segunda-feira, 21 de abril de 2025

Gilberto Menezes Côrtes: Congresso é uma casa de barganhas

Gentil Cardoso, um folclórico treinador de futebol dos anos 50 e 60, criou uma máxima para intuir a colaboração entre os jogadores: "Quem se desloca, recebe; quem pede tem a preferência". Na política, a colaboração visando o múnus público foi deixada de lado pelo interesse próprio. Para se eternizarem na vida pública e reforçarem seus cacifes eleitorais nos estados de origem ou onde fizeram carreira política, nossos políticos, graças ao empoderamento do "Orçamento Secreto", adotaram - não no sentido largo, mas no sentido estrito (ou estreito) - a máxima do líder criador do "Centrão" na Assembleia Nacional Constituinte, deputado Roberto Cardoso Alves, o "Robertão", que se elegeu em 1986 pelo MDB-SP. Dizia "Robertão", que aglutinou os interesses retrógrados e conservadores contra as propostas modernizadoras para serem inscritas na Constituição de 1988: "É dando que se recebe".

Nascido em Aparecida (SP), em 1927, Roberto Cardoso Alves representava os católicos e foi eleito, em 1962, deputado estadual pelo Partido Democrata Cristão. Em 1966, foi eleito deputado federal pela Arena (o partido do regime militar, quando a ditadura impôs o bipartidarismo e extinguiu as antigas siglas - PTB, PSD, UDN, PTN, PL, PCB, PSB, e PSP). Entretanto, quando o governo do marechal Costa e Silva quis cassar o deputado e jornalista Márcio Moreira Alves, por ter feito discurso na Câmara defendendo que as mulheres, repetindo o famoso episódio abordado por Chico Buarque de Holanda em "Mulheres de Atenas", evitassem namorar militares - era véspera do 7 de Setembro -, a caserna pediu a cabeça do deputado "Marcito", como era conhecido. Pois Roberto Cardoso Alves se manifestou contra a cassação e foi também cassado. Voltou à política em 1977, como vereador da capital paulista pelo MDB, partido pelo qual se elegeu em 1986 pelo MDB, que era o partido de Tancredo Neves e do vice-presidente, José Sarney, que assumiu o poder com a internação e morte de Tancredo, em 1985. Sarney presidiu a Arena quando "Robertão" foi cassado e depois se reencontraram no MDB, quando Sarney renunciou à presidência do PDS e fundou o PFL com Antônio Carlos Magalhães e outros políticos, viabilizando a vitória de Tancredo contra Maluf, do PDS. Ambos pertenciam, portanto, à ala conservadora do MDB na Constituinte.

O que chama a atenção nesses quase 40 anos de intervalo é que em 1986, um dos grandes poderes conservadores do Brasil, além dos latifundiários do agronegócio, defendidos pela União Democrática Ruralista (UDR), que temia as invasões de terra do MST, era a Igreja Católica. Mas a pregação de Jesus Cristo sempre foi dar sem exigir nada em troca. O troca-troca praticado por "Robertão" à frente do "Centrão" não rendeu apenas a Roberto Cardoso Alves o convite para ser ministro da Indústria e do Comércio, em 1988. Antes do fim do governo Sarney foi deslocado para a pasta do Desenvolvimento Industrial, Ciência e Tecnologia (lembra a contradição do Dr. Zaius, em "O Planeta dos Macacos", que enfeixava numa mesma pasta a "Ciência e a Religião").

O fato é que a ascensão das igrejas evangélicas, que viraram o maior curral eleitoral nas periferias e nos grandes centros, num país eminente urbano - em 1990 a taxa de urbanização saltou de 66%, em 1980, para 74% e agora estamos com mais de 85% -, mudou radicalmente o modo de fazer política no Brasil. O PT, que surgiu no fim dos anos 70, muito ligado às comunidades eclesiais de base - a ala progressista da igreja Católica -, perdeu espaço para os evangélicos. Os episódios mais recentes da atuação do Congresso - como a coleta de assinatura pelo deputado Sóstenes Cavalcante (PL-RJ), porta-voz do pastor Silas Malafaia, para um Projeto de Lei de Anistia que mais beneficia o ex-presidente Jair Messias Bolsonaro (antes mesmo de ser julgado) do que os que já foram condenados, e a interrupção, por 60 dias, do processo de cassação do deputado federal Glauber Braga (Psol-RJ), por acordo do presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta (Republicanos-PB), mostram como a Câmara e o Congresso, como um todo, se transformaram solidamente em uma feira de barganha.

