'Golpe do
PIX': Justiça acusa jornalistas baianos de formarem organização criminosa,
desviar e lavar dinheiro doado
As
12 pessoas denunciadas por envolvimento no caso conhecido como "Golpe do
PIX" formaram uma organização criminosa, de acordo com a Justiça baiana. O
Ministério Público estadual (MP-BA) apontou que o grupo desviou e lavou
dinheiro que deveria ser repassado para pessoas em situação de vulnerabilidade.
O órgão entendeu que se tratava de uma associação criminosa, porém, no parecer,
o juiz responsável pelo caso alterou a classificação para organização
criminosa, caracterização mais grave.
Os
valores foram arrecadados através de entrevistas exibidas no programa
"Balanço Geral Bahia", na emissora TV Record/Itapoan. As
investigações apontam que R$ 407.143,78 deixaram de ser entregues aos que
participaram das reportagens e seriam beneficiados.
Ao
tomar conhecimento da situação, a emissora realizou procedimentos internos e
identificou outros casos semelhantes. Conforme o MP, foi a própria TV
Record/Itapoan que procurou a polícia, e então foi iniciada a apuração.
O
g1 acessou a denúncia oferecida pelo Grupo de Atuação Especial de Combate às
Organizações Criminosas e Investigações Criminais (Gaeco) do MP-BA para a 9ª
Vara Criminal da Comarca de Salvador . Os documentos trazem detalhes sobre a
forma como o grupo agia.
Em
uma decisão datada de 12 de agosto de 2024 e assinada pelo magistrado Eduardo
Afonso Maia Caricchio, é apontado que as pessoas se juntaram para obter
vantagem mediante a prática de infrações penais. São elas:
• Lucas
Costa Santos, 26 anos
• Jakson
da Silva de Jesus, 21 anos
• Daniele
Cristina da Silva Monteiro, 27 anos
• Débora
Cristina da Silva, 27 anos
• Rute
Cruz da Costa, 51 anos
• Carlos
Eduardo do Sacramento Marques Santiago de Jesus, 29 anos
• Gerson
Santos Santana Junior, 34 anos
• Eneida
Sena Couto, 58 anos
• Thais
Pacheco da Costa, 27 anos
• Alessandra
Silva Oliveira de Jesus, 21 anos
• Marcelo
Valter Amorim Matos Lyrio Castro, 36 anos
• Jamerson
Birindiba Oliveira, 29 anos
Foi
através dos jornalistas Marcelo Castro e Jamerson Oliveira que o caso ganhou
repercussão em maio de 2023 e ficou conhecido como "Golpe do PIX". O
g1 entrou em contato com Marcus Rodrigues, advogado dos dois.
A
defesa afirmou que "continua, veemente, arguindo a inocência dos seus
assistidos, por ser de mais lídima justiça".
Conforme
o documento judicial, foi imputado aos integrantes do grupo "a prática dos
crimes de apropriação indébita, lavagem de dinheiro e associação
criminosa". Entretanto, a vara afirma que trata-se, "na verdade e a
princípio, de uma organização criminosa".
A
decisão destaca que a organização criminosa possui uma disposição mais
hierárquica e organizada, enquanto a associação tem uma estrutura mais simples.
Diante do exposto pelo MP-BA, a justiça considerou que o grupo formou uma
organização, avaliada como estruturalmente complexa, muito ordenada e
caracterizada pela divisão de tarefas.
Por
esses motivos, o juiz titular da 9ª Vara Criminal da Comarca de Salvador
determinou a remessa dos autos para que a Vara dos Feitos Relativos a Delitos
Praticados por Organização Criminosa da capital baiana siga com os
procedimentos, tendo em vista que o caso necessita ser acompanhado por uma
unidade especializada.
• Como
cada um atuava
Os
valores desviados foram arrecadados através de entrevistas exibidas no programa
"Balanço Geral Bahia", na emissora TV Record/Itapoan, que não é alvo
da ação.
No
dia 20 de junho de 2023, Marcelo, Jamerson e Lucas foram indiciados pela
Polícia Civil, pelos crimes de estelionato, associação criminosa e lavagem de
dinheiro. Mais de 40 pessoas prestaram depoimento.
O
MP concluiu que Marcelo e Jamerson eram os líderes da organização. O primeiro,
na condição de repórter, entrevistava as vítimas narrando dramas, pedia doações
e informava o número de uma chave PIX, que aparecia na tela para que as pessoas
recebessem as contribuições, mesmo sabendo que estas não pertenciam aos
entrevistados, e sim a terceiros.
