Após ceder ao
Centrão, Lula tem vitórias e é pressionado por reforma ministerial
Para
acabar o primeiro semestre de seu terceiro mandato com vitórias no Congresso, o
presidente Lula (PT) cedeu ao centrão, liberou emendas bilionárias e prometeu
trocas no primeiro escalão de forma a melhorar a relação com o Legislativo.
Mesmo
com a enxurrada de emendas e abertura para entrada do centrão no governo, Lula
sofreu reveses e começa o segundo semestre com pressão de parlamentares para
que promova mais mudanças na Esplanada, numa espécie de minirreforma
ministerial.
Em
busca da consolidação de uma base de apoio no Parlamento, hoje considerada
volátil e mais ligada ao presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), o Planalto
sinalizou que vai ceder aos deputados para acomodar também alas do PP e
Republicanos nos ministérios.
O
governo, depois de um início de ano derrapando na articulação política, aprovou
na última semana na Câmara a Reforma Tributária e o projeto do Carf (Conselho
Administrativo de Recursos Fazendários), os dois prioritários para o Executivo.
A
Câmara, no entanto, deixou o projeto do arcabouço fiscal para agosto. A
avaliação nos bastidores do Executivo é que os parlamentares adiaram a análise
da matéria a fim de manter, no segundo semestre, o poder de barganha com Lula.
O
projeto é a principal aposta da equipe econômica para equilibrar as contas
públicas e emitir um sinal de responsabilidade fiscal a empresários e
investidores.
A
ligação dos deputados com o presidente da Câmara foi o principal fator que
garantiu a Lula aprovação de medidas econômicas, temas que agradam ao líder do
centrão e cuja aprovação também o fortalece.
Por
outro lado, essa característica também foi usada para mandar recados ao
Planalto.
Em
abril, Lula editou decreto para revisar o marco do saneamento, sancionado por
Bolsonaro em 2020, mas, cerca de um mês depois, a Câmara aprovou um PDL
(projeto de decreto legislativo) derrubando as alterações feitas pelo governo,
por 295 a 136, e marcou a primeira derrota do Planalto no Legislativo.
O
governo também não conseguiu brecar a abertura de uma CPI (Comissão Parlamentar
de Inquérito) na Câmara para investigar o MST (Movimento dos Trabalhadores
Rurais Sem Terra), que acabou instalada em 17 de maio.
A
CPI do MST é fonte de desgaste ao presidente por mirar seus aliados históricos
e ter maioria de parlamentares Posteriormente, no fim de maio, a Câmara ameaçou
deixar expirar a medida provisória que reorganizava a Esplanada definida por
Lula em 1º de janeiro.
Após
o petista entrar pessoalmente na articulação política, o Congresso aprovou a MP
que reestrutura o governo, mas esvaziou ministérios e recriou a Funasa
(Fundação Nacional de Saúde), que o Planalto queria extinguir.
Nesse
cenário, as críticas à articulação política do governo começaram a crescer. As
reclamações foram desde queixas de que ministros não atendiam bem os deputados,
e por vezes não os recebiam, até a demora na liberação de emendas parlamentares
e nomeação de cargos.
Há
ainda críticas sobre a forma como o ministro Rui Costa (Casa Civil) se porta e
de que o ministro Alexandre Padilha (Secretaria de Relações Institucionais) não
foi empoderado na função, o que faz com que os ministérios não cumpram os
acordos firmados por ele.
Ainda
que parlamentares se queixem da dupla palaciana, Lula deixou claro, em
diferentes momentos, que os dois gozam de sua confiança nos cargos --afastando
a possibilidade de eventuais trocas.
Após
as derrotas iniciais, Lula prometeu melhorar e cobrou empenho da equipe na
liberação de emendas e cargos. Na última semana, no entanto, membros do
Congresso disseram que o governo mais uma vez demorou a agir para garantir a
aprovação do Carf e da Reforma Tributária.
Parlamentares
chegaram a ameaçar jogar para agosto a votação do Carf para dar um recado ao
Planalto, mas voltaram atrás. Em uma frente, Padilha e o ministro Fernando
Haddad (Fazenda) foram ao Congresso e fizeram apelo aos líderes de que havia a
necessidade de votar o programa de alimentos, que estava travado na pauta em
razão do Carf, e que ele perderia a validade.
