sábado, 24 de fevereiro de 2024

Militares da ativa escreveram carta para pressionar Exército a participar de golpe, diz PF

A Polícia Federal identificou o nome de dois militares que teriam ajudado na redação de uma carta de oficiais da ativa que pressionava o comandante do Exército em 2022, general Marco Antônio Freire Gomes, a adotar postura radical diante de pedidos por golpe para manter Jair Bolsonaro (PL) na Presidência.

documento, que foi recebido pelo tenente-coronel Mauro Cid na noite de 28 de novembro de 2022 véspera da publicação do texto.

O autor foi identificado pela Polícia Federal como o coronel Giovani Pasini. Alexandre Bitencourt teria sido o último a modificar o documento os investigadores afirmam que trata-se do coronel Alexandre Castilho Bitencourt da Silva.

As informações estão no relatório da Polícia Federal que embasou os pedidos de prisão e buscas, em 8 de fevereiro, contra ex-ministros e militares suspeitos de tramarem um golpe de Estado para manter o ex-presidente no poder após a derrota para Lula (PT). Os documentos foram obtidos pela Folha de S.Paulo.

Procurado pela reportagem, Pasini não comentou sobre a autoria do manifesto. "Não quero falar sobre esse assunto", disse antes de desligar o telefone.

Pasini é oficial de artilharia da turma formada na Aman (Academia Militar das Agulhas Negras) em 1997. Colegas do coronel afirmam, sob reserva, que ele passou a se dedicar ao ensino da língua portuguesa e, aos poucos, foi deixando o rumo tradicional da artilharia para se tornar professor de colégios militares e autor de livros.

Em 2022, ele pediu licença do Exército para se candidatar a deputado estadual do Rio Grande do Sul pelo partido Patriota. Não foi eleito. De volta à Força, decidiu pedir para ir à reserva, ato concretizado em fevereiro de 2023, após a divulgação da carta.

Alexandre Bitencourt também é oficial formado em 1997, da arma de infantaria. Em fevereiro de 2023, ele chegou a ser condecorado com a medalha militar de ouro com passador de ouro láurea entregue aos oficiais que completam 30 anos de bons serviços prestados.

O coronel morou no Chile durante cerca de seis meses em 2022, para fazer pós-graduação em condução de políticas estratégicas de defesa. De volta ao Brasil, foi realocado para função no Departamento-Geral de Pessoal.

A reportagem não conseguiu contato com Bitencourt. Em nota, o Exército disse que não poderia se manifestar sobre o assunto porque o inquérito está em "segredo de Justiça". "Cabe ressaltar que as informações acerca do tema serão prestadas, quando solicitadas, às autoridades competentes", completou.

Militares são proibidos por leis e regulamentos de se manifestar coletivamente, seja sobre atos de superiores ou em caráter reivindicatório ou político. À época da circulação da carta entre oficiais, o Alto Comando do Exército decidiu comunicar aos militares que haveria consequências àqueles que aderissem ao manifesto.

"Srs bom dia Alertem aos seus subordinados que a adesão a esse tipo de iniciativa é inconcebível. Eventuais adesões de militares da ativa serão tratadas, no âmbito do CMS (Comando Militar do Sul), na forma da lei, sem contemporizações", escreveu o general Fernando Soares para chefes de organizações militares.

A carta de oficiais superiores da ativa foi escrita quando bolsonaristas de posições radicais permaneciam, por quase um mês, acampados em frente a quartéis do Exército pedindo intervenção das Forças Armadas contra a eleição de Lula.

A Polícia Federal aponta ainda que Bolsonaro e aliados discutiam planos para um golpe de Estado naquela época. Bolsonaristas e militares incitavam o comando do Exército a assumir postura golpista, com ataques nas redes sociais contra generais contrários à ruptura democrática.

"Consideramos importante, portanto, que os Poderes e Instituições da União assumam os seus papéis constitucionais previstos em lei e em prol da pacificação política, econômica e social, especialmente para a manutenção da Garantia da Lei e da Ordem e da preservação dos poderes constitucionais, respeitando o pacto federativo previsto na regra basilar de fundação da República", dizia trecho da carta dos oficiais.

O texto ainda afirmava que os militares estão "sempre prontos para cumprir suas missões constitucionais" e que os soldados "colocam os objetivos nacionais sempre em primeiro plano, desprezando quaisquer interesses pessoais".

"Covardia, injustiça e fraqueza são os atributos mais abominados para um Soldado. Nossa nação, aquela que entrega os maiores índices de confiança às Forças Armadas, sabe que seus militares não a abandonarão."

