domingo, 2 de julho de 2023

Cassação de Bolsonaro empurra direita para o centro

A condenação de Jair Bolsonaro a ficar fora de eleições até 2030 consolida a influência do ministro Alexandre de Moraes sobre o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e sobre o Judiciário, após uma guerra aberta de anos com o ex-presidente da República em torno da disseminação de fake news sobre a confiabilidade do sistema eleitoral e de iniciativas golpistas que culminaram nos atos de 8 de janeiro.

Consolida, também, as regras para os próximos julgamentos (só sobre Bolsonaro há outros 15 ações no TSE) e para as próximas eleições. E, ao fazer isso, empurra a direita brasileira mais para o centro – já que, como disse Moraes em seu voto, essa decisão servirá de base para 2024 e 2026. “Para que candidatos não se utilizem de seus cargos públicos para disseminar notícias fraudulentas sobre fraude eleitoral e para, com isso, atingir o eleitor”.

O fato de Bolsonaro ter sido declarado inelegível por 5 votos a 2 pode sugerir que foi uma vitória fácil para Moraes, mas quem acompanhou nos bastidores sabe que o presidente do TSE em nenhum momento relaxou a vigilância sobre os movimentos do adversário e nem dos próprios colegas.

Ele mesmo rememorou esse histórico em seu voto, que teve efeito semelhante ao de um “discurso da vitória”.

Depois de chamar a campanha de Bolsonaro contra as urnas eletrônicas de “desinformação divulgada por verdadeiros milicianos digitais”, e de defini-la como fruto de um “degradante populismo renascido a partir das chamas dos discursos de ódio”, Moraes disse que o desfecho da condenação podia ter sido previsto desde junho passado, quando o TSE cassou e tornou inelegível o deputado estadual do Paraná Fernando Francischini (União).

“A Corte já havia definido de forma pública e para todos os candidatos independentemente de partido e ideologia tinham consciência dos parâmetros estabelecidos e que deveriam ser rigorosamente observados”, disse Moraes.

Francischini foi punido por afirmar em uma live durante o primeiro turno das eleições de 2018, com a votação em andamento e sem apresentar nenhuma prova, que as urnas eletrônicas tinham sido adulteradas para impedir a eleição do presidente Jair Bolsonaro. Desde a cassação, Moraes trabalhou para garantir que o entendimento adotado naquele julgamento permanecesse válido, apesar de alguns percalços processuais e da troca de dois ministros do TSE que poderia ter tornado a missão bem mais difícil.

No primeiro caso, seu colega de Supremo Kassio Nunes Marques, nomeado por Bolsonaro para o cargo, deu uma liminar suspendendo a cassação — que um mês depois foi derrubada pela Segunda Turma do STF.

Em razão do mal estar gerado por essa decisão, circulou nos bastidores do Supremo a especulação de que Gilmar Mendes e outros aliados de Moraes estavam preparando uma manobra para que Nunes Marques não se tornasse titular do TSE. A iniciativa não se confirmou, mas a guerra de nervos parece ter ajudado a suavizar o comportamento do ministro.

Bolsonaro ajudou — e muito. Desde que a ação do PDT julgada nesta sexta ingressou no tribunal, o então presidente da República promoveu uma escalada de ataques à credibilidade do sistema eleitoral que fez a preleção aos embaixadores parecer brincadeira de criança.

As lives, as repetidas ameaças de resistência a uma eventual derrota nas eleições, a denúncia sem provas de que rádios estivessem suprimindo suas propagandas na campanha e, por fim, a descoberta de uma “minuta do golpe” na casa do ex-ministro da Justiça Anderson Torres, demonstraram que Bolsonaro e seus seguidores simplesmente não respeitariam nenhum limite para tentar impor sua vontade sobre a do resto do eleitorado.

Ainda assim, até recentemente a prevalência de Moraes sobre o plenário do TSE não era garantida. A aposentadoria de Ricardo Lewandowski, em abril, abalou a correlação de forças dentro da Corte.

Antes, Moraes contava com o apoio incondicional de Lewandowski, Cármen Lúcia e do corregedor Benedito Gonçalves, sempre formando uma maioria de ao menos quatro votos em julgamentos cruciais do plenário.

Com a saída de Lewandowski, a divisão dos votos ficou mais apertada. Além de Raul Araújo, mais alinhado ao bolsonarismo, pelo menos dois ministros não seguiam automaticamente o presidente do TSE – Carlos Horbach, que votou contra a cassação de Francischini, e Sergio Banhos, que foi voto vencido pela retirada do ar de videos em que Lula chamava Bolsonaro de genocida.

Foi só com o final dos mandatos de Banhos e Horbach que o presidente do TSE conseguiu emplacar em seu lugar dois aliados – Floriano de Azevedo Marques e André Ramos Tavares, que estrearam no TSE já votando pela condenação do ex-presidente.

