Sob Bolsonaro, ações de combate ao racismo nas escolas caem para pior
nível em 10 anos
Metade das escolas públicas do país têm projetos
para combater o racismo e apenas um quarto delas adotam ações contra machismo e
homofobia. Os números, registrados durante o governo Jair Bolsonaro (PL), são
os menores da última década.
Os dados são de um levantamento do Todos pela
Educação, elaborado com informações fornecidas por diretores de escola para a
Prova Brasil 2021, avaliação feita pelo MEC (Ministério da Educação).
Em 2021, apenas 50,1% das escolas disseram ter
ações contra o racismo. É a menor proporção desde 2011, quando 66,7% das
unidades da rede pública tinham programas contra a discriminação racial.
O auge de políticas desse tipo foi registrado em
2015, na gestão de Dilma Rousseff (PT), quando chegou a 75,6% das escolas. A
partir daquele ano, o país começou a registrar queda do alcance desse tipo de
ação e registrou em 2021 o menor patamar.
O mesmo ocorreu com o total de escolas com projetos
para combater machismo e homofobia. Em 2011, 34,7% delas relataram ter ações. O
alcance dessa política cresceu gradativamente e chegou a alcançar 43,5% das
unidades da rede pública em 2017, quando o presidente era Michel Temer (MDB).
A partir daquele ano, no entanto, houve queda da
extensão desse tipo de ação, chegando a apenas 25,5% das escolas em 2021.
"O país já não vivia um cenário adequado,
porque essas ações deveriam já há muito tempo ser desenvolvidas em todas as
escolas. A agenda ultraconservadora, que ganhou espaço na sociedade brasileira
nos últimos anos, piorou ainda mais essa situação", diz Daniela Mendes,
analista de políticas educacionais do Todos pela Educação.
Quando ainda era deputado, Bolsonaro compartilhou
críticas e fake news sobre o chamado "kit gay". O material, que
integrava o programa Escola sem Homofobia do Ministério da Educação, foi usado
fora de contexto para atacar a gestão petista.
"Essa onda de fake news e os ataques que
surgiram a partir delas inibiram essas ações dentro da escola. Havia um
programa do governo federal para orientar e formar os professores sobre como
lidar com essas questões, mas a onda ultraconservadora desmontou essa política
ao criar polêmicas em torno do tema", diz Daniela.
Para ela, além dos ataques às políticas anteriores
de combate a discriminação, o governo federal sob Bolsonaro não liderou nenhum
tipo de ação ou apoio às escolas sobre essa temática. "A gestão anterior
despriorizou a pauta racial, de gênero e orientação sexual. A falta de atenção
para essas pautas se reflete nas ações das escolas."
Ela diz ainda lembra que a pandemia pode ter
prejudicado ações que antes eram desenvolvidas pelas escolas para essa
temática.
Os dados mostram que as escolas reconhecem
vivenciar diariamente situações de preconceito. Mais de 37% dos diretores
disseram lidar com casos de bullying e 15,5% afirmaram já ter registrado casos
de discriminação.
O ambiente escolar violento e hostil tem como
consequências a maior chance de evasão escolar e menor desempenho acadêmico
entre os grupos alvo de discriminação. Os próprios dados da Prova Brasil, por
exemplo, mostram que estudantes negros têm notas menores na avaliação.
"Quando um jovem é desrespeitado, agredido e
ofendido no ambiente escolar, ele vai querer se afastar e abandonar os estudos.
Além disso, o estresse psicológico atrapalha o aprendizado", diz Daniela.
"A escola tem um papel imprescindível na preparação para o exercício da
cidadania, sem ações de combate a discriminação, ela está falhando nessa
formação."
Brasil
firma acordo com Colômbia para promoção da igualdade racial
Nesta terça-feira (25), em celebração ao Dia da
Mulher Negra Latinoamericana e Caribenha, a ministra da Igualdade Racial,
Anielle Franco, participou de um encontro sobre liderança política de mulheres
negras, em Bogotá, na Colômbia. O convite partiu da vice-presidente colombiana,
Francia Márquez, que também é ministra da Igualdade e da Equidade.
Na ocasião carregada de simbolismo, a ministra
assinou um acordo de entendimento entre as duas nações com foco na promoção da
igualdade racial e desenvolvimento socioeconômico. O memorando foi assinado
conjuntamente pelo presidente da Colômbia, Gustavo Petro, e pela
vice-presidente.
Entre as ações previstas no acordo, destacam-se o
intercâmbio e troca de experiências nas áreas de combate e superação do
racismo, produção acadêmica e científica, e políticas para povos tradicionais.
A assinatura do memorando tem a vigência de cinco
anos. “Hoje, estamos aqui nós duas, duas ministras negras assinando esse
memorando histórico, pela mão de duas mulheres negras, com a comitiva de
parlamentares negras. Este é o início da retomada da democracia no nosso país.
Não daremos nenhum passo atrás”, afirmou a ministra Anielle Franco.
