segunda-feira, 28 de agosto de 2023

Exame de urina pode indicar novo sinal precoce de insuficiência renal

Pesquisadores da University of Texas Health Science Center at San Antonio, uma universidade nos Estados Unidos, descobriram que os níveis de adenina na urina, um metabólito que surge no rim, é um biomarcador que acusa, com até 10 anos de antecedência, o surgimento da insuficiência renal progressiva em pessoas com diabetes. Segundo o estudo, divulgado, nesta quinta-feira (24/08), na revista Journal of Clinical Investigation, a novidade poderá direcionar ações médicas mais assertivas, promovendo diagnósticos e intervenções em estágios iniciais da doença.

A vantagem de ter acesso a essas informações precoces é a possibilidade de reduzir a ocorrência de quadros mais críticos, como a instalação de uma insuficiência renal e a obrigatoriedade de diálises, segundo os autores. Atualmente, o biomarcador mais importante para a doença renal é a presença da proteína albumina na urina. No entanto, cerca de metade das pessoas com diabetes e insuficiência renal nunca apresenta alta quantidade dessa substância, o que dificulta um diagnóstico precoce eficaz.

"Antevemos que esse achado conduzirá a novos testes e tratamento", aposta Kumar Sharma, professor e chefe da área de nefrologia da universidade americana e autor sênior do trabalho. Wallace Padilha, nefrologista do Hospital DF Star, em Brasília, considera que a pesquisa, de fato, pode trazer luz à medicina. "Se realmente conseguirmos fazer isso, com um exame de urina, será possível detectar o perfil do paciente que evolui pior e, assim, tratá-lo de forma mais intensiva ou acompanhar mais de perto, evitando que seja necessário fazer diálise", afirma.

O estudo envolveu a análise de mais de 1.200 pessoas diagnosticadas com diabetes, abrangendo distintos grupos de indivíduos. Foram englobados participantes afro-americanos, hispânicos, caucasianos e asiáticos. Além disso, uma investigação separada foi conduzida junto à população indígena dos Estados Unidos. "Em cada estudo, encontramos o mesmo padrão, mostrando que níveis elevados de adenina na urina estavam associados a maior risco de insuficiência renal", relata, em nota, Sharma.

Ainda conforme o cientista, os metabólitos, que são moléculas de pequeno porte geradas pelo corpo, desempenham um papel crucial no funcionamento saudável das células e também revelam padrões ligados a patologias. Para investigar a ação dessa substância nos rins, a equipe de cientistas aprimorou um método pouco difundido, conhecido como aplicação da metabolômica espacial, em biópsias renais de humanos. Por meio dessa técnica, pôde-se mapear, com precisão, a distribuição da adenina e de outras moléculas de menor porte nos tecidos do órgão.

Ao analisar as informações obtidas, a equipe identificou a presença de adenina próximo a vasos sanguíneos cicatrizados nos rins e ao redor de algumas células do órgão que estava sofrendo deterioração. Essas informações são um preditivo para a falência renal em pacientes com diabetes. "O risco de morte causado por essa condição é muito elevado, especialmente nesses pacientes. A mortalidade chega a 40% em cinco anos naqueles com as duas condições", explica o autor principal do estudo.

Elber Rocha, nefrologista e coordenador do Programa de Transplantes do Hospital Santa Lúcia, em Brasília, pontua que, apesar dos resultados promissores, serão necessários outros trabalhos para comprovar que a adenina pode ser usada no diagnóstico precoce de complicações renais. "Esses estudos que investigam a excreção urinária de adenina ainda são preliminares. O marcador mais empregado hoje é a avaliação da relação albumina-creatinina. Então, a perda de albumina é o marcador clínico mais precoce que temos", explica.

•        Tratamento

Os pesquisadores também identificaram uma pequena molécula que bloqueia a principal via de produção de adenina no corpo, abrindo a possibilidade de futuros tratamentos. Testada em camundongos com diabetes tipo 2, a molécula diminuiu os níveis do biomarcador nos rins dos animais.

Conforme Sharma, o remédio apresentou benefícios notáveis na redução de todos os aspectos da lesão renal diabética. "Esse é o primeiro estudo a demonstrar que bloquear uma via metabólica específica, relacionada à fibrose renal, poderia tratar a doença nos rins sem afetar os níveis de glicose no sangue. Não há outros medicamentos existentes que tenham um efeito semelhante, pelo que sabemos", diz.

Na avaliação de Padilha, ainda não é possível saber se a molécula poderá ser usada em humanos e terá o mesmo desempenho. "Usada em ratos, ela reduziu a produção de adenina, só que isso não se associou a uma melhora dos níveis de creatinina nem a uma diminuição da quantidade de proteína na urina dos ratos. Então, ainda não é possível dizer se ela é uma potencial candidata à medicação para humanos. Novos estudos serão necessários para podermos concluir algo sobre isso."

Os cientistas descobriram ainda que um medicamento já disponível no mercado, a empagliflozina, também reduz a adenina em pacientes com o problema de saúde, agindo de maneira diferente à molécula testada em ratos. "Essa característica recém-encontrada poderia fazer parte da gama de efeitos benéficos", cogita Sharma. No momento, a equipe desenvolve novos tratamentos para bloquear a produção de adenina e avançará para testes clínicos caso essas terapêuticas se mostrem seguras e eficazes.

