segunda-feira, 26 de fevereiro de 2024

Bolsonaro somou evidências golpistas às claras antes de delação de Cid e operação da PF

O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) é um dos alvos de investigação em curso pela Polícia Federal sobre uma trama golpista desencadeada em 2022 para evitar a posse de Lula (PT) na Presidência.

Essa investigação tem como uma de suas bases mensagens e delação do tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro na Presidência da República.

Outros elementos ainda em fase de investigação são a reunião de teor golpista na qual, em julho de 2022, o então presidente sugere formas para atacar o sistema eleitoral e, já após a eleição, o papel dele na elaboração de uma suposta minuta de decreto na qual seria fundamentado o golpe de Estado.

Fora esses pontos que vieram à tona em recente operação da PF, Bolsonaro coleciona uma série de evidências anteriores de tom golpista. Neste domingo (25), o ex-presidente participará de um ato na avenida Paulista chamado por ele para, como tem repetido, defender-se diante das recentes investigações.

O ex-presidente já foi condenado pelo TSE (Tribunal Superior Eleitoral) por ataques e mentiras sobre o sistema eleitoral, por exemplo, e é alvo de diferentes outras investigações no STF (Supremo Tribunal Federal). Neste momento, ele está inelegível ao menos até 2030.

Caso seja processado e condenado pelos crimes de tentativa de golpe de Estado, tentativa de abolição do Estado democrático de Direito e associação criminosa, o ex-presidente poderá ser condenado a até 23 anos de prisão e ficar inelegível por mais de 30 anos.

Na decisão em que autorizou as prisões de aliados do ex-presidente no início do mês, o ministro Alexandre de Moraes afirmou que já está comprovada a prática de crimes contra a democracia e associação criminosa.

Veja, em 7 pontos, o avanço golpista às claras de Bolsonaro.

 1) ATAQUES ÀS URNAS E AO TSE PARA DESLEGITIMAR O SISTEMA

Ao longo de seu mandato, a principal estratégia de confronto do presidente foi a de questionar a segurança das urnas eletrônicas, sistema usado desde 1996 e considerado eficiente e confiável por autoridades e especialistas no país.

Ele nunca apresentou provas ou indícios para questionar as urnas, mas repetiu o discurso golpista, visto como uma tentativa de esconder os problemas do governo, a alta reprovação e as pesquisas que o colocavam atrás do hoje presidente Lula.

2) AMEAÇA DE QUE NÃO TERIA ELEIÇÃO SEM VOTO IMPRESSO

Bolsonaro manteve durante seu mandato um discurso em que, sem nenhuma prova, colocava dúvidas sobre o sistema eleitoral. Em várias ocasiões, deu a entender que não aceitaria outro resultado que não fosse a sua reeleição. Isso provocou forte crise institucional em 2021.

A ameaça mais forte ocorreu em julho daquele ano. "Eleições no ano que vem serão limpas. Ou fazemos eleições limpas no Brasil ou não temos eleições", declarou a apoiadores.

No dia seguinte, reforçou a ameaça e afirmou que a fraude eleitoral estava no TSE. Bolsonaro ainda atacou o então presidente da corte eleitoral e ministro do STF, Luís Roberto Barroso, a quem chamou de "idiota" e "imbecil".

"A fraude está no TSE, para não ter dúvida. Isso foi feito em 2014", declarou o mandatário, repetindo a acusação infundada de que o então candidato Aécio Neves (PSDB) teria vencido o pleito contra a ex-presidente Dilma Rousseff (PT).

3) DISSE QUE, SE DEPENDESSE DELE, NÃO VIVERÍAMOS EM UM REGIME DEMOCRÁTICO

Saudosista da ditadura militar (1964-1985), Bolsonaro reiterou ao longo de anos sua tendência autoritária e seu desapreço pelo regime democrático. Ele negou a existência de ditadura no Brasil e se disse favorável a "um regime de exceção", afirmando que "através do voto você não vai mudar nada nesse país".

Em uma entrevista em 1999, quando ainda era deputado, o político disse expressamente que, se fosse presidente, fecharia o Congresso. "Não há menor dúvida, daria golpe no mesmo dia! Não funciona! E tenho certeza de que pelo menos 90% da população ia fazer festa, ia bater palma, porque não funciona", afirmou.

Já na Presidência, em 2021, ele deu a entender que não poderia fazer tudo o que gostaria por causa dos pilares democráticos. "Alguns acham que eu posso fazer tudo. Se tudo tivesse que depender de mim, não seria este o regime que nós estaríamos vivendo. E apesar de tudo eu represento a democracia no Brasil", afirmou em uma formatura de cadetes.

Antes disso, ao longo de 2020, Bolsonaro participou de manifestações que defendiam golpe militar.

4) ATAQUES A MINISTROS DO STF E AMEAÇA GOLPISTA DE NÃO CUMPRIR DECISÃO JUDICIAL

O STF foi alvo preferencial de Bolsonaro ao longo do mandato. Ele usou termos como "politicalha", "acabou, porra", ligação com PT, ativismo e militância, em ataques que se intensificaram a partir de 2020, com a pandemia da Covid-19.

Em março de 2022, em uma mesma cerimônia no Planalto, defendeu a ditadura militar e disse para ministros do STF calarem a boca.

No 7 de Setembro de 2021, em discursos diante de milhares de apoiadores em Brasília e em São Paulo, Bolsonaro fez ameaças golpistas contra o STF, exortou desobediência a decisões da Justiça e disse que só sairia morto da Presidência da República.