A partir dessa troca, Moraes pôde ficar mais à vontade. Só faltava garantir que os dois ministros mais alinhados a Bolsonaro restantes no tribunal, Raul Araújo e Kassio Nunes Marques, não tentariam adiar o julgamento por mais dois meses, pedindo vista do processo.

Foi o que o presidente do TSE fez nas últimas semanas, em conversas fechadas com os colegas em que apelou para que se encerrasse de vez o processo contra o ex-presidente. Moraes não conseguiu virar o voto dos colegas, mas demonstrou nesta sexta-feira que detém de fato o poder sobre o plenário.

Em maio, diante de uma roda de convidados ilustres do casamento do filho de seu aliado Luis Felipe Salomão, Moraes fez uma previsão quase profética: em seis meses estaria “tudo resolvido”. Na interpretação de interlocutores do ministro, por “tudo resolvido” entenda-se condenar Bolsonaro à inelegibilidade e encerrar os inquéritos sobre os atos de 8 de janeiro.

Daqui por diante, as centenas de ações no Supremo contra os golpistas que invadiram a sede dos três poderes serão acelerados.

Se a estratégia for tão eficiente quanto a que levou à condenação de Bolsonaro nesta sexta-feira, até o final do ano o Judiciário terá encerrado pelo menos a parte que importa sobre o rescaldo das eleições de 2022.

Estará aberta então oficialmente uma nova disputa para ver quem assumirá o legado do bolsonarismo e da extrema-direita, agora sob as regras de Moraes no TSE.

•        Eduardo Bolsonaro se vitimiza e "chora" nas redes ao falar da condenação do pai no TSE

Desde que ascenderam ao cenário político, a família Bolsonaro e seus apoiadores acusam a esquerda de ser "vitimista" e de fazer "mimimi" nas redes. No entanto, agora eles fazem uso desses "mecanismos retóricos" quando se sentem acuados.

Como é sabido, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) condenou nesta sexta-feira (30) o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) por abuso de poder político, tornando-o inelegível por oito anos, ou seja, até 2030.

Diante dessa realidade, a claque bolsonarista iniciou um chorume interminável de lamentações nas redes, acusando a Justiça brasileira de perseguir o ex-presidente Jair Bolsonaro.

Quem também se juntou a esse derramamento foi o deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP), o filho "02" do ex-presidente Bolsonaro. Com discurso vitimista, Eduardo afirmou que "não é na glória que conhecemos nossa verdadeira força, mas sim nas adversidades. No final, vence aquele que consegue suportar a dor", lamentou.

"Não se esqueçam de quem venceu o mundo numa cruz e cuja mensagem persiste até hoje. Não somos perfeitos, mas somos sinceros, e nosso sonho continua mais vivo do que nunca. BRASIL ACIMA DE TUDO! DEUS ACIMA DE TODOS!", concluiu Eduardo Bolsonaro.

 

       Inelegível, Bolsonaro cita Lula 5 vezes em 1 minuto e invoca até Massacre do Carandiru

 

Jair Bolsonaro, além de extremamente irritado, deu uma declaração confusa na noite desta sexta-feira (30) ao desembarcar no Aeroporto de Brasília, que estava lotado de pessoas comemorando sua inelegibilidade por 8 anos.

Em rápida conversa com a imprensa, que o questionou sobre a decisão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) que cassou seus direitos políticos, Bolsonaro citou o presidente Luiz Inácio Lula da Silva cinco vezes em pouco menos de um minuto e misturou assuntos totalmente diferentes, como o Massacre do Carandiru.

"Onde vamos parar? O que querem? Me tirar. Ao que tudo indica, me tiraram. O Lula é democrata? Nem vou falar em corrupção. O Lula é democrata? O Lula é paz e amor? O Lula é a solução para o Brasil? O Lula é menos ódio? Não basta ele falar o que falou do Sergio Moro?", questionou o ex-presidente.

"Eu dei a graça para o Daniel Silveira, derrubaram o decreto. Nunca se viu isso. É competência do presidente. É a mesma coisa o pessoal do Carandiru. O que diz a lei? Pra citar no caso o indulto do caso do Carandiru. O fato ter ocorrido há mais de 30 anos. Eu dei o indulto em dezembro de 2022. Mais de 30 anos. Vão derrubar isso também?", disparou ainda.

 

       Bolsonaro diz que Brasil está de luto; a festa, no entanto, se espalha por toda parte

 

O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) afirmou, logo após a decisão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) de declarar a sua inelegibilidade, que o Brasil fica de luto

“Acho que o Brasil fica de luto, mas alguém vai soltar fogos, obviamente”, declarou.

A frase de Bolsonaro, no entanto, contrasta com o que se viu em vários lugares do país na noite desta sexta-feira (30. A festa para comemorar sua inelegibilidade explodiu em bares, shows, pelas ruas, enfim, por todas as partes.

Veja alguns exemplos abaixo:

•        Facada nas costas

O lamento de Bolsonaro não parou por aí. Ele afirmou também que a sua declaração de inelegibilidade pelo TSE foi uma ‘facada nas costas’.