O
Planalto também autorizou a liberação de R$ 5,3 bilhões em emendas às vésperas
das votações decisivas nesta semana na Câmara, batendo um recorde até então. Os
partidos mais beneficiados, como mostrou a Folha, foram o PL e o PP.
Em
outra frente, o governo fez gestos a parlamentares de que está disposto a ceder
espaços a alas do PP e do Republicanos em ministérios. Na última quarta-feira
(5), deputados desses partidos estiveram no Palácio do Planalto e, segundo
relatos, reforçaram a vontade de fazer parte do primeiro escalão.
O
próprio presidente do Republicanos, Marcos Pereira, se reuniu recentemente com
Padilha no seu gabinete. O gesto foi visto por palacianos como uma aproximação.
Mas o deputado diz que trataram apenas da sanção de um projeto de lei.
Integrantes
dos dois partidos afirmam que têm dado a maioria dos votos nas matérias de
interesse do governo, por vezes mais que União Brasil, MDB e PSD. Eles reclamam
com esse argumento que os três têm três ministérios cada um, eles não têm
nenhum.
A
tentativa de pressionar Lula por uma reforma ministerial ampla também foi
encabeçada pelo líder da União Brasil, Elmar Nascimento (BA).
A
previsão era que a troca no Ministério do Turismo fosse consolidada na semana,
mas acabou atrasando. A União Brasil agiu para tirar a ministra Daniela
Carneiro, que pediu à Justiça para se desfiliar do partido, do cargo, e no
lugar indicou o deputado Celso Sabino (União Brasil-PA).
Elmar,
no entanto, continua pressionando para comandar a Embratur, vinculada ao
Turismo, o que o Planalto resiste a ceder.
Além
disso, havia a pressão da ala do centrão para que o governo anunciasse a troca
de Sabino junto com outras mudanças em ministérios que contemplassem também o
PP e o Republicanos.
Esses
partidos miram o Ministério do Desenvolvimento Social e o do Esporte,
respectivamente. Há também a expectativa de que o comando da Caixa Econômica
será entregue a indicações partidárias. Segundo relatos, o PP teria interesse
no banco estatal que centraliza a maior parte dos repasses para estados e municípios,
além de programas sociais.
• Padilha estimula adesões de outros
partidos ao governo
Com
a aprovação pela Câmara da maior parte da pauta econômica, o ministro das
Relações Institucionais, Alexandre Padilha, responsável pela articulação
política do Planalto, deixou claro, ontem, que quer ampliar a base governista.
Ele disse que o governo segue aberto à adesão de outros partidos.
"Estamos
absolutamente abertos em discutir a entrada no governo de outras forças
políticas, outros setores da sociedade. Sobretudo, de parlamentares que fizeram
campanha para o presidente Lula ou que sinalizaram claramente a defesa do
governo a partir do 8 de janeiro", anunciou.
As
aprovações da reforma tributária e do projeto de lei que restabelece o voto de
qualidade nas decisões do Conselho de Administração de Recursos Fiscais (Carf),
contaram com o apoio de parlamentares de fora da base do governo. Para Padilha,
isso abre a possibilidade de costurar uma ampliação da base, mesmo que para
isso tenha que fazer rearranjos na Esplanada dos Ministérios.
"Vou
me encontrar não só com o presidente do União Brasil, mas com outras
lideranças. Vou ao Palácio do Planalto ficar com o gabinete aberto para
conversar com as lideranças e partidos", avisou.
• Protagonismo
Em
relação à saída da deputada Daniela Carneiro (União Brasil-RJ), que deixou o
Ministério do Turismo, Padilha afirmou que ela terá um posto de
"protagonismo" no Congresso. A parlamentar deve assumir a
vice-liderança do governo na Câmara.
"Nossa
intenção é de que ela assuma um papel de protagonismo. Quanto à definição da
data desta mudança, vamos construir com as lideranças do União Brasil, que é o
partido que indica este Ministério", observou o ministro. Para costurar a
substituição da deputada, Padilha esteve com o presidente do União Brasil,
deputado Luciano Bivar (PE).
