Adhemar
Bahadian: Cem noites sem dias e uma alvorada
Depois
de cem noites, uma alvorada surge nos Estados Unidos da América e aqui no
Brasil.
Nos
Estados Unidos, o “New York Times” noticia a expansão de marchas populares
contra a política de Trump cada vez mais questionada, quando não repelida,
tanto por insuspeitos analistas políticos e econômicos - dentre outros, Paul
Krugman e o próprio presidente do Banco Central americano - além de protestos
crescentes nas principais cidades do país. A lua de mel com o MAGA mostra sua
face autoritária de forma insustentável.
A
última performance midiática de Trump nos jardins da Casa Branca, diante de uma
plateia minguada e irrelevante, teve como apogeu a quase cômica sustentação nos
braços do presidente de um cartaz de enigmáticos números diante de uma lista de
países.
Imediatamente
comparada com um anúncio de “partidas e chegadas” de um aeroporto de subúrbio,
o cartaz só não levou a melhor diante da já cansativa e obsessiva exposição da
assinatura pública de Trump - cada vez mais parecida com a imagem de sismógrafo
de um terremoto asiático ou a de eletrocardiograma de uma arritmia grave da
coronária descendente - seguida da farta distribuição de canetas obesas e
talidominifórmicas. Um show besta.
No
Brasil, a Alvorada foi digna dos céus de Brasília. O Senado Federal aprova por
unanimidade um projeto de lei, relatado pela senadora Teresa Cristina,
ex-ministra da Agricultura, que autoriza o Poder Executivo a tomar medidas
cabíveis de retaliação aos prejuízos eventualmente causados ao Brasil pela
política extravagante de Trump.
Posteriormente enviada à Câmara dos Deputados - e após uma tentativa de
obstrução provocada por razões conhecidas de todos - o interesse nacional
predomina e o projeto de lei é elevado à sanção presidencial.
Não há como não reconhecer a importância da aprovação do projeto de lei,
poderoso instrumento a ser eventualmente utilizado pelos negociadores
brasileiros, seja em nossas conversações bilaterais com os Estados Unidos da
América, seja nas deliberações multilaterais.
Trata-se
de recurso legítimo e usual em negociações diplomáticas. Todo e qualquer agente
diplomático brasileiro já terá ouvido de negociadores americanos que esta ou
aquela concessão, tarifária ou não, estaria impedida por lei aprovada pelo
Congresso americano. Não há como não ver que se está diante de um argumento de
defesa da soberania nacional, peça angular do Direito Internacional. Nada seria
mais colidente com a prática das negociações internacionais do que adjetivar o
uso da soberania nacional como hostil a qualquer parceiro tanto em negociações
multilaterais quanto bilaterais. Apenas a má-fé ou o abuso de direito poderiam
subscrever o disparate.
A
gestão da política externa de Trump - e a interna também, mas isso é já
denunciado por marchas de protesto como acima relatei - parece abusar de
inegável poder de mercado, acompanhado de uma visão predatória do comércio
internacional, para conseguir vantagens abusivas diante de concorrentes.
Os que
me seguem até este ponto me permitirão esclarecer as artimanhas de Trump hoje
apresentadas como legítimas para impor tarifas ao Brasil. Argumenta Trump que
os Estados Unidos estão a ser historicamente espoliados pelo resto mundo, uma
vez que há déficit na balança comercial entre os americanos e os demais países.
O argumento é faccioso, primário e desonesto.
Vejamos
o caso brasileiro. De fato, quando se consideram os últimos dados estatísticos
disponíveis, o Brasil tem alguns poucos milhões de dólares a seu favor. Porém,
quando se olha para o valor total de comércio, que inclui bens e serviços -
royalties e outros - o superávit americano contra o Brasil supera 20 bilhões de
dólares.
Trump
parece ter o olho de vidro do pirata da perna de pau. Mas, ele sabe muito bem
que a inclusão de serviços nas regras da OMC foi vitória dos países
desenvolvidos à revelia dos interesses dos países em desenvolvimento.
Na
barganha das tarifas para aumentar um pouco o acesso de produtos primários do
agronegócio ao mercado americano, o Brasil e outros países tiveram que aceitar
a contrapartida de incluir uma abusiva proteção das patentes farmacêuticas
americanas, tema das mais graves consequências cuja amplitude escapa aos
limites deste artigo.
Espanta
que renomados “especialistas" brasileiros proponham “compreensão” diante
desses atos abusivos de Trump. Ou ignoram - o que seria lamentável - a
realidade das negociações na OMC ou tentam ignorar o direito de o Brasil lutar
por seus interesses, o que, mais do que lamentável, é digno do maior desprezo
acadêmico e pessoal.
