quarta-feira, 17 de abril de 2024

México processa empresas de armas nos Estados Unidos por tráfico

Nos últimos três anos, o governo do México tem seguido uma estratégia de levar à Justiça a indústria de armas americana. Agora, o judiciário dos Estados Unidos autorizou um país a processar esse setor pelo seu papel no tráfico internacional de armas – e para exigir reparações. 

A decisão foi amplamente celebrada no México, dado que a indústria de armas americana tem uma grande parcela de responsabilidade no tráfico de drogas, que é hoje o principal flagelo do país. 

Segundo dados do governo federal, quase meio milhão de armas americanas entram ilegalmente no país todos os anos. E, enquanto seis em cada dez assassinatos são cometidos com armas de fogo, quase todas são provenientes do país vizinho ao norte. Pelo menos 70% das armas recuperadas em cenas de crime no México entre 2014 e 2018 foram contrabandeadas para o país a partir dos Estados Unidos. 

A batalha legal, em curso desde agosto de 2021, levou a duas vitórias históricas nos tribunais federais de Boston, no estado de Massachusetts, Tucson, no Arizona. “Agora os EUA sabem que estão armando os cartéis que estão inundando o país com uma das drogas mais letais”, diz Jonathan Lowy, o advogado americano que representa o México nessa litigância e que tem lutado nos tribunais contra a indústria armamentista nos últimos 27 anos. 

·        Um revólver .38 chamado “Emiliano Zapata”

Nos processos judiciais contra seis empresas americanas, o Ministério das Relações Exteriores mexicano argumentou que essa indústria adotou “esforços deliberados para criar e manter um mercado ilegal para suas armas no México”. Estão no alvo da disputa as empresas Colt, Smith & Wesson Brands, Beretta USA, Sturm, Ruger & Company, Witmer Public Safety Group e D/B/A Interstate Arms. 

Entre outros exemplos, os processos mencionam armas projetadas no “estilo militar”, que podem ser facilmente convertidas para permitir disparo automático e cujo design imita símbolos da cultura dos narcotraficantes, além de outros símbolos tradicionais do país, como a bandeira nacional ou a Virgem de Guadalupe, santa padroeira do México. Por exemplo, a empresa Colt produz três modelos de seu revólver Colt .38, com alças gravadas com esses símbolos, bem como uma frase atribuída ao revolucionário mexicano Zapata: “É melhor morrer de pé do que viver de joelhos”. O nome desses modelos não deixa dúvidas qual é o público-alvo: El Jefe (“O chefe”), El Grito (“O grito”) e Emiliano Zapata, nome do general responsável pela Revolução Mexicana em 1920. 

Enquanto isso, a empresa Barrett projetou fuzis de calibre .50 capazes de pulverizar blindagem de veículos e que comprovadamente já derrubaram helicópteros do Exército mexicano ao sul do rio Bravo.

“No final de janeiro, o Tribunal de Apelações de Boston reconheceu que essas práticas são ilegais e que a indústria não tem ‘imunidade absoluta’ contra [ser responsabilizada pelo] tráfico ilegal de armas para o México”, explicou Alejandro Silverio Alcántara, assessor jurídico do Ministério das Relações Exteriores. 

Como resposta à demanda, em janeiro deste ano o tribunal de Boston, a segunda instância judicial, garantiu ao governo mexicano o direito de processar as fabricantes de armas naquele país. Essa vitória representa a primeira brecha naquilo que tem sido a maior “blindagem” da indústria de armas americana: A Lei de Proteção ao Comércio Legal de Armas (PLCAA), aprovada pelo presidente George W. Bush em 2005, que absolve a indústria de qualquer responsabilidade pelo uso de seus produtos. 

Em uma decisão de um tribunal inferior em setembro de 2022, o pedido do México fora rejeitado pelo juiz Dennis Saylor, que escreveu em sua decisão: “Embora o tribunal tenha grande simpatia pelo povo do México, e nenhuma simpatia pelos que traficam armas para organizações criminosas mexicanas, ele está obrigado a seguir a lei”. Ele se referia justamente à PLCAA.  

Agora, o tribunal de segunda instância reverteu essa decisão, concordando com a tese apoiada no “amicus curiae”, um documento elaborado por promotores de 18 jurisdições dos EUA que afirma que a PLCAA protege as empresas da indústria contra o uso indevido de seus produtos por terceiros – mas que, dessa vez, o que estava sendo questionado eram as práticas própria indústria.

