Paulo Nogueira Batista Jr.: “Vamos retomar o
nosso quintal”
Sempre
digo que o Brasil não cabe no quintal de ninguém. Cheguei a publicar um livro
com este título. Nem todo mundo concorda, porém.
O
secretário de Defesa dos Estados Unidos, Peter Hegseth, declarou recentemente,
referindo-se à América Central e à América do Sul, que a influência da China
cresceu demais nessas regiões e que Trump “está retomando o nosso
quintal” (“we are taking our back yard back”).
Um
insulto. Hegseth, um ex-apresentador de televisão (!), é dos muitos trogloditas
arrogantes e ignorantes que integram o governo Trump, feitos todos eles à
imagem e semelhança do chefe. Nunca vi um governo tão confuso e incompetente
nos Estados Unidos.
O
chanceler da China, Wang Yi, respondeu bem, dizendo: “O que os povos
latino-americanos querem é construir o seu próprio lar, não ser quintal de
ninguém. O que buscam é independência, não doutrinas de dominação.”
Até
agora, que eu saiba, não houve nenhuma manifestação do Itamaraty…
O
que o governo Trump está tentando é ressuscitar o imperialismo à moda antiga,
na base de sanções, chantagens e ameaças, inclusive de intervenção militar.
Disparou a metralhadora giratória, atingindo inclusive aliados tradicionais (ou
satélites) dos Estados Unidos.
A
hipocrisia foi para o espaço. Há muito tempo, não se via algo assim. Trump não
acredita no valor da hipocrisia e isso tende a enfraquecê-lo
internacionalmente. O Império mostra a sua verdadeira natureza, sem disfarces,
sem véus protetores.
Note,
leitor ou leitora, que o imperialismo à moda antiga era às vezes mais sutil.
Theodore Roosevelt, que foi presidente dos EUA de 1901 a 1909 e executou
política externa nacionalista e agressiva, tinha como lema: “Speak softly
and carry a big stick” (“Fale suavemente e carregue um grande porrete”). Já
Trump “speaks loudly and carries a doubtful stick” (“fala alto e carrega
um porrete duvidoso”).
Os
Estados Unidos não têm mais o poder de antes. As ameaças e medidas unilaterais,
distribuídas sem critério e sem estratégia aparente, são sinais de fraqueza.
Mais do que isso: o governo Trump como um todo é sintoma agudo da decadências
dos Estados Unidos. O que tem feito até agora, ao invés de Make America
Great Again (MAGA), vai provavelmente acelerar o declínio do país.
A
economia vai sofrer. A volatilidade e arbitrariedade da política econômica
trumpista tendem a abalar os níveis de atividade e de emprego e aumentar
a inflação. A confiança das empresas e famílias diminuiu muito, criando o risco
de uma recessão nos Estados Unidos.
Por
outro lado, os Estados Unidos estão se isolando do ponto de vista geopolítico.
Que sentido faz, por exemplo, agredir e humilhar canadenses e europeus? Canadá,
Inglaterra e União Europeia sempre foram fiéis seguidores. Agora são tratados a
pontapés. Se objetivo principal é conter a China, não seria mais
inteligente contar com a cooperação desses países?
O
governo Trump me fez lembrar de uma previsão, de autoria incerta: “Os Estados
Unidos serão o primeiro país a passar da barbárie à decadência, sem conhecer a
civilização”. Trump é a face mais explícita de um país violento,
predominantemente tosco e muito problemático para si e para o mundo. A única
vantagem para nós do seu novo presidente, repito, é que ele torna totalmente
claro e mais vulnerável um projeto de dominação que já foi conduzido de maneira
mais sutil e eficaz em outras épocas. O soft power dos Estados
Unidos está sendo destruído como nunca.
Nada
que caiba lamentar. O enfraquecimento dos EUA é bem-vindo, por motivos óbvios.
·
E o Brasil?
Como
fica o Brasil, este país que pelas suas dimensões populacionais, territoriais e
econômicas, não cabe no quintal de ninguém? Como se comportará?
Aqui
temos um problema. Os brasileiros nem sempre estão à altura do Brasil. Grande
parte da elite brasileira, inclusive diversos integrantes do governo Lula,
cabem no quintal de qualquer um.
Um
exemplo: Armínio Fraga, ex-presidente do Banco Central. Há poucos dias, na
mesma ocasião em que propôs congelar o salário mínimo por seis anos em termos
reais, disse estar um pouco preocupado com o novo governo dos EUA, país que
sempre foi uma espécie de “estrela guia” para o resto do planeta…
Outro
episódio: um diplomata brasileiro, que faz parte da equipe que tenta negociar
com o governo Trump, lembrou que temos déficit comercial com os Estados Unidos,
concluindo que o Brasil deveria ser um exemplo e não alvo da política dos
Estados Unidos.
Como
dizia Brizola, “a elite brasileira é um lixo”.
Diante
do desafio que Trump representa, o governo brasileiro resolveu manter um perfil
baixo, tentando se fingir de morto. Compreensível. Os EUA ainda são poderosos,
o novo presidente americano é imprevisível e, mais grave, dá sinais de
desequilíbrio mental. As tarifas de importação impostas a nós foram
importantes, mas são pequenas quando comparadas às que estão sendo aplicadas a
muitos outros países. O Brasil não é um dos alvos principais de Trump.
