O atraso que une governo Lula a
bolsonaristas e oposição
O governo do
presidente Lula da Silva deu sinais de que pode apoiar uma Proposta de Emenda à
Constituição (PEC) que trava ainda mais o Orçamento. De autoria do senador
bolsonarista Carlos Portinho (PL-RJ), a PEC fixa um porcentual mínimo para
destinação de recursos para a Defesa – 1,2% do Produto Interno Bruto no
primeiro ano de vigência, com aumentos anuais até chegar a 2%. Estivesse em
vigor, a chamada PEC da Defesa teria elevado o Orçamento da pasta para 2024 dos
atuais R$ 126,6 bilhões para R$ 130,8 bilhões.
Já se sabe que Lula
está ansioso para agradar às Forças Armadas e reconquistar a confiança dos
militares, mas colaborar para engessar ainda mais a peça orçamentária é um
péssimo caminho. A bem do País, o presidente deveria direcionar seus esforços
no sentido diametralmente oposto, vale dizer, trabalhar por um Orçamento cada
vez menos travado. Afinal, essa é uma distorção que, a um tempo, reduz
sensivelmente a discricionariedade do próprio chefe do Poder Executivo federal
e, o que é ainda pior, abastarda a democracia representativa ao interditar o
debate público sobre a destinação dos recursos dos contribuintes. Obviamente,
não se pode falar em debate algum quando o Orçamento já nasce com 90% dos
recursos comprometidos com gastos obrigatórios e apenas 10% destinados aos
chamados gastos discricionários.
Convém lembrar que “o
Orçamento é o coração da democracia”, como bem sintetizou o ex-presidente do
Banco Central Gustavo Franco em uma de suas colunas publicadas por este jornal
(O Orçamento público e a democracia, 28/11/2021). De fato, poucos atos da
vida coletiva expressam com mais vivacidade a essência do regime democrático do
que a discussão pública sobre os múltiplos desejos da sociedade e,
principalmente, sobre os meios para materializá-los na peça orçamentária. Mais
bem dito: uma democracia só estará plenamente consolidada quando a sociedade
for livre e madura o bastante para elencar, por meio de seus representantes, as
grandes prioridades nacionais, tendo como norte o bem comum. Em que pese o
valor de cada um dos interesses sociais em jogo no debate público, dinheiro não
brota do chão e, portanto, escolhas precisam ser feitas.
Deveria ser ocioso
enfatizar que Lula da Silva – ou qualquer presidente –, a rigor, não tem de
conquistar a simpatia ou a confiança dos militares, e sim manter com eles uma
relação republicana e institucional. Portanto, as discussões sobre um eventual
aumento de recursos para a Defesa deveriam se dar em razão das necessidades
específicas do setor e em contraste com as necessidades de outros setores –
porque, convém recordar, o dinheiro público é finito.
Ademais, no momento em
que o próprio governo federal se vê em dificuldades para fechar as contas
públicas, haja vista a recente revisão das metas de resultado primário para os
próximos anos, é no mínimo contraditório, para não dizer temerário, expressar esse
apoio a uma PEC que só tende a agravar a situação fiscal do País.
Não se discute aqui o
mérito das demandas orçamentárias das Forças Armadas, assim como decerto são
valorosos os pleitos por mais investimentos nas pastas da Saúde e da Educação,
ou do Turismo, ou da Cultura – sempre haverá bons argumentos para investir em
todas essas áreas e em tantas outras. A grande questão é que à sociedade não é
dado nem sequer discutir essas alocações orçamentárias, uma vez que boa parte
do dinheiro já está carimbada. Ao invés de contribuírem para a reversão desse
cenário, governo e oposição se unem para agravá-lo ainda mais.
Com um Orçamento
comprometido de forma avassaladora com os gastos obrigatórios – como o
pagamento de salários do funcionalismo público, pensões e aposentadorias, além
de benefícios sociais e privilégios setoriais que se perpetuaram ao longo do
tempo –, sobra quase nada para a sociedade decidir onde e como investir. Ou
seja, para definir melhor o seu próprio futuro.