As fabricantes de armas já protocolaram um recurso na Suprema Corte para barrar o processo judicial. 

·        Comprar drogas é ilegal no México 

Outro processo, protocolado pelo governo do México no estado do Arizona, teve sua primeira vitória em 24 de março, quando o juiz acatou a possibilidade de tramitação judicial. Nele, o Estado mexicano acusa cinco lojas de armas de fogo, cujos produtos foram comprados por narcotraficantes. 

Assim como no processo de Boston, a compra foi comprovada pelos tribunais de ambos os países. Além disso, foi submetido aos juízes um estudo que revelou que quase metade das lojas de armas nos EUA depende das vendas para o México para sua sobrevivência econômica. 

O processo usa como argumento a enorme discrepância entre as legislações de armas nos dois países. 

Enquanto no Arizona ou no Texas, é apenas necessário apresentar uma carteira de motorista para comprar uma arma, o México tem uma das legislações mais restritivas sobre posse de armas. Há apenas um revendedor de armas de fogo em todo o país, que emite menos de 50 licenças por ano. 

O México também adotou uma estratégia política robusta para respaldar essa disputa judicial. Primeiro, procurou ajuda de seus vizinhos, todos afetados pelo mesmo tipo de tráfico de armas. Começando pelo Haiti, cujas gangues adquirem grandes quantidades de armas na Flórida. 

Cinco países do Caribe – Jamaica, Belize, Antígua e Barbuda, Bahamas, Trinidad e Tobago – forneceram um “amicus curiae”, um documento em apoio à demanda mexicana.  

Além disso, o governo mexicano colocou o assunto na agenda em suas reuniões internacionais de uma forma que nunca havia feito antes. 

“Colocamos o tráfico de armas na mesa, seja com os Estados Unidos, com o resto da América Latina, que é afetada pelo mesmo problema, ou com a ONU, quando participamos do Conselho de Segurança em 2020, e também através do grupo das Nações Unidas contra o crime organizado”, explica Alcántara.

O processo judicial inicial visava também duas empresas europeias, a Beretta, na Itália, e a Glock, na Áustria, cujas armas de fogo são vendidas nos EUA. 

No entanto, em vez de levá-las aos tribunais, o México considerou que poderia colaborar com instituições europeias para obter mais informações sobre as vendas de armas. 

“Não sabemos quantas armas europeias chegam ao México através das vendas para os EUA. Mas sabemos, por exemplo, que os fuzis AK-47 estão sendo produzidos agora na Europa Oriental, especialmente na Romênia. Nossa abordagem é diferente na Europa”, explica Alcántara. “Com os EUA, você tem que passar pelo sistema legal.” 

Após essas vitórias judiciais, alguns mexicanos começaram a sonhar com uma redução do fluxo de armas para o país. “A batalha não é contra a venda de armas legais nos Estados Unidos, mas para que a indústria adote práticas responsáveis, como faz a indústria automobilística”, diz Alcántara. “Poderíamos imaginar um dia em que os proprietários de armas teriam que ter seguro, assim como quando possuem um carro?” 

O advogado Lowy, que é americano, acredita que o povo americano seria favorável a exigências como essa, assim como o presidente Joe Biden. No entanto, ele diz que duvida que a indústria de armas “mudaria por conta própria, sem ação legal”. 

“Talvez os mexicanos consigam o que nós nunca conseguimos.”

 

Ø  Presidente do México reafirma pedido de expulsão do Equador da ONU; Lula também se posiciona

 

O presidente mexicano, Andrés Manuel López Obrador, reiterou nesta terça-feira (16) seu pedido de expulsão do Equador da Organização das Nações Unidas (ONU), durante coletiva horas antes da cúpula da Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos (CELAC).

Por sua vez, o presidente brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva, durante intervenção na reunião, expressou seu descontentamento com o ocorrido — a operação policial equatoriana na embaixada mexicana em Quito, no último dia 5 — afirmando que "o que aconteceu em Quito é simplesmente inaceitável e não afeta só o México. Diz respeito a todos nós".

"Queremos que a Corte Internacional de Justiça [CIJ] atue, e está muito claro o que propomos: primeiro, uma separação do Estado do Equador das Nações Unidas, desde que se pronuncie oferecendo um compromisso de não repetição — a aceitação disso violou a nossa soberania", declarou o presidente mexicano.

