Empresas que disputaram contrato com
prefeitura de SP são ligadas a amigo de Nunes
As três empresas que
disputaram a licitação de R$ 19 milhões na qual a prefeitura de São Paulo
comprou armadilhas contra o mosquito da dengue têm ligação direta ou indireta
com o empresário Marco Bertussi, próximo ao prefeito Ricardo Nunes, revela nova
apuração da Agência Pública. A Pública mostrou que Nunes e Bertussi são
presidente e diretor de uma associação de empresas de controle de pragas.
Duas concorrentes da
licitação são do próprio Bertussi – a Biovec (a vencedora) e a TN Santos.
Agora, a apuração revela que a terceira empresa a disputar a concorrência, a
Biolive Proteção Ambiental, também tem relações com Bertussi.
A Biolive, de
Salvador, na Bahia, está em nome de Luiz Henrique Faria Martins. Ele é um dos
donos da DDM Cobrança Empresarial, uma empresa sediada no Rio de Janeiro que
faz parte do Grupo DDM, especializado em cobrança de dívidas. O Grupo DDM
pertence a Christiano di Maio, que é sócio de Bertussi em duas empresas –
justamente a Biovec e a TN Santos.
A licitação, feita por
meio de pregão eletrônico, necessitava que ao menos três fornecedores enviassem
uma cotação para ocorrer. A prefeitura entrou em contato com 19 empresas de
controle de pragas, mas apenas as três empresas apresentaram proposta comercial.
As demais informaram que não tinham os equipamentos pedidos pelo edital, não
atuavam em São Paulo ou não responderam.
“Pode haver uma mácula
aos princípios da moralidade pelo vínculo entre o prefeito e o empresário
ofertante de um produto que, ao que tudo indica e o Ministério Público
investiga, pode ter sido superfaturado”, diz Marcelo Nerling, professor de
direito público da Universidade de São Paulo (USP). “Chama atenção o fato de
que nem a Câmara Municipal e o Tribunal de Contas investiguem. Deve haver
justificativa para cada fornecedor e o preço ofertado deve estar compatível com
o de mercado”, continua.
<<< Por que
isso importa?
• Todas as empresas que disputaram a
licitação estão ligadas a um mesmo empresário, que é diretor numa associação
presidida pelo prefeito de São Paulo
• Foi Ricardo Nunes quem abriu as portas
para a empresa de Bertussi se aproximar da prefeitura quando ele era vereador.
A licitação é hoje alvo de representações no Ministério Público
A DDM Cobrança
Empresarial, do dono da Biolive, funciona no mesmo prédio comercial do Grupo
DDM, na avenida Ayrton Senna, no Rio de Janeiro. O e-mail usado para registrar
a empresa na Receita Federal é de Di Maio.
Na Biovec, Di Maio se
tornou sócio e administrador em julho de 2022, com participação de R$ 1 milhão
no capital social. No mês seguinte, ele deixou a Biovec, mas segue como único
sócio da CMDM Participações, empresa que gere ativos e é sócia da Biovec. Na TN
Santos, ele é sócio administrador.
Quando a licitação
paulista ocorreu, no início do ano passado, Di Maio fazia parte das duas
sociedades, a Biovec e a TN Santos, com Bertussi. Agora, sabe-se que a outra
competidora, a Biolive, também é ligada a ele.
A licitação de compra
das armadilhas já é investigada pelo Ministério Público de São Paulo por
suspeita de superfaturamento. Cada armadilha custou cerca de R$ 400 aos cofres
públicos, enquanto poderia ter sido fabricada por menos de R$ 10, segundo
apuração da Folha de S.Paulo. Após a reportagem da Pública, o órgão recebeu
representações para investigar também a ligação de Nunes e Bertussi.
• Empresa baiana que disputou licitação em
SP fez proposta mais cara
Apesar de ter se
candidatado a um contrato milionário com a maior prefeitura do país, não há
registros de que a Biolive já tenha prestado serviços para a prefeitura de
Salvador ou o governo da Bahia, locais onde está sediada. Também não há nenhuma
informação em sua página na internet sobre as armadilhas que ela se propôs a
fornecer para São Paulo.
