terça-feira, 7 de novembro de 2023

O que impulsiona o Brasil a estreitar relações comerciais com o sudeste Asiático?

Para além das relações diplomáticas, o Brasil vem, nos últimos meses, estreitando as relações comerciais com os países que compõem o BRICS, além de nações localizadas no continente africano e na Ásia. A região asiática com destaque. Afinal, a China lidera o ranking entre os parceiros mercantis do Brasil.

Só no ano de 2021, a China figurou como o oitavo maior investidor no Brasil e o primeiro da Ásia, superando na lista o Japão, a Coreia do Sul e a Índia.

O investimento estrangeiro direto (IED) chinês no Brasil aumentou em US$ 7,1 bilhões (equivalente a R$ 34,78 bilhões) em relação a 2020, representando um crescimento de 31%.

•        Mas qual a relação entre Brasil e Ásia?

Neste movimento, que toma cada vez mais números e corpo, a Associação de Nações do Sudeste Asiático (ASEAN) figura como rota brasileira.

A Indonésia é um exemplo deste novo percurso de lucro comercial. A aproximação das nações que fogem da rota tradicional, conforme pontuam analistas ouvidos pela Sputnik Brasil, é um novo olhar para as outras potências comerciais, em especial do sul global.

Desde a última sexta-feira (3), o governo brasileiro participa da CIIE (Feira Internacional da China, em tradução livre), maior feira multissetorial do país, que reúne 23 empresas brasileiras de alimentos e bebidas, que segue até próxima sexta (10).

Para Bianor Teodósio, mestre em ciência política pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e MBA em economia e gestão empresarial pela Fundação Getúlio Vargas (FGV), o alinhamento com novas economias que fogem do 'padrão' é sempre bem vista.

Ele salienta que tal característica pulveriza o mercado.

"A ligação e a aproximação de mercado com outros países, a exemplo da Indonésia faz com que o Brasil figure, ainda mais, como uma opção para exportação, para além do mercado tradicional, pulverizando a nossa forma de fazer e gerar economia", frisa à Sputnik o economista e cientista político.

•        Brasil e Indonésia: qual o fator que os aproxima?

De acordo com Bianor, a Indonésia é um Estado que tem uma renda per capita e uma biodiversidade extensa, ambas muito próximas do Brasil.

Devido a essas semelhanças, isso faz com que os dois países consigam se aproximar bastante.

"Qualquer abertura comercial é uma oportunidade para o Brasil", frisa Bianor.

Bruno Hendler, doutor em economia política internacional pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), coordenador do grupo de Pesquisa em Ásia-Pacífico (GEAP-UFSM) e pesquisador membro do grupo de pesquisa LabChina, pontuou traços sobre as relações entre Brasil e Indonésia, destacando oportunidades e desafios para ambas as nações.

"A ASEAN como bloco é muito atrativo para o Brasil, são mercados consumidores muito grandes, e a Indonésia dentro da ASEAN é o carro-chefe por causa da sua escala. Em termos de comércio, você tem exportações de valor agregado mais altas do Brasil para a Indonésia, mas para outros países também", pontua.

Segundo o especialista, além do viés comercial, outro ponto que aproxima as nações são as características climáticas, já que tanto o Brasil quanto a Indonésia possuem florestas tropicais.

"Brasil e Indonésia têm se alinhado muito na agenda ambiental. Junto com o Congo, as três maiores florestas tropicais do mundo estão localizadas nesses três países. Há questões de afinidade", ressalta.

•        Como é a relação entre Brasil e China?

O copresidente do Lide China, José Ricardo, pontua as crescentes oportunidades na parceria econômica entre Brasil e China, destacando o papel das feiras e a importância de explorar áreas como tecnologia e sustentabilidade.

Ricardo enfatizou a crescente participação do empresariado brasileiro e das autoridades na China International Import Expo (CIE), descrevendo-a como a principal feira de importação da China, onde o país asiático busca adquirir produtos do mundo inteiro.

Além da CIE, ele mencionou outras feiras, como a Feira Cial, focada em produtos agrícolas, e a Feira de Cantão, voltada para a exportação de produtos fabricados na China.

"O empresariado brasileiro, junto com as autoridades, tem organizado uma série de comitivas intensificando essa parceria [Brasil x Ásia e Sul Asiático]. Inclusive porque nós [Brasil e China] temos um potencial enorme na parte de exportação de alimentos, isso não só de alimentos agrícolas, como commodities, de uma forma geral. Mas é importante dizer que, dentro dessa exportação de produtos agrícolas, nós temos muita tecnologia empregada", explica o CEO do Lide China no Brasil.

