Lula faz acenos para se reforçar e barrar o
bolsonarismo
Em apenas uma semana,
o presidente Luiz Inácio Lula da Silva fez pelo menos três movimentações para
atrair e ganhar a simpatia de alguns setores refratários a seu governo e
resistentes ao petismo. São iniciativas focadas em dois principais objetivos:
ganhar força para as eleições municipais e conter uma tentativa de
"reabilitação" de Jair Bolsonaro, que levou milhares de apoiadores à
Avenida Paulista e preocupou o Palácio do Planalto.
Em poucos dias, Lula
sinalizou ao Congresso, aos evangélicos e aos militares. Para agradar ao
Legislativo, o governo anunciou sua concordância com a criação de um calendário
de pagamento de emendas parlamentares, até o fim de junho.
Coube ao ministro
Alexandre Padilha, da Secretaria de Relações Institucionais, fazer essa
costura, numa reunião no Planalto que levou à sua sala até mesmo o líder do PL
na Câmara, Altineu Côrtes (RJ). Uma concessão com endereço certo, para atrair
de vez o Centrão. A medida foi um recuo do governo, que resistia em liberar
ainda mais dinheiro aos congressistas e tinha vetado o calendário de
distribuição de verbas.
"O governo tem
concordância em acelerar essa execução e vai construir um cronograma de
execução das emendas ao longo do ano, como a gente sempre faz. Quer estabelecer
a prioridade absoluta do empenho e pagamento desses valores da saúde e da
assistência social, fruto de emendas individuais ou de bancada, no calendário
eleitoral para que permita os repasses até a data-limite da vedação eleitoral,
que é 30 de junho", anunciou Padilha. Horas depois, à noite, Lula recebia
lideranças do Centrão para uma confraternização no Palácio da Alvorada, com a
presença do líder maior do grupo, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL).
Na semana passada,
outro agrado do governo foi o aval para a aprovação da emenda constitucional
que amplia a imunidade tributária para igrejas e templos, de todas as correntes
religiosas. É algo que beneficia especialmente os evangélicos, já que se trata
de isenção fiscal para a compra de bens e serviços, que vão de aquisição de
material de construção a púlpito de oração, da contratação de pedreiros e
engenheiros a compra de pisos e esquadrias.
A proposta foi
aprovada, a toque de caixa, em 27 de fevereiro, na comissão especial, em
votação simbólica e por unanimidade. A concessão desses benefícios irá gerar
uma baixa no caixa do governo de bilhões de reais — estima-se até R$ 20 bilhões
por ano.
O texto deve ser
aprovado sem qualquer dificuldade. A PEC foi apresentada com a adesão de 346
deputados, bem mais que os 308 votos necessários para aprovação de uma emenda
constitucional na Câmara.
Autor da proposta, o
deputado e bispo Marcelo Crivella (Republicanos-RJ) naturaliza o apoio dos
evangélicos em troca da adesão ao governo e a facilitação na aprovação da
matéria. "Política é isso mesmo. Tem que atrair as pessoas. E acho justo.
O presidente Lula sabe que a igreja é forte, que mantém o crime longe. O
governo (com aprovação da PEC) vai ter uma grande aproximação com as igrejas. A
ovelha ouve a voz de seu pastor. E vamos dizer que o governo nos ajudou",
disse Crivella ao Correio. Ele aposta na promulgação da emenda durante o
feriado da Semana Santa.
• Caserna
O terceiro movimento
de Lula foi em direção a um agrupamento que o governo ainda tenta recompor a
relação —os militares. Sua declaração, numa entrevista à RedeTV!, de que o
golpe militar de 1964 é coisa do passado e que não irá "remoer" esse
assunto, soou como música na caserna. Em plena investigação do 8 de janeiro de
2023, com 16 oficiais sendo alvos de busca e apreensão da Polícia Federal (PF)
— e sob risco até de serem presos por uma frustrada tentativa de golpe de
Estado —, o presidente da República ergue a "bandeira branca" para o
resto da tropa.
Sua manifestação se dá
às vésperas da lembrança dos 60 anos do golpe que derrubou João Goulart e no
meio dos preparativos de seu governo em evidenciar a data, jogando luz em
locais que foram centros de tortura, desaparecimento e morte dos opositores do
regime no país. A opção de Lula por não mexer com esse passado indignou e
entristeceu uma parte de seus apoiadores, que são os setores ligados aos
direitos humanos e grupos, como o Tortura Nunca Mais, e familiares e vítimas
das violações do regime.
"Lula foi
ofensivo em relação à memória das violências cometidas, não só aos que vivemos
diretamente à barbárie em nossos corpos ou de nossos parentes, amigos e
companheiros. (São) violências cometidas sobre o conjunto da sociedade. Se
impôs pelo golpe de 1964 um projeto político que acentuou a desigualdade",
disse a psicóloga Vera Vital Brasil, presa, torturada e exilada.
