quarta-feira, 17 de abril de 2024

Segundo estudo, a gravidez pode acelerar o envelhecimento biológico em mulheres jovens

Em uma de suas magníficas composições, Caetano Veloso escreveu: “Eu vi uma mulher preparando outra pessoa. O tempo parou pra eu olhar para aquela barriga.” Como na canção, a gravidez é, evidentemente, uma experiência carregada de significados e pitadas de poesia. No entanto, a gravidez pode ter um custo, como demonstra um novo estudo.

A pesquisa em questão revela que as mulheres que disseram já ter engravidado aparentavam ter uma idade biológica mais avançada em comparação com aquelas que nunca tiveram gestações. Além disso, as mulheres que já tinham passado por gravidezes pareciam ser biologicamente mais velhas do que aquelas que relataram ter tido menos gestações. As descobertas foram publicadas no The Proceedings of National Academy of Sciences.

·        Envelhecimento biológico numa população adulta jovem e saudável acelerado pela gravidez

Um estudo conduzido por cientistas da renomada Escola de Saúde Pública Mailman, da Universidade de Columbia, localizada em Nova Iorque, trouxe à luz uma descoberta intrigante: a gravidez pode acelerar o processo de envelhecimento biológico em mulheres.

Essa investigação, realizada em um inquérito de saúde de longo prazo nas Filipinas, envolvendo 1.735 participantes, examinou os históricos reprodutivos e amostras de DNA para compreender melhor o impacto da gravidez no processo de envelhecimento.

Os pesquisadores utilizaram seis diferentes “relógios epigenéticos” para calcular a idade biológica dos participantes, ferramentas genéticas que estimam a idade biológica com base em padrões de metilação do DNA.

Calen Ryan, PhD, principal autor do estudo e cientista pesquisador do Columbia Ageing Center, explicou que “Os relógios epigenéticos revolucionaram a forma como estudamos o envelhecimento biológico ao longo da vida e abriram novas oportunidades para estudar como e quando os custos de reprodução a longo prazo e outros eventos da vida ocorrem.”

Os resultados revelaram que cada gravidez relatada por uma mulher estava correlacionada com um aumento de dois a três meses no envelhecimento biológico. Ademais, as mulheres que relataram mais gestações ao longo de um período de seis anos apresentaram um aumento ainda maior no envelhecimento biológico durante esse intervalo de tempo.

·        Fatores ligados ao envelhecimento biológico

A relação entre a história de gravidez e a idade biológica permaneceu evidente mesmo após a consideração meticulosa de vários outros elementos associados ao processo de envelhecimento biológico, como status socioeconômico, hábito de fumar e variação genética.

Ryan destacou que essa descoberta aponta para certos aspectos da maternidade, em oposição a fatores socioculturais relacionados à fertilidade precoce ou à atividade sexual, como impulsionadores do envelhecimento biológico.

O achado sugere uma interação complexa entre a experiência reprodutiva feminina e os processos biológicos que moldam o envelhecimento, lançando luz sobre o papel único da maternidade na saúde e no envelhecimento das mulheres.

Embora as descobertas sejam surpreendentes, Ryan encoraja os leitores a recordarem o contexto: “Muitas das gravidezes relatadas na nossa medida de referência ocorreram durante o final da adolescência, quando as mulheres ainda estão em crescimento. Esperamos que este tipo de gravidez seja particularmente desafiante para uma população em crescimento, especialmente se o seu acesso a cuidados de saúde, recursos ou outras formas de apoio for limitado.”

·        Um futuro de muita pesquisa

Ryan também reconheceu que há mais trabalho a fazer: “Ainda temos muito que aprender sobre o papel da gravidez e outros aspectos da reprodução no processo de envelhecimento. Também não sabemos até que ponto o envelhecimento epigenético acelerado nestes indivíduos em particular se manifestará como problemas de saúde ou mortalidade décadas mais tarde na vida.”

O pesquisador apontou que nossa compreensão atual dos relógios epigenéticos e sua capacidade de prever saúde e mortalidade é em grande parte baseada em estudos realizados na América do Norte e na Europa. Entretanto, ele destacou que o processo de envelhecimento pode se manifestar de maneiras distintas nas Filipinas e em outras regiões do mundo.

As descobertas ressaltam os possíveis impactos de longo prazo da gravidez na saúde das mulheres e a importância de cuidar dos novos pais, especialmente das mães jovens. Essa conscientização evidencia a necessidade de políticas e práticas de saúde que considerem adequadamente os desafios únicos enfrentados pelas mulheres em diferentes estágios da maternidade.

