terça-feira, 16 de abril de 2024

A legítima crítica ao Supremo

Ao contrário do que parecem pensar alguns ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), criticar instituições democráticas não é necessariamente atacá-las ou ameaçá-las. Tampouco exigir sua autocontenção é ser extremista, e demandar que atuem conforme a lei não é deslegitimá-las. Ao contrário, quem faz tudo isso de boa-fé quer aperfeiçoá-las, isto é, quer instituições que não sejam ativistas, partidárias, arbitrárias, corporativistas ou pessoais.

Pode parecer ocioso dizer que o debate público num ambiente genuinamente democrático presume total liberdade para questionar o poder, mas nos tempos que correm, em que as críticas aos exageros do STF são tomadas como atentados ao Estado Democrático de Direito, é o caso de relembrar que a opinião não pode ser criminalizada.

É evidente que os liberticidas instrumentalizam a liberdade de opinião para propósitos indisfarçavelmente antidemocráticos. Quando um Jair Bolsonaro fala em “liberdade”, obviamente não é a liberdade no sentido liberal democrático, que garante a todos, indistintamente, o direito de questionar o Estado e suas instituições a qualquer tempo, e sim a “liberdade” de desmoralizar os pilares dessas instituições porque estas são um obstáculo para seus projetos autoritários de poder. Quando Bolsonaro invocava a liberdade de expressão para deliberadamente desacreditar o sistema de votação para presidente, a intenção evidente era atacar a alma da democracia, isto é, a ideia de que numa eleição comprovadamente limpa e justa os derrotados aceitam o resultado, reconhecendo a legitimidade do vencedor e de todas as instituições que corroboraram a vitória.

Do mesmo modo, não cabe ingenuidade a propósito das acusações do empresário Elon Musk a respeito de supostas arbitrariedades cometidas pelo Supremo contra sua rede social, o X (antigo Twitter), e seus usuários. Alinhado a extremistas de direita mundo afora, Musk se apresenta como um “absolutista da liberdade de expressão”, mas isso só vale quando lhe interessa – basta lembrar que ele condescendeu à exigência da ditadura turca de suspender perfis e tolera em sua rede perfis falsos a serviço da propaganda do governo chinês, com quem tem vultosos negócios. Suas contradições, contudo, não importam nem um pouco para a tropa bolsonarista, que o elevou à categoria de “mito da nossa liberdade”, nas palavras de Bolsonaro.

Essa algaravia bolsonarista, que é de fato golpista e antidemocrática, tem sido usada pelos mais loquazes ministros do Supremo como prova de uma alegada ameaça permanente e generalizada à democracia, justificando dessa forma medidas juridicamente exóticas, quando não inteiramente desprovidas de base legal, para conter essa ameaça. Num ambiente assim, qualquer opinião mais contundente em relação ao Supremo é logo caracterizada como “bolsonarista” e, por conseguinte, “golpista”.

É o caso, portanto, de insistir que nem toda crítica ao Supremo tem, subjacente, a intenção de destruir a democracia. Exigir que o Supremo seja mais claro a respeito dos parâmetros que adota para as medidas drásticas que tem tomado em sua missão autoatribuída de salvar a democracia brasileira não é, nem de longe, minar sua legitimidade. Ao contrário, é constranger o Supremo a seguir o que vai na Constituição, como se isso já não fosse sua obrigação precípua, justamente por ser o guardião do texto constitucional.

Portanto, quem tem minado a legitimidade do Supremo é o próprio Supremo, quando atropela sua própria jurisprudência, atua de modo claramente político, colabora para a insegurança jurídica e imiscui-se em questões próprias do Legislativo.

O Brasil testemunhou um surto de golpismo no 8 de Janeiro, mas hoje as instituições estão, como se diz, funcionando: o governo está governando; o Legislativo, legislando; e a imprensa, publicando; enquanto a polícia está nas ruas e o Exército, nos quartéis. Por que o Supremo segue em mobilização permanente, como se o País vivesse num 8 de Janeiro interminável? São questões legítimas, que nada têm de extremismo. Demandar a contenção do Supremo não é ser golpista, é só ser republicano.