Com os acenos a esses
três segmentos, Lula quer iniciar o ano com algum controle que lhe dê margem
para, na campanha eleitoral municipal, fechar chapas e dobradinhas que
favoreçam seu projeto político, sejam candidaturas do PT ou não nos grandes
centros e capitais. E busca, também, anular, ou minimizar, a mobilização de
Bolsonaro, que, além do ato em São Paulo, decidiu percorrer o país.
Encurralado por uma
investigação da PF e do Supremo Tribunal Federal (STF), de uma tentativa de
golpe de Estado, o ex-presidente busca o apoio das ruas. E Lula percebeu que
alguma força seu antecessor ainda tem.
"O ato foi
grande. Não é possível negar um fato", avaliou o presidente sobre a
manifestação de 25 de fevereiro, na Avenida Paulista.
• Depois dos giros no exterior, Lula
promete mergulho no Brasil
Nem precisava que o
ex-governador do Ceará e ex-presidenciável Ciro Gomes provocasse — em
entrevista à emissora CNN Brasil, que foi ao ar ontem, cobrou de Luiz Inácio
Lula da Silva: "Larga de querer ser popstar estrangeiro e venha trabalhar
aqui". Isso porque já estava nos planos do presidente da República a
diminuição nas idas ao exterior.
No entendimento do
Palácio do Planalto, as tarefas que Lula tinha para fazer fora do Brasil estão
concluídas, pelo menos por enquanto. A intenção, desde que assumiu o comando do
governo, era a de reinserir o país na comunidade internacional e reconstruir as
pontes que foram detonadas durante o governo do ex-presidente Jair Bolsonaro.
Além disso, as viagens faziam parte do projeto do presidente de se colocar como
um interlocutor para as duas principais guerras em curso — a da invasão da
Ucrânia pela Rússia e o confronto na Faixa de Gaza entre as forças de Israel e
o grupo terrorista Hamas — como mais destacado líder do Sul Global.
"Viajei demais em
2023. Vocês sabiam que eu ia viajar, porque era preciso recuperar a imagem do
Brasil e construir uma imagem positiva do Brasil no mundo. O Brasil voltou a
ter importância", afirmou Lula.
Mas, agora, as
prioridades são outras. Depois das idas ao Egito e à Etiópia, em fevereiro, e
mais recentemente à Guiana e a São Vicente e Granadinas, no Caribe — onde
participou da reunião da Comunidade dos Estados Latino-americanos e Caribenhos
(Celac) —, a agenda de 2024 é rodar pelo Brasil e consolidar a presença do
governo, com vistas às eleições municipais de outubro. Este ano será dedicado
ao lançamento de obras, de apoiar aliados e de, se possível, aumentar o leque
de parceiros políticos.
"Se preparem
porque vou percorrer o Brasil. Quero visitar o Brasil, quero visitar as
cidades, conversar com prefeitos, com o povo, com os governadores",
anunciou, no final do ano passado.
• Costuras
Em janeiro, a primeira
região a ser visitada pelo presidente foi o Nordeste, fundamental para a
vitória sobre Jair Bolsonaro na eleição de 2022. Mas isso não quer dizer que
não existam apoiadores do ex-presidente e que não tentarão manter a presença
política da extrema direita no pleito municipal, em outubro. Exemplos disso são
os ex-ministros Marcelo Queiroga, da Saúde, João Roma, da Cidadania, e Gilson
Machado, do Turismo, que devem disputar as prefeituras de João Pessoa, Salvador
e Recife, respectivamente, empunhando a bandeira do bolsonarismo.
Lula esteve na Bahia,
em Pernambuco e no Ceará em janeiro. Em fevereiro, deu atenção a Minas Gerais e
São Paulo, maiores colégios eleitorais do país — e governados pelos adversários
Romeu Zema e Tarcísio de Freitas —, para a formação de chapas e palanques. No
Rio de Janeiro, o presidente tenta alavancar a reeleição do prefeito Eduardo
Paes e já acenou que gostaria de ver a ministra da Igualdade Racial, Anielle
Franco, como vice da chapa. Resta, porém, convencer o PT local a aceitar a
indicação.
Em São Paulo, o
presidente ungiu a ex-senadora Marta Suplicy como vice na chapa de Guilherme
Boulos (PSol) e torce para que o atual prefeito, Ricardo Nunes (MDB), vá para a
disputa com o apoio do bolsonarismo. Isso porque facilitará a
"nacionalização" da campanha, abrindo a possibilidade de desgastar o
governador Tarcísio — que diante da inelegibilidade de Bolsonaro, vem sendo
apontado com possível candidato da extrema direita às Presidência em 2026.