Por
enquanto. Sendo um dos gigantes do mundo, o Brasil dificilmente consegue passar
despercebido. E a timidez excessiva pode ser vista como fraqueza e suscitar
novas e maiores agressões e medidas unilaterais por parte do bully que
preside os Estados Unidos.
Cuidado!
Temos as eleições de 2026 e parece provável que Trump resolva interferir para
trazer de volta ao poder os “patriotas” alinhados a ele.
¨
Sul Global pagará pela guerra fiscal de Trump, diz
economista
As
tarifas impostas pelo presidente norte-americano Donald Trump geraram um caos
econômico e pânico pelo mundo, principalmente em países em desenvolvimento que
dependem das exportações para os Estados Unidos.
“Embora
alguns bilionários e apoiadores possam ter lucrado ao interpretar corretamente
as postagens de Trump nas redes sociais antes de sua repentina reversão de
política, as interrupções no comércio e nas finanças globais causadas por suas
tarifas continuam a representar sérios riscos”, explica a economista Jayati
Ghosh, em artigo publicado no site Project
Syndicate.
Além
disso, a suspensão de algumas tarifas não barrou a tarifa universal de 10%
sobre todas as importações, juntamente com outras tarifas setoriais, como a
taxa de 25% sobre aço, alumínio, automóveis e autopeças.
Ao
serem tomadas de uma só vez, essas medidas não só vão reduzir a oferta de
produtos importados aos consumidores norte-americanos, como vão impor custos
elevados aos países exportadores – mas, em última análise, as tarifas impostas
a cada país dependerão de negociações futuras, nas quais se espera que os EUA
joguem duro.
“A
incerteza sempre foi um grande impedimento à atividade econômica, e a
imprevisibilidade das políticas do governo Trump – marcadas por tomadas de
decisão erráticas, reversões repentinas e anúncios intermitentes – tornou os
desenvolvimentos futuros quase impossíveis de prever usando modelos de risco
padrão”, ressalta a articulista.
Diante
desse quadro, é inevitável pensar que a incerteza gerada pelas táticas de
choque e pavor de Trump não comprometam o investimento, levando empresas a
arquivarem projetos e adiarem expansões enquanto os eventos se desenrolam.
“Assim
como em crises econômicas autoinfligidas anteriores, a economia dos EUA sem
dúvida sofrerá, mas o fardo mais pesado recairá sobre os países em
desenvolvimento. Pedidos de exportação cancelados ou atrasados já
estão minando a produção e alimentando o
desemprego”, ressalta a economista.
“As
lições para as economias em desenvolvimento são claras. Não apenas o comércio
globalizado está sendo afetado, mas a globalização financeira tende a se tornar
ainda menos atraente para os países que buscam financiamento estável e de longo
prazo para apoiar seus objetivos de desenvolvimento”, reitera Jayati Ghosh.
¨
Para negociar tarifaço, Trump escolhe líder da extrema
direita da Itália, Giogia Meloni
Donald
Trump escolheu a líder da extrema direita da Itália, Giogia Meloni, como a
primeira representante da Europa a dialogar presencialmente e tentar chegar a
um acordo para diminuir ou evitar o tarifaço mundial.
Apesar
de a porta-voz do continente sobre a ofensiva tarifária dos Estados Unidos ser
a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, quem manifestou
sobre a posição dos países europeus frente à guerra
comercial, até então, Trump não decidiu falar com Ursula, mas com a radical
primeira-ministra italiana, nesta quinta-feira (17).
O
encontro é esperado, pois decidirá o tom das negociações do presidente
norte-americano com aliados-chave de seu governo.
No
início do mês, a União Europeia propôs um acordo tarifário “zero a zero” ao
governo Trump em uma tentativa de amenizar as tensões comerciais e de impedir
taxações entre ambos os países em alguns setores, como carros e produtos
industriais. Mas não funcionou.
No
auto-denominado “Dia da Libertação”, o mandatário dos
EUA impôs tarifas de exportações em todo o mundo, incluindo taxas de 20% para a
Europa, que foram reduzidas a 10% em um período de negociação de 90 dias, no
início do mês. As lideranças agora estudam como negociar com os EUA para que, após
essa trégua de 3 meses, as taxas não subam novamente.
Em meio
a essas tentativas, a visita de Meloni à Casa Branca, nesta quinta (17), é
aguardada não somente entre ambos os países, mas por todo o continente. Meloni
se equilibra entre a afinidade política com o mandatário dos EUA e o objetivo
de reduzir as tarifas.
Nesse
sentido, a primeira-ministra da extrema-direita conversou com porta-vozes e com
a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, antes da reunião desta
quinta. Autoridades francesas expressaram preocupações no que seria uma
abordagem bilateral de Meloni, tensionando ainda mais as relações
transatlânticas.
Como a
Itália teve um superávit comercial de €40 bilhões com os EUA no ano passado (o
terceiro maior da UE, atrás apenas da Alemanha e da Irlanda), Meloni tem
incentivos econômicos significativos para buscar uma resolução. Sua estratégia
deve envolver destacar os fortes laços econômicos entre EUA e Itália, e não
necessariamente o benefício do bloco europeu como um todo.
Fonte: Jornal GGN

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