terça-feira, 16 de abril de 2024

Comando Vermelho expande controle no Grande Rio

O Comando Vermelho (CV) foi a única facção criminosa a expandir seu controle territorial de 2022 para 2023, no Grande Rio. Com o aumento de 8,4%, a organização ultrapassou as milícias e passou a responder por 51,9% das áreas controladas por criminosos na região. 

A constatação é de uma pesquisa divulgada nesta segunda-feira (15) pelo Grupo de Estudos dos Novos Ilegalismos da Universidade Federal Fluminense (Geni/UFF) e pelo Instituto Fogo Cruzado.

Segundo o estudo, as milícias reduziram suas áreas em 19,3% de 2022 para 2023 e passaram a responder por apenas 38,9% dos territórios controlados por grupos criminosos.

A pesquisa mostrou que o CV retomou a liderança de 242 km2 que tinham sido perdidos para as milícias em 2021. Naquele ano, 46,5% das áreas sob controle criminoso pertenciam às milícias e 42,9% ao Comando Vermelho.

Os lugares onde o CV mais cresceu foram a Baixada Fluminense e o Leste Metropolitano. Já as milícias tiveram as maiores perdas na Baixada e na zona oeste da cidade do Rio de Janeiro.

“Com a morte de Ecko [Wellington da Silva Braga, uma das principais lideranças das milícias até sua morte, em 2021], a gente tem uma instabilidade nesse grupo. E outros grupos, sejam de outros milicianos, seja do Comando Vermelho, se aproveitam para avançar sob essas áreas”, explica o pesquisador do Geni/UFF Daniel Hirata.

Outras duas facções criminosas, Terceiro Comando Puro (TCP) e Amigos dos Amigos (ADA), também tiveram recuos, de 13% e 16,7%, respectivamente, de 2022 para 2023.

A pesquisa também avaliou a evolução do controle territorial armado ilegal ao longo dos últimos 15 anos no Grande Rio. Segundo o estudo, 8,8% da área construída na região metropolitana eram controlados por algum grupo criminoso em 2008. Em 2023, o percentual mais do que duplicou, passando a ser de 18,2%.

Nesse período mais longo de comparação, que envolve os últimos 15 anos, a milícia foi o grupo armado que mais cresceu no Grande Rio, triplicando sua área de controle entre 2008 e 2023.

Enquanto não houver política pública voltada para desarticulação efetiva das redes econômicas que sustentam os grupos armados e para proteção de funcionários públicos que prestam serviços essenciais em todos os bairros do Grande Rio, conviveremos com essa oscilação onde um ano a milícia cresce mais e no outro CV lidera”, afirma a diretora de Dados e Transparência do Fogo Cruzado, Maria Isabel Couto.

•        Por que o Comando Vermelho cresce e as milícias perderam espaço no Rio de Janeiro?

Uma das principais organizações criminosas do País, o Comando Vermelho (CV) expandiu seu poderio no ano passado e já controla mais da metade das áreas que estão sob domínio de facções ou milícias na região metropolitana do Rio. É o que aponta a atualização do Mapa dos Grupos Armados, feito pelo Grupo de Estudos dos Novos Ilegalismos (GENI) da Universidade Federal Fluminense (UFF) e pelo Instituto Fogo Cruzado, que compila dados sobre violência armada.

O novo estudo, divulgado nesta segunda-feira, 15, mostra ainda que o domínio desses grupos em regiões habitáveis do Grande Rio mais do que dobrou desde 2008, quando começou a série histórica.

Os dados que demonstram a expansão do CV coincidem com informações apresentadas pelas forças de segurança do Rio ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ), mas os diagnósticos das autoridades para o fenômeno é diferente da avaliação dos pesquisadores.

Ao CNJ, os gestores da segurança pública do Rio declararam que as restrições impostas pelo Supremo Tribunal Federal (STF) a operações em favelas na pandemia fizeram o CV ampliar seu domínio territorial.