A Biolive se apresenta
como uma empresa de controle de pragas, lavagem automotiva, desinfecção de
ambientes e tratamento de fossas sanitárias e efluentes. Ela foi aberta em
2006. Os telefones informados estão desativados. Tentamos contato por e-mail,
mas não houve resposta.
O endereço que consta
no site da empresa é, hoje, de um serviço de emergências médicas. Um atendente
disse à reportagem que a Biolive se mudou do local “há anos”, mas não soube
informar para onde.
Um outro endereço,
registrado pela empresa na Junta Comercial da Bahia, é de uma rua residencial.
Ele é o mesmo da Truly Nolen Salvador, do grupo ao qual pertence a TN Santos,
de Bertussi, que também participou da licitação.
Como revelado pela
Pública, enquanto as propostas comerciais enviadas pela TN Santos e Biovec para
a licitação na prefeitura detalham os equipamentos que seriam fornecidos
conforme o edital e fazem uma apresentação das empresas, o da Biolive se
limitou a apenas citar os valores dos produtos, sem sequer usar uma logomarca
ou papel timbrado.
Os preços da Biolive
eram expressivamente mais caros do que os das concorrentes. A empresa se propôs
a vender as armadilhas e o sachê inseticida para matar larvas por R$ 33,3
milhões, valor mais de 50% mais alto do que a proposta vencedora, da Biovec, de
R$ 21,3 milhões.
>>> Relembre:
contrato de R$ 19 milhões começou com doação de empresa do mesmo sócio
A TN Santos é uma
velha conhecida da prefeitura de São Paulo. Em 2019, o então vereador Ricardo
Nunes articulou para que o município aceitasse participar de um
“projeto-piloto” para testar armadilhas contra o mosquito cedidas pela empresa.
Na época, a TN Santos acordou com a prefeitura de Bruno Covas uma doação de
armadilhas no valor de R$ 118,2 mil.
O projeto resultou na
recomendação para que a licitação fosse realizada posteriormente, em 2022, sob
a gestão de Nunes. A disputa resultou na compra das armadilhas fabricadas pela
Biovec. Em outras palavras, uma das empresas de Bertussi e Di Maio fez uma
doação para a prefeitura que, anos depois, foi usada como argumento para
realizar a licitação de R$ 19 milhões vencida por outro negócio deles.
As armadilhas são um
dos investimentos mais caros pagos pela prefeitura no combate à dengue em meio
à pior crise da doença desde 2015. Recentemente, Nunes declarou emergência em
saúde por dengue. Apenas cinco distritos da cidade estão sem epidemia da doença.
Sem manutenção, as
armadilhas perdem a eficácia e estão virando criadouros do mosquito, segundo
denúncias recebidas pela reportagem e reveladas pela Pública no início do mês.
Há registros de armadilhas há meses sem troca da água e veneno de seu interior,
o que faz com que as larvas se desenvolvam e possam ajudar a espalhar a doença.
A Pública procurou os
citados nesta reportagem. Apenas a Biovec respondeu, em nota: “A Biovec
Comércio de Saneantes LTDA é uma empresa que nasceu com o objetivo de
desenvolver, entre outros, programas de combate a mosquitos, especialmente do
gênero Aedes, atuando na defesa da saúde pública. A Biovec afirma que todas as
contratações realizadas pela empresa seguiram rigorosamente suas políticas de
compliance e as legislações vigentes, reafirmando assim seu compromisso com a
plena integridade”.
'Só não enxerga melhora quem não quer',
diz Nunes sobre centro de São Paulo
O prefeito de São
Paulo, Ricardo Nunes (MDB), declarou nesta segunda-feira (22) que há um
"volume gigantesco" de empreendimentos imobiliários no centro da
capital e que as obras são um indicativo evidente de melhoria das condições de
vida na região. Ele participava da cerimônia de entrega de um edifício erguido
com incentivos fiscais do município, que permitiram um aumento de 50% na área
construída.
Nunes, que é
pré-candidato à reeleição, afirmou que há problemas a serem resolvidos na área,
mas manifestou descontentamento com a cobertura da imprensa sobre o centro da
cidade, que considera negativa.
