Estudo revela a perversidade dos contratos
‘temporários’ na educação pública
De acordo com um
estudo da ONG Todos Pela Educação, com base no Censo Escolar e no Sistema de
Avaliação da Educação Básica, os profissionais com contratos temporários nos
estados brasileiros já são maioria, 51,6% do total.
A situação é muito
grave, como mostra o levantamento, porque 43,6% dos “temporários” atuam há pelo
menos 11 anos como professora ou professor, ficando claro que esse tipo de
contratação deixou de ser apenas para uma demanda pontual e passou a ser a
regra, com a falta de concursos. O problema consiste em que os governadores
enxergaram na lei a possibilidade de contratação temporária para suprir
demandas pontuais, numa forma de burlar a lei e cortar verbas da educação.
Inclusive, em São
Paulo, depois de 13 anos, um concurso foi realizado, mas a nota desse concurso
foi utilizada como critério de atribuição de aulas para os “temporários”; e o
governo paulista não dá sinais de efetivar os aprovados.
Recentemente, o
presidente Lula sancionou a Lei 14.817, que visa à valorização
profissional das professoras e dos professores. Esta, em seu artigo 4º, inciso
I, diz que o “ingresso na carreira” deve ser “exclusivamente por concurso
de provas e títulos, que aferirá o preparo dos candidatos com relação a
conhecimentos pedagógicos gerais e a conhecimentos da área específica de
atuação profissional, sempre considerada a garantia da qualidade da ação
educativa”.
A nova lei estabelece
que o ensino público deve ter plano de carreira docente, formação continuada e
condições de trabalho adequada; o que não acontece nas redes estaduais nem para
os profissionais efetivos, que dirá aos “temporários”.
- Redes de ensino
O Plano Nacional de
Educação determina, às redes de ensino, a possibilidade de contratar
temporários até cerca de 10% do quadro de professoras e professores, para
suprir a demanda por casos de afastamento dos efetivos, o que já não acontece
há tempos.
Em primeiro lugar,
defendemos a realização de concursos nos estados para suprir a demanda da
educação pública como a melhor forma de melhorar a situação dos chamados
contratos “temporários”. Mas enquanto isso não acontece, defendemos a extensão,
aos “temporários”, de todos os direitos trabalhistas conferidos aos efetivos.
Também lutamos pela
efetivação de todos os aprovados em concurso até suprir todas as necessidades
da rede de ensino em cada estado. Além disso, por plano de carreira que
contemple as necessidades e os anseios das professoras e dos professores, e
salários que possam dar vida digna às trabalhadoras e aos trabalhadores da
educação pública e estruturas adequadas para o processo de ensinar e aprender
em todas as escolas.
Ø Em defesa da greve nas Universidades Federais. Por Wagner
Miquéias Damasceno
A greve dos
professores nas Universidades Federais foi deflagrada no dia 15 de abril deste
ano. Até agora, já são 39 Universidades em greve e 11 com indicativo de greve
para os próximos dias. Os Técnicos Administrativos em Educação (TAEs) das
universidades e institutos federais já estão em greve, desde 11 de março.
Mas por que os
professores decidiram cruzar os braços e entrar em greve? Por três demandas
negligenciadas pelo governo: (i) recomposição salarial, (ii) reestruturação da
carreira docente e (iii) recomposição do orçamento das Universidades e
Institutos Federais.
A exigência por
recomposição salarial é uma tentativa de repor as perdas dos últimos 14 anos.
Essas perdas salariais perfazem 39%, como demonstra estudo específico do
DIEESE. Ora, exigir que seus salários sejam recompostos conforme a inflação –
cujos índices são produzidos pelo próprio Estado – é um direito de todo
trabalhador. Entretanto, a resposta do governo federal, ainda no ano passado,
foi categórica: reajuste zero para 2024.
Aqueles que são
contrários à greve dos professores e se perfilam ao lado do governo, argumentam
que, no ano passado, o governo Lula concedeu 9% de reajuste salarial para os
professores e técnicos das Universidades Federais. Entretanto, se esquecem que:
(a) o que foi exigido por essas categorias era uma recomposição emergencial de
26,9%; (b) que o percentual de 9% já havia sido decidido no Projeto de Lei
Orçamentária Anual de 2022, feito pelo governo anterior; (c) e que, ainda
assim, Lula tentou reduzi-lo a 8% em 2023.
Achamos a proposta de
reajuste zero inadmissível e incongruente com a campanha do presidente durante
as eleições. Além de sermos responsáveis pela formação de profissionais para o
mundo do trabalho (médicos, engenheiros, sociólogos, professores, advogados,
físicos etc.) nós, professores universitários, somos os principais responsáveis
pela produção científica no país. A pandemia da COVID-19 mostrou a importância
da ciência e dos cientistas para toda a sociedade.
