Quanto devemos nos preocupar com a mpox?
A rápida disseminação
da mpox — anteriormente chamado de varíola dos macacos — em algumas partes da
África foi declarada uma emergência global.
Na semana passada, a
Tailândia anunciou seu primeiro caso confirmado da nova cepa potencialmente
mais mortal de mpox (chamada de clado 1b) — no primeiro caso registrado na Ásia
e o segundo fora da África.
A nova cepa do vírus
está no centro das preocupações, mas muitas perguntas ainda permanecem sem
resposta.
Ela é mais contagiosa?
Não sabemos. Quão mortal é? Não temos dados. Vai se tornar uma pandemia?
"Precisamos
evitar a armadilha de pensar que a mpox será a nova covid e que teremos
lockdowns — ou que a doença vai se comportar como em 2022", diz Jake
Dunning, cientista e médico especialista em mpox que tratou pacientes no Reino
Unido.
Para avaliar a ameaça
— apesar da incerteza — precisamos entender que não se trata de um único surto
de mpox, mas de três surtos distintos.
Todos estão ocorrendo
simultaneamente, mas afetam diferentes grupos de pessoas e se comportam de
maneiras diferentes.
Esses surtos são
classificados de acordo com seu "clado" — essencialmente, a
ramificação da árvore genealógica do vírus mpox a que pertencem.
• O clado 1a é responsável pela maioria
das infecções no oeste e norte da República Democrática do Congo (RDC). Esse
surto já dura mais de uma década e se espalha principalmente pelo consumo de
carne de animais selvagens infectados. Aqueles que adoecem podem transmitir o
vírus para pessoas com quem têm contato próximo, e as crianças têm sido
particularmente afetadas.
• O clado 1b é a nova ramificação da
família mpox e está causando surtos no leste da RDC e em países vizinhos. Esse
clado se espalha ao longo das rotas de transporte, com motoristas que têm
relações sexuais heterossexuais com trabalhadoras do sexo, e pessoas infectadas
também transmitem o vírus para crianças através do contato próximo.
• O clado 2 é o surto de mpox que se
espalhou globalmente em 2022, com uma forte conexão com o sexo, afetando
predominantemente comunidades de homens gays, bissexuais e outros homens que
fazem sexo com homens (98,6% dos afetados eram homens no Reino Unido), além de
seus contatos próximos. Este surto ainda não acabou.
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Caminhoneiros e trabalhadoras do sexo
A Organização Mundial
da Saúde (OMS) classificou o clado 1b como uma das principais razões para
declarar a mpox uma Emergência de Saúde Pública de Interesse Internacional.
Essa cepa se espalhou
para países anteriormente não afetados pelo vírus, como Burundi, Quênia, Ruanda
e Uganda.
Ela foi notificada
pela primeira vez este ano, mas a análise genética rastreou suas origens até
setembro de 2023 na cidade mineradora de Kamituga, na província de South Kivu,
na RDC.
"Há uma indústria
do sexo na cidade mineradora, e ela se espalhou rapidamente para os países
vizinhos devido ao grande movimento de pessoas", diz Leandre Murhula
Masirika, coordenador de pesquisa do departamento de saúde em South Kivu.
Ele afirma que pagar
por sexo é a principal forma pela qual o vírus está se espalhando, mas que
também é transmitido de pais para filhos ou entre crianças e tem sido associado
a abortos espontâneos.
O surto desse novo
ramo, clado 1b, parece marcadamente diferente do clado 1a.
"É realmente
diferente porque a erupção é mais severa, a doença parece durar mais, mas,
acima de tudo, está sendo realmente impulsionada pela transmissão sexual e pelo
contato pessoa a pessoa, e não vimos nenhuma ligação com carne de caça",
diz Trudi Lang, professora da Universidade de Oxford.
Mas por que esse surto
está ocorrendo?
A resposta pode ser
evolução ou oportunidade.
A nova cepa parece
geneticamente distinta, mas ainda não há evidências convincentes de que essas
mutações tenham tornado o vírus mais contagioso.
O contato com
trabalhadoras do sexo que têm contato próximo com muitas outras pessoas também
poderia acelerar um surto.
"A transmissão
mediante redes sexuais ocorre mais rapidamente, mas isso não significa
necessariamente que o vírus em si seja mais transmissível", diz Rosamund
Lewis, gerente de emergência e líder técnica para a resposta global de mpox na
OMS.
O vírus não é uma
infecção sexualmente transmissível clássica. No entanto, ele é transmitido por
meio de contato físico próximo, e o sexo envolve contato próximo.
Há também incerteza
sobre a letalidade dos surtos atuais.
