quinta-feira, 25 de abril de 2024

Parceiros no BRICS, Brasil e Índia ascendem como contraponto às grandes potências, dizem analistas

Brasil e Índia completam 76 anos de relações diplomáticas neste mês. Em entrevista à Sputnik Brasil, especialistas apontam que a cooperação entre os países atualmente é calcada sobretudo na reforma da governança global.

Parceiros no BRICS e atores importantes do Sul Global, Brasil e Índia completam neste mês 76 anos de relações diplomáticas. A Índia é um dos maiores parceiros do Brasil na Ásia. Somente em 2022, o fluxo comercial entre os países atingiu um recorde de US$ 15,2 bilhões (cerca de R$ 77 bilhões), um aumento de 31,4% em relação ao ano anterior.

Mas ainda há margem para aprofundar essa parceria e um grande potencial a ser explorado. Em entrevista ao podcast Mundioka, da Sputnik Brasil, especialistas apontam como o Brasil e a Índia podem expandir a parceria e quais as principais áreas de cooperação entre os países.

Florência Costa, jornalista, escritora e ex-correspondente na Índia, destaca que "os dois países são complementares na recomposição de uma nova ordem global de produção", que se configura no mundo após a pandemia e a eclosão dos conflitos atualmente vigentes. Ela lembra a recente visita de Natarajan Chandrasekaran, CEO do Grupo Tata, conglomerado industrial indiano que veio ao Brasil em março para se reunir com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva em Brasília.

"Eles tiveram uma conversa no sentido de ampliar o intercâmbio de pessoas entre os dois países. Essa visita foi muito importante, porque o Grupo Tata é um conglomerado de empresas indianas, multinacionais, que vai desde química até os setores de agronegócio e automotivo. Todas as empresas do Grupo Tata equivalem a três vezes o valor da Petrobras. Então esse empresário indiano destacou algumas áreas para a expansão [de parceria nos setores de] defesa, inteligência artificial, transição energética."

Ela destaca que o Brasil e a Índia "clamam pela ampliação de seus papéis nos organismos de governança internacionais", e cita como exemplo a demanda do Brasil por um assento permanente no Conselho de Segurança das Nações Unidas (CSNU), e o Grupo Basic, que atua na área de desenvolvimento sustentável e reúne Brasil, África do Sul, Índia e China, todos também parceiros no BRICS.

"Muita gente sabe, mas uma curiosidade é que na independência da Índia, em 1947, o Brasil foi o primeiro país latino-americano a reconhecer essa independência. E em 2006, durante o governo Lula, teve um marco muito importante [nas relações], que foi o estabelecimento da parceria estratégica. A partir daí, houve uma consolidação do relacionamento bilateral, que agora a gente vê com mais clareza. Por exemplo, o ministro das Relações Exteriores atual, Mauro Vieira, destacou que a sintonia do diálogo entre os dois países durante esse tempo se manifestou não só nas participações comerciais, mas também nos fóruns internacionais."

Atualmente, Brasil e Índia têm governos com correntes políticas distintas, sendo um gerido por um governo de esquerda e outro de direita. Questionada se as diferentes vertentes poderiam afetar as relações, Florência sublinha que os laços entre os governos da Índia e do Brasil são baseados no pragmatismo. Portanto, a relação não é afetada por valores ideológicos.

"Eu não acredito que nem o primeiro-ministro [da Índia] Narendra Modi nem o presidente Lula tenham qualquer problema por conta de ideologias. A Índia e o Brasil enxergam um ao outro como pontes para construir relações de suas vizinhanças. A Índia vê o Brasil como a porta de uma ponte para a América Latina e o Brasil enxerga a Índia como uma ponte para a Ásia", explica a especialista.

"Para se ter uma ideia, no ano passado, o presidente Lula se encontrou com Modi três vezes. Primeiro foi na cúpula do G7, em Hiroshima, em maio, que é a cúpula dos países mais industrializados do mundo. Depois foi na cúpula do BRICS, em agosto, em Joanesburgo. Depois foi na cúpula do G20, em Nova Deli", complementa.

•        Qual a principal pauta em comum entre Brasil e Índia?

Florência explica que a agenda econômica sempre foi a base das relações entre o Brasil e a Índia, e que hoje essa pauta se dá principalmente na busca pelo desenvolvimento sustentável, que ela afirma ser muito importante para ambos.

"Os dois países trabalham nas esferas internacionais conjuntamente, a fim de pressionar os países ricos a liberarem recursos para os países em desenvolvimento para poderem desenvolver essa nova economia sustentável. Não é fácil."