Outra exigência da
greve é a reestruturação da carreira. Isso significa unir o vencimento básico,
a retribuição por titulação e todos os demais benefícios numa só remuneração
salarial acabando, assim, com os chamados “penduricalhos” que não são incorporados
à aposentadoria. Significa, também, a luta por uma carreira única no magistério
federal e a estruturação de uma carreira que nos permita progredir e alcançar o
seu topo.
A terceira exigência é
a recomposição do orçamento das Universidades Federais. Segundo relatório
do Observatório do Conhecimento, as universidades federais vêm
perdendo orçamento nos últimos dez anos.
Isso se traduz em
universidades com falta de salas, salas sem ar condicionados e sem portas,
cadeiras quebradas, obras inacabadas, redes de internet precárias, falta de
laboratórios, laboratórios sem equipamentos etc.
Investir nas
Universidades Federais é uma excelente forma de absorver uma força de trabalho
especializada através de concursos públicos. E é uma importante medida para
reverter a posição subordinada do Brasil na divisão mundial do trabalho.
O Brasil vem se
cristalizando como uma neocolônia dos Estados Unidos, da União Europeia e da
China, tornando-se um país cuja razão de existir é exportar matérias-primas
produzidas ou extraídas em território nacional, para depois comprar desses
países os produtos transformados com maior valor agregado. Não por acaso o
carro chefe da economia brasileira, nas últimas décadas, tem sido a
agropecuária, enquanto o papel da indústria de transformação no PIB declina.
Reindustrializar o
país, investir em cadeias produtivas estratégicas e promover uma transição
energética – fundamental para o enfrentamento à crise climática – não são
tarefas exequíveis sem Universidades e Institutos Federais fortes e sem seus
profissionais valorizados.
Dinheiro para isso
tem, o problema reside na opção política feita pelo governo. O
contingenciamento do orçamento das Universidades Federais obedece aos ditames
do Arcabouço Fiscal, cuja razão de existir é restringir o investimento do
Estado com serviços públicos para destinar bilhões de reais do dinheiro público
para o pagamento de juros e amortizações da mal chamada dívida pública. Para
termos uma ideia, em 2023, foram pagos R$ 1,89 trilhões para banqueiros e
rentistas, enquanto foi destinado apenas R$ 129,4 bilhões para toda a Educação.
·
O que dizem os
contrários à greve?
Quem diz que a greve
docente favorece a extrema direita ignora um fato da realidade: governistas e
bolsonaristas – dentro e fora das universidades – estão unidos tacitamente
contra a greve.
Hostis às lutas dos
trabalhadores e portadores de uma visão de mundo reacionária e anticientífica,
os bolsonaristas se opõem à greve dos professores, ainda que, no plano do
discurso, tentem usar dela para desgastar o governo Lula.
Já os petistas e
governistas, desejam subordinar a luta dos professores à defesa do governo
Lula. Alegam que a greve enfraquecerá um governo aliado e pavimentará o retorno
da extrema-direita ao poder. O resultado dessa chantagem política é permitir
que o governo Lula fique com as mãos livres para implementar um receituário
neoliberal, enquanto os trabalhadores suportam resignados a perda de direitos e
a corrosão do serviço público por temerem o retorno de Jair Bolsonaro ao poder.
Isso ajuda a entender,
por exemplo, porque o Arcabouço Fiscal não encontrou a mesma resistência que
encontrou a Lei de Teto de Gastos de Michel Temer (MDB). Em junho de 2016,
Michel Temer criou a Lei do Teto de Gastos (PEC 241/16) para congelar investimentos
nos Serviços Públicos Federais e, assim, garantir superávit para destinar
bilhões aos banqueiros. Para aprová-la no congresso, Temer enfrentou atos nas
principais capitais do país e enfrentou um ato em Brasília, com cerca de 20 mil
manifestantes em dezembro de 2016.
Já o governo Lula
criou e conseguiu aprovar o Arcabouço Fiscal – que nada mais é do que uma nova
lei do teto de gastos semelhante à feita por Michel Temer – sem enfrentar
qualquer resistência popular semelhante! Derrubar o Arcabouço Fiscal é parte
inseparável da luta em defesa do serviço público.
Por fim, é preciso
dizer que o que realmente fortalece a extrema direita não é a luta dos
trabalhadores contra um governo que aplica políticas econômicas neoliberais,
mas, sim, a aplicação de uma agenda econômica neoliberal. Quem tem o sincero
temor de que a extrema direita possa retornar ao poder deve apostar na
mobilização independente dos trabalhadores como a única forma de combater
qualquer ameaça reacionária.
Afinal, a história já
ensinou fartamente que não se combate a extrema direita através de projetos
conciliatórios, mas mobilizando os trabalhadores em torno de seus interesses
próprios que são os interesses da esmagadora maioria da sociedade.
Fonte: Correio do
Brasil/A Terra é Redonda
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