Já no 7 de Setembro de 2022, diante de milhares de apoiadores na Esplanada dos Ministérios, discursou em tom de ameaça contra outros Poderes, com citação crítica ao STF.

5) INCENTIVO E PARTICIPAÇÃO EM ATOS ANTIDEMOCRÁTICOS

Ao longo de seu governo, Bolsonaro chamou aliados e participou de diferentes atos antidemocráticos. Uma investigação foi instaurada no STF a pedido da PGR (Procuradoria-Geral da República) para identificar os organizadores e financiadores das manifestações que pediam o fechamento do Congresso e do STF, além do retorno da ditadura militar.

Em uma das mais agudas manifestações, em 19 de abril de 2020, em cima da caçamba de uma caminhonete, diante do quartel-general do Exército e se dirigindo a uma aglomeração de apoiadores pró-intervenção militar, Bolsonaro afirmou que "acabou a época da patifaria" e gritou palavras de ordem como "agora é o povo no poder" e "não queremos negociar nada".

"Nós não queremos negociar nada. Nós queremos ação pelo Brasil", declarou o presidente, que participava pelo segundo dia seguido de manifestação em Brasília, provocando aglomerações em meio à pandemia do coronavírus. "Chega da velha política. Agora é Brasil acima de tudo e Deus acima de todos."

6) FALAS DÚBIAS CITANDO 'EXÉRCITO' E NÃO SAIR DAS '4 LINHAS'

Tanto no contexto das ameaças às eleições quanto no auge da pandemia, quando Bolsonaro buscava se contrapor a governadores e prefeitos que decretavam medidas restritivas buscando conter a circulação do coronavírus, o então presidente fez uma série de falas dúbias insinuando que poderia tomar alguma medida extrema como estado de sítio ou estado de defesa.

Nessas ocasiões, citava com frequência as Forças Armadas e os militares, indicando que eles seriam seu Exército. Também repetia seu bordão de que não sairia das quatro linhas da Constituição, apesar de na maior parte das vezes fazer ameaças que seriam inconstitucionais.

7) INCENTIVO AOS ACAMPAMENTOS GOLPISTAS APÓS A DERROTA PARA LULA NA ELEIÇÃO

Os atos e acampamentos antidemocráticos que pediam um golpe militar e escalaram em casos de violência pelo país foram atiçados por Bolsonaro desde a sua derrota nas urnas para Lula.

Na semana da derrota, em uma rápida declaração, ele disse defender os atos, tendo ali apenas condenado os bloqueios de estradas por seus apoiadores. Dias depois, quebrou um silêncio de 40 dias com um discurso dúbio que também atiçou seus apoiadores com fala salpicada de referências às Forças Armadas na qual estimulou indiretamente as manifestações antidemocráticas.

Nas poucas falas após o resultado, nunca admitiu diretamente a derrota, reforçou as acusações sem provas contra o sistema eleitoral e manteve um discurso dúbio dando a entender que a posse de Lula na Presidência não estava garantida.

"Tenho certeza que entre as minhas funções garantidas na Constituição é ser o chefe supremo das Forças Armadas. As Forças Armadas são essenciais em qualquer país do mundo. Sempre disse ao longo desses quatro anos que as Forças Armadas são o último obstáculo para o socialismo", disse Bolsonaro em dezembro de 2022, repetindo uma expressão usada diversas vezes ao longo de seu mandato.

 

       Filósofo vê esquerda morta e crescimento consistente da ultradireita

 

Professor de filosofia da Universidade de São Paulo (USP) e personagem de destaque no arco das esquerdas, no país, o escritor Vladimir Pinheiro-Safatle disse, em entrevista à mídia conservadora, neste sábado, que esquerda brasileira, como organização política, “morreu” ao se tornar uma "constelação de progressismos”.

Para o escritor, a esquerda teria perdido a ambição de transformar a estrutura da sociedade nos dois pontos fundamentais desse espectro político: igualdade e soberania popular.

— A vitória de Lula foi só um respiro, enquanto a extrema direita continua forte, e mascara a dificuldade de propor soluções para os desafios atuais. A extrema direita é hoje a única força política real do país, porque é a força que tem capacidade de ruptura, tem estrutura e coesão ideológica — afirmou o professor, que acaba de lançar o livro, ‘Alfabeto das Colisões’ (editora Ubu).

•        Democracia

Para Safatle, “a esquerda brasileira morreu como esquerda". O que existe agora, na visão dele, é uma "constelação de progressismos, mas sem aquilo que constituía o campo fundamental da esquerda, que são as ideias de igualdade radical e de soberania popular".

De acordo com essa análise, o que se perdeu na construção das pautas progressistas foi a ambição por uma transformação estrutural da sociedade, que pressupunha um tipo de igualdade dentro dos processos de produção e alguma forma de democracia direta.

— Hoje não se coloca nada parecido com isso — acrescenta.

•        Horizonte

Foi esse diagnóstico que o levou a disputar uma vaga de deputado federal em 2022, pelo Partido Socialismo e Liberdade (PSOL). Com 17.644 votos, terminou como suplente.

— Entendi que a gente estava num momento histórico que nem era mais de retração de expectativas. Era pior: era um horizonte de retração de enunciação. A gente não conseguia nem enunciar. Quantas vezes você ouviu, nos últimos dez anos, a ideia de autogestão da classe trabalhadora? — questiona.

Embora o quadro não tenha mudado desse ponto de vista, o professor de filosofia não pretende se candidatar na eleição municipal deste ano. Considera que, em 2022, havia um desafio maior em curso, que era a luta contra o bolsonarismo.

 

Fonte: FolhaPress/Correio do Brasil

 

 

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