De
fato, o Congresso Nacional afirmou, de forma inequívoca, que não somos um país
candidato a inaugurar uma nova forma de colonialismo autoritário, onde os povos
de países pobres pagam excessivas tarifas alfandegárias a um hegemônico
interessado em reduzir o imposto de renda da classe super-rica de Musks e
outros espécimes rastejantes.
Neste
ano de 2025, ainda teremos aqui no Brasil, no Rio de Janeiro e em Belém,
importantíssimas reuniões dos BRICs e da COP-30. Estarão nelas chefes de Estado
de aproximadamente um terço do PIB mundial. Não se trata de uma reunião de
pobres coitados.
Destas
reuniões podem surgir novas orientações muito mais modernas e humanas do que o
"mondo cane" que os Estados Unidos de Trump, Musk, Steve Bannon
"et caterva“ estão a nos propor como se fôssemos todos estupidamente
ignorantes, descrentes de nossas inteligências e profundamente alienados do
futuro do nosso país.
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China pede que EUA 'eliminem completamente' tarifas
recíprocas e corrijam seus 'erros'
A China pediu aos Estados Unidos, neste domingo (13), que "eliminem
completamente" suas tarifas recíprocas.
Em um
comunicado oficial, o Ministério do Comércio chinês comentou a decisão
anunciada pelo governo Donald Trump nesta sexta-feira (11), de isentar celulares, computadores e
outros produtos eletrônicos das tarifas. Afirmou que foi
um "pequeno passo" e que a China estava "avaliando o
impacto" dela.
"Instamos
os Estados Unidos (...) a tomarem medidas importantes para corrigir seus erros,
eliminar completamente a prática errônea de tarifas recíprocas e voltar ao
caminho certo do respeito mútuo", disse o porta-voz do ministério no
texto.
As
isenções beneficiarão empresas de tecnologia dos EUA, como Nvidia e Dell, assim
como a Apple, que fabrica iPhones e outros produtos de
ponta na China.
A maioria dos produtos chineses ainda
enfrenta uma tarifa geral de 145% para entrar nos Estados Unidos.
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Eletrônicos isentos
Ao
anunciar a isenção, a Alfândega e Proteção de Fronteiras dos EUA listou 20
categorias de produtos, que além dos celulares e computadores, incluem
semicondutores, chips de memória e monitores de tela plana.
Os
eletrônicos representam parte significativa das importações da China para os
EUA.
Em
2024, os smartphones foram a principal importação chinesa para o
país, totalizando US$ 41,7 bilhões, e os laptops ficar em segundo
lugar, com US$ 33,1 bilhões, de acordo com dados do US Census Bureau
divulgados pela Reuters.
A
isenção sobre esses produtos pode reduzir o impacto no bolso dos consumidores
americanos e beneficiar grandes empresas do setor, segundo a agência de
notícias Bloomberg.
Analistas
da Wedbush chamaram a exclusão tarifária de "a melhor notícia possível
para investidores em tecnologia", neste sábado (12), segundo a CNN.
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Grandes montadoras globais começam a abandonar os EUA
após tarifaço de Trump
As
novas tarifas sobre veículos e autopeças impostas pelo governo dos Estados
Unidos começaram a impactar diretamente a dinâmica do setor automotivo.
Desde o
dia 3 de abril, quando entrou em vigor a taxa adicional de 25% sobre a
importação de carros de passeio, picapes e componentes, fabricantes
internacionais têm revisto suas estratégias comerciais em relação ao mercado
norte-americano.
Marcas
tradicionais como Audi e Jaguar Land Rover foram as primeiras a suspender as
exportações para os Estados Unidos. Além dessas, outras montadoras também
iniciaram ajustes.
O Grupo
Stellantis, responsável por marcas como Jeep e Fiat, interrompeu operações em
fábricas localizadas no Canadá e no México, com a consequente dispensa
temporária de centenas de trabalhadores.
A
medida adotada pela administração Trump afeta particularmente empresas que
operam plantas industriais fora do território norte-americano, com destaque
para o México.
A
produção automotiva no país vizinho é favorecida por menores custos de mão de
obra, incentivos fiscais e localização geográfica estratégica, que facilita a
logística de exportação para os Estados Unidos.
De
acordo com relatos obtidos junto a representantes do setor, as reações variam.
Enquanto algumas empresas decidiram suspender operações ou exportações, outras
preferiram aguardar os desdobramentos para avaliar os impactos e decidir sobre
possíveis mudanças. Mesmo com declarações comedidas, a maioria das montadoras
demonstrou preocupação com o novo cenário.
