PF cumpre mandados em operação sobre compra
de respiradores pelo Consórcio Nordeste, na gestão Rui Costa
A Polícia Federal
deflagrou, nesta quinta-feira (1º), a segunda fase da Operação Cianose, que
investiga o desvio de valores na compra de respiradores pelo Consórcio
Interestadual de Desenvolvimento Sustentável do Nordeste (Consórcio Nordeste)
durante a pandemia da covid-19.
Segundo a PF, estão
sendo cumpridos 34 mandados de busca e apreensão e medidas judiciais de
sequestro de bens, expedidos pela Justiça Federal da Bahia. Os mandados são
cumpridos nos estados da Bahia, Paraná, Rio de Janeiro e São Paulo. Os delitos
investigados incluem crimes licitatórios, desvio de recursos públicos, lavagem
de capitais e organização criminosa, segundo a polícia.
• Primeira fase
A primeira fase da
Operação Cianose cumpriu mandados em abril de 2022. Ao todo, foram cumpridos 14
mandados de busca e apreensão. Os investigados podem responder pelos crimes de
estelionato em detrimento de entidade pública (art. 171, § 3º, do Código Penal),
dispensa de licitação sem observância das formalidades legais (art. 89, caput e
parágrafo único da Lei de Licitações) e lavagem de dinheiro (art. 10, da Lei nº
9.613/98).
Segundo a PF, o
processo de aquisição que se seguiu contou com diversas irregularidades, como o
pagamento antecipado de seu valor integral sem que houvesse no contrato
qualquer garantia contra eventual inadimplência por parte da contratada. Ao
fim, nenhum respirador foi entregue.
O nome da operação
denota a condição médica que afeta o paciente que passa por problemas
relacionados à má oxigenação do sangue, que pode ser causada, por exemplo, por
uma insuficiência respiratória ou uma doença pulmonar.
• Delação
O nome do
ministro-chefe da Casa Civil e ex-governador da Bahia, Rui Costa (PT), foi
citado na delação premiada da empresária responsável pela venda de 300
respiradores durante a pandemia. O governo baiano pagou R$ 48 milhões em um
contrato, mas os respiradores nunca foram entregues.
A reportagem teve
acesso ao acordo de delação premiada firmado pela empresária Cristiana Taddeo,
da Hempcare, responsável pela venda dos respiradores, com a PGR
(Procuradoria-Geral da República). Ela afirma que o negócio foi intermediado
por um empresário que se apresentou como sendo amigo de Rui Costa e da então
primeira-dama Aline Peixoto.
Aline era funcionária
da secretaria estadual de Saúde, e, em 2023, foi nomeada para o cargo vitalício
de conselheira do Tribunal de Contas dos Municípios da Bahia.
Taddeo revela que
pagou R$ 11 milhões em comissões aos intermediários, entre eles, o empresário
Cleber Isaac, que teriam facilitado o contato entre a empresa Hempcare junto ao
Consórcio Nordeste. Isaac seria amigo de Rui Costa e de Aline Peixoto.
Rui Costa negou
envolvimento com irregularidades e disse nunca ter tratado "com nenhum
preposto ou intermediário sobre a questão das compras deste e de qualquer outro
equipamento de saúde", em nota enviada à publicação.
'Durante a pandemia,
as compras realizadas por estados e municípios no Brasil e no mundo inteiro
foram feitas com pagamento antecipado. Esta era a condição vigente naquele
momento', afirmou em nota.
Em depoimento ainda em
2020, à Polícia Civil, a empresária dona da Hempcare disse que o ex-secretário
da Casa Civil do governo da Bahia, Bruno Dauster, sugeriu um aditivo contratual
para que fosse aumentado o valor dos equipamentos. O ex-chefe da pasta pediu
demissão após o escândalo.
No depoimento ao qual
o CORREIO teve acesso, Cristiana Taddeo contou que não conhecia Dauster
pessoalmente e tratou a venda de R$ 48,7 milhões através de ligações e
mensagens via WhatsApp. Após a assinatura do contrato, esse montante teria sido
depositado integralmente apenas dois dias depois. Ela disse ainda que sua
empresa, com sede em São Paulo, não é fabricante de respiradores e que agiu
como importadora dos produtos, que viriam da cidade de Guangzhou, na China.
Presa junto com outras
duas pessoas pela Operação Ragnarok, que investiga suposta fraude na compra das
máquinas, Cristiana Taddeo descreveu a Hempcare como uma empresa de fabricação,
distribuição e representação de medicamentos à base de canabidiol. A oportunidade
de fazer a importação de respiradores teria surgido após um grupo de
empresários se reunir pelo WhatsApp para entender como poderiam mediar essas
compras.
A empresária disse que
tratou das transações quase exclusivamente com Dauster e que o Consórcio
Nordeste "teve pouca autonomia no processo de compra dos ventiladores
pulmonares". O consórcio, presidido pelo governador Rui Costa, é uma
articulação formada pelos nove estados nordestinos para projetos econômicos,
políticos, infraestrutural e social.
À polícia, a
empresária Cristiana Taddeo disse que não tinha ideia do porquê a sua empresa
foi contratada, já que era pequena e dispensável no processo, uma vez que
"Bruno Dauster possui muitos contatos e poderia contratar diretamente com
o fabricante chinês".
Ainda no processo da
compra frustrada com a China, a empresária relatou que chegou a transferir R$
400 mil para um homem como uma espécie de comissão por ele ter ajudado a
agenciar os contatos com a empresa chinesa, a MCC8.
• Escândalo dos respiradores custou à
Bahia pelo menos R$ 3 milhões só com advogados nos EUA
Fora o enorme prejuízo
ao erário, a suspeita compra dos respiradores para pacientes em estado grave
por causa da covid-19 custou ao governo da Bahia cerca de R$ 3 milhões em
honorários advocatícios para um escritório dos EUA, contratado para reaver
valores de uma das empresas envolvidas no escândalo, a Ocean 26. A informação
consta em um relatório de auditoria feito pelo TCE nas contas da
Procuradoria-Geral do Estado (PGE) referentes a 2021. De acordo com o
relatório, o valor foi pago à banca King and Spalding, com sede no estado da
Califórnia. Incialmente, o contrato foi fixado em quase R$ 500 mil, mas ficou
seis vezes maior pela recusa da Ocean 26 em devolver os US$ 8,64 milhões pagos
pelo Fundo de Saúde do Estado.
Depois da rasteira
Pelo contrato firmado
no início da pandemia, a empresa se comprometeu a entregar 600 respiradores de
forma imediata ou até 20 de abril de 2020, mas os aparelhos jamais chegaram à
Bahia. Como a Ocean 26 se recusou a devolver a verba, o governo buscou os serviços
dos advogados americanos para tentar reaver o dinheiro.
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Salada de erros
Na avaliação dos
auditores do tribunal de contas, o contrato para compra dos respiradores foi
firmado em 30 de março de 2020 com "cláusulas atípicas, sem o oferecimento
de garantia e com pagamento antecipado", mas sem avaliação do risco de
inadimplência dos fornecedores. Após o calote consolidado, a empresa dos
Estados Unidos ofereceu, como contrapartida ao governo do estado, equipamentos
hospitalares diferentes, em quantidade menor e prazo maior que o previsto
inicialmente.
Fonte: Correio
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