A carta circulou sem o nome do autor, e o método de coleta de assinaturas não permite saber quantos oficiais da ativa subscreveram o texto. A participação em manifestações conjuntas é considerada infração e pode resultar em punição no Exército.

Em novembro de 2022, coronéis contaram à Folha de S.Paulo terem sido abordados por colegas de farda para pedir apoio à carta.

A divulgação do texto foi uma iniciativa de militares após oficiais da reserva publicarem, no fim de semana anterior, uma carta aberta aos comandantes das Forças Armadas dizendo que havia desconfiança com o resultado das eleições.

"É natural e justificável que o povo brasileiro esteja se sentindo indefeso, intimidado, de mãos atadas e busque nas FFAA [Forças Armadas], os reais guardiões de nossa Constituição, o amparo para suas preocupações e solução para suas angústias", diz trecho.

O texto ainda pede que os comandantes apoiassem ações para o "imediato restabelecimento da lei e da ordem, preservando qualquer cidadão brasileiro a liberdade individual de expressar ideias e opiniões".

·        Exército afasta militares presos em ação da PF que apura tentativa de golpe

O Exército oficializou nesta quinta-feira (22) o afastamento de dois militares presos durante operação da PF que investiga se houve uma tentativa de golpe de Estado para manter o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) na Presidência. A informação havia sido antecipada pelo UOL.

Um dos afastados foi o coronel de cavalaria Bernardo Romão Corrêa Neto. Ele foi apontado pela PF (Polícia Federal) como um ex-braço-direito do tenente-coronel Mauro Cid, que foi ajudante de ordens de Bolsonaro.

O outro afastado foi o tenente-coronel Rafael Martins de Oliveira. Segundo inquérito da PF, ele é um dos "kids pretos" e trocou mensagens com Mauro Cid para organizar o pagamento de R$ 100 mil para trazer manifestantes golpistas do Rio de Janeiro para Brasília. "Kid preto" é uma nomenclatura informal dada a militares da elite do Exército que fazem parte do Copesp (Comando de Operações Especiais).

Os afastamentos foram publicados no Diário Oficial da União. As portarias foram assinadas pelo general de brigada Antônio Bispo de Oliveira Filho, da Diretoria de Controle de Efetivos e Movimentações do Comando do Exército.

Os textos dizem que os dois militares foram "agregados". Segundo o estatuto que rege a carreira de integrantes das Forças Armadas, esse termo é usado para dizer que um oficial deixou de ocupar cargo na escala hierárquica à qual pertencia.

Militares podem ser agregados por motivos que vão desde licença por questões de saúde a deserção. No caso dos dois oficiais afastados, eles foram removidos da escala do Exército para ficarem exclusivamente à disposição da Justiça, segundo as portarias publicadas no Diário Oficial.

 

       Valdemar e Torres destoam de Bolsonaro e militares e falam à PF sobre trama golpista

 

O presidente do PL, Valdemar Costa Neto, e o ex-ministro da Justiça Anderson Torres destoaram de outros aliados de Jair Bolsonaro (PL) e responderam às perguntas da Polícia Federal durante depoimento nesta quinta-feira (22) referente às investigações sobre os planos discutidos no fim de 2022 para um golpe de Estado contra a eleição de Lula (PT) à Presidência da República.

Valdemar deixou a sede da PF, em Brasília, por volta das 17h15. Segundo a defesa do político, ele "respondeu todas as perguntas que lhe foram feitas". Os advogados, porém, decidiram não fazer comentários sobre as apurações.

Anderson Torres seguia prestado esclarecimentos aos investigadores durante esta tarde. A decisão do ex-ministro de não silenciar diante da PF já havia sido anunciada pela defesa.

"[Anderson] reafirma, assim, sua disposição para cooperar com as investigações e esclarecer toda e qualquer dúvida que houver, pois é o maior interessado na apuração isenta dos fatos", disse o advogado Eumar Novacki.

Bolsonaro e os oficiais-generais Braga Netto, Augusto Heleno, Paulo Sérgio Nogueira e Almir Garnier ficaram em silêncio.

As defesas dos investigados alegam que não tiveram acesso à íntegra dos documentos apreendidos pela Polícia Federal, como os anexos da delação do tenente-coronel Mauro Cid.

A defesa do ex-presidente pediu três vezes ao STF (Supremo Tribunal Federal) para adiar a data da oitiva de Bolsonaro. O ministro Alexandre de Moraes, relator do caso, negou os três pedidos.

Bolsonaro chegou à sede da PF em Brasília por volta das 14h20. O depoimento estava previsto para começar às 14h30. Com a decisão de Bolsonaro de se manter em silêncio, o depoimento foi encerrado pouco depois. Ex-ministros, ex-assessores, militares e aliados também foram intimados a prestar esclarecimentos à PF no mesmo horário. No total, 23 pessoas. Só em Brasília, 13.

