sexta-feira, 2 de fevereiro de 2024

Bolsonaro nunca negou que queria uma República das Milícias, diz sociólogo

Em entrevista ao programa Fórum Café de quinta-feira (1), o sociólogo e jornalista Bruno Paes Manso, autor do livro ‘A República das Milícias’, analisou a conjuntura das questões do crime organizado no Brasil.

Na visão do pesquisador, o bolsonarismo serviu como agiu diretamente para fortalecer a lógica miliciana e conectou a ideologia de Bolsonaro ao recente escândalo de espionagem da Abin durante o governo de extrema-direita.

"A gente estava com 30 anos de Nova República e uma tentativa de criar um estado democrático a partir da Constituição de 88. A gente tem uma crise e uma grande depressão no Brasil desde 2016 com o  impeachment da Dilma e a crise econômica profunda, e com a descrença na política muito grande”, explicou Bruno Paes Manso.

“Quando você não acredita na política, a solução é a polícia. O comandante desse exército de descrentes na política foi o bolsonarismo com um discurso de guerra, estabelecendo inimigos, que casava com o discurso dos generais e dos representantes das FFAA, com as viúvas da ditadura, que via a política com uma guerra, em um Brasil que havia sido tomado ‘pelos comunistas e esquerdistas’”, completou.

De acordo com o pesquisador, é esse clima de guerra e de financiamento a partir da ilegalidade que fomentou o escândalo da Abin paralela, uma lógica parecida com a das milícias no Rio de Janeiro.

“Você precisa tratar a política como uma extensão da guerra e aqueles que não são seus aliados precisam ser liquidados, e de poder ligado à força. No caso do bolsonarismo, você precisa ter aliados fortes, dinheiro e poder. O dinheiro vem com agronegócio, garimpo, venda de armas, assim a gente consegue financiar o poder. Você tem uma máquina de guerra”, afirma.

“O Bolsonaro nunca negou que fizesse isso”, completou o pesquisador.

·        Kakay: investigações na Abin seguramente vão chegar em Bolsonaro

Em entrevista ao programa Fórum Café desta terça-feira (30), o advogado e jurista Kakay comentou o escândalo do Abingate no governo Jair Bolsonaro.

Segundo informações da Polícia Federal, a Agência Brasileira de Inteligência (Abin) de Alexandre Ramagem teria monitorado pelo menos 30 mil cidadãos brasileiros entre 2019 e 2023 sob a batuta do governo Bolsonaro.

"O Brasil não está completamente seguro de que não haverá golpe", afirmou Kakay. "O mais difícil de lidar com esse pessoal da extrema-direita é que eles não têm escrúpulos, ética ou limites. Depois que eles se estruturaram em cima  de fake news, eles se estruturaram para chegar ao poder e para manter o poder. E para isso eles têm que manter o poder", afirma Kakay. “A ultradireita inoculou o ódio na população brasileira e nós temos hoje uma sociedade dividida. Não sei se voltará a ser como era”, completou.

·        Direitos dos espionados

Kakay afirma que a sociedade deve saber quem são os mais de 30 mil brasileiros que foram monitorados pela Abin e que esses brasileiros devem ter acesso individual às informações que foram coletadas.

"A sociedade não somente tem o direito. Nós que participamos do debate político, temos que cobrar”, afirmou Kakay. 

"Essa [violação do] direito à intimidade é extremamente grave. Imagine se eles estão ferindo esse direito para fazer jogo político", completou o jurista, que afirma que o nome dos monitorados deve ser divulgado para compreensão de quem eram os principais alvos do governo.

"Eu não tenho nenhuma dúvida de que o cidadão que foi investigado tem direito de saber o conteúdo inclusive e a sociedade tem o direito mínimo de saber quem foram as pessoas que foram investigadas", completa.

·        Vai chegar em Bolsonaro

Questionado se as investigações chegarão ao ex-presidente Jair Bolsonaro, Kakay foi objetivo ao dizer que ele foi o maior beneficiário das diversas investigações e que elas certamente chegarão ao inelegível.

"Eu não tenho nenhuma dúvida [de que as investigações chegarão em Bolsonaro]. Há uma máxima no direito penal que é ver quem é que se beneficia mais em determinada ação. Assim começam as investigações. Quando tem uma investigação que envolve política e poder econômico. Eu tenho para mim que ainda vamos ter uma série de questões graves. As imputações que foram colocadas nesse processo são gravíssimas", completa.

"O grupo político que se beneficiou e que se beneficiaria, seguramente, chegará no ex-presidente da República", completou.

 

Ø  Abin paralela: PF tem dados contra Heleno, que deve apontar para Bolsonaro

 

Ex-ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), pasta a qual a Agência Brasileira de Informação (Abin) era subordinada, o general da reserva Augusto Heleno enfrentará uma saia justa diante de dados coletados pelos investigadores no depoimento à Polícia Federal (PF), marcado para a próxima terça-feira (6), sobre o sistema de arapongagem ilegal montado no coração do ex-governo de Jair Bolsonaro (PL).

