sexta-feira, 9 de fevereiro de 2024

O que pesa contra Bolsonaro nas operações da PF

O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) é um dos alvos da operação Tempus Veritatis, deflagrada pela Polícia Federal nesta quinta-feira (8/2).

A operação especial investiga uma organização acusada de "tentativa de golpe de Estado e abolição do Estado Democrático de Direito" nos períodos que antecederam e se seguiram às eleições presidenciais de 2022, em uma tentativa de garantir a "manutenção do então presidente da República (Jair Bolsonaro) no poder".

Segundo o portal G1, o passaporte do ex-presidente foi apreendido, conforme ordem da Justiça, que também determinou que ele não mantenha contato com outros investigados.

Mas o que pesa especificamente contra Bolsonaro nas operações da PF?

Entenda a seguir.

•        Conhecimento e alterações na 'minuta do golpe'

A operação é realizada após o tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, fechar delação premiada com a PF.

Cid está preso e é investigado por envolvimento na tentativa de golpe e outras denúncias envolvendo o ex-presidente e integrantes de seu governo.

O ex-ajudante de ordens disse na delação que Bolsonaro teria visto a minuta de um decreto que seria usado para subverter o resultado da eleição presidencial de 2022, em que o ex-presidente foi derrotado por Luís Inácio Lula da Silva (PT).

A minuta teria sido apresentada a Bolsonaro em novembro de 2022 por Filipe Martins, segundo a PF.

A minuta detalhava, segundo a polícia, supostas interferências do Judiciário e decretava a prisão de autoridades, como os ministros Alexandre de Moraes e Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), além do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG).

O documento também determinaria a convocação de novas eleições.

Segundo Cid, Bolsonaro teria solicitado a Filipe Martins alterações na minuta e concordado com os termos ajustados, além de convocado uma reunião com os comandantes das Forças Armadas para apresentar a eles o documento para que aderissem à iniciativa.

Bolsonaro negou por diversas vezes ter conhecimento de uma minuta com esse teor.

•        Prisão de Moraes e anuência de Bolsonaro

"Conforme descrito, os elementos informativos colhidos revelaram que Jair Bolsonaro recebeu uma minuta de decreto apresentado por Filipe Martins e Amauri Feres Saad para executar um Golpe de Estado, detalhando supostas interferências do Poder Judiciário no Poder Executivo e ao final decretava a prisão de diversas autoridades, entre as quais os ministros do Supremo Tribunal Federal, Alexandre de Moraes e Gilmar Mendes, além do Presidente do Senado Rodrigo Pacheco e por fim determinava a realização de novas eleições", diz um trecho da representação da PF feita ao STF.

Ainda de acordo com a PF, após receber o documento, Bolsonaro sugeriu mudanças.

"Posteriormente foram realizadas alterações a pedido do então Presidente permanecendo a determinação de prisão do Ministro Alexandre de Moraes e a realização de novas eleições", diz o documento.

A PF afirma ainda que após as mudanças terem sido feitas, Bolsonaro concordou com a versão do documento e convocou uma reunião com militares.

"Após a apresentação da nova minuta modificada, Jair Bolsonaro teria concordado com os termos ajustados e convocado uma reunião com os Comandantes das Forças Militares para apresentar a minuta e pressioná-los a aderirem ao Golpe de Estado", diz a PF ao STF.

Segundo a PF, a minuta teria sido apresentada por Bolsonaro aos então comandantes das três forças militares (Aeronáutica, Marinha e Exército) em uma reunião no dia 7 de dezembro de 2023.

De acordo com trecho de parecer da Procuradoria-Geral da República (PGR) com base nos dados colhidos pela PF, a reunião teria o objetivo de pressionar os comandantes militares a aderirem a um suposto golpe no mesmo dia, a fim de apresentar-lhes a minuta e pressioná-los a aderir ao golpe de Estado.

Esta não é a primeira vez que a PF encontra evidências sobre minutas prevendo a manutenção de Bolsonaro no poder após a derrota nas eleições de 2022. Em 2023, a PF encontrou uma minuta prevendo a convocação de novas eleições na casa do ex-ministro da Justiça durante o governo Bolsonaro, Anderson Torres.

Desde então, Bolsonaro vem negando ter conhecimento sobre a existência do documento.