No interior, o matuto diz que a reunião de vendedores e compradores que querem fazer do escambo uma moeda de troca (com acerto de dinheiro das eventuais diferenças) é um "encontro de berganhistas". Nosso Congresso foi além da máxima de "Robertão". Com o poder do Orçamento Secreto que pôs na mão dos parlamentares (513 na Câmara e 81 no Senado) mais de R$ 50 bilhões em verbas para cevar seus currais eleitorais, o poder dos evangélicos se realimenta a cada eleição porque o político recebe antes de dar. Pobre Brasil.

<><> Trump X Powell, o que diz a Faria Lima

Estranho a Faria Lima, meca do sistema financeiro brasileiro, que tanto reclamava das críticas do presidente Lula aos juros elevados no Brasil, que tolhem o crescimento da economia (Desde o primeiro mandato, em 2003, Lula criticava a austeridade do BC e ainda tinha o vice, José de Alencar, como o principal crítico dos juros bancários), e se armou de paus e pedras quando Lula, em seu terceiro mandato, criticou o presidente Roberto Campos Neto, por manter os juros altos, se calar quando Donald Trump ameaça destituir Jerome Powell da presidência do Federal Reserve Bank, o BC dos Estados Unidos.

O principal argumento contra o Lula III era de que o Banco Central do Brasil se tornara uma instituição independente do Executivo com a aprovação da Lei Complementar 179, de 24 de fevereiro de 2021. Mas o mandato de Campos Neto foi cumprido até o último dia – 31 de dezembro de 2024, bem como os quatro anos para os demais diretores. No momento, restam dois diretores indicados no governo Bolsonaro, cujos mandatos expiram em 31 de dezembro de 2025. A independência não é sinônimo de infalibilidade. E assim como criticava a demora de RCN em baixar os juros, Lula pode criticar Gabriel Galípolo, que indicou para a diretoria de Política Monetária, em 2023, e que assumiu a presidência em 1º de janeiro de 2025, por escalar a taxa Selic - o piso do sistema financeiro do Brasil, atualmente em 14,25% ao ano.

<><> Dois casos distintos

Donald Trump enfiou os pés pelas mãos ao adotar duas medidas polêmicas e altamente inflacionárias na largada do seu governo, em 20 de janeiro de 2025: a deportação de imigrantes (com largo conceito de ilegalidade) e o tarifaço às importações, com sucessivos recuos quando os tiros saíram pela culatra, como advertiam economistas mais atilados. Com a interrupção das cadeias produtivas, a inflação tende a subir e a economia e o emprego desacelerarem.

Para evitar o naufrágio, Trump quer que o Fed baixe os juros da faixa atual de 4,25% a 4,50% ao ano para impedir uma temida recessão. Mas o mandato do Fed recomenda cautela para que a inflação (causada por Trump) não exploda (está em 2,4%). Diante do dilema que criou, o presidente americano quer atropelar as leis de seu país e ameaça destituir Jerome Powell da presidência do Fed, cujo mandato fixo expira em maio de 2026.

O problema é duplo, segundo o ”Wall Street Journal”, pois não está claro se o presidente tem autoridade legal para demitir Powell antes do fim de seu mandato no ano que vem. E a guerra comercial de Trump tornou os cortes de juros mais difíceis por enquanto, porque o Fed teme que medidas para sustentar a economia possam agravar a inflação, um de seus compromissos.

Segundo o “WSJ”, o presidente Trump vem discutindo em particular há meses a demissão do presidente do Federal Reserve, Jerome Powell, de acordo com pessoas familiarizadas com o assunto, mas ele ainda não tomou uma decisão final sobre se tentará destituí-lo antes do fim de seu mandato no ano que vem. Em reuniões no clube privado do presidente na Flórida, Mar-a-Lago, Trump conversou com Kevin Warsh, ex-governador do Fed (de 2006 a 2011) sobre a possibilidade de demitir Powell antes do fim de seu mandato e possivelmente escolher Warsh como seu substituto, disseram fontes próximas a Trump.

<><> O que diz a lei nos EUA

O Federal Reserve (Fed) é o banco central dos EUA, criado pela Lei do Federal Reserve, de 1913, para estabelecer um sistema monetário que pudesse responder eficazmente às tensões no sistema bancário. O Sistema do Federal Reserve inclui o Conselho de Governadores, uma agência federal localizada em Washington, DC, e 12 Bancos da Reserva Federal em todo o país. É antes de tudo, uma agência do governo federal, que se reporta e é diretamente responsável perante o Congresso.

