quinta-feira, 25 de abril de 2024

Empresas de agrotóxicos financiam ativistas contrários à ocupação, denuncia MST

Empresas de agrotóxicos financiam ativistas do Movimento Invasão Zero, contrário à ocupação da Fazenda Coqueirinho, em São Mateus, norte do Estado. A denúncia é do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), que organiza as mais de 200 famílias integrantes da ocupação, iniciada na última quarta-feira (17), como parte da Jornada Nacional de Luta pela Reforma Agrária.

“Gelo Cariri, Nutrimax e outras empresas do agronegócio que focam na venda de agrotóxicos na região” têm levado funcionários, a maioria jovens, para rondar o acampamento, afirma o MST, inclusive no episódio do dia 17 de abril, quando cercaram a entrada da ocupação, com xingamentos aos trabalhadores sem terra. As ameaças e agressões têm prosseguido, com “os mesmos carros passando bem devagar em volta do acampamento, fazendo fotos e filmagens”, informa o núcleo de Comunicação do MST/ES.

“Drones sobrevoando cotidianamente, arremessos de rojões e bombas de fabricação caseira, vídeos fazendo ameaças a integridade física das pessoas, xingamentos de diversas formas, têm sido alguns dos ataques comuns que as famílias estão lidando no acampamento”, relata. Das três bombas, ao menos um artefato foi localizado pelos trabalhadores e denunciado à Polícia por meio de Boletim de Ocorrência (BO). A partir da denúncia, o Esquadrão Antibombas foi enviado ao acampamento “para desarmar e fazer a retirada da bomba”, informa.

Além das empresas de agrotóxicos, o Invasão Zero também tem participação forte de políticos da extrema direita que são financiados pelo agronegócio, como Lucas Polese (PL) e Evair de Melo (PP), que inflamam discursos de ódio em suas redes sociais, em que criminalizam a luta pela reforma agrária, prática que “coloca em risco a integridade física de famílias inteiras, com adultos, crianças, adolescentes e idosos, que já estão em vulnerabilidade social e sofrem com a falta de direitos básicos como trabalho digno e moradia, dentre outras”, alerta.

•        Passivos sociais, trabalhistas e ambientais

Segundo investigações do MST e acompanhadas por mandatos que apoiam a luta pela justiça fundiária e os direitos humanos, como das deputadas estaduais Iriny Lopes (PT) e Camila Valadão (Psol), Coqueirinho se enquadra nos critérios federais para desapropriação e destinação à reforma agrária.

“Desde os anos 2000, a área está abandonada, ela já foi sede de uma fábrica de farinha de mandioca chamada Inquinor, que funcionou por poucos anos e foi desativada, sendo assim a área não se enquadra como produtiva, tem problemas com a Justiça do Trabalho por negar direitos trabalhistas e ter trabalho análogo a escravidão, além da contaminação ambiental, sendo passiva de reforma agrária conforme prevê a legislação”, elenca o MST.

A organização informa que o perfil dos acampados na Coqueirinho tem predomínio de pessoas do norte e noroeste do Estado, principalmente de São Mateus, Nova Venécia, Jaguaré, Ecoporanga e Barra de São Francisco. “Grande parte já tem vínculo com o trabalho agropecuário, sendo filhos de assentados e demais pequenos agricultores da região, outros, moradores urbanos que desejam viver e trabalhar com a terra e que buscam na reforma agrária a oportunidade de trabalho e vida digna para a família”, acrescenta.

•        Judicialização

As liminares de reintegração de posse e interdito proibitório, concedidas pela justiça de São Mateus à empresa Apal Agropecuária Aliança, são questionadas pelo MST, que aguarda julgamento do recurso judicial.

 

       Estudo identifica pelo menos três mortes ao ano provocadas por agrotóxicos em Goiás. Por Nanci Pittelkow

 

Um grupo de sete pesquisadores da Universidade de Rio Verde, em Goiás, analisou dados do Ministério da Saúde entre 2012 e 2022 e localizou 2.938 notificações de intoxicação por agrotóxicos. A média anual é de 267,09 casos, com taxa de letalidade de 1,46%. Ou seja, 33 óbitos no período, pelo menos três mortes ao ano.

Entre as intoxicações que aconteceram de forma crônica houve risco do desenvolvimento de neoplasias (tumores benignos ou malignos), “visto que a exposição a esses agentes de forma constante acaba gerando alterações no DNA”. Foram doze notificações desse tipo.

A intoxicação por agrotóxicos também está relacionada a tentativas de suicídio, somando 741 casos, ou 25,22%, alguns levando a óbito. Dos casos notificados, 2.444 estão relacionados a intoxicações de forma aguda única e 236 aconteceram de forma repetida. Do total, 43 apresentaram sequelas.

As intoxicações agudas provocam geralmente fraqueza, cólica abdominal, cefaleia, vertigem, vômito, convulsão, insuficiência respiratória. As crônicas, que se manifestam após longos anos de exposição, causam alterações celulares patológicas como arritmias cardíacas, lesões renais, pneumáticas, alergias, neurotoxicidade, neoplasias, lesões hepáticas, dermatites de contato.

