Os
árbitros de futebol e o "complexo de Napoleão"
Impedimento?
Falta? Mão na bola? No futebol, é comum ocorrerem discussões acaloradas sobre
decisões controversas tomadas pelos árbitros durante as partidas. É justamente
por isso que os jogos profissionais são normalmente supervisionados por um
árbitro principal no campo e dois auxiliares, além do chamado quarto árbitro.
Para
evitar decisões incorretas, há com frequência a presença dos assistentes de
vídeo (VAR) que analisam os lances mais controversos, possivelmente em câmera
lenta, e informam o árbitro principal com o auxílio de inúmeras câmeras que
observam meticulosamente cada momento das partidas através de ângulos
diferentes.
Apesar
de os árbitros não tomarem as decisões de maneira isolada, algumas delas podem
parecer um tanto arbitrárias. Isso pode ocorrer em razão de os árbitros
principais possuírem uma grande margem discricionária em seu poder de decisão
nas partidas de futebol.
·
Compensação da baixa
estatura
Um
grupo de pesquisadores alemães analisou a relação entre a estatura física dos
árbitros e dos jogadores de futebol em um estudo realizado a tempo do início
da Eurocopa 2024 – o
campeonato europeu de seleções realizado na Alemanha entre 14 de junho e 14 de
julho.
Segundo
a pré-publicação do estudo – que ainda não foi avaliado por outros
especialistas –, os árbitros de menor estatura punem os jogadores mais altos
com maior rigor, sugerindo que isso pode ser um modo de compensar uma
suposta baixa predominância física.
Alguns
torcedores podem compreender isso como uma explicação de como as decisões
seriam tomadas de maneira não objetiva e até injusta, simplesmente por que um
árbitro possui um complexo. No entanto, essa teoria somente será validada após
a pré-publicação passar por análises científicas.
·
"Quem manda aqui
sou eu"
Os
pesquisadores Hendrik Sonnabend e Giulio Callegaro da Universidade de Hagen, na
Alemanha, juntamente com Mario Lackner, da Universidade Johannes Kepler em
Linz, analisaram dados da Bundesliga (campeonato alemão de futebol) de 2014 a
2021, e observaram mais de 2.340 partidas.
Segundo
a pré-publicação, um árbitro comparativamente mais baixo estaria mais apto a
apitar uma falta e aplicar um cartão amarelo quando o jogador em questão é mais
alto do que ele, de acordo com a conclusão dos pesquisadores.
"A
tendência a punir com mais rigor é 10% maior quando os jogadores são
significativamente mais altos do que os árbitros, em comparação a situações nas
quais os atletas estão na mesma altura dos olhos", diz Sonnabend.
Segundo
a pré-publicação, o chamado "complexo de Napoleão" pode ser visto
mais claramente no primeiro tempo das partidas. "Fica claro que as
punições são usadas para demonstrar autoridade. Se eles não obtiverem êxito
através da predominância física, eles punem segundo o lema 'quem manda aqui sou
eu'", diz o pesquisador.
No
segundo tempo dos jogos, as punições mais duras pelos árbitros relativamente
mais baixos, como os cartões amarelos, diminuem. "Isso pode ocorrer em
razão de os jogadores perceberem que o árbitro pune as infrações mais
rapidamente", avalia Sonnabend.
·
O pequeno grande
imperador
A base
para o estudo é a teoria da psicologia conhecida como "complexo de
Napoleão", que afirma que pessoas de baixa estatura, especialmente os
homens, tendem a ser agressivos ou dominantes para compensar seu tamanho.
O
nome dado à teoria remete ao antigo imperador francês Napoleão Bonaparte.
Contudo, a convicção equivocada sobre o suposto "pequeno imperador"
se baseia em um erro de conversão. Com 1,69 metro de altura, ele era bem mais
alto do que a média de sua época.
Ao
mesmo tempo, segundo a pré-publicação, há também o complexo reverso de Napoleão
nas partidas de futebol, quando um árbitro alto que olha os jogadores de cima
para baixo é mais leniente ao aplicar as penalidades.
Os
jogadores de baixa estatura recebem 16% menos punições do que os com altura
semelhante à dos árbitros. Ser alto, aparentemente, é algo que vem em
combinação com uma certa calma, segundo pesquisadores.
·
Lições para a vida
profissional?
Se
essa publicação preliminar poderá ou não ser comprovada, dependerá das análises
cientificas. Hendrik Sonnabend é, na verdade, um pesquisador das áreas do
trabalho e da economia comportamental. Em sua opinião, as observações feitas no
esporte podem ser transferidas para nosso comportamento cotidiano ou
profissional.
Ele
diz que é comum que, na vida profissional, uma pessoa em posição superior
"lance mão de outros meios ao lidar com um funcionário, ao sentir que não
está sendo levada a sério".
Os
pesquisadores em Hagen acreditam que um preconceito relacionado à altura também
é comum em quadros de diretores, em processos de seleção e nas avaliações de
desempenho. Essa pré-noção também afeta as oportunidades de carreira, promoções
e a vida diária no ambiente de trabalho.
A
autoridade, porém, pode ser estabelecida não apenas através de punições, mas,
acima de tudo, através de declarações claras e da linguagem corporal adequada.
Os pesquisadores, portanto, defendem programas de treinamento adequados. As
avaliações devem ser sempre feitas com justiça – seja na vida profissional ou
no futebol – e não devem ser distorcidas por outras características, como
simpatias pessoais ou altura física.
Fonte:
Deutsche Welle
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