O Conselho de Governadores é administrado por sete membros, ou "governadores" que cumprem mandatos escalonados de 14 anos, que são nomeados pelo presidente dos Estados Unidos e confirmados em seus cargos pelo Senado dos EUA. Do colegiado de sete são escolhidos um presidente e um vice-presidente, que podem ser nomeados para um ou mais mandatos adicionais de quatro anos;

Orienta a operação do Sistema da Reserva Federal para promover os objetivos e cumprir as responsabilidades atribuídas ao Sistema da Reserva Federal pela Lei da Reserva Federal; supervisiona as operações dos 12 Bancos de Reserva e compartilha com eles a responsabilidade de supervisionar e regular certas instituições e atividades financeiras; e

O Sistema da Reserva Federal desempenha cinco funções essenciais que atendem a todos os americanos e promovem a saúde e a estabilidade da economia e do sistema financeiro dos EUA. Ele conduz a política monetária do país, promove a estabilidade do sistema financeiro, supervisiona e regula as instituições financeiras, promove a segurança e a eficiência dos sistemas de pagamento e liquidação e promove a proteção ao consumidor e o desenvolvimento comunitário.

Os 12 Bancos da Reserva Federal, que operam em todo o país para ajudar a garantir que todas as condições e perspectivas econômicas das famílias, comunidades e empresas informem as políticas, ações e tomadas de decisão da Reserva Federal. Em sistema de rodízio, os 12 membros votantes de todo o Sistema atuam no Comitê Federal de Mercado Aberto (FOMC em inglês), e ajudam a definir, a cada 45 dias, a política monetária crucial dos EUA.

O FOMC serviu de inspiração ao Comitê de Política Monetária do Banco Central (Copom), que é composto por nove membros (um presidente e oito diretores do BC) e se reúne também a cada 45 dias (geralmente na mesma data do FOMC) para definir a política monetária e o piso dos juros no Brasil. Como as reuniões do Fed terminam às 15 horas, o Copom tem mais três horas para decidir.

O Banco Central do Brasil foi criado em 31 de dezembro de 1964, pela Lei 4.595. da Reforma Bancária, enfeixando atividades da antiga Superintendência da Moeda e do Crédito (Sumoc), do Banco do Brasil (até então caixa do Tesouro e depositário das reservas bancárias) e do Tesouro Nacional. Decorridos 90 dias, o BCB começa a operar em abril de 1965, tendo Dênio Nogueira como primeiro presidente (com mandato fixo) no governo do marechal Castelo Branco, o primeiro do regime militar.

Com a posse do marechal Costa e Silva, em março de 1967, com Antônio Delfim Neto no Ministério da Fazenda, assume o Banco Central o economista Ruy Leme em 31 de março de 1967. Mas o país tinha passado por uma “quebradeira”. Com muitas reformas e o controle rígido do crédito do Banco do Brasil (de 1965 e 1966) houve uma onda de falências e concordatas, no período de saneamento financeiro e fiscal empreendido pela dupla Octávio Gouveia de Bulhões (Fazenda) e Roberto Campos (Planejamento). O ministro da Indústria e do Comércio, Paulo Egydio Martins, batizou a fase de “falências purificadoras”.

O marechal Costa e Silva queria que seu governo – com a economia saneada – marcasse uma fase de “pisar no acelerador”. Mas Ruy Leme, no Banco Central, mantinha a ortodoxia monetária e relutava em reduzir os encaixes compulsórios para facilitar os empréstimos bancários. E alegava que tinha um mandato fixo. Costa e Silva, que no fim de 1968 baixou o AI-5, o mais draconiano dos atos institucionais autoritários, não fez por menos: em 12 de fevereiro de 1968, demitiu Ruy Leme e acabou com a independência do Banco Central. A diferença é que a Lei de um período antidemocrático é feita por quem comanda o Poder.

Trump quer ser ditador dos EUA e do mundo?

¨      A hora de o Brasil ser parceiro. Por Adhemar Bahadian

Vejamos os fatos: Trump esperava um telefonema chinês. Não veio. Trump esperava um apoio popular a sua política. Ao contrário, os americanos começam a correr aos supermercados com temor da escassez e da alta de preços. Trump esperava o consentimento dos super-ricos. O mercado financeiro entra em arritmia galopante. Trump esperava que as operações das obrigações do Tesouro americano se mantivessem estáveis e confiáveis. Esta semana, fluxos financeiros se dirigem à Alemanha. Trump conseguiu abalar a confiança não só das "velhinhas americanas" no Tesouro americano, mas grandes capitalistas começam a vender suas posições. Musk à frente.