"Não tomei conhecimento desse documento, dessa minuta. Nas perícias, só encontraram digitais do delegado da operação e de um agente, de mais ninguém. Papéis, eu recebia um monte. Então, é óbvio que não tem cabimento você dar golpe com respaldo da Constituição", disse Bolsonaro em junho de 2023.

•        Outra reunião

Além disso, em um computador apreendido na residência de Cid, havia um vídeo de uma reunião, realizada em 5 de julho de 2022, de Bolsonaro com outros alvos da operação, como Augusto Heleno, ex-chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), o general Braga Netto, ex-ministro da Defesa e da Casa Civil, e Paulo Sérgio Nogueira, ex-ministro da Defesa.

Na ocasião, o presidente reforçou as suspeitas sem provas de que haveria fraude eleitora, e os presentes "ratificavam a narrativa mentirosa apresentada pelo então Presidente da República", de acordo com a decisão de Moraes.

Na reunião, Bolsonaro teria instado seus ministros a divulgar "desinformações e notícias fraudulentas quanto à lisura do sistema de votação, com uso da estrutura do Estado brasileiro para fins ilícitos e dissociados do interesse público".

O ex-presidente teria afirmado, no entanto, que as pesquisas estavam certas e que provavelmente Lula ganharia a eleição.

Heleno teria respondido então que, para "virar a mesa", tem que ser "antes da eleição" e que era preciso “agir contra determinadas instituições e contra determinadas pessoas".

O general também teria, segundo os investigadores, discutido que agentes da Abin se infiltrassem nas campanhas eleitorais, mas Bolsonaro teria interrompido a conversa para que falassem sobre o assunto “em particular”.

 

       O que se sabe até agora sobre a operação da PF contra Bolsonaro e aliados

 

A Polícia Federal (PF) fez na quinta-feira (8/2) uma operação para investigar uma organização acusada de "tentativa de golpe de Estado e abolição do Estado Democrático de Direito" nos períodos que antecederam e se seguiram às eleições presidenciais de 2022, em uma tentativa de garantir a "manutenção do então presidente da República (Jair Bolsonaro) no poder".

O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) é alvo da operação Tempus Veritatis, que foi autorizada pelo ministro Alexandre de Moraes do Supremo Tribunal Federal (STF) no âmbito do inquérito que apura a atuação de milícias digitais.

De acordo com a decisão de Moraes, a PF obteve evidências de que:

•        Bolsonaro teria se envolvido na confecção de uma minuta de decreto com medidas para impedir a posse de Luiz Inácio Lula da Silva (PF) e mantê-lo no poder;

•        Militares teriam organizado manifestações contra o resultado das eleições e atuado para garantir que os manifestantes tivessem segurança;

•        O grupo em torno de Bolsonaro teria monitorado os passos de Moraes, incluindo acesso à sua agenda de forma antecipada.

Por ordem da Justiça, ex-presidente teve seu passaporte apreendido e não pode fazer contato com outros investigados.

Bolsonaro disse em entrevista à Folha de S.Paulo: “Saí do governo há mais de um ano e sigo sofrendo uma perseguição implacável. Me esqueçam, já tem outro governando o país”.

O ex-presidente também afirmou à emissora CNN que “ninguém entende essa ‘tentativa de golpe’": "Não se movimentou um soldado em Brasília para dar golpe em ninguém aí”.

A declaração foi feita antes de Moraes tirar o sigilo sobre sua decisão que autorizou a operação da PF e sobre os detalhes da investigação.

Em um post na rede social X, Fabio Wajngarten, assessor de Bolsonaro, afirmou que o ex-presidente estava em sua casa em Angra dos Reis, no Rio de Janeiro, no momento da operação, acompanhado de um ex-assessor.

Pelo menos nove aliados e ex-ministros de Bolsonaro também foram alvo da PF. Três deles já foram presos preventivamente:

•        Filipe Martins, ex-assessor para assuntos internacionais de Bolsonaro;

•        O coronel do Exército Marcelo Câmara, ex-assessor especial da Presidência e que era investigado no caso da suposta fraude ao cartão de vacinação do ex-presidente;

•        e o major do Exército Rafael Martins de Oliveira, que atuou no batalhão de Forças Especiais da corporação.

Também há um mandado de prisão contra o coronel do Exército Bernardo Romão Correa Neto, que está no momento no exterior.

