mãe Bernadete
deixaram Pitanga dos Palmares por conta própria, em busca de segurança, no
mesmo dia em que a quilombola foi morta.
A investigação da morte de Mãe Bernadete está sob
sigilo, mas uma fonte que acompanha o inquérito confirmou para a reportagem que
o laudo da necropsia no corpo da líder quilombola concluiu que ela foi morta
com 22 disparos, sendo 12 no rosto e 10 na região do tórax. As armas e munições
utilizadas não foram especificadas.
• O
CASO
A líder quilombola Maria Bernadete Pacífico,
conhecida como Mãe Bernadete, foi assassinada na noite do dia 17 de agosto,
dentro do Quilombo Pitanga dos Palmares, localizado no município de Simões
Filho, na Região Metropolitana de Salvador (RMS).
Mãe Bernadete era ex-secretária de Políticas de
Promoção da Igualdade Racial e líder da comunidade quilombola de Simões Filho.
Ela era mãe de Flávio Gabriel Pacífico dos Santos (Binho do Quilombo),
liderança quilombola da comunidade Pitanga dos Palmares, também assassinado há
6 anos.
Um homem suspeito de participação no assassinato da
Mãe Bernadete está sendo procurado pela polícia. Segundo informações passadas
por uma fonte ao G1, as ameaças se intensificaram nas últimas três semanas. A
liderança reclamava da presença de um homem que morava perto da sua casa e
tentava vender terrenos no quilombo.
De acordo com a publicação, esse homem ostentava
armas e teria chegado na comunidade, inicialmente, como um prestador de
serviços. No entanto, pouco tempo depois se mostrou interessado em
comercializar terras e mantinha ligação com envolvidos em extração de madeira
ilegal.
"Suspeitamos que tenha havido um conluio entre
esse invasor dos terrenos no quilombo e um policial que está por trás da
exploração clandestina de madeira", disse. O homem é apontado, inclusive,
como responsável por cortes de energia que aconteceram no imóvel momentos antes
do crime.
Pessoas da região acreditam que o corte de energia
tenha sido causado para prejudicar o funcionamento das câmeras de segurança. A
suspeita é de que esse morador tenha servido como espécie de
"olheiro" para os executores do crime
• Família
repudia fala de governador sobre ação do tráfico
A família de Mãe Bernadete está revoltada com a
fala do governador Jerônimo Rodrigues (PT) sobre uma suposta motivação para o
assassinato da líder quilombola. Na semana passada, o governador relacionou o
crime à uma possível guerra entre facções criminosas no território do quilombo.
A fala foi classificada pelo advogado da família,
Leandro Santos, do Instituto de Acesso à Justiça e à Cidadania, como
"irresponsável, violenta e precipitada" e com “potencial de induzir a
investigação da Polícia Civil a seguir uma pista que não tem amparo na
realidade”.
O advogado explica ainda que a fala do governador
exclui as razões mais prováveis para a execução da defensora dos direitos
humanos, que é a disputa fundiária, com a ação de grileiros e de madeireiros
ilegais na região do quilombo Pitanga dos Palmares, que está situado em uma
Área de Proteção Ambiental (APA). O outro advogado da família, David Mendez,
disse que a grilagem é a principal linha investigativa.
Fonte: Correio
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