Durante o evento, a ministra relembrou a trajetória
de sua irmã, Marielle Franco, cujo assassinato, segundo ela, foi uma forma de silenciar
sua representação política. “Quando falamos de um assassinato de uma mulher
negra com cinco tiros na cabeça, entendemos o recado que querem nos deixar,
quando tiram um corpo de Marielle Franco e miram diretamente na sua cabeça,
para calá-la, silenciá-la e fazer com que a política brasileira não tivesse
mais essa representante”, declarou.
Além disso, a titular da pasta de Igualdade Racial
falou sobre os desafios de ser uma mulher negra na política brasileira e sobre
a invisibilização que sofrem. “Um dos meus maiores desafios, especificamente
desde os últimos sete meses, é sempre a capacidade das pessoas brancas, dos
homens brancos, de tentarem invisibilizar as mulheres negras quando chegam a
lugares de decisão, de protagonismo”, afirmou a ministra.
Anielle ressaltou ainda que há desafios semelhantes
entre os dois países da América Latina no combate ao racismo e que as mulheres
negras alcançaram posições de poder político através de luta e que vão avançar
na busca por mais espaço.
“As experiências de dificuldade são muito parecidas
entre Brasil e Colômbia. Porém, chegamos nesse lugar com muita resistência,
mesmo entendendo todos os desafios que estamos lidando diariamente. Mas estamos
chegando, cada vez mais, para mudar o cenário político do poder”, finalizou.
Judiciário
se mobiliza por equidade racial, mira mulheres negras e estuda cotas
Iniciativas na Justiça brasileira têm trabalhado
para superar dificuldades que impedem a inclusão e promoção de profissionais
negros no direito e impactam especialmente as mulheres. Nas cortes superiores,
a presença de ministros negros é rara e, de mulheres negras, inexistente.
Nesta terça-feira, 25 de julho, é celebrado o Dia
Internacional da Mulher Negra Latino-Americana e Caribenha, data criada há 31
anos para dar visibilidade ao enfrentamento ao racismo e sexismo.
Segundo Karen Luise de Souza, juíza auxiliar da
presidência do CNJ (Conselho Nacional de Justiça) e supervisora do programa de
Equidade Racial, estuda-se a adoção de cotas para promoção no Judiciário. O
intuito seria garantir que mulheres e negros atinjam a cúpula na mesma
proporção que homens brancos.
Para ela, uma das barreiras para que isso aconteça
é o imaginário de que apenas o homem branco seria um julgador imparcial.
"A gente tem que romper com a lógica de que
Justiça significa homem branco. Nas primeiras comarcas onde trabalhei eu
causava imenso estranhamento porque ninguém conseguia conceber que eu, uma
mulher negra, era a Justiça encarnada."
"Há 135 anos, uma pessoa como eu fazia parte
do inventário, era um ativo para as pessoas brancas daquela sociedade. Como é
que essa coisa se converte em alguém que é a representação da Justiça? Ainda é
muito difícil para as pessoas verem isso", diz.
Um estudo feito pelo CNJ sugere o aumento no
percentual de magistrados negros. Antes de 2013, eram 12%. Entre 2016 e 2018,
subiu para 20%. Já nos anos de 2019 e 2020, passou a 21%. Porém, como as
metodologias das pesquisas são diferentes, a comparação não é perfeita.
Karen diz que um novo censo foi realizado neste ano
e os dados estão em análise.
O CNJ também trabalha na atualização dos bancos de
dados do Judiciário. Uma campanha de recadastramento foi encerrada em maio e a
expectativa é divulgar registros atualizados em setembro, durante um seminário
sobre questões raciais.
"A partir dos dados atualizados a gente pode
construir políticas judiciária de inclusão e fazer projeções estatísticas. Em
2020, a previsão era que levaríamos 30 anos para conseguirmos atingir 20% de
juízes negros e negras", afirma.
Outra iniciativa é a construção da Política de
Equidade Racial em construção pelo Fonaer (Fórum Nacional do Poder Judiciário
para a Equidade Racial).
Criado em março pelo CNJ, atendendo uma demanda do
Enajun (Encontro Nacional de Juízas e Juízes Negros) e do movimento negro, o
grupo reúne 18 instituições, ministérios e organizações para implementar ações
de enfrentamento ao racismo.
O fórum recebe até o final deste mês sugestões para
uma minuta de resolução que busca melhorar o ingresso, a permanência e a
inclusão de magistrados negros, além de criar procedimentos na esfera criminal
e cível e na atenção a mulheres negras, crianças e adolescentes.
Representante da OAB nacional no fórum, a
presidente da Comissão Nacional da Mulher Advogada, Cristiane Damasceno, que se
autodeclara negra, afirma que as conselheiras da Ordem estudam um formato mais
efetivo para garantir diversidade nas vagas nos tribunais destinadas a
integrantes da advocacia, o chamado quinto constitucional.
"O que nós estamos buscando é a efetividade de
uma mulher preta sentada no tribunal. O que a instituição está discutindo é a
melhor forma de fazer isso, porque não basta ter uma política de cotas".
