terça-feira, 22 de abril de 2025

Dóris Faria: Brasil - país do vale tudo?

O vale tudo no Brasil não é só um objeto de duas edições de novela, é um processo histórico recorrente de nosso passado, presente e será que ainda do futuro? A começar com a própria Proclamação da República (1889), que, desde então, sofre algumas ocorrências em processo contínuo, sob o controle das elites econômicas que dominam as políticas regionais e nacionais. Foram várias as tentativas de golpe que não tiveram punição e, mutatis mutante, se repetiram. Com anistia garantida a todos seus executores, essas recorrências foram acontecendo ao longo de nossa história republicana. 

Três períodos podem ser compreendidos com similaridades e diferenciações do vale tudo que vem dominando a nação brasileira: o primeiro, ao longo da ditadura (anos 60 a 80), garantiu aos militares torturadores a isenção de um processo de anistia; o segundo — a partir de 1985, no início do processo de democratização, conclusão da nova Constituição (1988) — ocorreu até 2002, com a primeira eleição presidencial direta e o (primeiro) governo Lula.

Por fim, houve um terceiro momento do vale tudo nacional, que teve início no segundo governo Lula e chegou aos tempos mais recentes, com o domínio do Congresso Brasileiro por elites econômico-empresariais que tanto levaram à ocorrência de processos como o Mensalão e o Petrolão, como à posterior deposição da presidenta Dilma Rousseff.

Mas não só, vale tudo também ocorre com a entrega total dos governos a um Centrão conjugado a outros partidos políticos, inclusive de uma direita mais radical. Não exclui o atual governo Lula, que continua patinando com as elites.

Trata-se de momentos similares, apesar de algumas diferenças quanto aos detentores pessoais do poder que continuam a realizar o que venha a ser interesse lucrativo em detrimento de demandas nacionais. No "mostra a sua cara", o Brasil atual continua o mesmo: dos poderes voltados às elites e do povo abandonado.

A novidade atual é que, pela primeira vez, está em curso uma proposta de anistia preventiva — dado que o crime de tentativa de golpe ainda não foi julgado e, portanto, ainda não há sequer a condenação de seus mentores. Esse novo vale tudo entrou em ritmo acelerado de execução num Congresso Nacional turbinado com mais de R$ 50 bilhões, vantagem ganha mesmo após o fim do financiamento privado que tanto o corrompia, e com uma nova aliança dos políticos em exercício, representantes das novas elites (bélica, do agronegócio e evangélicos).

Começa-se a acelerar uma tentativa que visa não só a "anistia preventiva" dos mentores do ataque à democracia. Configura-se, ainda, a vingança especial ao Supremo Tribunal Federal (STF) pela condenação e, também, pela vigilância ao descontrole nas emendas parlamentares.

Essa nova edição do vale tudo Brasil dependerá, além da anistia preventiva, do que vier a acontecer em breve com relação às votações de políticas redistributivas em curso no Congresso. Já se sabe que as riquezas nacionais deverão continuar, no campo legal, a serem direcionadas para  elites donas da dívida interna, que gozam de subsídios tributários empresariais e a quase total isenção de impostos de renda pessoal e familiar.

E no campo ilegal? Será que continuarão, por exemplo, os desvios de recursos públicos por "propinas" e "rachadinhas"? Negarão a isenção de impostos para os pobres e remediados de renda até R$ 5 mil, compensada pelo aumento compensatório da hoje parca tributação dos rendimentos que sejam maiores que R$ 50 mil mensais ou milhão anual?

Ressalte-se que o período proposto para o tal projeto de anistia preventiva antecede, em meses, os atos golpistas de 8 de janeiro de 2023. Sem dúvidas, denunciando que nada é em defesa da massa popular manejada nos atos de vandalismo, mas direcionado para o tal grupo político militar que os controlava. Nesse lamaçal, nós, o real povo brasileiro, derrapamos, há centena de anos, num potentíssimo vale tudo em defesa dos privilégios dominantes. Aguardemos as cenas dos próximos capítulos: Brasil, mostra a tua cara!