 

       Técnica identifica "impressão digital" de câncer em amostras de saliva e urina

 

A descoberta do câncer pode se tornar mais fácil, mais barata e menos invasiva com uma nova técnica desenvolvida por pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP): o grupo desenvolveu um método de diagnóstico a partir da análise de substâncias químicas em amostras de saliva e urina, que, caso estejam alteradas, são consideradas “impressões digitais” do câncer.

As substâncias químicas analisadas no estudo são chamadas de compostos orgânicos voláteis (VOCs), produzidos naturalmente pelo organismo humano, mas que podem sofrer alterações em pessoas com câncer. “Em casos de doenças como o câncer, ocorrem alterações metabólicas que podem gerar novos VOCs ou modificar a concentração dos que já estão presentes no organismo”, explica Bruno Ruiz Brandão da Costa, farmacêutico bioquímico da USP e autor principal do artigo, ao Jornal da USP.

Com a técnica, que ainda é experimental, os diagnósticos serão simplificados e poderão ser acessíveis a pessoas que não possuem recursos para fazer os exames necessários para detectar câncer.

“Para diagnosticar o câncer, os médicos utilizam diversos exames, como mamografia, tomografia, ressonância magnética, endoscopia, colonoscopia, exames de sangue e biópsia. Esses métodos são seguros e eficazes. No entanto, esses procedimentos costumam ser invasivos, trabalhosos, envolvem custos consideráveis e exigem profissionais altamente qualificados”, detalha Bruno.

“Sendo assim, muitas vezes os exames diagnósticos não são facilmente acessíveis a todos os tipos de pacientes. Por todos esses motivos, o desenvolvimento de técnicas acessíveis, rápidas e não invasivas de detecção do câncer representa uma demanda crítica e desafiadora em nossa sociedade”, acrescenta.

•        Em busca da “impressão digital”

Para encontrar a “impressão digital” do câncer, os pesquisadores, da Faculdade de Ciências Farmacêuticas de Ribeirão Preto (FCFRP) da USP, recolheram amostras de urina e saliva de pessoas com câncer e pessoas saudáveis — a ideia era verificar se a técnica conseguia captar as alterações dos VOCs presentes em pacientes com câncer.

Se a técnica tivesse êxito e encontrasse as alterações, os cientistas saberiam que ela é capaz de diagnosticar o câncer em pessoas que ainda não descobriram a doença apenas pelo teste de saliva e urina.

Para testar a técnica, os cientistas convidaram pacientes dos ambulatórios da área de Oncologia Clínica do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (HCFMRP) da USP para doar as amostras. Os participantes do estudo foram divididos em dois grupos: o primeiro com pacientes com câncer na cabeça e no pescoço (15 pessoas) e gastrointestinal (19) e o segundo com pessoas saudáveis (39).

As amostras foram coletadas e levadas para a análise no Laboratório de Análises Toxicológicas Forenses do Departamento de Química da FCFRP. Lá os pesquisadores fizeram a técnica química para avaliar os perfis das coletas.

Primeiro, o material foi colocado em um frasco, que era fechado, aquecido e agitado. Depois, ele foi submetido a um processo de vaporização e o vapor foi submetido a uma análise em um equipamento de cromatografia com detector de ionização, que realiza a separação dos compostos.

“Após a separação, os compostos são detectados e geram um sinal analítico que chamamos de ‘pico’. O conjunto de picos presentes em toda a análise é chamado de ‘cromatograma’”, detalha Bruno. Os perfis cromatográficos de cada amostra foram analisados e a técnica foi capaz de identificar as assinaturas do câncer em pessoas com a doença.

“Neste trabalho nós não identificamos as substâncias presentes nas amostras, para isso seria necessário um equipamento muito mais caro. A diferenciação foi feita exclusivamente pelos diferentes perfis dos picos presentes no cromatograma, o que também é chamado de fingerprint, ou uma ‘impressão digital’ do câncer”, explica Bruno.

De acordo com os pesquisadores, os resultados foram bons para um estudo preliminar: a taxa de detecção de câncer de cabeça e pescoço por meio da análise de urina foi de 82,3%. Já o melhor resultado para diagnosticar câncer gastrointestinal foi a análise de amostra de saliva, que atingiu taxa de sucesso de detecção de 87,5%.

Bruno diz que já há pesquisas do tipo em todo o mundo, no entanto, “ainda não há nenhum método do tipo sendo adotado, de fato, em uma rotina clínica”. Além disso, a pesquisa da USP traz o fator inovador da análise “híbrida”, onde as duas amostras são avaliadas em conjunto para aprimorar a detecção do câncer.

Agora, o pesquisador afirma que é necessária uma análise com um número maior de participantes antes de usar o método nos serviços de saúde. Ele está certo que o caminho é promissor.

“O método desenvolvido é simples, mais barato do que aqueles aplicados atualmente. Além disso, um ponto importantíssimo é que a nossa coleta é não invasiva, realizada de maneira rápida e simples, causando o mínimo desconforto possível para o paciente, muito diferente de um exame de sangue ou biópsia, por exemplo”, declara.

 

Fonte: Correio Braziliense

 

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