sábado, 27 de janeiro de 2024

O que é refúgio climático?

Com o agravamento da emergência climática em escala global, um contingente cada vez maior de pessoas é forçado a abandonar suas casas devido a catástrofes naturais, secas e outros fenômenos meteorológicos. Esses deslocados são frequentemente referidos como “refugiados climáticos”. Esta crise humanitária exige ação imediata, mas antes é preciso entender quem são essas pessoas e de que maneira a comunidade internacional pode abordar de forma apropriada essa problemática crescente.

A Agência das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR) define “refugiados” como aqueles que escaparam de situações de guerra, violência, conflito ou perseguição, cruzando fronteiras internacionais em busca de segurança em outro país. De acordo com a Convenção de Genebra de 1951, um a pessoa em situação de refúgio é definida como “alguém que não pode ou não deseja retornar ao seu país de origem devido a um fundamentado temor de perseguição por motivos de raça, religião, nacionalidade, filiação a um grupo social específico ou opinião política”.

Seguindo essas definições, o ACNUR calcula que, até julho de 2023, havia 117,2 milhões de refugiados oficialmente registrados em todo o mundo. No entanto, essas definições não abrangem aqueles que são obrigados a fugir de eventos como inundações, secas, aumento do nível do mar ou de áreas agrícolas prejudicadas por solos excessivamente salinos para o cultivo, todos resultantes das mudanças climáticas.

O Conselho de Direitos Humanos da ONU chegou à conclusão de que muitos refugiados climáticos não se enquadram na definição convencional de “refugiados”, rotulando-os como as “vítimas esquecidas do mundo”. Esse veredicto implica que essas pessoas não podem usufruir das proteções legais destinadas a salvaguardar seus direitos humanos, expondo-as a ameaças como a deportação.

Apesar de não encontrar respaldo no direito internacional, nem ser contemplado na Convenção de 1951 ou no Protocolo de 1967, o termo “refugiado climático” ganha relevância como uma expressão que transcende fronteiras geográficas. De acordo com o ACNUR, entre 2008 e 2016, uma média anual de 21,5 milhões de pessoas foram deslocadas à força, devido a eventos como inundações, tempestades, incêndios florestais e extremos de temperatura. Da mesma forma, desde 2020, observa-se um aumento anual médio de 41% no número total de deslocados por catástrofes, comparado à década anterior, evidenciando uma tendência alarmante. Espera-se que esse êxodo climático cresça nas próximas décadas.

O Instituto para a Economia e a Paz (IEP) prevê que até 2050, 1,2 bilhão de pessoas possam ser deslocadas devido a essas ameaças ecológicas. Os impactos são variados e profundos. Desde a perda de meios de subsistência até conflitos gerados pela escassez de recursos, cria-se uma série de desafios humanitários.

 (PNUMA) mostra que a elevação do nível do mar resultou no aumento de pessoas que vivem em zonas costeiras de alto risco, passando de 160 milhões para 260 milhões nos últimos 30 anos, sendo 90% delas provenientes de países em desenvolvimento e pequenos Estados insulares. Por exemplo, Tuvalu e Kiribati, ilhas do Pacífico, estão literalmente desaparecendo à medida que o nível do mar aumenta, forçando seus habitantes a buscarem refúgio em terrenos mais elevados. Isso implica reconhecer que as mudanças climáticas não representam apenas uma ameaça imediata, causando danos a pessoas e infraestruturas, mas também um perigo a longo prazo que pode desestabilizar gradualmente sociedades e economias.

Conflitos e guerras também aumentam a crise. Na Síria, onde a desertificação de terras agrícolas resultou em uma queda acentuada nos rendimentos das colheitas. Cerca de 800 mil pessoas perderam suas fontes de renda, e 85% do gado do país morreu. Com a perda de meios de subsistência, os preços dos alimentos dispararam, levando 1,5 milhões de trabalhadores rurais a migrarem para áreas urbanas em busca de emprego.

Embora não seja o único fator que desencadeou a guerra civil síria, as questões sociais decorrentes das mudanças climáticas contribuíram para a intensificação das tensões. O resultado foi um conflito que exacerbou uma das piores crises de refugiados em décadas, com aproximadamente 6,6 milhões de sírios, representando cerca de um quarto da população, sendo forçados a deixar o país.

Infelizmente, a experiência síria não é única. Há uma notável correlação entre os países mais suscetíveis às mudanças climáticas e aqueles que enfrentam conflitos ou violência. Conforme indicado no relatório “Tendências Globais em Deslocamentos Forçados 2020” do ACNUR, 95% de todos os deslocamentos por conflitos em 2020 ocorreram em países vulneráveis ou altamente vulneráveis às mudanças do clima. O relatório também destaca que este tipo de migração forçada pode ter implicações significativas para a segurança internacional, a estabilidade, e a geopolítica.