Especialistas
em economia e indústria automobilística projetam desaceleração no crescimento
global do setor em 2025. Estimativas anteriores apontavam uma alta de 4% na
produção e vendas mundiais de veículos, mas a expectativa agora é de revisão
para baixo.
Parte
dessa retração estaria ligada à elevação dos preços dos veículos importados nos
Estados Unidos, que, segundo previsões de mercado, podem sofrer aumento de até
US$ 12 mil. A elevação dos custos é considerada um fator decisivo para a queda
na demanda.
Estudos
indicam que a redução nas vendas pode chegar a 1 milhão de unidades, afetando
diretamente a cadeia produtiva e o consumo.
Embora
o aumento das tarifas possa, em tese, beneficiar montadoras nacionais,
analistas afirmam que a substituição de modelos importados por similares
produzidos nos Estados Unidos não é imediata. Consumidores que buscam marcas ou
modelos específicos tendem a adiar a compra, em vez de migrar para veículos de
outras fabricantes.
Outro
impacto previsto é no processo de eletrificação da frota norte-americana. A
fabricação de veículos elétricos depende fortemente de componentes importados,
que também foram atingidos pelas novas tarifas. Isso pode atrasar a transição
energética no setor e comprometer metas de descarbonização estabelecidas por
governos e fabricantes.
A
justificativa do presidente Donald Trump para a medida é baseada em alegações
de desequilíbrio nas relações comerciais. Segundo ele, outros países impõem
tarifas elevadas sobre veículos fabricados nos Estados Unidos.
Como
exemplo, citou a União Europeia, que aplica uma alíquota de 10% sobre carros
americanos, enquanto os EUA cobravam anteriormente 2,5% sobre automóveis
europeus.
No
entanto, o governo norte-americano já aplicava, antes da nova medida, uma
tarifa de 25% sobre a importação de picapes — o segmento de maior volume de
vendas no país. Especialistas apontam que, ao considerar esse dado, o argumento
de desproporcionalidade perde força.
Trump
declarou ainda que a política tarifária visa fortalecer a indústria automotiva
nacional. Em 2024, dados da agência de classificação de risco Standard &
Poor’s revelaram que 46% dos 16 milhões de veículos vendidos no país foram
importados — mais de 7 milhões de unidades.
O
mercado norte-americano, apesar da presença de grandes fabricantes locais como
Ford e General Motors, depende fortemente das importações para atender à
demanda.
Os
principais países exportadores para os Estados Unidos incluem México, Japão,
Coreia do Sul e Canadá. No caso mexicano, aproximadamente 76% da produção de
veículos é destinada ao mercado norte-americano, o que representa mais de 3
milhões de unidades.
Com a
imposição das tarifas, a tendência é que parte dessa produção fique sem
destino, especialmente se as exportações forem interrompidas ou reduzidas
significativamente.
Analistas
destacam que o excedente da produção mexicana pode ser redirecionado para
outros mercados, incluindo a América Latina. O Brasil é apontado como destino
provável para esse fluxo, em razão do acordo de livre comércio firmado com o
México.
A
entrada de veículos mexicanos no mercado brasileiro em volumes maiores pode
gerar impacto direto na competitividade da indústria nacional, especialmente em
segmentos mais sensíveis a variações de preço.
A
reconfiguração das relações comerciais e industriais provocada pela medida dos
Estados Unidos está sendo monitorada de perto por governos, empresas e
analistas.
As
consequências para o mercado global de automóveis ainda são incertas, mas a
expectativa é de que os efeitos se prolonguem ao longo dos próximos meses, com
implicações tanto econômicas quanto geopolíticas.
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Empresas chinesas apostam na produção local e ampliam
presença industrial no Brasil
Empresas
chinesas do setor tecnológico e automotivo estão adotando uma nova estratégia
para operar no mercado brasileiro: a instalação de fábricas em território
nacional.
A
mudança de abordagem busca contornar barreiras tarifárias, reduzir custos
operacionais e fortalecer relações com países do Sul Global. A iniciativa marca
uma transição da China de fornecedora global para investidora industrial com
atuação local.
De
acordo com o portal chinês Guancha, empresas como Xiaomi, OPPO e Vivo têm
intensificado sua presença no Brasil por meio de fábricas e parcerias locais. A
Vivo, por exemplo, iniciou operações no país sob a marca JOVI após a
inauguração de sua unidade fabril em Manaus.
A
entrada no mercado brasileiro, apesar de tardia, ocorre em um ambiente
tributário complexo e com altas taxas de importação, que podem chegar a 60%
sobre eletrônicos como smartphones.