•        As prostitutas de Kim Kataguiri. Por Ricardo Nêggo Tom

Se não tivesse se casado recentemente com a vereadora Amanda Vettorazzo, aquela que criou um Projeto de Lei com o objetivo de proibir que a Prefeitura de São Paulo contrate artistas do funk e do trap, eu diria que o “nipo-brasileiro” Kim Kataguiri é mais um incel que odeia mulheres devido à rejeição sofrida por parte delas. O seu projeto que visa proibir a prostituição em vias públicas (PL 778/2025), não passa de mais um ataque da extrema-direita às liberdades individuais, na tentativa de estabelecer um Estado autoritário que controle o ir e vir das pessoas sob a égide do combate a insegurança em áreas residenciais.

A pergunta que não quer calar é: desde quando a presença de prostitutas nas ruas causou insegurança à população? Elas cometem delitos no exercício de sua função? Roubam e agridem pessoas que passam pelas ruas onde elas oferecem os seus préstimos? Quantos crimes temos notícias de que foram cometidos por prostitutas que trabalham nas ruas? Pergunto isso porque uma das alegações do deputado do União Brasil é a de que “ninguém tem o direito de transformar a rua em zona de prostituição e prejudicar quem mora ou trabalha no local”. Para piorar um pouco mais a sua argumentação, o defensor do nazismo como liberdade de expressão associa todos os pontos de prostituição de rua ao tráfico de drogas e perturbação do sossego, defendendo a prisão de quem exerce tal atividade.

Kataguiri admite que a prostituição é uma atividade reconhecida pelo Ministério do Trabalho e registrada na Classificação Brasileira de Ocupações como “profissional do sexo”, mas, segundo a sua interpretação, ela precisa seguir parâmetros legais. Talvez, se as mulheres fossem ucranianas refugiadas em busca de socorro em meio à uma guerra em seu país, elas estariam legalmente amparadas para ocupar as ruas e serem comercializadas, mesmo não estando oferecendo serviços sexuais. Seria a jurisprudência de Arthur do Val, ativista do MBL e amigo de Kim, que foi fazer turismo sexual na Ucrânia com dinheiro público, na intenção de se aproveitar do desespero de mulheres de vaginas rosadas que, em condições normais, jamais dariam trela para os incels ideológicos de tal movimento.

Kim Kataguiri pode estar comprando briga com gente importante que contrata ou que lucra com a prostituição nas ruas. Ronaldo Fenômeno não gostou da ideia (perco o gol, mas não perco a piada) A Polícia Militar também não. Para quem não sabe, a rua costuma ser paga por essas pessoas que se prostituem em vias públicas. Isso mesmo que você leu. Mesmo as vias sendo públicas, é preciso pagar uma taxa para trabalhar com prostituição nelas. Seja para um cafetão ou cafetina, ou para um agente de segurança do Estado. Em ambos os casos, a taxa garante a segurança dos profissionais do sexo. Pesquisando a questão para escrever este artigo, encontrei o relato de uma profissional do sexo onde ela revela que um cliente teve que pagar R$ 300,00 para policiais militares não o enquadrarem no crime de ato obsceno e atentado ao pudor, ao ser flagrado transando com ela dentro do seu carro numa via pública.

Esse PL pode trazer diversas complicações para pessoas comuns, sobretudo, para aquelas que integram grupos minoritários. É preciso questionar como se dará a identificação de alguém que esteja oferecendo serviços sexuais nas ruas. Numa sociedade hipocritamente conservadora e que defende a manutenção de estereótipos, principalmente, em questões de raça, gênero, classe e sexualidade, uma mulher que esteja parada numa esquina vestida com uma roupa considerada inadequada, poder sofrer o constrangimento de uma abordagem policial sob suspeita de estar se prostituindo. E se ela for esposa de algum policial e estiver apenas esperando o seu marido passar para buscá-la? Temos um claro exemplo de como o ir e vir de muitas pessoas estará em risco e submetido a avaliação do Estado.

