Negativa de golpe, oração de Michelle e
ataques de Malafaia: o protesto de Bolsonaro em SP em 5 pontos
O protesto
convocado pelo ex-presidente Jair
Bolsonaro (PL) reuniu políticos e milhares de manifestantes em
São Paulo no domingo (25/2) em meio ao avanço das investigações
da Polícia Federal (PF) sobre um suposto plano de golpe de Estado depois
da eleição de Luiz Inácio
Lula da Silva (PT).
O protesto foi
realizado, segundo seus organizadores, como uma defesa da “liberdade e do
Estado democrático de direito”.
Mas a manifestação foi
vista por analistas como um esforço do ex-presidente de demonstrar
que tem força política e apoio popular.
Bolsonaro pediu que o
público não levasse faixas contra autoridades e ministros do Supremo
Tribunal Federal (STF), como ocorreu em outros atos com a
participação do ex-presidente.
Do alto de um trio
elétrico, diante de manifestantes que carregavam a bandeira do Brasil e vestiam
a camisa da seleção, Bolsonaro negou que tenha havido uma tentativa de golpe de
Estado e defendeu que agiu dentro dos limites da Constituição.
Bolsonaro também pediu
anistia para os acusados de invadir os
prédios dos Três Poderes em 8 de janeiro de 2023 e afirmou
querer "passar uma borracha no passado".
O protesto contou com
a participação da ex-primeira
dama Michelle Bolsonaro, que abriu o ato na avenida Paulista com uma
oração e um discurso emocionado.
O pastor Silas Malafaia,
principal organizador do ato, foi o último a discursar antes do ex-presidente e
assumiu tom mais duro em sua fala.
A manifestação também
contou com a presença de diversos políticos, entre eles o presidente do
PL, Valdemar da
Costa Neto, os governadores Tarcísio de
Freitas (Republicanos), de São Paulo, e Jorginho Melo (PL), de
Santa Catarina, o prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes (PSDB), além de
parlamentares.
O ato também ficou
marcado pelas centenas de bandeiras de Israel, empunhadas por bolsonaristas ao
longo da Paulista e da presença de judeus, após Lula ter sido
criticado por ter comparado o conflito em Gaza ao Holocausto.
A BBC News Brasil
reuniu em cinco pontos os principais momentos e fatos do protesto convocado por
Bolsonaro.
·
1. Bolsonaro: Negativa
de golpe e pedido de anistia
Em seu discurso, que
durou 22 minutos, Jair
Bolsonaro refutou a acusação de que teria planejado dar um
golpe de Estado após a vitória de Lula nas eleições de 2022.
"Eu teria muito a
falar, e tem gente que sabe o que eu falaria, mas o que eu busco é a
pacificação, é passar uma borracha no passado, é buscar uma maneira de nós
vivermos em paz, é não continuamos sobressaltados", disse, dirigindo-se a
deputados e governadores que estavam ao seu lado.
De acordo com investigações
da PF, Bolsonaro teria se envolvido na confecção de uma minuta de
decreto com medidas que impediriam a posse de Lula para mantê-lo no poder.
Militares próximos a
Bolsonaro também teriam organizado manifestações contra o resultado das
eleições e atuado para garantir que os manifestantes tivessem segurança.
Já o grupo em torno de
Bolsonaro teria monitorado os passos do ministro do
STF Alexandre de Moraes, incluindo acesso à sua agenda de forma
antecipada.
A minuta, encontrada
na casa do ex-ministro
da Justiça Anderson Torres, previa "estado de defesa na sede do
Tribunal Superior Eleitoral, em Brasília, Distrito Federal, com o objetivo de
garantir a preservação ou o pronto restabelecimento da lisura e correção do
processo eleitoral presidencial do ano de 2022, no que pertine [sic] à sua
conformidade e legalidade, as quais, uma vez descumpridas ou não observadas,
representam grave ameaça à ordem pública e a paz social".
Inicialmente,
Bolsonaro negou ter conhecimento da minuta, mas um documento com este mesmo
teor foi encontrado depois pela PF na sala do ex-presidente na sede do PL, seu
partido.
Em sua fala no
protesto, Bolsonaro afirmou que agiu dentro dos limites da Constituição e que,
para ser aplicado, o decreto de estado de defesa dependeria da aprovação do
Congresso.
"Continuam me
acusando de um golpe, porque tem uma minuta de um decreto de estado de defesa.
Golpe usando a Constituição? Tenha santa paciência", disse.
"Querem entubar a
todos nós um golpe, usando dispositivo da Constituição cuja palavra final quem
dá é o Parlamento brasileiro."
No protesto, o
ex-presidente também pediu aos congressistas um projeto de lei que anistie seus
apoiadores que foram em Brasília por participarem na depredação de prédios
públicos em 8 de janeiro
de 2023.