O advogado de Bolsonaro, Paulo Bueno, disse nesta quinta que a defesa não teve acesso a todos os elementos das imputações contra o ex-presidente, o que motivou a opção pelo silêncio. Ele também afirmou que Bolsonaro nunca foi simpático a movimento golpista.

"O presidente fez o silêncio, como a defesa antecipou. Esse silêncio, quero deixar claro, não é simplesmente o uso do direito constitucional, mas estratégia baseada no fato de que a defesa não teve acesso a todos os elementos que estão sendo imputados ao presidente a prática de certos delitos."

A PF investiga as tratativas por um golpe de Estado desde que encontrou na casa do ex-ministro da Justiça Anderson Torres, em janeiro de 2023, uma minuta de decreto para Bolsonaro instaurar estado de defesa na sede do TSE (Tribunal Superior Eleitoral).

O objetivo seria reverter o resultado da eleição, segundo os investigadores.

Com a delação de Mauro Cid e as provas obtidas em outras operações, a PF chegou à conclusão de que Bolsonaro teve acesso a versões da minuta golpista (não exatamente a mesma que estava com Torres).

De acordo com as investigações, ele chegou a pedir modificações no texto e apresentar a proposta aos chefes militares, para sondar um possível apoio das Forças Armadas à empreitada.

 

•        Filipe Martins desmente Cid e diz que não entregou ‘minuta do golpe’ a Bolsonaro

 

O ex-assessor da Presidência Filipe Garcia Martins negou, em depoimento à Polícia Federal (PF) nesta quinta-feira, 22, ter entregue uma “minuta do golpe” ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). Em delação premiada no ano passado, o tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens da Presidência, disse que Bolsonaro recebeu de Martins um rascunho de decreto, que previa a prisão de autoridades e a convocação de novas eleições.

Filipe Martins foi um dos alvos da Operação Tempus Veritatis, deflagrada no último dia 8, que investiga uma suposta organização criminosa que planejou um golpe de Estado após as eleições de 2022. O ex-assessor foi um dos quatro aliados do ex-presidente presos preventivamente por ordem do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes.

O ministro do STF argumentou, na autorização da prisão de Martins, que o ex-assessor teria entregue para Bolsonaro uma “minuta golpista” que previa a prisão de autoridades e a convocação de novo eleição presidencial. A PF teve conhecimento do documento a partir da delação premiada de Cid.

Segundo a corporação, Bolsonaro teria solicitado ainda que Martins fizesse alterações na “minuta”, o que teria sido cumprido pelo ex-assessor. Na delação premiada, Cid disse que o ex-presidente teria levado a “minuta” para comandantes das Forças Armadas em uma reunião secreta. Durante o encontro, que ocorreu em novembro de 2022, os líderes militares, com exceção do ex-comandante da Marinha, almirante Almir Garnier Santos, teriam repreendido a ideia de ruptura democrática.

No depoimento prestado nesta quinta, Martins confrontou a versão dada por Cid na delação e afirmou que não redigiu ou entregou uma minuta para Bolsonaro. O ex-assessor da Presidência disse também que não participou de reuniões com temas golpistas.

Em nota enviada ao Estadão, os advogados João Vinícius Manssur, William Iliadis Janssen e Ricardo Scheffer, responsáveis pela defesa de Filipe Martins, disseram que o ex-assessor foi “claro e objetivo” durante o depoimento.

O ex-assessor disse não ter tido acesso aos autos da Tempus Veritatis. A reclamação também foi feita por outros alvos interrogados nesta quinta, como o próprio ex-presidente Bolsonaro.

Martins contestou a informação dos investigadores de que teria ido para o exterior após a posse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Ele foi preso em Ponta Grossa (PR).

•        Leia na íntegra a nota da defesa de Filipe Martins:

“O depoimento do Sr. Filipe Martins, como era de se esperar, foi claro e objetivo. Filipe está tranquilo, mas inconformado com a sua prisão, que julga precipitada e ilegal. Aguardamos agora a decisão referente ao requerimento de revogação da prisão preventiva, pontuando que essa só deve persistir em casos excepcionalíssimos, quando a liberdade em si for um risco, o que demonstrado não ser o caso de Filipe, sob pena de a medida se transmutar em um cumprimento antecipado de uma eventual e absolutamente incerta pena, que naturalmente só poderá ser determinada após o trânsito em julgado, e não antes, em respeito ao princípio constitucional da presunção de inocência. Temos confiança que uma análise sóbria e técnica levará à sua colocação em liberdade.”

 

Fonte: FolhaPress

 

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