¨ Cenário no Congresso é de derrotas anunciadas para o Planalto
Com ou sem
reaproximação com o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), o cenário que se
desenha para o governo em votações previstas a partir da semana que vem é de
derrotas anunciadas. E que já estão contabilizadas pelo Palácio do Planalto.
Duas delas, ao menos, deverão ser vitórias da oposição, aliada ao Centrão, por
uma larga margem de votos.
O governo não terá
qualquer chance em conter a derrubada do veto do presidente Luiz Inácio Lula da
Silva no texto da lei que regulamentou as saídas temporárias de presos. Lula
buscou flexibilizar, permitindo que os presos possam sair para ver seus familiares,
manteve pontos de interesse da bancada da bala e de outros nichos conservadores
do Congresso, mas o esforço do Executivo não sairá vitorioso. Esse grupo mais
radical não quer margem que dê o direito dos presos às "saidinhas"
pelo bom comportamento.
Ainda assim, o líder
do governo na Câmara, José Guimarães (PT-CE), está otimista. "Estamos
dialogando bem. O presidente manteve tudo que a Câmara e o Senado aprovaram,
tem apenas esse artigo e nós vamos negociar bem isso na Câmara. Eu estou
otimista porque o ministro Ricardo Lewandowski (Justiça) esteve na Câmara e
teve um excelente desempenho na Comissão de Segurança Pública. Então, eu acho
que dá para negociar", disse o líder.
"Estamos
dialogando bem. O presidente manteve tudo que a Câmara e o Senado aprovaram,
tem apenas esse artigo e nós vamos negociar bem isso na Câmara"José
Guimarães (PT-CE), líder do governo na Câmara
A emenda
constitucional que endurece com o usuário de entorpecentes, a PEC das Drogas,
aprovada por diferença elevada semana passada no Senado, é outra desses reveses
certos para o Planalto. Nesse tema, aliaram-se o conservadorismo predominante
no Congresso com a vontade de dar uma resposta para o Supremo Tribunal Federal
(STF), que já tem um placar de 5 a 3 para descriminalizar o porte da maconha
para uso pessoal.
O governo trata ainda
o veto ao trecho do Orçamento de 2024 sobre as emendas de comissões como uma
batalha perdida. Líderes no Senado constataram que o presidente Luiz Inácio
Lula da Silva (PT) não tem apoio suficiente para manter essa decisão e, por
isso, articularam o adiamento da sessão do Congresso, onde os parlamentares
analisarão os vetos presidenciais.
·
Agenda
Inicialmente, o
presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), havia anunciado a sessão do
Congresso para quinta passada, mas a data sequer chegou a ser marcada na
agenda. No início da semana passada, os senadores se reuniram e pediram mais
tempo para conseguir articular sobre as emendas de comissões e a reunião do
parlamento foi adiada para o próximo dia 24.
Isso porque, ao manter
o veto às emendas de R$ 5,6 bilhões, o Congresso causaria um rombo nas contas
públicas, já que Lula não tem de onde tirar o valor e acabaria atingindo o
orçamento dos ministérios. Com o adiamento, o governo espera que o Senado aprove
a retomada da cobrança do Seguro Obrigatório de Danos Pessoais por Veículos
Automotores Terrestres (Dpvat). O texto foi aprovado na semana passada pela
Câmara dos Deputados e chegou à Casa Alta em regime de urgência.
Se o Dpvat for
aprovado na Comissão de Constituição e Justiça e no plenário, horas antes da
sessão de vetos, o governo teria nas mãos um acréscimo na arrecadação federal,
além da alteração no marco fiscal que permite uma antecipação de cerca de R$ 15
bilhões em despesas. Desse valor, cerca de 50% poderiam ser usados para
pagamento de emendas. Assim, Lula poderá usar parte dos R$ 15 bilhões para
cumprir a demanda dos congressistas, sem que haja um rombo nos orçamentos dos
ministérios.
A Câmara ensaia
derrubar o decreto de Lula que igualou o salário entre homens e mulheres. Um
projeto de decreto legislativo apresentado pela direita quer acabar com a
equiparação. Essa proposta chegou a entrar na pauta nesta semana, mas após
apelo do governo, com intervenção direta de Lula, Lira o retirou de votação.
