Abriram a 'Caixa Preta do BNDES'... e não
tinha nada dentro
A EXPRESSÃO ‘CAIXA
PRETA DO BNDES’ foi largamente mobilizada pela direita liberal brasileira
no contexto do avanço da criminalização do Estado e de seus instrumentos de
política econômica, particularmente após a deflagração da Operação Lava Jato,
em 2014, e seu uso e abuso nas eleições presidenciais de 2018 e 2022.
A Operação Lava Jato
mirou, demagogicamente, no ‘combate à corrupção’ e acertou na criminalização e
deslegitimação do Estado brasileiro e seus instrumentos de desenvolvimento,
construindo a associação no imaginário social coletivo de que ‘mais Estado’ significava
‘mais corrupção’.
Portanto, era
necessário reduzir, vigiar e punir as ações estatais e das suas empresas para
preservar os bens públicos e favorecer a melhor alocação de recursos, aquilo
que o neutro e benévolo mercado faria com muito mais racionalidade e livre dos
interesses populistas e particulares.
Dessa lógica não
passou incólume ao maior banco público de desenvolvimento da América Latina, o
BNDES.
Em estreita conexão
com o que ocorria na Petrobrás e na cadeia do Petróleo e Gás, o alvo das
perseguições ao BNDES também incluía as grandes empresas nacionais e as
operações internacionais, sobretudo as exportações e, dentro dessas, as
exportações de serviços que miravam países do Sul Global.
Por conseguinte,
aumentavam não somente a influência brasileira na região, mas também resolviam
parte dos problemas de infraestrutura de países embargados ou semi-embargados
por sanções do imperialismo estadunidense, como o caso do Porto de Mariel em
Cuba ou do metrô de Caracas na Venezuela.
Em 2025 o Tribunal de
Contas da União, o TCU, abriu diversas investigações que miravam as operações,
tanto de crédito quanto de compras de fatias da empresa JBS pelo braço atuante
no mercado de capitais do Banco, a BNDESPar.
Além das operações de
crédito, o que ascendeu um sinal vermelho àqueles que os sócios minoritários
dos interesses imperialistas, sobretudo estadunidenses foram as operações de
compra de ações da JBS para apoiar a aquisição, justamente, de uma empresa americana,
a Swift, fortalecendo o cenário para que a brasileira viesse a se consolidar
como a maior empresa de alimentos do mundo.
Em que pese as
considerações sobre o seu significado político, o fato é que essa é uma
estratégia legítima e típica de um banco nacional de desenvolvimento, tal qual
desenvolvida pelos demais Estados Nacionais com pretensão de fortalecer seu
espaço econômico nacional, o que demonstra o quanto a ‘questão nacional’, tão
aventada pelos teóricos do imperialismo e da dependência, segue obstaculizada
na periferia capitalista, senão pela força das armas, pelas novas modalidades
jurídico-políticas de intervenção sobre a nossa soberania.
No caso das ações
envolvendo as operações com a JBS, não somente o TCU, mas a Polícia Federal
também foi partícipe.
Em 2017 foi decretada
a ‘Operação Bullish’, que investigou 102 trabalhadores e dirigentes do BNDES em
mais de 190 citações além de protagonizar a condução coercitiva de 35
funcionários.
Nem do ponto de vista
financeiro as operações citadas se sustentavam, uma vez que o dispêndio nas
operações de crédito, aquisição de debêntures e compra de ações rendeu aos
cofres do banco um lucro de R$ 16,5 bilhões em valores nominais.
Há um pouco mais de um
mês, o TCU julgou outro caso, que também compunha a retórica da ‘Caixa preta’
ao lado da política de ‘campeãs nacionais’, que foram os casos de exportações
de serviços, sobretudo para Cuba e Moçambique.
Alegava-se
irregularidades na aprovação das formas de pagamento do prêmio de seguro de
crédito à exportação, conhecida como modalidade ongoing. A caixa preta, enfim,
foi aberta. O BNDES, seus ex-dirigentes e seus trabalhadores foram todos
absolvidos.
Embora tenha se
passado quase uma década, o TCU compreendeu que não houve irregularidade, nem
dolo nem erro grosseiro em quaisquer dessas operações, reconhecendo, ainda, o
papel de todo o Sistema BNDES como executor de políticas públicas do Governo
Federal, em especial da Política de Desenvolvimento Produtivo (PDP) que esteve
em voga no período investigado.
Reconhecido e
importantíssimo alento ao banco e aos seus trabalhadores, embora tardio e não
noticiado pela imprensa tradicional com o mesmo afinco que as suposições de
‘corrupção’ tiveram. No entanto, a história não caminha para trás.
Hoje o BNDES sofre as
consequências das tentativas sequenciais de seu apequenamento e criminalização,
especialmente no que toca ao seu restrito papel à exportação de serviços,
elemento fundamental ao desenvolvimento de países periféricos, e até hoje objeto
de tanta interdição no Congresso Nacional.
Fonte: Por Juliane
Furno, em The Intercept
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