“Não gostaria de me tornar inelegível. Há pouco tempo tomei uma facada na barriga, hoje uma facada nas costas”, disse o ex-capitão.

Perguntado sobre possíveis nomes para substituí-lo na arena eleitoral, o ex-presidente tergiversou. “Eu não estou morto, vamos continuar trabalhando. Não é o fim da direita no Brasil. Antes de mim ela existia, mas não tinha forma. Começou a ganhar materialidade”, prosseguiu.

 

       Lágrimas bolsonaristas: veja as "melhores" lamentações à inelegibilidade de Bolsonaro

 

O Brasil está em festa. Nesta sexta-feira (30), o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), por 5 votos a 2, condenou Jair Bolsonaro e o ex-presidente se tornou inelegível por 8 anos e, caso queira voltar à vida política, só poderá ser candidato novamente em 2023 - isso se até lá ele não for preso a partir de um dos inúmeros processos e inquéritos dos quais é alvo.

A maior parte dos usuários das redes sociais vêm celebrando a decisão. Uma minoria de parlamentares bolsonaristas, entretanto, estão esboçando reação contrária. Entre os apoiadores do ex-presidente, há um misto entre lamentação, raiva e frieza - o que já vem fazendo essas publicações contra o julgamento do TSE virarem motivo de chacota.

O deputado federal Nikolas Ferreira (PL-MG), por exemplo, deixou a habitual estridência de lado e se limitou a dizer: "Vence o sistema". As respostas à publicação do bolsonarista são puro deboche. A deputada estadual Laura Sito (PT-RS), respondeu ironizando: "Vence o sistema eletrônico de votação?".

Já a deputada federal Carla Zambelli (PL-SP), apontada como a próxima a ter o mandato cassado, fez uma postagem em tom de ameaça: "A semeadura do Presidente Bolsonaro não desaparecerá".

O deputado Gustavo Gayer (PL-MG), por sua vez, que é acusado de duplo homicídio ao dirigir embriagado e que se tornou alvo de ministros do governo Lula após fala racista contra a população africana, disse que "o sistema é foda nessa democracia relativa". 

Há também aqueles que, abalados, não conseguiram ainda esboçar reação, como é o caso de um dos filhos do ex-presidente inelegível, o deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP). Conhecido como "Bananinha", o parlamentar vem mantendo o silêncio desde a sentença do TSE.

Por fim, o próprio condenado, Jair Bolsonaro, reagiu com chilique em entrevista à CNN Brasil. O ex-presidente não conseguiu esconder a irritação com a decisão. “Há pouco tempo tentaram me matar em Juiz de Fora, levei uma facada na barriga. Hoje, levei uma facada nas costas com a inelegibilidade”, reclamou.

•        Fim do “Trump dos Trópicos”, diz Washington Post

A decisão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE)  para tornar o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) inelegível por oito anos teve ampla repercussão na imprensa internacional.

O Washington Post se referiu a Bolsonaro como “Trump dos Trópicos”.

“Como presidente, o ‘Trump dos Trópicos’ repetidamente afirmou sem provas que os sistemas de votação no maior país da América Latina eram vulneráveis a fraudes. Com o voto da juíza Cármen Lúcia na tarde desta sexta-feira, os sete membros do Tribunal Superior Eleitoral chegaram a uma maioria para condenar o populista de direita por abuso de poder por minar a fé na jovem democracia do país!”, destacou um dos trechos da matéria.

“A decisão significa que Bolsonaro, 68 anos, não poderá concorrer à presidência até a eleição de 2030, quando ele terá 75 anos. É a primeira vez em 90 anos de história que o tribunal aplica a proibição a um ex-presidente. O veredicto desta sexta-feira foi o primeiro de várias investigações contra Bolsonaro. Ele continua acusado em vários processos criminais e eleitorais”, acrescentou o Washington Post.

>>>> Veja a reação de outros veículos

The New York Times: “A decisão é uma repreensão afiada e rápida do Sr. Bolsonaro e seu esforço para minar as eleições do Brasil. Há apenas seis meses, o Sr. Bolsonaro era presidente de uma das maiores democracias do mundo. Agora, sua carreira como político está em risco”.

Bloomberg: “Os esforços de Bolsonaro para semear dúvidas sobre as eleições de 2022 agora colocam em risco seu futuro político”.

The Guardian: “A marginalização de Bolsonaro, a figura dominante na direita brasileira, gerou especulações sobre quem pode herdar os formidáveis 58 milhões de votos que recebeu no ano passado”.

Diários de Notícias, de Portugal, sobre as eleições de 2024: “Eles devem criar uma campanha sob o mote ‘perseguição política’ para angariar mais votos”.

BBC, CNN e Al Jazeera ressaltaram que a defesa de Bolsonaro ainda pode recorrer ao Supremo Tribunal Federal (STF), embora seja muito difícil uma reviravolta na decisão.

 

Fonte: O Globo/Fórum

 

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