CHUVA DE VENENO EM ESCOLA ATINGIU CENTENA DE CRIANÇAS E ADOLESCENTES

Os dados mostram que Goiás é o sétimo estado com maior número de casos de intoxicação por agrotóxico, atrás de Pernambuco, Minas Gerais, Espírito Santo, São Paulo, Paraná e Rio Grande do Sul. O levantamento foi feito por meio do Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan), do Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde (Datasus), e podem não incluir todas as ocorrências.

No sudoeste de Goiás, onde fica Rio Verde, foram registrados 681 casos, seguidos do entorno de Brasília (519) e a região de Goiânia (333).

O estado registra um dos casos mais conhecidos de intoxicação por agrotóxicos, quando, em 3 de maio de 2013, um avião de pulverização despejou o pesticida Engeo Pleno sobre a Escola Municipal Rural São José do Pontal, no Projeto de Assentamento Pontal dos Buritis, no município de Rio Verde. Foram atingidas 122 pessoas, principalmente crianças e adolescentes. Muitas ficaram com sequelas. O documentário “Brincando na Chuva de Veneno: Cinco anos depois“, de 2018, mostra histórias como a do assentado Wagner Mendes Vieira, cujo filho passou a ter ataques epiléticos e desmaios frequentes após o ataque.

Em 7 de maio de 2021, 47 pessoas intoxicadas precisaram ser atendidas depois de uma pulverização de agrotóxicos em Bela Vista de Goiás. A região, antes ligada a pequenos produtores e agricultura camponesa, assiste ao avanço da soja.

METADE DOS CASOS TEM RELAÇÃO DIRETA COM O AGRONEGÓCIO

No estudo da Universidade de Rio Verde, o maior número de atingidos é do sexo masculino, 71,91%, sendo que 51,56% tinham entre 20 e 39 anos (51,56%). O perfil condiz com o de trabalhadores do agronegócio. Segundo a pesquisa, as áreas com maior incidência de intoxicações coincidem com as de maior atividade do agronegócio. No sudoeste de Goiás, uma das áreas com maior número de casos, é predominante o cultivo de soja e milho e a cana avança.

Outra evidência da ligação com o agronegócio é o fato de 50,71% das intoxicações ocorrerem por exposição ao trabalho, seja na manejo de agrotóxicos ou na atividade agrícola, durante a colheita, pulverização ou tratamento de sementes. O maior número de casos ocorreu em março e novembro, meses que correspondem à safra em Goiás. Em 8% dos casos, os atingidos já tinham vivenciado uma intoxicação agrícola.

A pesquisa da Universidade de Rio Verde, publicada em janeiro na revista digital acadêmica Peer Review, considera que os agrotóxicos, “por seu potencial para o adoecimento humano, animal e contaminação ambiental, seu uso intensivo e indiscriminado é considerado problema de saúde pública”. Entre os pontos de atenção destacados está a “política de fomento” pelo baixo custo de registro de produtos na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), de R$ 180,00 a R$ 1.800,00, e isenções fiscais na maioria dos estados.

Os pesquisadores ressaltam a escalada de liberações: de 2005 a 2015, a média de novos registros de agrotóxicos por ano ficou em 140,5. A partir de 2016, no governo Temer, o número cresceu para 277. Com Bolsonaro, em 2019, atingiu 474 novos registros. Ao todo, durante os quatro anos de governo Bolsonaro, foram liberados 2.182 agrotóxicos, uma média de 546 por ano, segundo dados da Coordenação-Geral de Agrotóxicos e Afins do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento.

Os pesquisadores concluem que é necessária “a implementação de ações de promoção e prevenção à saúde do trabalhador”. Eles apontam a falta de normas que “priorizem a segurança dos trabalhadores agrícolas”, além da “ausência de medidas rigorosas para obtenção desses produtos”.

SÉRIE “BRASIL SEM VENENO” APRESENTOU PERSEGUIÇÕES E RESISTÊNCIA

sofreu perseguição por pesquisar agrotóxicos. (Imagem: Denise Matsumoto)

Em 2022, o De Olho nos Ruralistas, em parceria com O Joio e o Trigo, identificou 542 iniciativas de resistência aos agrotóxicos pelo Brasil, incluindo aquelas de movimentos sociais e da sociedade civil, acadêmicas, educativas e comunicacionais, institucionais e legislativas.

A série Brasil sem Veneno contou ainda com uma reportagem mostrando um mapa do corpo humano e os impactos à saúde causados pelos pesticidas. Foram entrevistados seis pesquisadores e cientistas perseguidos após revelarem impactos ambientais, sociais e de saúde provocados pelos agrotóxicos.

Candidatos das eleições de 2022 que assumiram compromissos contra o uso indiscriminados de agrotóxicos foram destaque em reportagem, e também em um dos episódios do programa De Olho na Resistência.

 

Fonte:  Século Diário/De Olho nos Ruralistas

 

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