Em pouco mais de 100 dias, Trump tornou os Estados Unidos um Estado chamado ora de “pária”, ora de “mafioso”. Não apenas por opositores, mas por revistas reconhecidamente conservadoras como o “The Economist”, jornais como o ‘The Guardian” ou “The New York Times”. Trump, sexta-feira à noite, unilateralmente, resolveu suspender as tarifas aplicadas a produtos tecnológicos exportados pela China. Trump não só piscou. Precisa de um oftalmologista.

Em entrevista à imprensa mundial, por ocasião da visita do primeiro ministro da Espanha, o mandatário chinês mencionou o presidente Lula como uma das principais vozes em defesa do sistema internacional justo e equilibrado.

A agenda de viagens de Lula demonstra a aceitação do papel do Brasil como interlocutor leal e construtivo. A viagem ao Japão e ao Vietnã resultou em claras reafirmações da soberania dos Estados e do reconhecimento da primazia do Direito Internacional Econômico.

Lula deverá avistar-se ainda com Xi Jinping, com autoridades europeias e ainda outros líderes, como Macron. Mais importante de tudo, Lula receberá os chefes de Estado dos Brics, em julho, no Rio de janeiro, talvez a mais importante reunião internacional deste ano de 2025.

Esta agenda indica a reconhecida importância do Brasil e reafirma a confiança da comunidade internacional na capacidade de agregação de Lula, porta-voz inequívoco da melhor Diplomacia hoje disponível no mundo. Cordial, negociadora, cumpridora de seus compromissos internacionais, defensora da Democracia, do comércio justo e equlibrado, consciente de que só o desenvolvimento social e o controle dos fenômenos climáticos poderão nos fazer sair do maior e mais ameaçador futuro.
Uma força não-armada, em consonância com as aspirações maiores de paz universal do povo brasileiro.

Agrego a esses fatos, recentes pesquisas de opinião de órgãos nacionais que confirmam a inabalável solidariedade do povo brasileiro com o regime democrático, com uma maior justiça tributária em que os ricos tenham maior contribuição para o desenvolvimento social equilibrado e o apoio explícito ao papel construtivo do Brasil no cenário internacional.

E aqui há uma constatação a se impor. Lula fala em consonância com as aspirações de seu povo, além e acima de eventuais opções partidárias que numa Democracia é de praxe.

Impossível também não reconhecer - e o melhor exemplo é o da Alemanha - que as ideologias de extrema polarização começam a perder força. O novo governo alemão governará com maioria sem a participação da extrema direita no Poder.

Neste ponto, registro como altamente alentador, que o registro autoritário e autárquico imprimido por Trump nos Estados Unidos da América não provocou senão repúdio mundo afora, esgotado como as movimentações bélicas na Faixa de Gaza, na Ucrânia e em alguns países da África. E sempre ameaçador no Oriente Médio.

Igualmente, claramente repudiada a política de ameaça à soberania de países, aliados ou não, de invasões ao direito soberano sobre seus territórios como estamos a ver nas ameaças ao Canadá ao Panamá e à Groelândia. Mesma incoerência observada em relação à Carta das Nações Unidas e ao abandono da ajuda ao desenvolvimento e à saída intempestiva da Organização Mundial da Saúde.

Sabe-se, ademais, que está nos planos maquiavélicos de Trump promover reestruturação da política industrial das grandes empresas farmacêuticas, trazendo-as de volta aos Estados Unidos em grande prejuízo para a assistência sanitária internacional.

Há certamente quem haverá de ler maliciosamente estas linhas como uma confirmação de uma possível ideologia antiamericana. Nada mais fora da realidade. Sou, claramente, contra as políticas de Trump em gênero, número e grau. Até porque hoje já não há dúvidas de que elas se baseiam em autoritarismo e falsas percepções políticas e econômicas. E tenho os melhores cientistas políticos e econômicos a meu lado.

Acredito que é chegada a hora de o Brasil reafirmar sua contribuição ao bom-senso. E o que estamos a fazer me parece digno de todo apoio e aplauso de nosso povo.

Até porque, nesta hora, replicar erros que estamos a testemunhar seria uma atestado de incurável indigência intelectual. E sobretudo de reles subserviência.

 

Fonte: Jornal do Brasil

 

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