Já para Daniel Hirata, sociólogo da UFF e um dos responsáveis pelo Mapa dos Grupos Armados, as evidências indicam outras razões. Para ele, o avanço do Comando Vermelho está ligado a disputas territoriais e conflitos internos entre grupos milicianos, que vinham expandindo suas áreas na última década. De 2019 a 2022, a maior parte das áreas urbanas habitadas do Rio era controlada por milícias.

“Há insistência das forças policiais em responsabilizar o STF pelo avanço da criminalidade organizada, mas isso tem mais relação com posicionamentos no debate público do que efetivamente o que seria a matéria de um debate assentado em dados e evidências”, diz Hirata.

O mapa é atualizado anualmente com base denúncias coletadas por meio do portal Disque Denúncia, mantido pelo governo do Rio. Procurado pela reportagem, o Executivo fluminense não comentou o estudo até a publicação desse texto.

Segundo os pesquisadores, desde 2005 mais de 700 mil denúncias que mencionavam milícias ou tráfico de drogas foram analisadas. Os registros permitiram traçar o movimento histórico de domínio de facções e milícias sobre mais de 11 mil sub-bairros, favelas e conjuntos habitacionais da região metropolitana do Rio.

A Liga da Justiça, que já foi considerada a maior milícia do Rio, expandiu seu domínio da zona oeste carioca até a Baixada Fluminense, segundo Hirata. “Em seguida à morte do Ecko (líder do grupo), há uma série de disputas que se intensificam cada vez mais”, diz.

As milícias são grupos armados que formam um poder paralelo, à revelia das forças de segurança do Estado. Em geral, elas são formadas por agentes ou ex-agentes do próprio Estado, como policiais.

“Quando se prende uma grande liderança, há intensificação dos conflitos, porque, mesmo internamente, há disputa sobre a chamada sucessão. O Comando Vermelho percebeu que havia ali oportunidade para avançar”, avalia o sociólogo.

Áreas controladas por grupos armados no Grande Rio mais do que dobram

A expansão do Comando Vermelho no último ano ocorre ao mesmo tempo em que outros grupos reduziram suas áreas de influência - o que reforça a tese de que foi provocada por disputas territoriais.

“As oscilações de domínio sempre fizeram parte do histórico da violência no Rio. Em 2017 e 2018 constatamos recuo dos dois principais grupos, CV e milícias. Em 2020 e 2021, crescem mais as milícias e há recuo do CV. Em 2022 e 2023, isso se inverte”, detalha Maria Isabel Couto, diretora de Dados e Transparência do Instituto Fogo Cruzado.

Em 2008, 8,8% da área urbana habitada da região metropolitana estavam dominados, conforme o Mapa dos Grupos Armados. No ano passado, já eram 18,2%. “E nada indica que a expansão será contida”, diz Maria Isabel Couto.

Apesar de perder o “primeiro posto”, as milícias foram as que mais se expandiram no período. Em 16 anos, esses grupos cresceram 204,6%. Comando Vermelho (89,2%) e Terceiro Comando Puro (79,1%), facção rival do CV, também avançaram bastante sobre as áreas urbanas.

Hirata lembra ainda que os números não demonstram apenas que facções do tráfico ou grupos milicianos estão presentes em quase 1/5 das áreas habitadas do Grande Rio. A presença dos grupos impacta diretamente na vida das pessoas.

As milícias, por exemplo, atuam em territórios de baixa renda, onde controlam ilegalmente ou cobram taxas extorsivas sobre serviços essenciais como água, luz, gás, TV a cabo, transporte e segurança, além do setor imobiliário.

“Há um conjunto de exigências, que passam por controle social, por controle da mobilidade, de mercados urbanos”, afirma.

Outro drama frequente de comunidades pobres são tiroteios entre traficantes e policiais, que resultam em vítimas por bala perdida.