O representante do empresariado apontou para a mudança no eixo econômico global, observando que a Ásia representa um grande potencial de negócios e investimentos para o Brasil.

O país sul-americano tem tomado a liderança em diversas frentes internacionais, incluindo o G20 e os BRICS.

"O eixo da Terra mudou. A gente tem percebido que a Ásia tem um grande potencial para a aproximação do Brasil em termos de negócios, em termos de investimentos. E o Brasil, hoje, tem tomado a liderança em diversos mecanismos internacionais, não só com o G20, não só com a relação sino-brasileira, mas também, por exemplo, com o BRICS", reforça.

A visão do executivo inclui o destaque para a liderança do Brasil na tecnologia de energia limpa, como a energia eólica, energia solar e o hidrogênio verde.

Ele observou que, embora haja desafios a serem superados, a intensificação do diálogo, intercâmbio e participação em feiras e debates internacionais são formas eficazes de enfrentá-los.

Ele finaliza reforçando que o Brasil está se tornando um ator de destaque nas relações internacionais, promovendo o desenvolvimento econômico inclusivo e a transição para fontes de energia mais limpas.

 

       A hora é agora: relação da Índia com o Brasil está no auge e com crescimento 'exponencial'

 

O Brasil está no 'caminho certo' para incrementar as trocas comerciais com a Índia, mas é fundamental romper com a lógica tradicional de fazer negócios e investir na complementariedade, segundo os entrevistados ouvidos pela Sputnik Brasil.

Com o segundo maior Produto Interno Bruto (PIB) agrícola mundial e maior população do planeta, a Índia é o principal parceiro comercial asiático do Brasil, mas representa apenas 2% das exportações brasileiras e 3,3% das importações.

A parceria subaproveitada deve-se sobretudo ao desconhecimento mútuo sobre potenciais setores e produtos que possam incrementar o comércio entre os dois países, de acordo com o economista Fábio Sobral, professor da Universidade Federal do Ceará (UFC), e o presidente da Câmara de Comércio Índia-Brasil (CCIB), Leonardo Ananda Gomes, ouvidos pela Sputnik Brasil.

Apesar das dificuldades e obstáculos, o Brasil está no "caminho certo" na busca de aumentar as trocas comerciais com o gigante asiático, para Ananda Gomes.

O empresário participou da delegação do Ministério da Agricultura e Pecuária e de empresários brasileiros que esteve na Índia nesta semana com extensa agenda bilateral.

"Sem dúvida, estamos vivenciando o melhor momento da relação entre os dois países. Os governos estão alinhados, existe uma relação forte, laços de amizade entre as duas nações", opina o presidente da CCIB.

"Temos uma delegação empresarial acompanhando, porque aí sim viabiliza os negócios. Os ministros, os chefes de Estado viabilizam um cenário propício, mas os homens de negócio é que fazem de fato a relação comercial acontecer e a balança se fortalecer."

Ele lembra que nos últimos anos, a relação comercial entre os dois países ultrapassou US$ 15 bilhões (R$ 78,6 bilhões), com crescimento de 106% na exportação de commodities do Brasil para o continente indiano, entre 2022 e 2023, e a perspectiva é que se intensifique ainda mais nos próximos meses.

"É um crescimento exponencial. A previsão é que em pouco tempo, talvez em cinco, seis anos, a gente atinja US$ 100 bilhões (cerca de R$ 500 bilhões) em trocas comerciais, aproximando-se dos números da relação bilateral comercial entre Brasil e China", afirma o empresário.

Segundo ele, o momento atual representa "a pontinha do iceberg" na relação bilateral entre os dois países, não apenas do ponto de vista do comércio, como também na atração de investimentos:

"Os indianos ainda não conhecem o Brasil, não conhecem o potencial brasileiro, os principais setores do país, assim como os brasileiros não conhecem a Índia. Não sabem que é um dos maiores mercados consumidores do mundo, que já é a maior população do mundo, que é o país que mais cresce no mundo há muitos anos e a quinta maior economia do mundo", comenta Ananda Gomes.

•        O que a Índia importa do Brasil?

Atualmente apenas três produtos (óleo de soja, petróleo bruto e ouro) representaram 80% das exportações para o mercado indiano, segundo o Ministério da Agricultura e Pecuária.