“[Queremos] Anistia
para aqueles pobres coitados que estão presos em Brasília, nós não queremos
mais que seus filhos sejam órfão de pais vivos. Agora nós pedimos a todos os
513 deputados e 81 senadores um projeto de anistia para que seja feita a
Justiça em nosso Brasil”, disse Bolsonaro.
“E quem, porventura,
depredou o patrimônio, nós não concordamos com isso. Que paguem, mas que essas
penas não fujam ao mínimo da razoabilidade.”
·
2. Valdemar da Costa
Neto: ‘PL é maior partido do Brasil’
O presidente do
PL, Valdemar da Costa Neto, compareceu ao ato na Paulista, mas
discursou horas antes de Bolsonaro chegar ao local.
Ambos estão proibidos
pela Justiça de manter contato, após Costa Neto ser alvo em 8 de fevereiro de
uma operação da PF que investiga a suposta tentativa de golpe, que teria o
envolvimento de Bolsonaro, segundo os investigadores.
Costa Neto chegou a
ser preso por porte ilegal de arma de fogo e teve sua liberdade provisória
concedida por Moraes dois dias depois.
Seus advogados afirmam
que “a arma é registrada, tem uso permitido, pertence a um parente próximo e
foi esquecida há vários anos” no apartamento do presidente do PL, onde foi
encontrada.
Na Paulista, Costa
Neto falou por poucos segundos, do alto de um trio elétrico, e agradeceu ao
público.
"Vim aqui só para
falar que vocês transformaram o PL no maior partido do Brasil. Pátria, saúde,
liberdade e família", disse.
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3. Michelle Bolsonaro:
'Estamos sofrendo'
A ex-primeira dama
Michelle Bolsonaro abriu o ato na avenida Paulista com seu discurso e uma
oração, momento em que causou forte reação do público presente, como
testemunhou a reportagem.
Emocionada, ela chorou
citando “um momento tão difícil da história”.
"Desde 2017,
estamos sofrendo porque exaltamos o nome do senhor no Brasil, porque meu marido
foi escolhido e declarou que era Deus acima de todos", disse.
"Não tem como não
se emocionar vendo o exército de Deus nas ruas, o exército de homens e mulheres
patriotas que não desistem da sua nação."
A ex-primeira-dama foi
implicada em alguns escândalos envolvendo o ex-presidente e sua família.
Um deles foi o caso das
joias que foram presenteadas ao casal Bolsonaro em 2021 pelo
governo saudita.
Uma investigação apura
se as joias foram trazidas ao país de forma ilegal.
Bolsonaro e
Michelle prestaram
depoimento à PF sobre o caso em agosto do ano passado. Ambos
negam quaisquer irregularidades.
Em sua fala durante o
ato na Paulista, Michelle também agradeceu o público.
"Aqui fica meu
agradecimento a cada uma de vocês, por saírem de suas casas, de sua zona de
conforto para dizer que o Brasil é do senhor, que somos um povo que defende
valores e princípios cristãos".
A ex-primeira-dama é
desde o ano passado presidente do PL Mulher, braço da legenda de Bolsonaro
dedicado a mobilizar o eleitorado feminino, e sempre atuou como uma ponte do
ex-presidente com o eleitorado evangélico.
Após Bolsonaro ser
considerado inelegível pela Justiça Eleitoral, Michelle passou a ser citada
como uma possível herdeira do seu capital político e um nome forte para futuras
eleições.
·
4. Bandeiras de Israel
O protesto contou com
a presença de muitas pessoas que carregavam a bandeira de Israel, e havia entre
os presentes judeus com adereços tradicionais judaicos.
Os ambulantes vendiam
bandeiras de Israel ao lado de bandeiras do Brasil.
A BBC News Brasil
conversou com um dos ambulantes, que se apresentou como Francisco e disse ter
vendido todas as 50 bandeiras israelenses que tinha levado para o ato, ao preço
de R$ 50 cada.
O protesto ocorreu uma
semana depois de o presidente Lula comparar a
morte de 30 mil palestinos em ataques de Israel na guerra
contra o Hamas com o Holocausto sofrido pelos judeus na 2ª Guerra Mundial.
"O que está
acontecendo na Faixa de Gaza com
o povo palestino, não existe em nenhum outro momento histórico. Aliás, existiu
quando Hitler resolveu matar os judeus", disse Lula a jornalistas em Adis
Abeba, capital da Etiópia, onde ele participava de uma cúpula da União
Africana.
Isso gerou uma forte
reação de Israel, que o declarou persona non grata, e exigiu um
pedido de desculpas.