Com
os temas econômicos superados, o presidente Luiz Inácio Lula da Sila retoma a
agenda no exterior. Ele viaja, hoje, para Letícia, na Colômbia, a convite do
presidente Gustavo Petro. Na cidade, que faz fronteira com a brasileira
Tabatinga, os dois encerram um encontro com especialistas, pesquisadores e
representantes dos povos indígenas da Região Amazônica, realizado pela
Organização do Tratado de Cooperação Amazônica (OTCA).
Noblat: Centrão bate à porta do governo e
Lula dá-lhe boas-vindas
Certa
vez, um advogado famoso em Pernambuco, amigo de Miguel Arraes, que por três
vezes governou o Estado, quis saber por que sendo ele um dos ícones da esquerda
no país, sempre se elegeu em aliança com setores da direita.
Arraes
pigarreou, tomou um gole do uísque da sua predileção, o escocês Johnnie Walker
Black Label, deu uma baforada no charuto que acabara de acender, e respondeu:
“Seu
doutor, aprenda uma coisa: a gente só se elege com o voto dos outros”.
E
em seguida gargalhou, sacudindo todo o corpo.
Poderia
ter acrescentado que, para governar, o voto dos outros também era
indispensável. Lula aprendeu a lição não com Arraes, mas com a vida. Foi com o
voto dos outros que se elegeu presidente pela terceira vez. E será com ele que
governará.
As
portas do governo estão sendo escancaradas para dar entrada a quem queira
apoiá-lo. E o Centrão de Ciro Nogueira (PP-PI), Arthur Lira (PP-AL), Luciano
Bivar (União-PE), Marcos Pereira (Republicanos-SP) e Valdemar Costa Neto (PL) pede
passagem.
Sim,
o PL, partido que abriga e paga as contas do casal Bolsonaro. Sim, o
Republicanos pelo qual Tarcísio de Freitas se elegeu governador de São Paulo.
Sim, o PP de Nogueira, ex-chefe da Casa Civil do governo Bolsonaro, e de Lira,
presidente da Câmara.
Esquisito?
Não. O Rei está morto, salve o Rei. Farinha pouca, meu pirão primeiro.
Bolsonaro já era, o presidente é Lula, e embora não falte farinha ao governo,
aos que chegarem depois o pirão será servido frio. Apressem-se, portanto. A
corrida começou.
O
PL de Costa Neto (99 deputados federais, 14 senadores) entregou 20 votos para
aprovar na Câmara a reforma tributária. Antes, emplacou o engenheiro Fábio
Pessoa Nunes como diretor de Infraestrutura Rodoviária do Dnit, que cuida de
rodovias.
Dnit
é Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes, autarquia vinculada
ao Ministério da Infraestrutura. Pessoa Nunes foi diretor de Planejamento e
Projetos Especiais quando o titular do ministério era… Tarcísio de Freitas. São
bons amigos.
Nogueira
passou 2022 inteiro a prever a vitória de Bolsonaro. Disse poucas e boas sobre
Lula, a quem no passado apoiara, e só fez elogios a Bolsonaro, a quem no
passado atacara. Nas suas redes sociais, postou, ontem, uma nota que é um show
de realismo:
“Defender
o péssimo contra o bom nunca será perdoável pelo povo. O povo quer que o Brasil
melhore. E enquanto o ótimo não chega, temos de prezar pelos nossos valores
mais profundos, mas sem o radicalismo e o extremismo que não sejam o da
coerência”.
“O
povo quer que o Brasil melhore” significa: não posso me opor a medidas que
sejam boas. “Temos de prezar pelos nossos valores mais profundos” significa:
nada. “Sem o radicalismo e o extremismo que não sejam o da coerência” é
abobrinha.
No
último parágrafo da nota está oculto o adeus de Nogueira a Bolsonaro e o aceno
a Lula:
“Ser
radical? Ser extremista? Sim. Ser radicalmente a favor do Brasil e extremamente
coerente. Se um governo, qualquer um, faz uma autocrítica e passa a defender o
que sempre defendemos, não podemos ficar contra nós mesmos”.
Sem
o refinamento de Nogueira, Pereira, presidente do Republicanos, bateu em
Bolsonaro abaixo da linha de cintura:
“[…]
Bolsonaro já se isolou e vem se isolando pelo seu próprio comportamento.
Entregou a eleição para o Lula por causa do comportamento dele. Vem se isolando
quando começa a brigar com o Judiciário, quando lá no início do governo briga
com o Parlamento, quando é contra a vacina”.