"Muito me causou
estranheza de ter esse projeto que coloca em questão a lei de igualdade
salarial. É necessário avançar nas questões das mulheres, nos debates políticos
e não entrar numa proibição e anulação do decreto. Se trata de misoginia e ódio
contra as mulheres isso também", disse da ministra das Mulheres, Cida
Gonçalves.
¨ Governo deve fechar texto da regulamentação da reforma nesta
semana, diz Padilha
O ministro das
Relações Institucionais, Alexandre Padilha, disse nesta segunda-feira, 22, que
o governo deve fechar o texto dos projetos de lei para a regulamentação da
reforma tributária do consumo nesta semana, permitindo que sejam enviados ao
Congresso também nos próximos dias.
“Esta semana devemos
fechar o texto aqui dentro do governo… A expectativa é que a gente possa mandar
nesta semana (para o Congresso) os projetos”, disse Padilha em entrevista à CNN
Brasil
O ministro ainda
afirmou que o governo acredita que a regulamentação possa ser aprovada até o
fim do mandato dos presidentes da Câmara dos Deputados e do Senado, previsto
para fevereiro do próximo ano.
O texto-base da
reforma tributária do consumo foi aprovada pelo Congresso no ano passado na
forma de Proposta de Emenda à Constituição, após meses de negociação com
entidades federais e representantes de setores econômicos.
No entanto, o governo
e os parlamentares optaram por estabelecer certos detalhes do projeto, como a
implementação de uma alíquota padrão para todos as partes, posteriormente a
partir da apresentação de leis complementares.
Na semana passada, o
ministro da Fazenda, Fernando Haddad, havia confirmado que o texto dos projetos
da regulamentação já tinham passado pela equipe econômica do governo e estavam
sob análise da Casa Civil.
Durante a entrevista
desta segunda-feira, Padilha ainda reiterou que a prioridade do governo para
este primeiro semestre no Congresso segue sendo a consolidação do equilíbrio
das contas públicas, uma agenda que gerou a aprovação de uma série de medidas de
arrecadação no ano passado.
“A prioridade absoluta
neste primeiro semestre é consolidar a saúde das contas públicas… O esforço que
fizemos no ano passado e estamos fazendo este ano tem sido muito importante
para a trajetória decrescente da taxa de juros.”
O ministro também
indicou que o governo deve priorizar neste semestre projetos que tratam da
transição ecológica.
Ele disse ter certeza
que a “boa dupla” formada entre o governo e o Congresso no ano passado, o que
permitiu a aprovação de medidas de interesse do Executivo, vai continuar tendo
“sucesso” no atual ano legislativo
¨ Diálogo com o Congresso continua e ofensa vinda de Lira é
‘episódio superado’, diz Padilha
O ministro das
Relações Institucionais, Alexandre Padilha, reiterou que o diálogo entre o
Planalto e o Congresso Nacional continua e disse que a tensão entre ele e o
presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL) é um “episódio
superado”.
Em entrevista à CNN
Brasil, Padilha foi questionado sobre o atrito entre ele e Lira e,
especificamente, sobre o fato de o presidente da Câmara ter chamado o ministro
de “incompetente” e “desafeto pessoal”.
“Vim para a política
para agregar, não agredir”, disse Padilha à CNN Brasil. “É um
episódio superado. O diálogo do governo continua, em nenhum momento fechou a
porta. Vamos continuar seguindo de forma firme e direta para aprovar as medidas
que ajudam a consolidar a recuperação econômica, fortalecer políticas sociais e
reposicionar o Brasil no mundo”, acrescentou.
Rebatendo as críticas
ao seu desempenho na articulação política, Padilha ressaltou que dos 18
projetos prioritários para o governo neste ano, dez deles foram aprovados na
Câmara dos Deputados e dois receberam também o aval do Senado. “Um deles será
sancionado nos próximos dias, a isenção de Imposto de Renda para quem ganha até
dois salários mínimos”, afirmou.