Ainda foram alvo de mandados de busca e apreensão no círculo de aliados mais próximos de Bolsonaro:

•        general Augusto Heleno, ex-chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI);

•        general Walter Braga Netto, ex-ministro da Defesa e da Casa Civil e vice na chapa de Bolsonaro em 2022;

•        Valdemar da Costa Neto, presidente do PL, pelo qual Bolsonaro disputou a reeleição;

•        Anderson Torres, ex-ministro da Justiça de Bolsonaro;

•        o general Paulo Sérgio Nogueira, ex-comandante do Exército e ex-ministro da Defesa de Bolsonaro;

•        e o almirante Almir Garnier Santos, ex-comandante-geral da Marinha.

Valdemar da Costa Neto foi preso em flagrante durante a operação por posse ilegal de arma de fogo.

A BBC News Brasil procurou a defesa de Costa Neto e de Braga Netto por meio da assessoria do PL e Heleno em seu celular pessoal, mas não obteve resposta.

A reportagem não conseguiu contato com Anderson Torres, Paulo Sérgio Nogueira e Almir Garnier Santos.

Em nota à imprensa, o advogado de Filipe Martins, João Vinícius Manssur, afirmou que a petição que levou à prisão de seu cliente em segredo de justiça e "que não teve acesso à decisão que fundamentou as medidas e que já solicitou o acesso integral dos autos para estudo e posterior manifestação".

Delação de Mauro Cid e minuta do golpe

A operação é realizada após tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, fechar delação premiada com a PF.

Cid está preso e é investigado por envolvimento na tentativa de golpe e outras denúncias envolvendo o ex-presidente e integrantes de seu governo.

As informações passadas por Cid ajudaram a embasar a investigação que levou à operação desta quinta-feira.

O ex-ajudante de ordens disse na delação que Bolsonaro teria visto a minuta de um decreto que seria usado para subverter o resultado da eleição presidencial de 2022, em que o ex-presidente foi derrotado por Lula.

A minuta teria sido apresentada a Bolsonaro em novembro de 2022 por Filipe Martins, segundo a PF.

A minuta detalhava, segundo a polícia, supostas interferências do Judiciário e decretava a prisão de autoridades, como os ministros Alexandre de Moraes e Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), além do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG).

O documento também determinaria a convocação de novas eleições.

Segundo Cid, Bolsonaro teria solicitado a Filipe Martins alterações na minuta e concordado com os termos ajustados, além de convocado uma reunião no dia 7 de dezembro de 2023 com os comandantes das Forças Armadas para apresentar a eles o documento para que aderissem à iniciativa.

Bolsonaro negou por diversas vezes ter conhecimento de uma minuta com esse teor.

•        'Virar a mesa antes da eleição'

Além disso, em um computador apreendido na residência de Cid, por exemplo, havia um vídeo de uma reunião de Bolsonaro com outros alvos da operação, como Heleno, Torres, Braga Netto e Nogueira, realizada em 5 de julho de 2022.

Moraes cita a reunião em sua decisão que autorizou a operação ao dizer que o episódio "nitidamente, revela o arranjo de dinâmica golpista no âmbito da alta cúpula do governo, manifestando-se todos os investigados que dela tomaram parte".

Na ocasião, o presidente reforçou as suspeitas sem provas de que haveria fraude eleitoral, e os presentes "ratificavam a narrativa mentirosa apresentada pelo então Presidente da República", de acordo com a decisão de Moraes.

Na reunião, Bolsonaro teria instado seus ministros a divulgar "desinformações e notícias fraudulentas quanto à lisura do sistema de votação, com uso da estrutura do Estado brasileiro para fins ilícitos e dissociados do interesse público".

O ex-presidente teria afirmado, no entanto, que as pesquisas estavam certas e que provavelmente Lula ganharia a eleição.

Heleno teria respondido que, para "virar a mesa", tem que ser "antes da eleição" e que era preciso “agir contra determinadas instituições e contra determinadas pessoas".

O general também teria, segundo os investigadores, discutido a possibilidade de agentes da Abin se infiltrarem nas campanhas eleitorais, mas Bolsonaro teria interrompido a conversa para que falassem sobre o assunto “em particular”.

Por sua vez, Nogueira teria afirmado que o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) seria um “inimigo” com quem o grupo estaria em "guerra".

Nogueira, então ministro da Defesa, teria dito que se reunia com os comandantes das Forças Armadas "para ver o que pode ser feito.

