sexta-feira, 1 de setembro de 2023

Só assim anda: CNJ e CNMP vão acompanhar apuração sobre assassinato de Mãe Bernadete, na Bahia

Os processos judiciais em que se apuram os assassinatos da líder quilombola Mãe Bernadete e do filho dela, Binho do Quilombo, serão acompanhados pelo Observatório das Causas de Grande Repercussão. O colegiado é formado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e pelo Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP).

A determinação é da presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) e do CNJ, ministra Rosa Weber. Segundo o CNJ, "o acompanhamento dos processos sobre as mortes de Mãe Bernadete e de seu filho, ambos na cidade de Simões Filho (BA), responde à gravidade dos fatos noticiados na Bahia e à representatividade da religiosa, que era ligada à defesa da causa quilombola em território ainda sob conflito fundiário".

A ministra Rosa Weber determinou, ainda, a criação de uma comissão executiva especial para acompanhar os trabalhos de apuração. Em reunião com o governador do Estado, Jerônimo Rodrigues, e o presidente do Tribunal de Justiça da Bahia (TJBA), desembargador Nilson Soares Castelo Branco, ela enfatizou sua consternação e preocupação com a necessidade de profunda apuração sobre os fatos.

O assassinato da Mãe Bernadete também está sendo acompanhado pelo Observatório dos Direitos Humanos do Poder Judiciário e pelo grupo de trabalho criado pelo CNJ para analisar questões relativas à regularização dos territórios quilombolas.

•        Encontro

Na semana passada, durante a sessão plenária do conselho, a ministra Rosa Weber afirmou que não ia esquecer do assassinato da líder quilombola e cobrou explicações. “Eu não esquecerei. E o Conselho Nacional de Justiça vai continuar se empenhando e questionando no sentido do esclarecimento deste bárbaro assassinato”, afirmou.

A ministra se emocionou ao lembrar do encontro que teve com Mãe Bernadete em julho. “Tivemos conhecimento de todas as dificuldades que estas comunidades enfrentam. No mesmo dia, em contato com o governador da Bahia, externei a ele minha enorme preocupação com o que vira; com a pobreza e com as dificuldades enfrentadas [por quilombolas]”, acrescentou.

Em julho, após conversar com lideranças quilombolas da Bahia, a ministra anunciou a instalação de um grupo de trabalho do CNJ para elaborar estudos e propostas de aperfeiçoamento da atuação do Poder Judiciário em casos envolvendo a posse, propriedade e titulação envolvendo comunidades quilombolas. O GT será presidido pelo conselheiro Vieira de Mello Filho.

“Em função desta portaria, quando percorri cinco capitais fazendo o lançamento dos mutirões carcerários [do CNJ], fomos eu e a equipe que me acompanhava visitar o Quilombo Quingoma, nas cercanias de Salvador. […] Conheci a chamada mãe Bernadete, que nos relatou sua história, o assassinato do seu filho. Uma defensora, uma lutadora pelos direitos humanos. E que, inclusive, [estava], teoricamente, sob proteção, com câmeras de vídeo instaladas em sua casa há alguns anos.”

 

       Subsecretário diz que polícia já sabe quem matou Mãe Bernadete: "Investigação bem adiantada"

 

O subsecretário de Segurança Pública da Bahia, Marcel de Oliveira, que é o secretário em exercício, afirmou que a investigação sobre a morte de Mãe Bernadete está indo bem e que a polícia já sabe quem cometeu o crime. Mãe Bernadete foi executada a tiros em Simões Filho, na Região Metropolitana de Salvador, no dia 17 desse mês.

"A investigação está bem adiantada, com autorias definidas, com prováveis motivações conhecidas. No entanto, a investigação tramita em sigilo, mas pode ter certeza que a família vai ter o resultado que ela precisa e merece receber em pouco tempo", disse Marcel em entrevista à TV Globo.

•        Crime

O quilombo onde Mãe Bernadete, 72 anos, foi assassinada tem sete câmeras de segurança, mas apenas três estão realmente funcionando. A líder quilombola estava em programa de proteção do estado por conta das ameaças que sofria por defender os direitos humanos e, principalmente, por lutar pela demarcação e titulação das terras de Pitanga dos Palmares.

As câmeras deveriam ajudar na proteção dela e da comunidade, só que mais da metade dos equipamentos estavam desligados, o que pode dificultar o trabalho da investigação. Os familiares de Mãe Bernadete deixaram Pitanga dos Palmares por conta própria, em busca de segurança, no mesmo dia em que a quilombola foi morta.

A investigação da morte de Mãe Bernadete está sob sigilo, mas uma fonte que acompanha o inquérito confirmou para a reportagem que o laudo da necropsia no corpo da líder quilombola concluiu que ela foi morta com 22 disparos, sendo 12 no rosto e 10 na região do tórax. As armas e munições utilizadas não foram especificadas.

•        O CASO

A líder quilombola Maria Bernadete Pacífico, conhecida como Mãe Bernadete, foi assassinada na noite do dia 17 de agosto, dentro do Quilombo Pitanga dos Palmares, localizado no município de Simões Filho, na Região Metropolitana de Salvador (RMS).

Mãe Bernadete era ex-secretária de Políticas de Promoção da Igualdade Racial e líder da comunidade quilombola de Simões Filho. Ela era mãe de Flávio Gabriel Pacífico dos Santos (Binho do Quilombo), liderança quilombola da comunidade Pitanga dos Palmares, também assassinado há 6 anos.

Um homem suspeito de participação no assassinato da Mãe Bernadete está sendo procurado pela polícia. Segundo informações passadas por uma fonte ao G1, as ameaças se intensificaram nas últimas três semanas. A liderança reclamava da presença de um homem que morava perto da sua casa e tentava vender terrenos no quilombo.

De acordo com a publicação, esse homem ostentava armas e teria chegado na comunidade, inicialmente, como um prestador de serviços. No entanto, pouco tempo depois se mostrou interessado em comercializar terras e mantinha ligação com envolvidos em extração de madeira ilegal.

"Suspeitamos que tenha havido um conluio entre esse invasor dos terrenos no quilombo e um policial que está por trás da exploração clandestina de madeira", disse. O homem é apontado, inclusive, como responsável por cortes de energia que aconteceram no imóvel momentos antes do crime.

Pessoas da região acreditam que o corte de energia tenha sido causado para prejudicar o funcionamento das câmeras de segurança. A suspeita é de que esse morador tenha servido como espécie de "olheiro" para os executores do crime

•        Família repudia fala de governador sobre ação do tráfico

A família de Mãe Bernadete está revoltada com a fala do governador Jerônimo Rodrigues (PT) sobre uma suposta motivação para o assassinato da líder quilombola. Na semana passada, o governador relacionou o crime à uma possível guerra entre facções criminosas no território do quilombo.

A fala foi classificada pelo advogado da família, Leandro Santos, do Instituto de Acesso à Justiça e à Cidadania, como "irresponsável, violenta e precipitada" e com “potencial de induzir a investigação da Polícia Civil a seguir uma pista que não tem amparo na realidade”.

O advogado explica ainda que a fala do governador exclui as razões mais prováveis para a execução da defensora dos direitos humanos, que é a disputa fundiária, com a ação de grileiros e de madeireiros ilegais na região do quilombo Pitanga dos Palmares, que está situado em uma Área de Proteção Ambiental (APA). O outro advogado da família, David Mendez, disse que a grilagem é a principal linha investigativa.

 

Fonte: Correio

 

Nenhum comentário:

Postar um comentário