Sobral concorda que o momento é positivo para a parceria bilateral entre as duas nações, mas os resultados serão sentidos no longo prazo e se forem implementadas estratégias inovadoras para responder aos enormes desafios da sociedade indiana e da sociedade brasileira:

"É promissor que haja esse debate, mas ainda é insuficiente, porque busca fazer mais do mesmo, com um olhar unicamente no imediato: na balança comercial do próximo ano, no volume dessa balança comercial e não na qualidade dessa balança comercial, pensando inclusive nos povos", avalia ele.

•        Índia, a parceira estratégica do Brasil no Sul Global

O professor da UFC considera que ainda falta inteligência estratégica que permita que os países deem um salto com uma lógica não tradicional, e que tire a economia brasileira do patamar de "mero exportador de commodities, com parceria mais voltada para a agregação de valor industrial".

Para Sobral, o fato de as duas economias ocuparem nichos de mercados muito semelhantes (agricultura, têxtil, calçados, automóveis) exige das duas nações investimentos na diversificação e estudo para que mais oportunidades sejam identificadas e os números correspondam ao potencial dessa relação:

"É preciso aproveitar uma parceria que busque um desenvolvimento estratégico desses dois países. Pensar novas formas além das áreas habituais. Desenvolver, por exemplo, o setor agroflorestal para além do agronegócio da monocultura, do latifúndio, o desenvolvimento de uma nova agricultura."

A parceria conjunta deve priorizar o intercâmbio tecnológico, ressalta o professor, como desenvolvimento de semicondutores, de microchips para os dois países, "áreas em que estão atrasados, embora o setor de informática da Índia estar incomparavelmente mais mais avançado que o do Brasil", argumenta o estudioso.

•        Qual a importância da relação entre Brasil e Índia?

O docente da UFC avalia que a atual ausência da Organização das Nações Unidas (ONU), faz com que iniciativas como a iniciativa trilateral entre Índia, Brasil e África do Sul (IBAS) e o bloco dos Brics e do G20 tenham papel fundamental nesse processo de articulação política dos países para se contraporem ao domínio das grandes potências, mas que as iniciativas de integração "ainda estão muito incipientes".

O fato de a Índia ter presidido o G20 neste último ano e estar passando a presidência para o Brasil também foi crucial nesse processo, pois proporcionou encontros bilaterais importantes entre ministros brasileiros e ministros indianos de diversos setores e áreas, assim como encontros dos chefes de Estado.

"O presidente Lula encontrou o primeiro-ministro Narendra Modi inúmeras vezes ao longo desse último ano, em virtude dos encontros proporcionados por esses fóruns G20, BRICS, IBAS, e isso ajuda a fortalecer também a relação bilateral", comenta Ananda Gomes.

•        Mercosul e Índia

O acordo entre Índia e Mercosul, que está sendo revisado, poderá ampliar ainda mais o número de produtos com preferências tarifárias e contribuir muito para o fortalecimento da relação, segundo os especialistas, priorizando as complementaridades importantes.

As tratativas, que estavam paradas há dez anos, podem dobrar o atual fluxo de comércio brasileiro com os indianos para US$ 30 bilhões (R$ 153 bilhões) até 2030. A soma pode chegar a US$ 50 bilhões (R$ 255 bilhões), se for incluído o comércio de serviços.

Em um levantamento feito pelo governo brasileiro, ficou claro o largo tamanho das barreiras para as exportações de produtos brasileiros que têm a Índia como destino. A tarifa de importação de frango, por exemplo, é de 100%. De carne suína 30%, de milho 50% e de café de 53% a 100%.

"É preciso pensar um sistema de desenvolvimento tecnológico, de ampliação de parques tecnológicos, de centros de pesquisa, integração com as universidades de pesquisa", concluiu o professor da universidade do Ceará.

 

       Milei busca feito que só Macri conseguiu para virar presidente da Argentina

 

Para conseguir ser o novo presidente da Argentina, o candidato de extrema direita Javier Milei terá de repetir um feito conquistado somente por Mauricio Macri em 2015: virar a votação no dia 19 de novembro, quando o segundo turno será disputado.

Após surpreender com o primeiro lugar nas prévias argentinas, Milei não repetiu a dianteira na disputa de primeiro turno, em 22 de outubro, e obteve 29,98% dos votos para o cargo, contra 36,68% do líder, o governista Sergio Massa.

•        A virada

Há oito anos, a virada de Macri representou não somente a única em eleições presidenciais argentinas desde a redemocratização, em 1983, mas também uma solitária interrupção do peronismo no governo federal nas últimas duas décadas. Essa continuidade é representada pelo atual ministro da Economia.