Ela afirma que a OAB trabalha ainda em regras para
a adoção de bancas de heteroidentificação nas eleições das seccionais no
próximo ano.
Em 2020, na gestão anterior, a Ordem adotou pela
primeira vez cotas para mulheres e pessoas negras. Porém, houve denúncias de
desrespeito às regras, com pessoas não negras se candidatando.
O modelo de bancas também é discutido pelo Fonaer,
assim como medidas aumentar a participação de profissionais negros em
concursos.
"Não existe falta de capacidade dessas pessoas
para estarem nesses lugares. Nós precisamos remover obstáculos e normas que são
aparentemente neutras, mas que acabam privilegiando um grupo em detrimento do
outro", diz Souza, citando como exemplo as notas de corte e cláusulas de
barreira, eliminadas no último ano pelo CNJ.
Para Ana Míria Carinhanha, diretora de ações
governamentais do Ministério da Igualdade Racial e representante da pasta no
Fonaer, o aumento da representatividade não é uma ação isolada. O ministério
defende a construção de um protocolo para julgamento a partir de uma
perspectiva racial, como existe para questões de gênero.
Nesse atendimento, ela afirma que é preciso pensar
nas mulheres negras por serem elas as mais prejudicadas pelo acúmulo de
violências sociais.
"Qualquer política de inclusão voltada para
mulher negra, não faz bem exclusivamente a essa mulher e à população negra, mas
à sociedade brasileira como um todo. É a forma mais rápida e eficaz de tornar a
sociedade mais inclusiva", diz.
Na composição atual do STF (Supremo Tribunal
Federal), o ministro Kassio Nunes Marques se autodeclara pardo. O Supremo teve
outros três ministros negros na história da corte, o último Joaquim Barbosa,
que se aposentou em 2014.
Em abril, o presidente Lula (PT) indicou seu
advogado, Cristiano Zanin, ao Supremo. Outra vaga será aberta até outubro, com
a aposentadoria da presidente do STF, ministra Rosa Weber. A cadeira era antes
de Ellen Gracie, que em 2000 se tornou a primeira mulher a ingressar na corte.
Lula tem evitado se comprometer com um perfil de
indicação, e entre os cotados está o atual advogado-geral da União, Jorge
Messias. A escolha de uma mulher negra seria inédita.
No STJ (Superior Tribunal de Justiça), o ministro
Benedito Gonçalves é o único magistrado negro. A corte não tem a autodeclaração
de seus 33 membros, mas informa que trabalha para aperfeiçoar o cadastro.
Gonçalves é também corregedor-geral eleitoral no TSE (Tribunal Superior
Eleitoral), onde é o único ministro negro titular.
Em junho, após indicar como titulares André Ramos
Tavares e Floriano de Azevedo Marques Neto, apadrinhados pelo ministro
Alexandre de Moraes, Lula escolheu a advogada Edilene Lôbo como ministra
substituta do TSE. Após tomar posse, em agosto, ela será a primeira mulher
negra a exercer o cargo.
O TST (Tribunal Superior do Trabalho) informou que
o ministro Lélio Bentes Corrêa é o único que se autodeclara pardo. No STM
(Superior Tribunal Militar) não há registro de ministros autodeclarados pretos
e pardos.
Incitação
ao estupro por Bolsonaro prescreveu
A Justiça do Distrito Federal decidiu, nesta
segunda-feira (24/7), arquivar a ação penal na qual o ex-presidente Jair
Bolsonaro era réu por insultos contra a deputada federal Maria do Rosário
(PT-RS). A justificativa do juiz Francisco Antonio Alves de Oliveira é de que,
de acordo com a legislação penal, os crimes — calúnia e injúria — imputados ao
ex-presidente prescreveram.
“Tendo em vista a data do recebimento da
queixa-crime, o período em que o processo permaneceu suspenso, o correspondente
prazo prescricional e a pena máxima cominada no caso verifica-se a ocorrência
da prescrição da pretensão punitiva do Estado”, escreveu o magistrado.
No dia 9 de dezembro de 2014, em discurso no
plenário da Câmara dos Deputados, Bolsonaro disse que só não estupraria Maria
do Rosário porque “ela não merecia”, em uma crítica à aparência da colega de
parlamento. Posteriormente, a deputada processou Bolsonaro.
O ex-presidente passou a responder às acusações no
Supremo Tribunal Federal (STF), mas o processo foi suspenso após ele assumir
Presidência da República, em 2019. Com o fim do mandato e do foro privilegiado,
o Supremo determinou que o caso voltasse a tramitar na primeira instância da
Justiça do DF.
A defesa de Bolsonaro alegou que o embate entre
Maria do Rosário e Bolsonaro ocorreu dentro do Congresso e deveria ser
protegido pela regra constitucional da imunidade parlamentar, que impede a imputação
criminal quanto às suas declarações.
Fonte: FolhaPress/CNN Brasil/Correio Braziliense
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