Por sua vez, João Nicolini, doutor em ciência política pela Universidade de Louvain, na Bélgica, afirma que a principal agenda em comum entre os países é a reforma na governança global.

"São dois países que, ao meu ver, estão no mesmo território das relações internacionais, no campo das potências emergentes, que convergem em muitos temas, divergem também em outros, mas que buscam soluções para as relações internacionais, o sistema internacional, de uma maneira às vezes muito similar. Entendem que merecem espaço maior, entendem que as relações internacionais, da maneira como está a governança global, o sistema ONU [Organização das Nações Unidas], já está um pouco ultrapassada", afirma o especialista.

Nesse contexto, ele ressalta que apesar dos 76 anos de relação entre os países, houve uma aproximação muito grande nos últimos 20 anos, o que engloba também a troca cultural, com o Brasil aumentando o consumo de filmes indianos e a Índia aumentando o interesse pelo futebol brasileiro.

"Então, hoje, a gente tem muitos motivos para celebrar esses marcos diplomáticos, culturais, sociais e políticos, […] e a gente tem visto uma aproximação desses dois países, no ramo do BRICS, no campo de convergência de tecnologias."

Parceria tecnológica como forma de se contrapor às grandes potências

Nicolini diz que a parceria entre Índia e Brasil nos setores da pecuária e agrícola sempre foi importante, mas agora o setor tecnológico ganhou espaço nas relações.

"O Brasil sempre teve uma tentativa de parceria tecnológica muito forte com a Índia. A Índia é um país que desenvolve a tecnologia de forma autônoma e de forma a contrapor-se às grandes potências", afirma Nicolini. "A Índia sempre tentou fazer de forma autônoma e se contrapor às regras, por exemplo, de submissão a alguns marcos jurídicos."

"Por exemplo, no campo da energia nuclear, a Índia sempre peitou as grandes potências para desenvolver uma indústria nuclear capaz de produzir reatores. O Brasil tem esse interesse em se aproximar da Índia [nesse sentido]. Brasil e Índia sempre foram países que tiveram intenção no ramo nuclear", acrescenta.

Ela destaca ainda que além dos campos nuclear e tecnológico, também há uma grande parceria entre os países no campo militar, voltada para o mercado de defesa.

"Uma parceria entre ambos, sempre no campo do mercado de defesa, que já vem se consolidando. As indústrias brasileiras tentam entrar no mercado indiano. A Índia tem aumentado seus investimentos no Brasil nos últimos anos, principalmente por conta de sua indústria tecnológica, mas também por conta de outros serviços", conclui o especialista.

¨      Entenda o que a Colômbia tem a ganhar com uma possível entrada no BRICS

Durante a recente visita do presidente brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva (PT) a Bogotá, a possibilidade de adesão da Colômbia ao BRICS foi levantada.

Em 17 de abril, o presidente da Colômbia, Gustavo Petro, manifestou o interesse em aderir ao bloco como membro pleno, no menor prazo possível, o que foi acolhido pelo governo brasileiro, que se comprometeu a promover a candidatura.

Especialistas em relações internacionais e representantes do governo colombiano ressaltaram à Sputnik Brasil os potenciais benefícios dessa eventual integração — que poderiam, inclusive, impactar negativamente sobre a influência do Ocidente na América Latina.

O professor da Escola Superior de Administração Pública da Colômbia (ESAP), Andrés Londoño Niño, ressaltou que a relevância colombiana ao bloco está principalmente em seu crescimento econômico desde a década de 1980.

Atualmente, o país se posiciona como "o quinto com o maior produto interno na América Latina" e é a quarta maior economia latino-americana, após Brasil, México e Argentina.

Uma das motivações para essa possível adesão é, segundo ele, "a falta de interesse claro de países como México e Argentina em ingressar no bloco", deixando espaço para os colombianos preencher essa lacuna.

Além disso, a estabilidade econômica do país, "apesar da desigualdade e dos problemas sociais internos", e sua busca por diversificação econômica além dos setores tradicionais como petróleo e mineração, o tornam "uma economia estável e que interessa para, por exemplo, o investimento estrangeiro".

"A Colômbia, se entrasse no BRICS, poderia ter essa oportunidade de diversificar seu comércio exterior e também no plano político. Participar em outras instâncias, mais além da esfera de influência dos Estados Unidos."

O interesse mútuo entre os presidentes colombiano e brasileiro em questões como "reforma do sistema econômico internacional" e "proteção do meio ambiente" reforça a possibilidade de uma convergência de interesses entre a Colômbia e o BRICS.