Nem todas as mortes
estão sendo registradas, pois algumas pessoas buscam "medicina
tradicional" em vez de cuidados hospitalares.
E não temos ideia de
quantas pessoas estão sendo infectadas — algumas das quais podem ter sintomas
leves ou inexistentes.
"Simplesmente não
sabemos quantos casos há e, para mim, essa é uma das maiores incógnitas",
diz Lang, da Universidade de Oxford.
Historicamente, os
surtos do clado 1 são mais perigosos do que os do clado 2.
Em surtos anteriores,
até 10% das pessoas que adoeceram com a mpox do clado 1 morreram. No entanto,
não está claro quão relevante é essa taxa de 10% para os surtos atuais.
Além disso, as taxas
de mortalidade envolvem mais do que o vírus em si. A desnutrição, o HIV não
tratado que compromete o sistema imunológico ou a falta de acesso a cuidados
hospitalares também elevam a taxa de mortalidade.
A OMS afirma que 3,6%
dos casos conhecidos de mpox com o clado 1a levaram à morte em 2024. Não há um
número equivalente para o novo clado 1b.
• Como os primeiros dias do HIV
Mais de 500 pessoas já
morreram nos surtos de mpox na RDC este ano. A ameaça para o país e seus
vizinhos é clara.
"Não conseguimos
controlar o vírus em South Kivu", diz Masirika.
"Precisamos de
uma intervenção maciça para controlar esse surto e pará-lo", acrescenta.
A situação é
complicada pelo conflito em curso no leste da RDC, onde vários grupos rebeldes
estão em combate.
Lang, que está
trabalhando com equipes na RDC, traça comparações com os primeiros dias do HIV.
Quando questionada
sobre isso, ela diz que é uma frase usada "não muito frequentemente e
definitivamente não levianamente."
Ela acrescenta:
"A combinação de trabalhadores do sexo jovens e explorados, as famílias,
os caminhoneiros e, obviamente, as crianças ao redor que são as vítimas
vulneráveis iniciais desse surto, é exatamente a mesma situação dos primeiros
dias do HIV, onde foi realmente perpetuada pelas rotas de transporte."
• Ameaça global?
Não se espera que o
mpox atinja o nível da covid. Já se passou quase um ano desde que a nova cepa
surgiu em setembro de 2023.
O cenário mais
provável no Reino Unido e em países semelhantes é que alguém retorne com o
vírus e fique doente.
Isso já aconteceu
várias vezes com o mpox no passado no Reino Unido, e o país continua a
notificar casos de mpox ligados ao surto de clado 2 de 2022.
Esses casos importados
podem ficar por isso mesmo ou pode haver uma propagação limitada dentro de
domicílios através de contato físico próximo.
A Suécia teve o
primeiro caso de Clado 1b fora da África, sem mais propagação relatada.
Um cenário mais
preocupante seria uma criança pequena infectada levando o vírus para a creche
ou pré-escola, onde brinca com outras crianças e causa um surto lá.
Esse é o limite do que
está sendo considerado provável no Reino Unido.
"Não, eu não acho
que isso [o surto atual] vai ser grande", diz Dunning.
"Estou um pouco
irritado e nervoso com as pessoas focando apenas no que aconteceu em 2022 e
pensando que o mesmo vai acontecer."
A resposta seria
encontrar pessoas que tiveram contato com alguém infeccioso e vaciná-las, em
vez de realizar programas de imunização em massa.
Deve ser mais fácil
acompanhar qualquer caso importado dessa forma no Reino Unido do que na RDC,
que enfrenta conflitos e desafios humanitários adicionais.
Ainda não há vacinas
específicas para mpox, mas vacinas contra a varíola são eficazes contra a
doença.
Os vírus da varíola e
do mpox são ambos Orthopoxvírus e a imunidade a um proporciona proteção contra
o outro.
O fim das campanhas de
imunização contra a varíola — após a erradicação da doença em 1979 — é uma das
razões para o surgimento do mpox agora.
Aqueles que receberam
a vacina contra a varíola quando crianças, apesar de um sistema imunológico
envelhecido, ainda devem ter alguma proteção.
Assim como os homens
que receberam a vacina durante o surto de 2022, embora os surtos do clado 1 não
estejam afetando desproporcionalmente homens gays, bissexuais e outros homens
que fazem sexo com homens.
As pessoas com maior
necessidade de vacinas estão no centro do surto na África.
Dunning diz:
"Somos absolutamente péssimos em compartilhar ferramentas para prevenir a
mpox, especialmente vacinas, e isso é indefensável."
"É óbvio para mim
que a maior vitória para nós é controlar esses surtos na origem."
Fonte: BBC News
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