Jamerson,
então editor-chefe do programa, era responsável pela transmissão, oportunidade
em que autorizava a inserção e a exibição da chave PIX destinada ao recebimento
das doações, também ciente de que pertencia a um dos integrantes do grupo
criminoso.
Lucas
atuava como "operador", identificando casos para serem exibidos na
TV. Ele também foi o responsável por cooptar os outros participantes do esquema
e obteve com eles os números das chaves PIX que eram exibidas na TV, bem como
das contas bancárias para receberem os valores doados pelos telespectadores.
Todos
os envolvidos no esquema tinham algum tipo de relação familiar com Lucas,
exceto Jamerson e Marcelo. Ele é filho de Rute, companheiro de Thais, primo de
Alessandra, Débora, Daniele e Gerson. Já Gerson é filho de Eneida e companheiro
de Débora.
Juntas,
essas 12 pessoas se apropriavam indevidamente da maior parte das doações, e
destinavam aos donatários "uma ínfima quantia" dentre o total
arrecadado. Em seguida, dividiam entre si valores proporcionais à atuação e
liderança dentro do grupo.
O
Gaeco destaca que as vítimas acreditavam que a chave PIX informada era de
titularidade da emissora ou de alguém ligado ao programa, porque essa era a
informação repassada por Marcelo Castro quando era questionado por alguém.
Sem
acesso à informação do montante efetivamente arrecadado, elas satisfaziam-se
com os valores recebidos, e apenas tomaram conhecimento da fraude quando os
fatos foram divulgados na imprensa.
A
TV Record/Itapoan demitiu os dois então funcionários quando os casos vieram à
tona.
• Estopim
Os
fatos só vieram à público após a apresentação do programa transmitido no dia 28
de fevereiro de 2023, quando foi exibida a situação de uma criança com grave
problema de saúde, que precisava de ajuda.
Na
oportunidade, houve uma doação realizada por um jogador de futebol aos
familiares da vítima. Posteriormente, um assessor dele, que tinha conhecimento
da ação, assistiu ao programa e constatou que a Chave PIX exibida na
transmissão divergia da utilizada na doação feita pelo atleta. Ao simular uma
transação, foi constatada divergência de titularidade das chaves.
"Ele
descobriu que aquela chave PIX era de uma pessoa que desenvolvia a atividade de
rifeiro. Como ele queria fazer essa doação, desconfiou e conseguiu o telefone
da mãe da criança com câncer. Foi feito um acerto de que doação seria feita
diretamente para ela, não para aquela chave'', contou, há alguns meses, o
delegado Charles Leão, responsável pelas investigações.
De
acordo com o Gaeco, as investigações realizadas pela Polícia Civil demonstram
que além da situação que deu origem às investigações, outros 11 casos
semelhantes foram identificados, seguindo exatamente o mesmo modo de ação do
grupo criminoso.
Em
todos os 12 fatos investigados e imputados na denúncia do MP, ocorreram
participações "efetivas e estáveis" de Marcelo, Jamerson e Lucas. Os
outros se alternaram na execução, inclusive de forma estratégica, para não
apresentarem movimentação financeira volumosa nas contas bancárias e serem
identificados por órgãos de controle. Alguns atuaram em um caso, enquanto
outros, em dois ou mais.
Ainda
segundo o Gaeco, o primeiro programa em que houve a apropriação indevida de
parte dos valores doados às vítimas foi transmitido em 8 de setembro de 2022.
Durante
todo o período da fraude, o grupo arrecadou R$ 543.089,66 em doações, que
deveriam ser totalmente repassadas às vítimas. Apesar disso, apenas 25% do
valor foi repassado, o que equivale a R$ 135.945,71. O grupo se apropriou de R$
407.143,78, de acordo com o MP.
Em
um dos casos exibidos no programa, por exemplo, foram arrecadados R$ 64.127,44.
Desse valor, eles se apropriaram de R$ 57.591,26 e repassaram apenas R$
6.536,18 às vítimas.
O
MP requer seja fixado, no total, a quantia de R$ 607.143,78 a ser paga pelos
envolvidos, para reparação dos danos.
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Veja a nota da defesa de Marcelo Castro e Jamerson Oliveira na íntegra:
"A
denúncia foi ofertada, mas a mesma ainda não foi recebida pela Justiça. Por
tais motivos, deveremos ter cautela nas informações que são passadas, até
porque "as provas" colhidas na fase inquisitorial não passaram por
diversos princípios processuais e constitucionais penais e constitucionais. A
defesa continua, veemente, argoindo a inocência dos seus assistido, por ser de
mais lídima justica".
Fonte:
g1
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