A extrema-direita brasileira criou uma espécie de guerra-fria interna, para tentar estabelecer sua ideologia e promover um retrocesso social, civilizatório e humanitário no país. Revogar direitos e conquistas adquiridos pelas chamadas minorias, é o principal objetivo desse conservadorismo que tem como principais expoentes, seja no campo político ou religioso, figuras abjetas e amorais que tentam colocar a moralidade que eles não possuem, acima da legalidade que não conseguem admitir. A manutenção de padrões que limitam a liberdade e o direito à igualdade por determinados grupos, é o ideal que move a extrema-direita. Onde quer que haja um ser humano se sentindo livre, vivendo à sua maneira, e tendo esse direito garantido por lei, lá estará um hipócrita conservador defendendo o controle dessa liberdade em nome de Deus, da ordem, da moral, dos bons costumes.

Foi assim quando os escravizados africanos foram libertos, quando as mulheres adquiriram independência, quando a união entre LGBTS foi reconhecida, quando os mais pobres começaram a ser justiçados socialmente por políticas inclusivas. Não faço apologia à prostituição. A preocupação é alertar aos mais desavisados com relação ao “Conto da Aia” e ao estado policialesco que se avizinha em nossa sociedade por meio do controle de corpos pobres, pretos, femininos e trans. Castos ou prostituídos, eles ainda são indesejáveis à elite fascista e representam forte resistência ao seu projeto de poder conservador, teocrático, fundamentalista, neoliberal e opressor de gêneros, sexualidades e liberdades. Uma agenda perversa em defesa do tradicionalismo e da exclusão.

•        Zoe Martinez, vereadora bolsonarista, é alvo de ação por chamar professores de "vagabundos"

A vereadora Zoe Martinez (PL-SP) virou alvo de uma ação movida pela deputada federal Luciene Cavalcante (PSOL-SP) por atacar professores que faziam uma manifestação pacífica em frente à Câmara Municipal de São Paulo na quarta-feira (16).

Segundo a deputada, Zoe "se manifestou de forma ofensiva e desrespeitosa ao se referir ao movimento grevista de professores públicos municipais, chamando-os de 'vagabundos'".

"As declarações da vereadora não apenas desmerecem o importante trabalho dos profissionais da educação, mas também desrespeitam o legítimo exercício do direito de greve. Os professores buscam, por meio da greve, reivindicar melhores condições de trabalho e assegurar a valorização de sua profissão, fundamental para a formação dos cidadãos", diz a deputada na ação protocolada junto ao Grupo de Atuação Especial da Educação (Geduc) do Ministério Públido de São Paulo (MP-SP).

A ação pede que a bolsonarista seja investigada por crime contra a honra de funcionários públicos, que pode resultar em até 1 ano e meio de prisão.

"A conduta da Representada, além de configurar os crimes de injúria e difamação, previstos em arts. 139 e 140, CP, contêm as agravantes de terem sido cometidas contra funcionário público por meio que facilite a divulgação e por ter sido divulgada por redes sociais", diz a deputada.

Luciene também apresentou um Projeto de Lei Complementar (PLC) na Câmara para inserir um artigo no Código Penal "agravando e qualificando os crimes contra a honra e lesão corporal contra profissionais da educação".

"No Brasil, estudos têm demonstrado um aumento significativo da violência contra profissionais da educação. De acordo com uma pesquisa realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), cerca de 34% dos profissionais da área afirmaram ter sido vítimas de agressões verbais, enquanto 18% relataram ter sofrido agressões físicas. Esses dados alarmantes evidenciam a urgência de medidas efetivas para proteger esses profissionais", diz a deputada, que é professora da rede pública, ao justificar o projeto que pede prisão de até 5 anos por crimes contra profissionais da educação.

 

Fonte: Correio Braziliense/Brasil 247/Fórum

 

Nenhum comentário: