Noblat: Mauro Cid é só um - o militar que
dá nojo porque desonrou a farda
A Polícia Federal tem
mais de 30 horas de gravações da delação premiada do tenente-coronel Mauro Cid,
ex-ajudante de ordem de Bolsonaro. Elas confirmam tudo o que foi encontrado na
memória do celular de Cid e o que ele mais contou espontaneamente em seis
depoimentos prestados.
Mas Cid sempre foi um
aprendiz de Bolsonaro. E entre as muitas lições que recebeu, destaca-se uma: em
perigo, de preferência atire no próprio pé e jogue a culpa nos outros. Foi o
que Cid fez na semana passada, em desabafo gravado por um amigo, ao desacreditar
o que revelou na delação.
A revista Veja, em sua
edição deste fim de semana, trouxe parte do desabafo. Cid diz, por exemplo, que
a polícia o pressionou a relatar fatos que simplesmente não aconteceram e
detalhar eventos sobre os quais não tinha conhecimento:
– Eles (os policiais)
queriam que eu falasse coisas que eu não sei, que não aconteceram. Você pode
falar o que quiser. Eles não aceitavam e discutiam. E discutiam que a minha
versão não era a verdadeira, que não podia ter sido assim, que eu estava mentindo.
– A lei já acabou há
muito tempo. A lei é eles, eles são a lei, o Alexandre Moraes é a lei. Ele
prende quando ele quiser, como ele quiser; com Ministério Público, sem
Ministério Público, com acusação, sem acusação.
– Eu vou dizer o que
eu senti: eles já estão com a narrativa pronta, é só fechar. Eles querem o
máximo possível de gente para confirmar a narrativa deles. É isso que eles
querem.
– Se eu não colaborar,
vou pegar 30, 40 anos. Porque eu estou [no caso da] vacina, eu estou [no caso
da] joia.
– Vai entrar todo
mundo em tudo. Vai somar as penas lá, vai dar mais de 100 anos para todo mundo.
Entendeu? A cama está toda armada. E vou dizer: os bagrinhos estão pegando 17
anos. Teoricamente, os mais altos vão pegar quantos?
Em nota, a defesa de
Cid desmentiu-o:
– Referidos áudios
divulgados pela revista Veja, ao que parecem clandestinos, não passam de um
desabafo [de Cid] que relata o difícil momento e a angústia pessoal, familiar e
profissional pelos quais está passando, advindos da investigação e dos efeitos que
ela produz perante a sociedade, familiares e colegas de farda, mas que, de
forma alguma, comprometem a lisura, seriedade e correção dos termos de sua
colaboração premiada.
Cid, hoje, será ouvido
outra vez pela Polícia Federal. O que se mantém de pé: o que Cid contou nos
depoimentos em troca de uma pena de prisão mais leve, ou o desabafo que fez ao
amigo? A depender da resposta, Cid poderá novamente ser preso, e o acordo de
delação desfeito.
A Polícia Federal
dispõe de provas e indícios suficientes de que Bolsonaro planejou um golpe,
roubou joias milionárias presenteadas por governos estrangeiros ao Estado
brasileiro e pediu a Cid que falsificasse certidões de vacinação contra a Covid
para que ele e a filha pudessem circular no exterior.
O ministro Alexandre
de Moraes, presidente do inquérito aberto no Supremo Tribunal Federal que apura
crimes contra a democracia cometidos ao longo do governo Bolsonaro, já admite
anular a delação de Cid. Se isso acontecer, pior para Cid, mas não só para ele,
também para sua mulher e seu pai.
Gabriela Cid, mulher
de Cid, aparece em mensagens trocadas com Ticiana Villas-Bôas, filha do
ex-comandante do Exército general Villas-Bôas, sobre as manifestações na porta
dos quartéis e discutindo o futuro de Moraes. O pai de Cid, um general da
reserva, envolveu-se na venda das joias roubadas.
De todo modo, Cid
prestou mais um serviço a Bolsonaro, que agora usará em sua defesa o que ele
disse ao amigo. Mas isso não impedirá o ex-presidente de ser condenado e preso,
talvez até apresse a condenação. Não há dois Mauro Cid na praça: o que diz uma coisa
e depois o contrário. Só há um. Qual?
O militar que desonrou
a farda que vestia e envergonhou o Exército. Como fez Bolsonaro no passado.
Diretor da PF reage a áudios de Cid e
aciona STF: “Graves acusações”
O diretor-geral da
Polícia Federal, Andrei Rodrigues, reagiu nesta sexta-feira (22/3) aos áudios
em que Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro, faz críticas à
corporação.
À coluna, Rodrigues
chamou as declarações de Cid de “graves acusações” e afirmou que a PF acionou o
Supremo Tribunal Federal (STF) para que elas sejam esclarecidas.
“Fomos acusados,
representamos ao STF para que as graves acusações sejam esclarecidas”, afirmou
o diretor-geral da PF à coluna.
Nas gravações,
reveladas pela revista Veja, Cid critica a forma como a PF conduziu seu
interrogatório durante a colaboração premiada, sugerindo ter sido pressionado a
confirmar uma “narrativa pronta”.
“Eles já estão com a
narrativa pronta. Eles não queriam saber a verdade, eles queriam que eu
confirmasse a narrativa deles. Entendeu?”, afirma o ex-ajudante de ordens de
Bolsonaro em um dos áudios.
Em outra gravação, Cid
diz que Moraes “é a lei”. “Ele prende, ele solta, quando ele quiser, como ele
quiser. Com Ministério Público, sem Ministério Público, com acusação, sem
acusação”, afirmou.
Como noticiou a
coluna, Cid confirmou a interlocutores a veracidade dos áudios. O
tenente-coronel disse que as gravações seriam um “desabafo” com um amigo, cujo
nome não se recordava no momento.
• O que diz a defesa de Cid
Em nota, a defesa de
Cid afirmou que os áudios seriam “clandestinos”, mas reforçou a tese de que o
conteúdo “não passam de um desabafo” em que o militar relata o momento difícil
e angústia pessoal pelo qual passa.
Os advogados dizem
ainda que “não subscrevem” o conteúdo dos áudios e que as gravações, “de forma
alguma, comprometem a lisura, seriedade e correção dos termos de sua
colaboração premiada”.
• Advogado de Bolsonaro sobre áudios de
Mauro Cid: “Gravíssimo”
Em publicação no
Twitter, Fabio Wajngarten, advogado e ex-Secom de Jair Bolsonaro (PL), afirmou
ter ficado surpreendido com o que chamou de “potencial jogo duplo” de Mauro
Cid, após áudios do militar terem sido divulgados. Na gravações, o ex-ajudante
de ordens de Bolsonaro critica a Polícia Federal e o ministro do STF Alexandre
de Moraes.
“Ainda não tenho
opinião formada, nem juízo de valor, diante de tantas possibilidades que podem
ter ocorrido”, aponta Wajngarten.
Em um dos áudios,
divulgados pela revista Veja, Mauro Cid afirmou que os investigadores da PF
queriam que ele falasse “coisas que não aconteceram”.
“Eles não aceitavam e
discutiam que a minha versão não era verdadeira, que não podia ter sido assim,
que eu estava mentindo. Eles já estão com a narrativa pronta. Eles não queriam
saber a verdade”, disse Cid a um interlocutor de seu círculo próximo, afirmando
depois se tratar de um desabafo.
• Defesa de Bolsonaro tomará
“providências”
Wajngarten chama a
atenção para o fato de que a imprensa retratou, durante a semana, possível
discrepância entre o que o Cid falou para a PF e o depoimento posteriormente
divulgado.
“Isso é gravíssimo. O
levantamento do sigilo das gravações dos depoimentos dele, na íntegra, poderá
dirimir potenciais dúvidas e dará a transparência necessária para a elucidação
de parte dos fatos”, escreveu.
Segundo o advogado, se
o vazamento dos áudios for uma estratégia da defesa de Cid, ele não crê “que
tenha sido oportuna”. “De todo modo, a defesa do presidente [Bolsonaro] tomará
as devidas providências ao longo do dia”, conclui.
Na semana passada, a
coluna de Igor Gadelha, do Metrópoles, já tinha noticiado que Cid vinha
reclamando do que chamava de “narrativas” construídas pela PF. Por causa disso,
o militar pediu à corporação acesso aos vídeos de seus depoimentos.
• Bolsonaro vê com desconfiança áudios de
Cid criticando PF e Moraes
O ex-presidente Jair
Bolsonaro e seus aliados mais próximos viram com desconfiança o suposto
vazamento de áudios de Mauro Cid criticando a Polícia Federal e o ministro do
STF Alexandre de Moraes.
Nas gravações,
reveladas pela revista Veja, Cid critica a forma como a PF conduziu seu
interrogatório durante a colaboração premiada, sugerindo ter sido pressionado a
confirmar uma “narrativa pronta”.
“Eles já estão com a
narrativa pronta. Eles não queriam saber a verdade, eles queriam que eu
confirmasse a narrativa deles. Entendeu?”, afirma o ex-ajudante de ordens de
Bolsonaro em um dos áudios.
Em outra gravação, Cid
diz que Moraes “é a lei”. “Ele prende, ele solta, quando ele quiser, como ele
quiser. Com Ministério Público, sem Ministério Público, com acusação, sem
acusação”, afirmou.
“Desabafo orquestrado”
Como noticiou a
coluna, Cid confirmou a interlocutores a veracidade dos áudios. O
tenente-coronel disse que as gravações seriam um “desabafo” com um amigo, cujo
nome não se recordava no momento.
Para Bolsonaro e seus
aliados, o conteúdo e o formato dos áudios indicam que Cid e sua equipe de
defesa podem ter “orquestrado” a divulgação dessas gravações com algum objetivo
específico.
“É um desabafo
orquestrado. O áudio está limpo, bem construído”, avaliou à coluna um auxiliar
de Bolsonaro, que diz ainda tentar entender o real objetivo do ex-ajudante de
ordens com a divulgação dos áudios.
• Aliados de Bolsonaro veem Mauro Cid
perto da prisão após áudio vazado
Após o vazamento de
áudios nos quais ataca a Polícia Federal e Alexandre de Moraes, aliados de
Bolsonaro veem Mauro Cid perto de voltar à prisão.
A avaliação é que,
embora os áudios expostos pela revista Veja sejam positivos para o
ex-presidente, podem ter um efeito devastador para Cid e fazê-lo perder os
efeitos da colaboração premiada.
E que Moraes não
deixará Cid em liberdade após o áudio no qual diz que os depoimentos na PF
buscam apenas “confirmar a narrativa” que já está pronta.
Ø
‘Ninguém acusa a PF e o STF de crime
impunemente’, diz investigador sobre áudios de Cid, antecipando clima hostil
"Ninguém acusa
a Polícia Federal e o
Supremo Tribunal Federal de crime impunemente." A declaração é de um
integrante da cúpula da PF e adianta o clima hostil que o ex-ajudante de ordens
de Jair Messias Bolsonaro, Mauro Cid, vai enfrentar nesta sexta (22), quando será ouvido para
explicar as declarações que deu, segundo a revista "Veja", a um
"amigo", atacando a PF e o ministro Alexandre de Moraes.
Segundo a revista, o
"amigo" gravou a conversa com Cid. Trechos vazados à revista mostram
um tenente-coronel ressentido, dizendo que Bolsonaro ficou
"milionário" com PIX de seguidores fiéis, enquanto ele havia perdido
tudo. Mas Cid não para no ressentimento. Ele insinua que seus depoimentos
foram manipulados.
Por isso, foi chamado a esclarecer os áudios. Sua defesa, coordenada por Cezar Bittencourt, correu para, em
nota, tentar desmentir as falas de Cid, tratando o diálogo como clandestino e
exaltando a legalidade da colaboração dele à Justiça contra Bolsonaro - e
reafirmando tudo o que foi declarado por ele em depoimentos.
Até aliados de
Bolsonaro estão cautelosos. A situação de Cid é delicada.
Segundo um procurador
da República, Mauro Cid incorreu em mais de um pecado capital para qualquer
acusado que tente minimizar penas colaborando com a Justiça.
"Isso que ele
(Cid) fez se chama reserva mental", inicia o procurador. "O
colaborador não pode agir com reserva mental, subterfúgios e cartas na manga.
Ele não é obrigado a colaborar. Mas, se decide fazê-lo, tem de agir com fair
play", conclui.
Cid certamente já
comprometeu a extensão de seu acordo de colaboração. Comparado por aliados de
Bolsonaro a Joaquim Silvério dos Reis, o delator da inconfidência, enfiou-se,
por vontade de voltar aos braços do bolsonarismo ou imprudência, no pior dos
mundos.
De todos os envolvidos
nos casos já citados, ele é o que mais tem provas contra si. O celular de Cid
já era, por si só, uma espécie de delação. Mais: Cid recorreu à delação para
salvar de punição a mulher e o pai, envolvidos comprovadamente, por documentos
e registros telefônicos, em diferentes crimes.
A mulher de Cid entrou
e saiu dos Estados Unidos com um comprovante de vacina falso,
fabricado por ele, em conluio com um aliado de Bolsonaro e o ex-secretário de
Saúde de Duque de Caxias.
O pai de Cid, a pedido
dele, tornou-se uma espécie de vendedor de relíquias pegadas por
Bolsonaro da Presidência. Ele ainda aparece em
mensagens no celular de Cid como portador de dinheiro vivo levado a pessoas
próximas ao presidente.
Militar de carreira, o
pai de Cid chegou a cometer a proeza de se fotografar segurando uma caixa com
obra de arte da Presidência que tentava vender nos EUA.
Ao comprometer o
próprio acordo, Cid pode ter arrasado não só o próprio futuro, como o de sua
família.