Obrador exigiu um pedido público de desculpas — que já foi negado pelo Equador — e uma promessa de não repetição por parte do governo equatoriano, além de estabelecer um procedimento para casos semelhantes no futuro.

"É hora de qualquer Estado que violar a soberania de uma embaixada de outro país e violar o direito de asilo, o direito internacional, ser expulso da ONU", enfatizou.

A incursão da polícia equatoriana na embaixada mexicana em Quito visava prender o ex-vice-presidente equatoriano Jorge Glas, que buscava asilo.

O governo equatoriano argumenta que Glas foi condenado por crimes comuns de corrupção e não poderia ser considerado perseguido politicamente.

Lula enfatizou a importância do respeito à inviolabilidade das missões diplomáticas e destacou a tradição humanitária da América Latina em defesa do direito de asilo diplomático.

Ele propôs a formação de uma comissão integrada por países da CELAC para acompanhar a situação e a saúde de Jorge Glas, além de buscar formas de reconstruir a confiança e o diálogo na região.

O recurso do México à CIJ e a continuidade do diálogo foram ressaltados como fundamentais para a normalização das relações entre Equador e México, destacando a importância desses países como parceiros regionais.

Posteriormente, a CELAC condenou o ataque à embaixada e pediu salvo-conduto a Jorge Glas. O presidente da Colômbia, Gustavo Petro, também solicitou o restabelecimento do direito de asilo ao ex-vice-presidente.

¨      Governo da Venezuela ordena o fechamento de embaixada e consulados no Equador

Presidente venezuelano, Nicolás Maduro afirmou que seu homólogo equatoriano, Daniel Noboa, deveria ter se apresentado na cúpula da CELAC e assumido a responsabilidade pelo ataque à Embaixada do México em Quito.

O presidente venezuelano, Nicolás Maduro, ordenou nesta terça-feira (16) o fechamento da Embaixada da Venezuela e de consulados do país no Equador.

As partes têm tido rusgas diplomáticas desde que o ex-vice-presidente do Equador Jorge Glas foi preso dentro da Embaixada do México em Quito, onde estava refugiado desde dezembro do ano passado.

Nesta terça-feira, Maduro acusou seu homólogo equatoriano, Daniel Noboa, de "não mostrar o rosto" na cúpula da Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos (CELAC), após o ataque à embaixada mexicana em Quito.

"O presidente Daniel Noboa deveria ter mostrado seu rosto hoje diante de toda a América Latina e do Caribe, deveria ter se apresentado e assumido sua responsabilidade diante do Equador, diante da América Latina, diante do Caribe, diante do mundo, e ele não mostrou seu rosto. Posso dizer que para a Venezuela o presidente Daniel Noboa se escondeu e o povo do Equador deveria saber disso", disse Maduro durante seu discurso na cúpula virtual da CELAC.

Mais cedo, Maduro afirmou que seu governo exigiria na cúpula da CELAC que o Equador liberte Glas e garanta o retorno do ex-vice-presidente à Embaixada do México.

"A Venezuela exigirá que o governo do Equador devolva o ex-vice-presidente Jorge Glas, que lhe seja concedido asilo político e que ele retorne à Embaixada do México para se recuperar fisicamente, para recuperar sua saúde. É o que diz o direito internacional", disse Maduro em seu programa, Con Maduro +.

Maduro também expressou apoio à proposta do seu homólogo mexicano, Andrés Manuel López Obrador, de expulsar o Equador da Organização das Nações Unidas (ONU).

"A Venezuela apoia a proposta do México de expulsar o Equador das Nações Unidas até que peça desculpas à comunidade internacional e restaure a situação [de Glas] ao seu status legal original", disse Maduro.

Na reunião desta terça-feira, a CELAC condenou o ataque à Embaixada do México no Equador e pediu salvo-conduto ao ex-vice-presidente equatoriano.

Jorge Glas foi preso pela polícia após se refugiar na sede diplomática mexicana em Quito devido a acusações de corrupção na sua administração.

O México concedeu asilo político a Glas um dia depois de o Equador ter declarado a embaixadora mexicana, Raquel Serur Smeke, persona non grata por declarações de Obrador sobre o processo eleitoral equatoriano em 2023.

 

Fonte: Por Anne Vigna, da Agencia Pública/Sputnik Brasil
 

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