No entanto, para ele, a efetivação da adesão ainda é uma incógnita, dada a complexidade dos processos de integração e o contexto político regional. "Nossos países da América Latina dependem dessas convergências ideológicas entre os líderes da região."

"A possível adesão da Colômbia aos BRICS também levanta questionamentos sobre seu relacionamento histórico com os Estados Unidos", ressalta.

Doutor em ciência política pelo Instituto de Estudos Sociais e Políticos (IESP) da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), Niño afirma que embora o país mantenha os EUA como o principal parceiro comercial, a aproximação com os BRICS poderia significar um questionamento.

"A eventual entrada da Colômbia nos BRICS representa uma mudança significativa na política externa do país", comenta.

·        Benefícios para o BRICS: Como está a economia da Colômbia hoje?

A professora de relações internacionais da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) e do Centro Universitário La Salle do Rio de Janeiro (Unilasalle-RJ), Fernanda Gonçalves, destacou a importância econômica, energética e populacional da Colômbia na região.

Segundo ela, há uma grande oportunidade de incrementar o comércio bilateral, cooperação em regiões de fronteira e investimentos em infraestrutura.

Para Gonçalves, a adesão de Bogotá ao bloco poderia fortalecer relações diplomáticas e comerciais entre os países membros do bloco e a nação sul-americana, de forma a aproximá-los em um cenário regional fragmentado e estimular a integração regional.

"A adesão da Colômbia ao BRICS representaria um ponto de inflexão em sua política externa."

Em relação ao Brasil, segundo ela, a inclusão ampliaria a representação regional e fortaleceria a estratégia brasileira de unificar a América do Sul em meio a um cenário de fragmentação política na região.

Gonçalves ressaltou que a adesão faz parte da nova agenda de política externa colombiana, iniciada pelo governo de Petro. "A possível adesão da Colômbia aos BRICS também levanta questionamentos sobre seu relacionamento histórico com os EUA."

"A possível adesão ao BRICS abriria portas para a intensificação das relações comerciais com a China, além de proporcionar acesso ao Banco dos BRICS para investimentos em projetos de infraestrutura", argumenta a professora.

 

Ø  EUA admitem falta de confiança africana: 'Estamos fora. Agora a Rússia

 

Washington já percebeu que os países africanos estão cansados da estratégia dos EUA no continente e não querem mais tolerar a visão norte-americana de democracia que lhes é imposta e confiam cada vez mais na ajuda russa, destaca o Politico.

Segundo apuração do portal de notícias, as autoridades norte-americanas parecem perceber que a sua estratégia de pressionar o Níger e outros países africanos devastados pela guerra a "cortar laços com Moscou e abraçar as normas democráticas" já não está funcionando, escreve matéria, citando fontes familiarizadas com o assunto.

De acordo com os entrevistados, o desenvolvimento dos acontecimentos nas relações entre os Estados Unidos e o Níger, que está prestes a terminar, é a saída das tropas norte-americanas do país e a sua posterior substituição pelas da Rússia, o que forçou a administração Biden a repensar sua estratégia na região.

"Países de todo o continente, como o Chade, a República Centro-Africana, o Mali e a Líbia, recorreram à Rússia em busca de ajuda em matéria de segurança", prossegue a publicação que destaca que a retirada das tropas norte-americanas do Níger ameaça os EUA com a perda de uma das suas bases militares críticas.

"Quando todos estes países [onde houve golpes militares] expulsaram os franceses e se focaram em si, então tentamos nos tornar pacificadores na esperança de podermos manter a nossa presença lá. É claro que tudo isso não funciona. Agora estamos fora. Agora a Rússia está dentro", disse o ex-oficial de inteligência da CIA para África, Cameron Hudson.

Segundo a mídia, a estratégia da administração Biden reside em estabelecer contatos com os novos governos africanos e negociar roteiros e calendários para "eleições democráticas". Os líderes africanos, por sua vez, rejeitaram em grande parte as sugestões de que os seus países deveriam abraçar mais plenamente a democracia, sem abandonar o seu desejo de manter relações com Washington.

"A maior parte destes governos [africanos] não quer realmente que lhes digam o que fazer. Há uma longa história de o Ocidente dizer aos países africanos como governar e eles estão finalmente dizendo 'basta'", disse outra fonte à apuração.

Alguns líderes africanos saudaram a ajuda da Rússia, afirmando que "Moscou pode fornecer ajuda rápida em segurança quando os EUA não podem". Outros se opuseram às exigências norte-americanas de reformas democráticas, afirmando que "o Ocidente não tem o direito de dar sermões sobre a democracia na África quando ignora problemas semelhantes com aliados em outras partes do mundo".

 

Fonte: Sputnik Brasil

 

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