A
decisão por uma produção localizada reflete uma reação à política de proteção
da indústria brasileira, que tradicionalmente impõe tarifas elevadas sobre
produtos estrangeiros. Como exemplo, o iPhone 15 foi lançado no país a R$
7.299, valor significativamente superior ao praticado nos Estados Unidos.
A
Samsung, que fabrica produtos localmente desde 1999, consolidou sua vantagem
competitiva nesse cenário. A Apple, mesmo com tentativas de nacionalização
parcial da produção por meio da Foxconn, permanece com menos de 10% do mercado.
Empresas
chinesas seguem esse modelo, firmando parcerias com companhias brasileiras como
a Multi, que atua como intermediária tecnológica. A OPPO, ao instalar produção
local, também busca adaptar produtos aos hábitos de consumo regionais, como o
desenvolvimento de câmeras com funcionalidades voltadas ao público
latino-americano.
O
movimento de expansão industrial da China no Brasil ocorre em um contexto
geopolítico global marcado por políticas de isolamento econômico.
Com a
reeleição de Donald Trump em 2025 e o reforço de medidas protecionistas nos
Estados Unidos, a China adotou estratégia oposta, promovendo parcerias e
compartilhamento tecnológico com países em desenvolvimento.
“O que
os países em desenvolvimento mais precisam é de tecnologias produtivas que
permitam elevar a renda de suas populações. E a China está disposta a
compartilhar isso”, afirma a reportagem do Guancha. Segundo o veículo, a
atuação chinesa contribui para a criação de novas cadeias produtivas e para o
fortalecimento da competitividade industrial local.
Fatores
estruturais tornam o Brasil um destino atrativo para essas iniciativas. A
urbanização atinge 87,6% da população, o Sistema Único de Saúde cobre 75% dos
habitantes e o uso de smartphones alcança 85% da população. Além disso, dados
da empresa AppAnnie apontam que brasileiros utilizam o celular por uma média de
5,4 horas diárias.
A
entrada da DiDi no mercado brasileiro também reflete essa tendência. Após
adquirir a plataforma 99, a companhia chinesa passou a atuar nos setores de
transporte, pagamentos digitais — por meio da “99Pay” — e entregas. O modelo de
cooperação inclui intercâmbio entre engenheiros chineses e equipes brasileiras,
promovendo capacitação técnica e inovação no país.
A
estratégia chinesa se assemelha a práticas adotadas em outros mercados. No
Japão, a fabricante Hisense ultrapassou 40% de participação no setor de
televisores em 2024 após a aquisição da divisão da Toshiba e o relançamento sob
a marca REGZA.
A
Haier, por sua vez, segue desde os anos 1990 uma política baseada em três
frentes: produção e venda internas, produção nacional para exportação e
produção local para consumo no exterior.
Na
Europa e na Coreia do Sul, empresas chinesas também têm buscado diferenciação
por meio da adaptação cultural e da colaboração com atores locais. O foco,
segundo analistas, está em desenvolver valor compartilhado com os parceiros,
superando estratégias meramente baseadas em preço.
O
investimento chinês em países do Sul Global se distancia de práticas de
extração de recursos naturais adotadas por antigas potências coloniais. Um
exemplo citado pelo Guancha é o caso da Hungria, que se tornou o segundo maior
produtor de veículos elétricos no mundo graças ao capital chinês, mantendo, ao
mesmo tempo, autonomia política.
Para o
especialista Lin Xueping, a estratégia tem êxito quando há integração produtiva
e desenvolvimento conjunto. Um exemplo negativo ocorreu na Índia, onde uma
empresa chinesa foi alvo de retaliação governamental por tentar operar sem
transferência de conhecimento, importando tecnologia e mão de obra diretamente
da China.
A atual
expansão da China no exterior se baseia na ideia de reciprocidade e
complementaridade. Assim como a Volkswagen contribuiu para o desenvolvimento da
indústria automotiva chinesa na década de 1980, empresas chinesas agora buscam
replicar esse modelo em outros mercados, com foco em geração de demanda e
construção conjunta.
Diante
da política externa dos Estados Unidos, marcada por medidas restritivas, a
China tem respondido com investimentos industriais, acordos de cooperação e
ampliação de parcerias produtivas.
A
consolidação de fábricas chinesas no Brasil indica uma reconfiguração das
relações comerciais e aponta para a formação de uma nova arquitetura econômica
global, em que o país sul-americano ocupa posição estratégica na rota da
industrialização tecnológica entre nações do Sul Global.
Fonte:
JB/ig/g1/O Cafezinho

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