 

Ø  Investir na saúde da mulher pode adicionar US$ 13 bilhões à economia brasileira por ano

 

Mulheres não são homens. Uma obviedade. Ainda assim, a fisiologia masculina é tomada como padrão na maioria das pesquisas e tratamentos médicos. A lógica, aliás, começa ainda nas fases iniciais dos estudos clínicos, com testes feitos em animais — machos.

Somada a diversos outros fatores, essa realidade impacta no bem-estar geral da população feminina. Embora tenham uma expectativa de vida maior, elas passam 25% mais tempo do que eles em condições de saúde precárias.

Eliminar o gap nos cuidados com a saúde feminina melhoraria a vida das 3,9 bilhões de mulheres do mundo até 2040, com reflexos diretos na economia. Segundo o novo relatório do McKinsey Health Institute em parceria com o Fórum Econômico Mundial, o impacto no PIB global pode ser superior a US$ 1 trilhão por ano — US$ 13 bilhões só no Brasil, acelerando o crescimento sustentável e inclusivo no país.

·        Cuidando de vidas, gerando valor

Além do enorme impacto social positivo, cada dólar investido para reduzir a lacuna de saúde entre mulheres e homens poderia gerar US$ 3 em crescimento econômico.

  • Veja o caso da endometriose: a OMS estima que cerca de 190 milhões de mulheres em idade reprodutiva no mundo tenham o diagnóstico, o que demonstra um potencial para tratamentos na ordem de US$ 250 bilhões ao ano até 2040. Esse impacto financeiro está apoiado, sobretudo, na perda de produtividade e de rendimento resultante da doença.

Ao se fazer o recorte do Brasil, a grande oportunidade econômica está relacionada à síndrome pré-menstrual, cujo impacto potencial é de US$ 2,4 bilhões, seguida por depressão (US$ 2 bilhões) e enxaqueca (US$ 1,5 bilhão). Ainda completam essa lista transtornos de ansiedade, outras enfermidades ginecológicas, osteoartrite, artrite reumatoide, câncer de colo do útero, asma e dor lombar.

·        Um longo caminho à frente

A saúde da mulher é vista com frequência como um nicho. No entanto, os números acima mostram o contrário e essa nova percepção está ganhando mais espaço – mesmo que lentamente.

Na última década, o ecossistema de inovação viu crescer as chamadas femtechs, startups que desenvolvem produtos e serviços voltados às necessidades femininas, principalmente nas áreas de saúde e bem-estar. Ainda assim, foi um período em que, globalmente, as femtechs captaram só 3% do total dos investimentos de saúde digital, outra potencial avenida de inovação para tornar o acesso ao cuidado mais igualitário.

Essa falta de investimento é um entrave para a inovação e a escala. Numa análise global, a McKinsey constatou que 11 startups focadas em disfunção erétil, entre outras questões de saúde masculina, obtiveram US$ 1,24 bilhão em financiamento entre 2019 e 2023, enquanto oito startups dedicadas à endometriose receberam US$ 44 milhões — 28 vezes menos.

·        Melhor estudar para melhor remediar

Parte da solução dos desafios passa necessariamente pela forma que os estudos são concebidos.

O relatório da McKinsey analisou mais de 650 pesquisas clínicas mundo afora e descobriu que só metade delas desagregou os resultados por gênero, apesar de as distinções entre os sexos irem bem além do sistema reprodutivo.

A falta de representatividade nas investigações leva a distorções no atendimento. O caso da arritmia cardíaca é emblemático. Apesar de uma mulher ter o dobro do risco de morrer após um infarto, os homens têm três vezes mais probabilidade de receber terapia adequada.

  • Mais evidências: um estudo feito na Dinamarca ao longo de 21 anos mostrou que mulheres foram diagnosticadas mais tarde do que homens para mais de 700 doenças — nos casos de câncer, o atraso foi de mais dois anos e, nos de diabetes, foi de quatro anos e meio.

<< Ganha-ganha

O mais recente estudo do McKinsey Health Institute mostra que investir na saúde da mulher tem um potencial trilionário, impactando positivamente a sociedade enquanto também cria valor adicional à economia, promove o avanço da ciência e fomenta a inovação. É acrescentar mais anos à vida delas e mais vida aos anos que elas têm.

 

Fonte: SóCientifica/Exame

 

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