Após as operações contra Carlos Bolsonaro (Republicanos) e Alexandre Ramagem (PL-RJ), ex-diretor da agência, a PF já tem dados que revelam que Heleno tinha conhecimento dos monitoramentos ilegais feito pelos subordinados na Abin.

Além disso, há um histórico de ações que ligam diretamente Heleno à estrutura montada por Carlos Bolsonaro na Abin após a exoneração do general Carlos Alberto dos Santos Cruz e de Gustavo Bebbiano do núcleo duro do governo logo no início do mandato do ex-presidente, em 2019.

Em sua defesa, Heleno deve contar o histórico de aproximação de Ramagem do clã Bolsonaro e afirmar que as tratativas do ex-diretor-geral da Abin se davam diretamente com o ex-presidente.

Caso o general confirme realmente o que tem dito a interlocutores, Jair Bolsonaro (PL) deve virar alvo da investigação e ser convocado a prestar depoimentos sobre o caso.

De acordo com os investigadores, os arapongas lotados na Abin obedeciam ordens direta de Ramagem que, por sua vez, era subordinado a Heleno e a Bolsonaro.

·         Heleno sabia

Em entrevista ao Roda Viva em 3 de março de 2020, o ex-secretário geral da Presidência Gustavo Bebianno afirmou que Heleno tinha conhecimento de que Carlos Bolsonaro queria montar uma Abin paralela dentro do governo. Bebianno morreu 11 dias depois da entrevista.

Na ocasião, o ex-secretário geral da Presidência revelou que o filho de Bolsonaro articulava com "um delegado da PF" a montagem da Abin paralela logo nos primeiros meses de governo.

"Um belo dia o Carlos Bolsonaro aparece com um nome de um delegado federal e três agentes que seriam uma Abin paralela. Isso porque ele não confiava na Abin".

Ainda segundo o ex-secretário, ele e o general Santos Cruz afirmaram a Bolsonaro que eram contra a ideia.

"O general Heleno (chefe do gabinete Institucional da presidência) foi chamado. Ficou preocupado. Mas ele não é de confronto e o assunto acabou comigo e o general Santos Cruz. Nós aconselhamos o presidente a não fazer aquilo porque também seria motivo de impeachment. Eu não sei se isso foi instalado porque depois eu acabei saindo do governo".

Questionado se o delegado seria o atual diretor da Abin, Alexandre Ramagem, Bebianno preferiu não responder. “Eu lembro o nome do delegado. Mas não vou revelar por uma questão institucional e pessoal”, afirmou.

Na mesma entrevista, Bebianno revelou que Carlos Bolsonaro comandava o Gabinete do Ódio.

“Eu disse ao presidente que as notícias falsas não podiam estar dentro do Planalto porque poderiam dar em impeachment. Mas a pressão que o Carlos faz é tão grande que o pai não consegue se contrapor ao filho. É como aquela criança que quer um presente no shopping, esperneia e o pai não tem pulso para dizer não”, contou.

·        Gabinete do ódio e "Abin paralela"

Após se aproximar de Ramagem e em meio à tentativa de criar a "Abin paralela" para atuar junto ao Gabinete do Ódio, Carlos Bolsonaro instalou a primeira grande crise no Planalto.

O alvo era justamente o general  Carlos Alberto dos Santos Cruz, que se opôs aos planos do filho de Bolsonaro e foi demitido em 13 de junho de 2019. 

Menos de um mês depois, Ramagem foi nomeado por Bolsonaro como diretor-geral da Abin e, sob o aval de Augusto Heleno, iniciou a instalação da Organização Criminosa que virou alvo da PF - e resultou na ação contra o agora deputado federal nesta quinta-feira (25).

A investigação da PF segue a mesma linha de raciocínio exposta por Bebbiano e escancara a relação espúria com o clã Bolsonaro que fez Ramagem alavancar sua carreira política e se lançar pré-candidato à prefeitura do Rio - tendo como coordenador de redes sociais, Carlos Bolsonaro.

 

Ø  O que pode acontecer se for provado que clã Bolsonaro ocultou provas na estranha "pescaria"

 

A fuga do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) ao lado de seus filhos Carlos (Republicanos-RJ) e Flávio (PL-RJ) pelo mar, momentos antes da chegada dos agentes da Polícia Federal para cumprir mandados de busca e apreensão em sua residência na praia de Mambucaba, em Angra dos Reis (RJ), na última segunda-feira (29), tornou-se o alvo das investigações, levantando suspeitas de possível ocultação de provas que poderiam incriminar o clã.

Após virem à tona informações indicando que Bolsonaro e seus dois filhos, mencionados na investigação da PF sobre a "Abin paralela", teriam fugido, a defesa do ex-presidente alegou que eles haviam saído ainda na madrugada para uma pescaria em alto-mar, retornando à residência, onde os policiais aguardavam, apenas após serem contatados por aliados.