¨ Para investigadores e ministros do STF, Cid está pressionado e
faz jogo duplo para tumultuar as investigações
Os áudios em que ataca
o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes e a Polícia
Federal (PF) fazem parte de uma estratégia
de Mauro Cid, ex-ajudante de
ordens de Jair Bolsonaro (PL) para tentar tumultuar as investigações contra si
e o ex-presidente, avaliam integrantes da corte e da corporação.
Cid, que foi detido em
maio de 2023 na operação que investigava a emissão fraudulenta de cartões de
vacina para Bolsonaro e outras pessoas, fez um acordo de delação premiada com a
Polícia Federal (PF) para poder deixar a cadeia.
Desde então, essa
colaboração foi usada pela PF em diversas frentes de investigação, como as
que apuram se o ex-presidente desviou joias da União em benefício próprio
se tentou dar um golpe de estado para se manter no poder mesmo com a derrota
nas urnas em 2022.
Na quinta-feira (21),
a revista "Veja" divulgou áudios atribuídos a Cid. Neles, segundo a
revista, o ex-ajudante-de-ordens diz que os investigadores da PF “não queriam
saber a verdade” e que Moraes "está com a sentença pronta" para condenar
investigados.
Não é possível saber
se Cid fala com alguém e quem é essa pessoa.
Como a delação está em
sigilo, Cid não pode discuti-la com ninguém (a não ser advogados e
investigadores) e, por isso, o episódio pode levar à anulação da colaboração, o
que poderia levar o ex-ajudante de ordens de volta à prisão.
Uma dúvida também a
ser apurada é se houve combinação desses áudios com advogados de outros
investigados, o que poderia configurar obstrução de Justiça.
Após a revelação dos
áudios, Moares determinou que Cid seja ouvido por um juiz auxiliar. O depoimento foi marcado para as 13h desta sexta-feira
(22). A defesa e um representante da Procuradoria-Geral da República (PGR) vão
participar.
O movimento, assim, é
arriscado, mas Cid de ordens está pressionado pelo entorno bolsonarista, que
quer saber se ele falou o que tem sido divulgado sobre a delação. Os áudios
divulgados pela Veja, assim, foram vistos com bons olhos nesse grupo – apesar de
trazerem também críticas a Bolsonaro ("O presidente teve Pix de milhões,
ficou milionário, né?", disse Cid, segundo a revista.)
Ocorre que, ressalta
um investigador da PF, nem tudo que está nas investigações saiu da boca de Cid.
Na operação Tempus Veritatis, sobre a tentativa de golpe de Estado, os relatos
do colaborador não foram prioritários, segundo a corporação.
“A colaboração não é a
única e nem a mais importante prova que temos. Além do mais, o termo de
colaboração e as outras provas obtidas a partir dele continuarão válidas, pois
quem está dando causa à rescisão é ele", diz outra fonte da PF.
As reuniões para
discutir uma tentativa de golpe de estado realizadas no final de 2022 no
Palácio do Alvorada, residência oficial da Presidência da República, foram confirmadas por meio de registros de entrada e saída do
local e de dados de celulares dos investigados, além dos depoimentos de participantes de peso, como o ex-comandante do Exército general Freire Gomes.
Uma eventual anulação
da delação, assim, não invalidaria as investigações, na visão de integrantes da
PF.
"[Cid] só tem a
perder. A delação apenas corrobora as demais provas que temos... pouco traz de
novo", disse um uma fonte da corporação.
·
Sem delação, sem benefícios
Procurado pelo blog, o
diretor-geral da Polícia Federal (PF), Andrei Rodrigues, disse que, após a
divulgação dos áudios, reuniu equipes e encaminhou representação para Alexandre
de Moraes "para que ele apure quem é o interlocutor e em que circunstância
foi dito aquilo". E também para apurar o que ele diz sobre a PF.
O chefe da PF explicou
ainda que vai ter desdobramentos do caso.
Questionado a respeito
de eventuais nulidades, Andrei explicou que “se anular a delação, o que se
anula são os benefícios, porque o que ele disse pode ser aproveitado no
processo”.
E que está tudo
gravado em vídeo e áudio.
·
Defesa quer ‘amenizar prejuízos’
O advogado Cezar
Bitencourt, que atua na defesa de Cid, disse que seu cliente não quer anular a
delação e que a defesa vai trabalhar para remediar a situação.
“Não poderei
abandoná-lo agora e terei que amenizar os prejuízos, que são grandes”, diz.
Questionado sobre qual
seria a identidade do interlocutor no episódio dos áudios, ele fala que
desconhecia. "Ainda não sei nada. Vou falar com ele às 13h, quando formos
ao ministro Moraes", completa Bittencourt.
Fonte: Metrópoles/g1
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