•        Mapa mostra CV em quase todos os Estados

Mapeamento sigiloso feito pelo Ministério da Justiça e da Segurança Pública e obtido pelo Estadão mostra que há ao menos 72 facções criminosas nas prisões brasileiras. A análise leva em conta informações enviadas pelas agências de inteligência penitenciária dos 26 Estados e do Distrito Federal.

O relatório revela o alcance dos rivais Primeiro Comando da Capital (PCC) e CV, presentes em quase todos os Estados, e a pulverização de grupos locais - uma rede de alianças e tensões que frequentemente resulta em rebeliões sangrentas.

Conforme o documento, o Comando Vermelho aparece em presídios de pelo menos 20 Estados e também domina 70% dos detentos integrantes de facções das cadeias do Rio.

•        CV faz ofensiva para recuperar áreas tomadas por milícias

Levantamento publicado nesta segunda-feira (15) indica que o Comando Vermelho, maior facção do Rio de Janeiro, tem feito uma ofensiva nos últimos anos para retomar o domínio de territórios que haviam sido perdidos para milícias.

>>>> O que aconteceu

Um estudo aponta que 18,2% da área urbanizada do Rio e região metropolitana está sob domínio armado. O Mapa Histórico dos Grupos Armados, do Instituto Fogo Cruzado e pelo Geni (Grupo de Estudo dos Novos Ilegalismos), da UFF (Universidade Federal Fluminense), rastreia as áreas sob controle do tráfico e das milícias.

Segundo o Mapa, só o Comando Vermelho ampliou seus domínios de 2022 a 2023. O levantamento afirma que a facção teve um aumento de 8,42% na área sob seu domínio, enquanto houve queda no território controlado por milícias (-19,26%) e pelas fações Terceiro Comando Puro (-13,01%) e Amigos dos Amigos (16,70%).

O estudo indica disputas por território em mãos de rivais. A área total controlada pelos grupos armados no Rio mais que dobrou entre 2008 - ano em que começou o levantamento - em comparação com 2021. A partir daí, o território total sob domínio armado parou de crescer, o que sugere que os grupos têm tentado tomar áreas que já são controladas pelo crime.

# Crises internas teriam freado a expansão das milícias

Segundo a série histórica do Mapa dos Grupos Armados, os grupos milicianos foram os que mais cresceram até 2021, quando passaram a sofrer divisões internas. Para os autores do estudo, os conflitos entre milicianos se acentuaram com a morte de Ecko, então chefe da maior milícia.

Os percentuais de território que estão sob controle de cada grupo são aproximados. O estudo é baseado em chamados da população ao serviço do Disque Denúncia sobre a presença do tráfico ou de milícias. Isso pode não retratar com exatidão as mudanças de controle entre um grupo e outro durante as disputas.

“As milícias se expandiram muito até alguns anos atrás, mas têm passado por uma série de conflitos internos. Os dados sugerem que o Comando Vermelho pode ter identificado essas disputas internas e apostado em retomar territórios. Vemos um avanço importante deles na Baixada Fluminense, por exemplo.” - Daniel Hirata, coordenador do GENI-UFF.

“O Comando Vermelho cresce na Zona Oeste, também na Baixada Fluminense, mas o que ele faz é tentar recuperar áreas. Ele está numa resposta de uma perda anterior. Mas a milícia continua sendo a que mais cresce.” - José Cláudio Souza Alves, sociólogo e professor da UFRRJ.

<<<< Área dominada dobrou desde a CPI das Milícias

Segundo o Mapa, o território sob domínio mais que dobrou em 15 anos. Desde 2008, ano da CPI das Milícias na Alerj, a área controlada por grupos armados cresceu 105,73%. Em 2023, eles alcançaram o controle de 466,65 km² de Rio e região metropolitana.

A área dominada equivale a cerca de 65 mil campos de futebol, ou um terço da cidade de São Paulo. Apenas no município do Rio de Janeiro - sem contar as cidades vizinhas - o território controlado por milícias ou facções é de 155,33 km², algo em torno de 22 mil campos de futebol.

 

Fonte: Agencia Brasil/Agencia Estado/UOL

 

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