Enfrentando um representante do governo da época, Daniel Scioli, Macri teve 34,15% dos votos no primeiro turno, contra 37,08% do oponente. Pouco mais de 700 mil votos separaram os candidatos — no domingo, 1,7 milhões de eleitores distanciaram Massa de Milei.

No confronto definitivo, Macri fez 51,34%. Em 2019, novamente contra um peronista (o atual presidente, Alberto Fernández), ele não foi reeleito.

A professora Sara Toledo, do Instituto de Relações Internacionais da Universidade de São Paulo (IRI-USP), lembra que havia um “contexto de insatisfação com o discurso de polarização kirchnerista” em 2015. Hoje, o movimento tem na vice-presidente Cristina Kirchner seu principal expoente.

“Macri se elege com muito apoio de moradores de áreas urbanas e jovens cansados de um discurso de divisão, na época muito entoado pelo kirchnerismo”, diz. Para ela, embora a rejeição ou parte dela se reproduza em 2023, Sergio Massa é um candidato menos identificado com esse grupo político.

•        Segundo no primeiro turno, mas sem segundo turno

Em 2003, Nestor Kirchner se tornou presidente após terminar o primeiro turno atrás de Carlos Menem. Como o líder desistiu da candidatura no segundo turno, contudo, Kirchner não precisou de uma virada para triunfar.

Nos outros pleitos pela Presidência da Argentina, o vencedor se repetiu ou a disputa foi definida em turno único.

A título de comparação, no Brasil, principal democracia da América Latina, não houve virada em pleitos presidenciais desde a redemocratização.

•        Rejeições pesam

A professora de Relações Internacionais da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), Regiane Bressan, considera este segundo turno “imprevisível”: “Os candidatos vão disputar na unha os eleitores remanescentes”.

“Deve haver novamente muitos votos contra Milei, inclusive de um eleitorado de direita conservador, que se assusta com seu discurso radical; e também muitos votos contra o peronismo de Massa, que é uma bandeira quase onipresente na sociedade argentina”, diz.

Na mesma linha, Arthur Murta, professor de Relações Internacionais da Pontifícia Universidade Católica (PUC-SP), projeta a importância de um fenômeno que chama de “não-opção”: “Uma parcela significativa de argentinos estão desinteressados em votar em qualquer um dos dois. O sentimento de rejeição é amplo”.

“A população argentina nutre uma descrença muito grande com relação ao futuro. Existe o sentimento de que os problemas econômicos do país não se resolverão apenas com a escolha de um presidente”, acrescenta Sara Toledo.

Neste cenário, os dois postulantes devem investir justamente nos fatores de rejeição de seu adversário. Massa deverá destacar as propostas mais polêmicas do opositor, como a de liberar o comércio de armas. Por outro lado, o vice-líder deve reforçar as críticas à gestão econômica do atual governo, comandada pelo adversário.

Bressan lembra que, “com uma inflação de 138% ao ano e quase metade da população abaixo da linha da pobreza, a campanha de Milei pode alegar que seu adversário representa a continuidade dessa situação”.

Murta aponta uma “mudança na narrativa” de Milei em busca da virada: “Ele apostou no discurso anti-establishment para se consolidar [até o primeiro turno]. Agora, com uma disputa completamente aberta contra Massa e o peronismo, busca aproveitar o sentimento de rejeição a esse movimento, agravado no atual governo”.

•        Apoio de Bullrich

A busca para alcançar o feito de Macri tem o apoio de Patricia Bullrich, candidata do campo político do ex-presidente e terceira colocada no pleito inicial, com 23,83% — 6,2 milhões — de votos.

“A urgência do momento nos desafia a não sermos neutros”, disse ela em entrevista coletiva. “A Argentina, do nosso ponto de vista, não pode reiniciar um novo ciclo kirchnerista liderado por Sergio Massa”.

Regiane Bressan diz que esse eleitorado poderá se dividir: “Ela representa um eleitor de oposição ao peronismo dentro de uma política conservadora, de austeridade fiscal, que não é radical como Milei”.

A especialista lembra que, no início de sua trajetória política, Bullrich era peronista: “Ela migrou à direita ao se opor a Massa, e confirmou seu caminho de oposição ao atual governo”.

Para Arthur Murta, os votos da terceira colocada serão “pivotais” e o gesto público é importante para o representante da oposição. Segundo o professor, Sergio Massa não é um candidato “tão à esquerda no peronismo” e, por isso, poderia captar uma fatia desse eleitorado. Com o apoio, “esse movimento pode ser revertido em direção a Javier Milei”.

 

Fonte: Sputnik Brasil/CNN Brasil

 

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