 

Ø  Presidente do STF diz que ataques de Musk são reflexo de negócio que sustenta engajamento pelo ódio

 

O ministro Luís Roberto Barroso, presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), criticou neste domingo, 14, o que chamou de “modelo de negócio” que se vale do engajamento motivado “por ódio, desinformação deliberada e teorias conspiratórias”. O ministro condenou o funcionamento das redes sociais ao ser questionado sobre o embate entre o empresário Elon Musk, dono do X (antigo Twitter), e o ministro Alexandre de Moraes. Para Barroso, este é um “não assunto” e a questão está “encerrada”.

“Esses ataques muitas vezes se escondem na liberdade de expressão, quando na verdade estamos falando de um modelo de negócio que vive do engajamento mais motivado por ódio, mentiras, ataques às instituições do que pelo uso racional e moderado”, disse Barroso em agenda pública em Belo Horizonte (MG), onde está acompanhando a primeira edição do Exame Nacional da Magistratura, prova apelidada de “Enem dos Juízes”.

·        ‘Não assunto’, diz Barroso sobre embate entre Musk e STF

“Acabam estimulando o ódio e ataques às instituições, em nome da liberdade de expressão, quando o que estão fazendo é ganhar dinheiro”, criticou o presidente do STF, aludindo ao embate entre Musk e Moraes. Segundo Barroso, a discussão entre o empresário e o ministro é um assunto “encerrado”.

“Esse assunto envolvendo o empresário de uma plataforma digital e a justiça brasileira eu considero encerrado. O Brasil tem Constituição, leis e ordens judiciais”, disse o presidente do Supremo. Durante o embate com Moraes, Musk ameaçou não cumprir medidas judiciais para a remoção de conteúdo na rede, ato ao qual o empresário se referiu como “censura”. Na segunda-feira, 8, Barroso disse que “faria prevalecer” no País o cumprimento de determinações da Justiça.

Neste domingo, o ministro voltou a frisar que a questão foi superada. “Se forem observadas (as medidas judiciais), ficará tudo bem. “Se não forem observados, terão as consequências previstas na legislação. Portanto, esse passou a ser um ‘não assunto’”, disse Barroso.

 

Ø  STM tem maior custo por ministro e menor número de ações entre tribunais superiores

 

O STM (Superior Tribunal Militar), órgão máximo da Justiça Militar, julga menos de 1.000 processos por ano e tem o maior custo mensal por ministro, com salários e benefícios que beiram R$ 78 mil.

Os resultados da corte são apresentados por críticos à Justiça Militar como argumento para defender a extinção do tribunal discussão que se arrasta por mais de duas décadas e foi retomada após os ataques às sedes dos três Poderes, em 8 de janeiro de 2023.

Do outro lado, integrantes e apoiadores do STM sempre reforçam o discurso de que só um órgão especializado tem a capacidade de analisar na Justiça casos relacionados aos valores da caserna e das instituições militares com a celeridade necessária para evitar danos às Forças Armadas.]

Também pleiteiam maior influência no CNJ (Conselho Nacional de Justiça), que não tem em seus quadros um integrante da Justiça Militar.

O tribunal finalizou 842 processos em 2023. As outras cortes superiores, em comparação, tiveram produtividade maior, como o Superior Tribunal de Justiça (412.570 processos baixados), Tribunal Superior do Trabalho (353.877) e o Tribunal Superior Eleitoral (11.843).

Os dados coletados pelo CNJ e divulgados no último boletim "Justiça em Números" dão a dimensão de cada uma das cortes superiores. Enquanto no STM cada ministro julgou, em média, 51 processos em 2023, cada magistrado do STJ analisou mais de 12 mil casos no mesmo ano.

As diferenças seguem grandes quando analisada a quantidade de processos concluídos nos tribunais e o número de servidores da área judicial. A proporção no STM é de 3 processos por servidor, número menor que o verificado no STJ (231), TST (229) e TSE (27).

O STM é ainda a corte superior que mais gasta com salário e benefícios por ministro. O gasto mensal com cada um dos 15 juízes do tribunal militar é de R$ 77.964.

O valor é menor no TST (27 ministros, R$ 77.434), no STJ (33 ministros, R$ 55.424) e no TSE (14 ministros, R$ 17.116).

"É uma instituição muito pesada em termos de organização e funcionamento. E é uma sinecura, porque o tribunal acaba julgando, em boa parte dos casos, uso de entorpecentes em ambiente militar basicamente maconha", destaca Maria Celina DAraujo, pesquisadora visitante da PUC-Rio, que se dedica ao estudo da área militar.