"Que ações poderão ser tomadas pra que a gente possa ter transparência, segurança, condições de auditoria e que as eleições se transcorram da forma como a gente sonha! E o senhor, com o que a gente vê no dia a dia, tenhamos o êxito de reelegê-lo e esse é o desejo de todos nós.”

•        A operação

Segundo a PF, estão sendo cumpridos ao todo 33 mandados de busca e apreensão, quatro mandados de prisão preventiva e 48 medidas cautelares.

Ainda conforme a PF, o Exército acompanha o cumprimento de alguns mandados.

De acordo com o portal UOL, o atual comandante do Exército, o general Tomás Paiva, afirmou internamente que quatro militares da ativa que estão na mira da operação serão afastados de suas funções.

As medidas da operação incluem a proibição de manter contato com os demais investigados e de se ausentarem do país, a entrega dos passaportes no prazo de 24 horas e a suspensão do exercício de funções públicas.

A operação está sendo realizada nos Estados do Amazonas, Rio de Janeiro, São Paulo, Minas Gerais, Mato Grosso do Sul, Ceará, Espírito Santo, Paraná, Goiás e no Distrito Federal.

As apurações apontam que "o grupo investigado se dividiu em núcleos de atuação para disseminar a ocorrência de fraude nas eleições presidenciais de 2022, antes mesmo da realização do pleito, de modo a viabilizar e legitimar uma intervenção militar, em dinâmica de milícia digital".

Segundo a polícia, houve uma construção e propagação de suposta fraude nas eleições de 2022, por meio da "disseminação falaciosa de vulnerabilidades do sistema eletrônico de votação, discurso reiterado pelos investigados desde 2019 e que persistiu mesmo após os resultados do segundo turno do pleito em 2022".

Também houve a "prática de atos para subsidiar a abolição do Estado Democrático de Direito, através de um golpe de Estado, com apoio de militares com conhecimentos e táticas de forças especiais no ambiente politicamente sensível".

Os fatos investigados configuram, em tese, os crimes de organização criminosa, abolição violenta do Estado Democrático de Direito e golpe de Estado.

Segundo a PF, a mesma organização criminosa também é investigada por:

•        ataques virtuais a opositores;

•        ataques às vacinas contra a covid-19 e às medidas sanitárias na pandemia;

•        uso da estrutura do Estado para obtenção de vantagens (o que inclui o caso das joias).

<<< Lula: 'Não teria acontecido sem Bolsonaro'

O presidente Lula da Silva afirmou nesta quinta-feira (8/2) que é um "dado concreto" que houve tentativa de golpe no Brasil.

Ao ser questionado, durante entrevista à Rádio Itatiaia, sobre se teria ocorrido envolvimento de Bolsonaro na suposta tentativa de golpe, Lula respondeu: "Acho que não teria acontecido sem ele."

Lula defendeu, no entanto, a presunção de inocência do ex-presidente.

"O que eu acho e que eu quero é que o seu Bolsonaro tenha a presunção de inocência que eu não tive. O que eu quero é que seja investigado e seja apurado. Quem tiver responsabilidade pelos seus erros, que pague seus erros", disse Lula.

"Queremos saber quem é que financiou, quem é que pagou, quem é que financiava aqueles acampamentos, para que a gente nunca mais permita que aconteça o ato que aconteceu no 8 de janeiro."

Por sua vez, o general Hamilton Mourão (Republicanos-RS), que foi vice-presidente de Bolsonaro e atualmente é senador, disse por meio da rede social X que a operação contra o ex-presidente e aliados é uma "devassa persecutória".

"Não podemos nos omitir, nem as Forças Armadas, nem a Justiça Militar, sobre esse fenômeno de desmando desenfreado que persegue adversários e que pode acarretar instabilidade no País."

Filho do ex-presidente, o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP) escreveu na mesma rede social que "a política do Brasil hoje é feita no Supremo Tribunal Federal".

A ex-primeira dama Michelle Bolsonaro fez referência a uma declaração da atual primeira-dama Janja da Silva ao comentar a operação.

Janja havia dito à militância do PT no final do ano passado que "se tudo der certo, logo Bolsonaro vai estar preso".

Em suas redes sociais, Michelle postou: ''Se tudo der certo... Se lembram? Pois bem...''.

 

Fonte: BBC News Brasil

 

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