A
adesão do Centrão a Lula, caso ele derrotasse Bolsonaro, foi a pedra mais
cantada de 2022. Bingo!
Aprovada a reforma, Centrão quer mais e
espera que o governo retribua
Deputados
ainda querem um aceno concreto do governo Lula, com entrega de ministérios ao
Centrão, para garantirem a votação de projetos de lei de interesse do governo,
como o arcabouço fiscal. O recado foi dado nesta sexta-feira, 7, na negociação
para a aprovação do “voto de qualidade” do governo para o Conselho
Administrativo de Recursos Fiscais (Carf). O projeto acabou aprovado na Câmara
por votação simbólica, em que apenas os líderes partidários se manifestam. O
arcabouço fiscal só deve ser votado em agosto.
No
caso da reforma tributária, foi considerável a adesão de parlamentares do PL na
votação. Dos 99 deputados do partido, 20 votaram a favor da proposta, que tinha
entre seus principais adversários o ex-presidente Jair Bolsonaro, principal
líder da agremiação.
Mais
cedo, o clima interno na Casa era de que a votação do Carf seria adiada, não
pela resistência ao mérito do texto, mas principalmente pela dificuldade na
articulação política. Em votação histórica, a Câmara aprovou na noite desta
quinta-feira, 6, a reforma tributária. Para isso, o governo assumiu
compromissos, e muitos parlamentares queriam garantias de que eles serão
cumpridos.
O
clima, no entanto, melhorou. De acordo com relatos ouvidos pelo
Estadão/Broadcast, sistema de notícias em tempo real do Grupo Estado, o governo
mostrou empenho nos últimos dias em resolver os “espaços pactuados”, atendendo
principalmente União Brasil, Republicanos e PP. Ontem, o ministro das Relações
Institucionais, Alexandre Padilha, se reuniu com os principais líderes
partidários da Câmara para resolver as insatisfações.
• Esporte
Um
dos ministérios em negociação é o do Esporte, de Ana Moser, que seria destinado
ao Republicanos. O partido de Marcos Pereira vem resistindo a ocupar espaços no
primeiro escalão da gestão petista por causa do governador de São Paulo,
Tarcísio de Freitas, filiado à legenda e considerado competitivo para disputar
o Planalto em 2026.
A
saída para não associar a sigla ao governo petista seria indicar um nome da
“cota pessoal”, que não seja necessariamente um parlamentar. O deputado Silvio
Costa Filho (PE), próximo ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva, tenta se
credenciar para o cargo, mas o partido resiste a indicar um filiado.
• Desenvolvimento
Para
atender o PP, partido do presidente da Câmara, Arthur Lira (AL), o governo
negocia o Ministério do Desenvolvimento Social, hoje comandado pelo
ex-governador Wellington Dias. Apesar de ser do quadro histórico do PT, Dias é
senador licenciado e não ficaria fora da vida pública. Além disso, nos
bastidores, avalia-se que o ministro não tem tido um desempenho positivo na
pasta, já que comanda uma das principais vitrines do governo, mas não entrega
na mesma proporção. Até mesmo integrantes do PT dizem que ele não faz jus ao
tamanho da pasta responsável pelo Bolsa Família.
O
PP vinha se movimentando para controlar o Ministério da Saúde, comandado por
Nísia Trindade e com um orçamento de R$ 188,3 bilhões neste ano. Lula, no entanto,
resistiu a atender o pleito Parlamentares da legenda reclamam de que entregam
mais votos do que partidos com ministérios e não têm espaço no governo.
Já
com o União Brasil o acordo é pelo Ministério do Turismo. Daniela Carneiro está
para deixar o cargo, que será destinado ao deputado Celso Sabino (União
Brasil-PA). A demora em resolver o impasse no Turismo – a saída de Daniela
estava definida desde a segunda semana de junho, mas só foi sacramentada
anteontem – se deve ao fato de que o União só aceita comandar a pasta se tiver
também o controle da Embratur, hoje sob comando de Marcelo Freixo. O líder do
partido na Câmara, Elmar Nascimento (BA), quer um ministério “completo”.
Fonte:
FolhaPress/Correio Braziliense/Metrópoles/Agencia Estado
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