·
Governo espera relatório para decidir sobre
reajuste de servidores
O governo federal espera
a divulgação de um documento técnico que sairá em março para dar resposta
definitiva aos servidores públicos sobre a concessão ou não de um reajuste
salarial em 2024. O documento — chamado de Relatório de Avaliação de Receitas e Despesas Primárias — é produzido em conjunto pelas áreas técnicas dos
ministérios da Fazenda e do Planejamento e Orçamento e publicado de forma
bimestral.
O relatório, que será
divulgado em 22 de março, trará um balanço sobre a arrecadação federal nos
meses de janeiro e fevereiro. Como vem sendo dito pela ministra da
Gestão, Esther Dweck, se houver alta na arrecadação federal, o novo Marco Fiscal (a
regra de controle dos gastos públicos) traz uma brecha que prevê a ampliação das despesas e pode contemplar
reajuste ainda em 2024.
Essa novidade foi
adiantada por ela, com exclusividade, em entrevista ao Metrópoles, em 25
de janeiro. “Se você estiver cumprindo a meta de resultado primário e tiver um
excesso de receita, a gente pode ter uma expansão da despesa em até R$ 15 bilhões
este ano. E, aí, isso sim já está pactuado com os ministros que compõem a Junta
de Execução Orçamentária, que parte disso, sim, seria para um reajuste dos
servidores este ano”, revelou, na ocasião.
A ampliação das
despesas só vai ser possível se não houver nenhuma verba bloqueada para
alcançar a meta de déficit fiscal zero. Tampouco
está definido quanto desses R$ 15 bilhões poderão ser destinados para bancar um
eventual reajuste para os servidores.
·
Governo pede tempo a servidores
Na última quarta-feira
(28/2), após nova rodada da Mesa Nacional de Negociação Permanente
(MNNP), o governo se disse impedido de se
posicionar, neste momento, sobre eventual reajuste salarial para este ano
aos funcionários do Executivo federal.
De acordo com o
secretário de Relações de Trabalho do Ministério
da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos (MGI), José Feijóo, o governo federal não vai se posicionar sobre
eventual reajuste neste ano enquanto não forem consolidados os dados de
arrecadação da União.
“São muitas as
conquistas para os servidores desde o ano passado para cá. Está muito claro o
quanto o governo se esforça para atender as demandas apresentadas pelos
servidores”, afirmou José à bancada sindical.
Em resposta, os
servidores alegaram que, sem recomposição salarial neste ano, não há acordo. Ou
seja, devem intensificar as mobilizações. Algumas categorias, como a dos
funcionários do Banco Central (BC) e
do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais
Renováveis (Ibama), têm feito paralisações para pressionar o
governo. Um movimento grevista geral não está descartado.
·
Proposta e contraproposta
Para 2024, a equipe de
Dweck sugeriu aumento no auxílio-alimentação, de R$ 658 para R$ 1 mil; no
valor per capita referente ao auxílio-saúde, de R$ 144 para R$
215; e no auxílio-creche, de R$ 321 para R$ 484,90.
Isso representa 51,06%
de reajuste nos auxílios, já contemplado no Orçamento de 2024. Com exceção do
auxílio-saúde, os demais benefícios não abrangem aposentados e pensionistas;
por isso, há pressão dos servidores.
O MGI promete mais 9%
de correção nos próximos dois anos, a ser paga em duas parcelas de 4,5%: a
primeira em maio de 2025; e a segunda em maio de 2026.
Inicialmente, a bancada sindical apresentou uma contraproposta pedindo correções de 22,71% e 34,32%, a depender do tipo
de acordo firmado com as categorias. Em seguida, em um esforço de negociação,
ajustou para baixo os percentuais demandados, entre 7% e 10%, pontuando que
aceita que eles sejam implementados apenas no segundo semestre.
Justificando não ter
como atender a demanda agora, o governo negou a contraproposta.
·
Déficit e bloqueio também serão decididos
O relatório bimestral
também tem o intuito de acompanhar o cumprimento da meta fiscal estabelecida
para o exercício atual, de déficit zero.
É por meio deste
relatório ainda que o Poder Executivo estabelece o contingenciamento (isto é, o
bloqueio) das despesas do orçamento geral da União quando a receita reestimada
não comportar o cumprimento das metas de resultado primário ou nominal estabelecidas.
Assim, o relatório pode trazer valores a serem bloqueados em determinadas
áreas.
Se houver bloqueio em
alguma pasta, não será possível conceder reajuste ao funcionalismo.
Segundo dados de
janeiro já divulgados, a arrecadação federal tem surpreendido positivamente,
como resultado de medidas para expansão das receitas tomadas pelo governo, em
conjunto com o Congresso Nacional, no ano passado.
Fonte: Correio
Braziliense/Metrópoles
Nenhum comentário:
Postar um comentário