"Não estou
falando que está tudo resolvido, que não tenha problemas. Mas não é possível,
só não enxerga quem não quer o que está acontecendo no centro", disse o
prefeito, destacando que era possível ver 12 edifícios em construção a partir
da cobertura do edifício Praça Buarque, na rua General Jardim, na Vila Buarque.
"Estamos fazendo o maior programa habitacional da história da
cidade", ele afirmou.
Nunes citou as
transformações de áreas centrais de metrópoles ao redor do mundo para falar da
situação paulistana. Ele disse que vendas digitais e o surgimento de grandes
centros comerciais espalhados pela cidade criaram uma competição com o centro
histórico, que ficou esvaziado.
"A gente precisa
ter uma seriedade na análise do centro, não só de São Paulo, mas de todos os
grandes centros, ou quase, do mundo", disse Nunes. "A gente às vezes
tem visto, infelizmente, algumas pessoas da imprensa, mal-intencionadas, fazendo
uma divulgação do centro totalmente equivocada."
O prefeito assinou, no
mesmo evento, as novas regras da Área de Intervenção Urbana do Setor Central
(chamada de AIU, ela substitui o PIU Central). A regulamentação foi alterada
por causa das revisões do Plano Diretor e da Lei de Zoneamento da capital.
O texto dá ainda mais
incentivos à construção na região, que já tem regras mais flexíveis do que o
restante da cidade -está previsto um "bônus" de área construída para
os empreendimentos que seguirem algumas políticas municipais.
Antes do discurso,
houve elogios à política habitacional da atual gestão pelo presidente do
Secovi-SP (Sindicato da Habitação), Rodrigo Luna, e pelos donos da
incorporadora Magik, proprietária do Praça Buarque. Eles destacaram a grande
demanda do público por apartamentos no centro.
O prédio -que também
integra o programa Minha Casa Minha Vida, do governo federal- tem apartamentos
de até 35 m², de um ou dois quartos, com preço entre R$ 230 mil e R$ 300 mil. O
prédio inaugurado com a presença do prefeito tem apenas três apartamentos disponíveis
para venda, e o terreno vizinho abrigará unidades com o mesmo padrão.
Se financiado em 30
anos, o preço da parcela mensal equivale a mais da metade do atual salário
mínimo (R$ 1.412), tornando-o proibitivo para essa faixa de renda, que compõe a
maior parte do déficit habitacional paulistano.
Nunes destacou que há
outros programa da prefeitura para esse público, especialmente o Pode Entrar,
carro-chefe da Secretaria de Habitação. O programa não exige pagamento de
entrada e a parcela mensal corresponde a 15% da renda familiar do beneficiado.
Segundo o prefeito, já
foram entregues 3.000 unidades habitacionais do Pode Entrar na região central
-em agosto, eram 6.291 unidades em toda a cidade. A meta é entregar mais 116
mil residências para população de baixa renda até o final do ano.
"A gente não tem
dúvida nenhuma, estou muito tranquilo em relação a isso, de que a política
habitacional que a gente está desenvolvendo vai dar resultado", disse o
prefeito. "Agora, a gente consegue resolver no prazo que a gente queria?
Óbvio que não, mas estamos num processo bastante acelerado."
DECRETO TRARÁ 'BÔNUS
EQUIVALENTE' AOS EDIFÍCIOS
A prefeitura incluiu
na regulamentação do plano urbanístico para a área central um novo incentivo à
construção de prédios mais altos. O "bônus equivalente", segundo a
administração municipal, prevê que as construtoras recebam o direito de construir
mais sem pagar outorga onerosa, a taxa cobrada pela prefeitura para se
construir além do tamanho básico previsto na legislação.
O bônus será concedido
a "empreendedores que destinarem metros quadrados para produção de
Habitação de Interesse Social, requalificação de edificações (retrofit) ou
preservação de imóveis tombados", diz a prefeitura. "Em troca, eles
receberão uma declaração de potencial construtivo que poderá ser utilizada pelo
próprio empreendedor gerador do bônus ou vendida a terceiros."
Fonte: Por Amanda
Audi, da Agencia Pública/FolhaPress
Nenhum comentário:
Postar um comentário