"A Justiça Militar tem uma estrutura muito grande para julgar poucos casos. Para se fazer justiça militar não precisa de um tribunal permanente, especializado, ainda mais em tempos de paz. Os casos no Brasil podem ser perfeitamente julgados em varas da Justiça comum", completa.

No último ano, os três crimes mais julgados pelo Superior Tribunal Militar foram estelionato (134 casos), posse ou uso de entorpecente (112) e deserção (92).

A maioria dos processos que chegaram ao STM (447) foram recursos de instâncias inferiores. Em dezembro, por exemplo, o colegiado decidiu manter a condenação de 21 militares e civis envolvidos em esquema de fraudes em licitações de alimentos em Manaus.

O criminalista Fernando Augusto Fernandes, criador de site sobre julgamentos políticos no STM durante a ditadura militar, defende que a Justiça Militar seja extinta em tempos de paz, por ser "uma estrutura sem sentido na democracia".

"Matérias militares podem ser resolvidas internamente e, se judicializadas, a prestação jurisdicional pode ser da Justiça comum, mesmo que tenham varas especializadas."

Em outros casos, os ministros do Superior Tribunal Militar são criticados por atuarem com corporativismo ao reduzir penas de oficiais ou militares envolvidos em mortes de civis.

É o cenário que envolve o julgamento do caso Evaldo Rosa, músico assassinado por militares do Exército durante ação que envolveu o disparo de 257 tiros em 2019.

Na primeira parte do julgamento, o ministro Carlos Augusto Amaral Oliveira apresentou relatório favorável à redução de até 28 anos da pena dos oito militares envolvidos na morte do músico e também do catador Luciano Macedo.

Ele foi acompanhado pelo ministro-revisor José Coêlho Ferreira, e o julgamento foi interrompido pelo pedido de vista (mais tempo para análise) da ministra Maria Elizabeth. Não há previsão de retorno do julgamento.

O STM é formado por 15 ministros, sendo dez militares e cinco civis. Os cargos são ocupados a partir de indicação do presidente da República e aprovação do Senado.

A ministra Maria Elizabeth, única mulher no plenário do STM, afirma que o tribunal julga poucos processos em comparação com as demais cortes superior porque só analisa casos criminais. Além disso, há regulamentos dentro das Forças Armadas que já estipulam punições para militares, o que reduz o volume.

Ela entende que não há corporativismo na Justiça Militar. "É uma Justiça que pune bastante, não admite acordos de não persecução penal, não tem nenhuma das benesses concedidas aos réus na Justiça comum", disse a ministra à Folha.

Elizabeth afirma que o STM se debruça sobre muitos casos de uso de drogas por militares e que, em regra, a Justiça Militar "é muito dura" nesses processos. Quando trata sobre crimes cometidos por militares contra civis, como assassinatos durante operações militares, a situação já é diferente.

"Entendo as críticas [ao STM] e acho, inclusive, que os crimes dolosos contra a vida deveriam ser julgados por um tribunal do júri mas nós nunca instituímos um júri sequer", completa.

A ministra diz que a Justiça Militar "foi criada pela Constituição e respeita todo o devido processo legal". "A sociedade civil ainda é muito marcada pela ditadura de 1964. Enquanto as feridas estiverem abertas, a Justiça Militar vai ter de suportar esse ônus, que é uma grande injustiça", diz a ministra.

Ex-presidentes do STM também já se manifestaram, em debates anteriores, contra propostas de extinção. O general Edson Alves Mey disse, em 1999, que o baixo número de processos julgados no tribunal pode ser resultado da eficiência da própria corte.

"Não é pelo fato de existirem poucos pacientes que deve-se suspeitar que um hospital está deficiente; é bem possível que ocorra o contrário: por ele ser eficiente, existem poucos usuários", disse.

Em 2013, o então presidente do STF (Supremo Tribunal Federal) Joaquim Barbosa defendeu abertamente a extinção da Justiça Militar. Em resposta, o então presidente do STM, general Raymundo Nonato de Cerqueira, disse que a prerrogativa é do Congresso e que, nem em 1988, "em um clima de revanchismo, isso foi discutido".

Dois anos depois, outro presidente do STM, José Coêlho Ferreira, reforçou que só a Justiça Militar poderia atuar "com a velocidade necessária para evitar danos irreparáveis à hierarquia e à disciplina".

 

Fonte: Agencia Estado/FolhaPress

 

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