Ø Com impacto de R$ 42 bilhões, PEC do quinquênio assusta o
governo
A Comissão de
Constituição e Justiça (CCJ) do Senado aprovou na última semana uma proposta de
emenda à Constituição (PEC) que cria um bônus a algumas carreiras do
Judiciário, conhecida como PEC do quinquênio. O texto prevê que, a cada cinco
anos de carreira, profissionais da magistratura, Ministério Público, ministros
do Tribunal de Contas da União (TCU), bem como a conselheiros dos tribunais de
contas estaduais e municipais, defensores públicos, servidores da
Advocacia-Geral da União (AGU), procuradores dos estados e do DF e delegados da
Polícia Federal recebam um adicional de 5% sobre seus salários, limitados a
35%.
O benefício não
entraria no teto de remuneração do funcionalismo público de R$ 44.008,52, valor
dos vencimentos dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF). Para Vera
Monteiro, professora de direito administrativo da Fundação Getúlio Vargas (FGV
Direito-SP) e vice-presidente do conselho do instituto República.org, a medida
cairá como "pólvora no Judiciário". "Além de todas essas
carreiras, todas as outras que se qualificarem como as chamadas carreiras de
Estado vão querer o benefício. Isso vai ser como pólvora no Judiciário",
comentou a especialista.
O líder do governo no
Senado, Jaques Wagner (PT-BA), estimou no dia da votação que o benefício
poderia causar um impacto anual de R$ 42 bilhões nas contas públicas,
dependendo de quantas categorias seriam impactadas pela PEC. O texto é mais uma
das "pautas-bombas" aprovadas ou emperradas pelo Congresso que
apertam ainda mais o cumprimento da meta fiscal de zerar o deficit nas contas
públicas e pode encurralar ainda mais o governo Lula no cumprimento do
arcabouço fiscal.
Randolfe Rodrigues
(sem partido-AP), líder governista no Congresso, prometeu que o governo entrará
em campo, com mais uma vez o auxílio do ministro da Fazenda, Fernando Haddad,
para negociar a questão, especialmente a diminuição das carreiras contempladas.
Originalmente, a matéria concedia o adicional somente a juízes, promotores e
procuradores do MP.
Porém, segundo
relataram senadores ao Correio, a briga não deve ser para engavetar a PEC. A
ideia acordada na reunião dos líderes partidários junto ao presidente do
Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), que também é autor do texto, é segurar a
promulgação da emenda, caso seja aprovada no plenário da Casa Alta e pela
Câmara, para que o projeto de lei que combate os supersalários no funcionalismo
público possa tramitar.
·
Complementares
Tanto a PEC quanto o
PL chegaram ao Senado em 2022 e se encontravam parados desde então. Pacheco
defendia, desde essa época, que as matérias eram complementares e deveriam
tramitar ao mesmo tempo. As matérias dividem, inclusive, o relator Eduardo
Gomes (PL-TO). Diferentemente do bônus ao Judiciário, que se aprovado será
inscrito na Constituição, a baliza para os supersalários ocorreria por meio de
uma lei ordinária. A votação da PEC em plenário ainda demorará a acontecer,
pois há cinco sessões de debate até que possa ser votada em primeiro turno, o
que dá mais tempo para a articulação do governo.
Na sexta, uma reunião
emergencial entre Lula, os ministros palacianos e seus líderes no Congresso,
tratou de alguns dos empecilhos criados pelos parlamentares ao governo. Após o
encontro, o líder na Câmara, José Guimarães (PT-CE), sinalizou que o Planalto
deverá ir em busca dos governadores para tentar reverter a PEC. A estratégia
seria desenhar o "efeito cascata" que a proposta teria para os cofres
estaduais.
"Se essa PEC
prosseguir, ela vai quebrar o país. Quebra o país e quebra os estados. Não tem
o menor fundamento, na minha opinião. O presidente (Lula) não falou isso. É
opinião minha como líder da Câmara. Essa PEC não pode, ela quebra fiscalmente o
país", disse o deputado.
Fonte: Agencia Estado/Correio Braziliense/Istoé
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