'Tem gente comendo ração e esquentando comida com velas': como é a pobreza no Reino Unido
O aumento da pobreza no Reino Unido está levando
pessoas a se alimentarem com ração, enquanto outras estão aquecendo comida no
radiador de calefação ou com velas.
A
denúncia foi feita por Mark Seed, diretor de um projeto comunitário de
alimentação em Trowbridge, no leste de Cardiff, capital do País de Gales.
Análise
da BBC dos dados do Censo britânico de 2021 indica que seis das comunidades
mais carentes do País de Gales, uma das quatro nações que compõem o Reino
Unido, estão naquele distrito.
No
entanto, ONGs advertem que famílias em dificuldades não se encontram apenas em
áreas há muito associadas à pobreza e pede que as políticas se concentrem nas
pessoas, e não nos lugares.
A
situação em Cardiff retrata um cenário desafiador que muito enfrentam no Reino
Unido por causa do aumento da inflação — relatos como o de Seed se somam aos de
muitos outros cidadãos que vivem em diferentes partes do país.
Quase
um terço das mães ou pais solteiros está pulando uma das refeições do dia para
sobreviver, segundo um levantamento recente do grupo Which? sobre as famílias
mais atingidas pela crise inflacionária no país.
Membros
de três em cada 10 famílias monoparentais entrevistados disseram que pularam
uma refeição como resultado do aumento dos preços dos alimentos. No total, a
mesma situação ocorre em 14% dos domicílios que participaram do estudo.
"As
famílias em todo o Reino Unido estão enfrentando dificuldades devido ao aumento
do custo de vida, sendo as famílias monoparentais as mais afetadas pela
crise", diz Rocío Concha, diretora de política e ativismo da Which? ao
jornal britânico The Guardian.
·
'Arco da pobreza'
Trowbridge
fica no que Seed chama de "arco da pobreza" de leste a oeste de
Cardiff.
"Ainda
fico impressionado com as pessoas comendo ração", diz ele.
"[Há]
pessoas que tentam aquecer a comida no radiador ou com uma vela. São histórias
verídicas chocantes", acrescenta.
"Cardiff
é uma cidade próspera, mas tem bolsões de pobreza que são simplesmente
inaceitáveis ", diz Seed, que relata que as pessoas não ganham o
suficiente para pagar pelo essencial.
A
crise inflacionária só agravou a situação.
"[As
pessoas] nos dizem que trabalham todas as horas que podem", explica ele.
The
Pantry, o banco de alimentos administrado por Seed, oferece comida de boa
qualidade a preços muito baixos para mais de 160 pessoas.
Uma
delas é Elizabeth Williams, de 54 anos, que diz que o projeto "faz uma
grande diferença" e aproxima as pessoas, mas admite que sua situação está
muito difícil.
"Normalmente,
tento não gastar para melhorar as coisas na minha casa", diz ela.
Ela
e o companheiro não trabalham, enquanto o filho, que mora com eles, trabalha
muitas horas.
"Mesmo
com meu filho trabalhando e contribuindo, é difícil, porque ele também tem que
viver e tem necessidades. Ele tem vários problemas e está aguardando uma
cirurgia", diz.
Durante
décadas, o oeste de Gales e a região dos vales receberam financiamento
adicional da União Europeia (UE) porque estavam entre as regiões mais pobres da
Europa, mas Cardiff não era incluída porque, em termos de padrão de vida médio,
não é considerada uma região carente.
Victoria
Winckler, diretora da ONG galesa The Bevan Foundation, alerta sobre os perigos
de estereotipar grandes áreas ou cidades como carentes ou prósperas.
"O
estereótipo é que Cardiff é próspera e os vales são pobres, mas os números
mostram que não é bem assim", diz ela.
"Há
áreas de Cardiff que são prósperas, sim, mas também há áreas bastante
significativas da capital galesa onde as pessoas não vivem tão bem",
acrescenta.
Para
a organização, é fundamental que os supermercados garantam que os preços sejam
fáceis de comparar e que haja variedade de oferta para diferentes orçamentos.
"Como
os preços continuam subindo, é fundamental que todas as pessoas tenham acesso a
alimentos saudáveis e acessíveis para elas e suas famílias", acrescenta
Concha, da Which?.
Os
últimos dados oficiais mostram que a inflação de alimentos no Reino Unido
atingiu 16,4% em outubro, nível mais alto desde 1977.
Isso
se deve principalmente ao forte aumento de produtos da cesta básica, como
leite, manteiga, queijo, massas e ovos.
Os
domicílios monoparentais e os aposentados destinam parcela maior de sua renda à
alimentação, eletricidade e gasolina, cerca de 30%. Para casais com filhos,
esse percentual cai para 25%, segundo cálculos oficiais.
No
entanto, todas as famílias estão gastando significativamente mais do que no ano
passado em produtos essenciais.
Uma
mulher de 40 anos disse aos entrevistadores que, devido ao custo de suas
contas, em algumas semanas ela mal consegue alimentar os filhos.
Outra
pessoa acrescentou: "Não estou comendo adequadamente para poder alimentar
e vestir meus filhos e ainda ter o suficiente para (pagar pela)
eletricidade."
Segundo
dados revelados esta semana pela Confederação da Indústria Britânica, a
economia do Reino Unido caminha para uma contração de 0,4% no próximo ano
devido à inflação e ao receio das grandes empresas em investir.
Fonte:
BBC News Brasil
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