Além disso, essas pessoas enfrentam discriminação e falta de apoio em várias partes do mundo. Frequentemente, são compelidas a migrar para áreas urbanas superlotadas, onde a competição por recursos limitados pode gerar tensões adicionais. A ausência de reconhecimento legal para o status de refugiado climático torna-as particularmente vulneráveis, desprovidas dos direitos e proteções garantidos ao conceito de refugiado pelas convenções internacionais.

Frente a essa crise em ascensão, é imperativo que a comunidade global aja de maneira coordenada e urgente. Há algumas soluções possíveis para mitigar os impactos dos refugiados climáticos e enfrentar esse fenômeno exige uma abordagem global e coordenada. Entre as possíveis soluções, destaca-se a necessidade de políticas públicas mais eficazes para amenizar as mudanças do clima e o comprometimento dos países ricos em diminuir as emissões de gases poluentes que colaboram com o aquecimento global. Investir em infraestruturas resilientes e sistemas de alerta precoce pode ajudar a minimizar os impactos de eventos ambientais extremos.

Além disso, há a necessidade de garantir a essas pessoas, um estatuto protegido equivalente ao oferecido a outros grupos de refugiados, tais como aqueles que escaparam de conflitos. Para reverter essa situação, é imperativo que os governos e órgãos jurídicos reestruturem as condições derivadas das alterações ambientais como uma ameaça aos direitos humanos e reconheçam o perigo enfrentado por eles.

Em última análise, a crise das pessoas deslocadas no contexto de catástrofes e mudanças do clima serve como um duro lembrete de que o custo da inação diante das mudanças do meio ambiente é elevado e recai sobre os mais vulneráveis. Como comunidade global, enfrentamos uma escolha crítica: agir agora para prevenir futuros deslocamentos em massa ou confrontar as consequências devastadoras de uma crise humanitária sem precedentes.

 

Ø  Como a abrasão dos pneus impacta o meio ambiente

 

Um cruzamento no meio de Berlim. O semáforo fica verde, os carros que aguardavam aceleraram e os pneus rolaram no asfalto. No ar e no solo, permanece quase invisível uma mistura de partículas de plástico, aditivos e pavimento – resultado da abrasão dos pneus. Somente na Alemanha, são produzidos 110 milhões de toneladas de partículas todos os anos. Disso, tudo o que não é levado pela chuva ou pelo vento, escorre pelo bueiro mais próximo. A partir daí, diretamente, as partículas acabam chegando aos rios, aos solos e aos oceanos .

Em Berlim, há um total de 1,24 milhão de carros registrados – e o número vem aumentando continuamente nos últimos anos. Mesmo com cada vez mais carros elétricos em circulação – há mais de 24 mil na capital alemã –, o problema do desgaste dos pneus não deve diminuir tão cedo. Como geralmente são mais pesados, os carros elétricos acabam gerando ainda mais abrasão.

·        Centenas de milhares de toneladas de microplásticos 

Foi com a intenção de medir substâncias poluentes como esse que surgiu na empresa Emission Analytics. “A cada ano, diminui a quantidade [de poluentes] que sai do escapamento [dos carros], e aumenta a quantidade que sai dos pneus, pois os veículos estão ficando mais pesados”, disse Nick Molden, fundador da Emission Analytics, em entrevista à DW. 

Cerca de 500 mil toneladas de microplásticos são liberadas no meio ambiente todos os anos devido à abrasão dos pneus. Cada vez que freamos, aceleramos e seguimos adiante, um pneu perde matéria, liberando em sua vida útil cerca de quatro quilos de microplásticos. Mas e então, o que nos resta fazer?

"Não se trata de tentar minimizar [o problema] ou de mantê-lo sob controle. O problema está aí e também é claro que a abrasão é concluída. Hoje em dia, existe um consenso de que não se pode resolver isso sozinho", afirma Daniel Venghaus, cientista da Universidade Técnica (TU) de Berlim que pesquisa formas de reduzir a abrasão com o projeto Urbanfilter. O problema, aponta, só pode ser resolvido através de uma cooperação estreita entre a ciência, a pesquisa e a indústria – que, para Venghaus, teria o dever de reduzir a abrasão.

Os serviços de saneamento básico, bem como de planeamento de tráfego urbano, também desempenham um papel importante. Na última análise, até mesmo indivíduos podem contribuir para dirigir de forma mais defensiva ou até mesmo ao optar pelo ônibus ou trem em vez do carro.