Contudo, uma reportagem do portal Metrópoles revelou que a PF identificou que uma das três embarcações que transportavam Bolsonaro, seus filhos e aliados, incluindo o deputado Zucco (PL-RS), não retornou à residência. Os investigadores suspeitam que o jet ski, que não retornou à casa em Mambucaba, possa ter sido utilizado para transportar e ocultar provas. 

Segundo o Metropóles, Bolsonaro e seus três filhos, junto a seguranças e aliados, deixaram a residência em um barco e dois jet skis às 6h40 após saberem da operação da PF, que chegou às 8h40 de helicóptero do Rio de Janeiro. Eduardo voltou às 9h30 em um jet ski, negociando o retorno de Carlos, que voltou às 11h com Bolsonaro no barco. Flávio e o segundo jet ski não retornaram pela manhã, alegando ida a um almoço, o que gerou estranheza entre os agentes da PF.

A suspeita aumenta com declarações conflitantes, incluindo a de Fábio Wajngarten, ex-secretário de Comunicação do governo Bolsonaro e atual advogado do ex-presidente, que afirma ter encontrado Flávio na casa em Mambucaba às 12h45, enquanto as imagens da saída da PF mostram apenas Jair, Carlos e Eduardo Bolsonaro.

Mas, afinal, o que pode acontecer se for provado que o clã usou a "pescaria" de pretexto para ocultar ou destruir provas? 

·        Situação grave pode motivar prisão preventiva 

Em entrevista à Fórum, o professor e advogado Guilherme Gonçalves, especialista em Direito Público e membro da Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político (Abradep), avaliou que a suposta destruição de provas, cuja suspeita foi gerada a partir da "pescaria" da família Bolsonaro no momento da operação da PF, pode ensejar a prisão preventiva dos envolvidos por se tratar de uma "situação grave". 

"Caso for comprovado que eles [a família Bolsonaro] eventualmente foram avisados por algum vazamento de que haveria uma operação da Polícia Federal, e se provar que essa saída para a pescaria foi um simulacro, e ainda se provar que equipamentos eletrônicos foram descartados ou destruídos, aí não há dúvida de que teríamos uma situação grave, que é um exemplo acadêmico daquilo que pode levar à determinação de uma prisão preventiva dentro de uma visão garantista", destaca Gonçalves.

"Nesse caso, a contemporaneidade é evidente, a gravidade da destruição de provas, ainda mais se houver provas que a operação foi vazada para os integrantes da família Bolsonaro. Aí me parece que há um ambiente para a própria prisão preventiva", prossegue. 

 

Ø  Altamiro Borges: Vivo, Claro e Tim encobriram a espionagem da Abin

 

Reportagem da Folha desta quarta-feira (31) revelou que “as operadoras de telefonia Claro, Tim e Vivo sabiam que suas redes estavam sendo atacadas pelo software espião FirstMile, contratado pela Agência Brasileira de Inteligência (Abin) e por outros órgãos públicos, mas não avisaram a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel). A necessidade de comunicação em casos do tipo consta em regimento do setor e é obrigatória”.

A denúncia é grave e pode até resultar em punições.

O jornal procurou as três operadoras, mas elas “não se manifestaram sobre a falta de notificação e as invasões”.

Já a Anatel confirmou em nota que as três empresas “não notificaram a agência sobre ataques ou tentativas de invasão por meio do software FirstMile”.

Ela ainda confirmou que essa omissão pode gerar alguma medida administrativa e lembrou que no passado disposições de proteção para evitar acessos criminosos e indevidos foram tomadas.

Na nota, a Anatel ainda informou “ter instaurado três processos administrativos a partir dos fatos noticiados pela imprensa em 14 de março de 2023, quanto ao possível monitoramento de cidadãos por meio de software espião, nas redes de empresas de telefonia móvel. Tais procedimentos priorizaram, no início, esclarecer se houve conhecimento e colaboração das prestadoras para com a Agência Brasileira de Inteligência (Abin), e apurar sobre eventuais falhas que pudessem permitir tais acessos indevidos”.

·        Operadoras não notificaram as invasões

Como lembra a Folha, “a Polícia Federal encontrou um e-mail em que um funcionário da empresa responsável pela FirstMile relata uma tentativa de invasão na rede da Tim.

As empresas, segundo a Anatel, conseguiram corrigir falhas que permitiam que a ferramenta monitorasse a localização de aparelhos celulares, mas não notificaram a agência à época da descoberta das invasões operadas pelo FirstMile”.

O artigo 9 do Regulamento de Segurança Cibernética Aplicado ao Setor de Telecomunicações determina que as operadoras têm a obrigação de “notificar à Agência e comunicar às demais prestadoras e usuários, conforme o caso e sem prejuízo de outras obrigações legais, os incidentes relevantes que afetem de maneira substancial a segurança das redes”.

Segundo a Folha, “os processos instaurados pela Anatel demonstraram até o momento que o software espião ‘teria atuado sem o conhecimento ou acordo prévio das prestadoras Claro, Tim e Vivo’”.

Será mesmo? Cabe uma rigorosa investigação!

 

Fonte: Fórum/Viomundo

 

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