Congressistas da
oposição protocolaram um pedido de impeachment do presidente devido à
declaração, criticada até mesmo por alguns aliados do governo, como o
presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG).
Outros congressistas
da base governista, no entanto, defenderam a fala de Lula.
Na sexta-feira (23/2),
o ministro de Relações Exteriores israelense, Israel Katz, publicou no X
(antigo Twitter) uma ilustração que mostra brasileiros e israelenses abraçados
em meio às bandeiras dos dois países e pessoas vestidas de amarelo.
"Ninguém vai
separar o nosso povo — nem mesmo você, Lula", escreveu Katz na postagem,
publicada em português e em hebraico.
Em novembro do ano
passado, o embaixador de Israel no Brasil, Daniel Zohar Zonshine, participou de
um encontro com Bolsonaro na Câmara dos Deputados.
Fábio Wajngarten,
ex-secretário de Bolsonaro, disse na rede social X (ex-Twitter) que iria
sugerir ao ex-presidente que convidasse o embaixador israelense e que ele seria
"muito bem recebido e acolhido".
Wajngarten disse
depois a jornalistas que Zohar não chegou a ser formalmente chamado para o ato.
Além da proximidade de
Bolsonaro e aliados com o governo Netanyahu, a defesa de
Israel é uma bandeira cara a muitos evangélicos - um dos grupos
mais próximos de Bolsonaro.
·
5. Silas Malafaia e
aliados no palanque
A manifestação
bolsonarista também teve a presença de quatro governadores.
Além de Tarcísio de Freitas, de
São Paulo, também participaram os governadores Romeu Zema (Novo),
de Minas Gerais, Ronaldo Caiado (União Brasil), de Goiás, e Jorginho Mello
(PL), de Santa Catarina.
Bolsonaro fez acenos
aos quatro em seus discursos, assim como ao prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes (PSDB),
que também compareceu ao ato.
Tarcísio de Freitas
falou ao público e, em seu discurso, disse que “não era ninguém” até ser
indicado por Bolsonaro para ser ministro da Infraestrutura.
"Ele é um
presidente que sempre defendeu a liberdade acima de tudo. Meu amigo Bolsonaro,
você não é mais um CPF, não é mais uma pessoa, você representa um movimento de
quem acredita que vale a pena brigar pela família, pela pátria e pela liberdade",
disse Tarcísio.
"Muito obrigado,
Bolsonaro, nós sempre estaremos juntos."
Entre os parlamentares
estavam os deputados federais Nikolas Ferreira e Marco Feliciano, ambos do
PL.
O pastor Silas Malafaia, da
Assembleia de Deus Vitória em Cristo, foi um dos principais organizadores do
protesto.
Malafaia foi o último
a falar antes de Bolsonaro. Coube a ele os comentários em tom mais incisivo e
críticas mais duras.
Malafaia questionou,
por exemplo, se Lula sabia com antecedência das invasões do 8 de janeiro.
"Eu tenho algumas
perguntar para fazer: primeiro, por que Lula saiu às pressas de Brasília e foi
para Araraquara? Ele foi avisado que ia ter baderna?", disse Malafaia.
Lula estava em visita
oficial à cidade do interior paulista, que havia sido atingida por fortes
chuvas e enchentes, e é governada por Edinho Silva (PT).
"Outra pergunta:
cadê os vídeos gravados pelas câmeras do governo? Que estão em posse de
Alexandre de Moraes?! O povo precisa saber quem está por trás daquela baderna,
daquela safadeza", afirmou.
Malafaia também
criticou os ministros Alexandre de Moraes, que
conduz as investigações contra Bolsonaro no STF, e o atual presidente da
Corte, Luís Roberto
Barroso.
"Alexandre de
Moraes diz que a extrema direita precisa ser combatida na América Latina. Como
o ministro do STF tem lado? Ele não tem que combater nem a extrema direita nem
a extrema-esquerda. Ele é guardião da Constituição", disse o pastor.
Na ocasião, em agosto
de 2023, Moraes afirmou que via um aumento de ataques à democracia no mundo,
relacionado ao crescimento do populismo da direita radical.
Malafaia em seguida
falou: "O presidente do STF, ministro Barroso, disse 'nós derrotamos o
bolsonarismo'. Isso é uma afronta, uma vergonha".
A declaração de
Barroso foi feita em um evento da União Nacional dos Estudantes (UNE) em julho
de 2023.
O ministro disse em
nota depois que se referia "ao extremismo golpismo e violento que se
manifestou em 8 de janeiro e que correspondeu a uma minoria".
Também afirmou que
"jamais pretendia ofender os 58 milhões de eleitores do ex-presidente nem
criticar uma visão de mundo conservadora e democrática que é perfeitamente
legítima".
Fonte: BBC News Brasil
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