·        Pneu sem abrasão – uma realidade distante

O fabricante de pneus Michelin tem buscado soluções para o problema na medida em que desenvolve pneus mais resistentes. Segundo Cyrille Roget, diretor científico e de comunicação da empresa, isso reduziria em média 5% do desgaste. “Mas ainda não foi descoberto como fabricar um pneu que seja seguro e durável e ao mesmo tempo não cause emissões de partículas”, disse em entrevista à DW. O objetivo atual, acrescentou Roget, é encontrar materiais renováveis ​​ou mesmo reciclados para substituir os aditivos químicos nos pneus.

Um pneu de carro é feito de borracha sintética, preenchimento e aditivos químicos. O aditivo 6PPD, por exemplo, busca garantir mais segurança. Mas quando vão parar nos rios, tais partículas oxidam e são altamente tóxicas para o salmão prateado, por exemplo. Esse mesmo 6PPD também se acumula nas folhas de alface, conforme comprovado por pesquisadores da Universidade de Viena num estudo publicado em 2023 na revista Environmental Science & Technology. Uma análise da revista suíça K-Tipp, voltada ao consumidor geral, chegou a conclusões semelhantes: por meio de amostras, a publicação descobriu que a alface absorve substâncias tóxicas ao ar livre. A alface e o salmão são apenas dois exemplos de como as partículas dos pneus podem ingressar diretamente na cadeia alimentar.

No entanto, Cyrielle Roget não vê uma alternativa ao 6PPD muito em breve. “As pesquisas realizadas de muito tempo, pois antes de um material ser substituído, é preciso garantir que o novo não seja altamente tóxico para outras espécies ou reduza a segurança do pneu”, diz.

·        Soluções que buscam minimizar o impacto

Até que surja um pneu livre de abrasão, portanto, são permitidas outras soluções que amenizem o problema ao máximo. Na ciência e na pesquisa, isso vai desde ideias rápidas e práticas até aquelas menos funcionais. Um exemplo é o protótipo "Zero Emission Drive Unit – Generation 1" (ZEDU-1) com ar de roda fechada do Centro Aeroespacial Alemão (DLR). Ainda que prometa uma mobilidade quase completamente livre de poluição, ele ainda deverá levar alguns anos para ser construído. Não por falta de interesse, garante o diretor do projeto, Franz Philipps, mas sim devido à falta de um consenso na União Europeia (UE) sobre valores-limite para o desgaste dos pneus.

Através de um dispositivo fixado diretamente na borda do pneu, a start-up londrina Tire Collectives busca capturar essas partículas diretamente na fonte. Em seu site, a empresa afirma que um modelo piloto foi testado em 2021, mas ainda resta saber se ele também pode ser implantado em larga escala.

Para contornar o problema, Daniel Venghaus participa de um projeto em parceria com a Fundação Ambiental Audi na área de saneamento – ou, mais especificamente, de escoamento de esgotos. Para isso, foram testados e desenvolvidos diversos tipos de filtros, que são então instalados em bueiros em pontos críticos de abrasão – segmentos e curvas no centro da cidade.

Testes em ambientes controlados foram capazes de filtrar até 66% das partículas particularmente finas e 97% de toda a poluição. Já os testes em campo indicaram uma retenção três vezes maior nos bueiros com filtros. O projeto deve terminar em julho de 2024, mas, até lá, o plano é criar uma empresa sem fins lucrativos para sistemas de filtragem. Segundo Venghaus, alguns municípios já manifestaram interesse na ideia.

·        A soluções mais radicais – e eficientes

"Os sistemas de filtros são a solução mais simples para a indústria. No final, são os municípios e os contribuintes que pagam", diz Thilo Hofmann, pesquisador da Universidade de Viena que liderou o estudo sobre os efeitos do desgaste dos pneus na alface. "O que nós realmente precisamos com urgência é de alternativas verdes aos aditivos plásticos que não sejam tóxicos". 

Os efeitos tóxicos do desgaste dos pneus, aliás, são cada vez mais discutidos em Bruxelas. Com a norma Euro 7, por exemplo, a União Europeia quer estabelecer valores limites para a abrasão pela vez, embora o texto final primeiro ainda esteja em debate. A proposta também requer a definição de um procedimento padronizado para medir a abrasão. Hoje, as orientações são feitas através de um método desenvolvido pelos próprios fabricantes de pneus.

Por fim, ainda resta a forma politicamente mais desconfortável de reduzir o desgaste dos pneus, aponta Thilo Hofmann. Tal começaria a solução com o transporte individual que, a seu ver, precisa ser reduzido. A lógica, diz Hofmann, é simples: um pneu que não rola não produz abrasão.

 

Fonte: Redação CicloVivo /Deutsche Welle

 

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