quinta-feira, 3 de outubro de 2024

Mídias contra-hegemônicas são perseguidas por expor a hipocrisia da narrativa ocidental

Em entrevista à Sputnik Brasil, analistas apontam que as mentiras do Ocidente não mais convencem boa parte do mundo graças à atuação de mídias contra-hegemônicas, sediadas sobretudo em países do Sul Global.

Em meados de setembro, os EUA impuseram novas sanções à Rússia, desta vez mirando a Sputnik e sua empresa-mãe, o grupo de comunicação Rossiya Segodnya.

Poucos meses antes, Israel enviou soldados para fechar o escritório da Al Jazeera em Tel Aviv, confiscando os equipamentos da emissora catari. Os veículos atingidos têm em comum o fato de atuarem na divulgação do outro lado dos conflitos nos quais esses dois países estão envolvidos.

Em entrevista à Sputnik Brasil especialistas analisam se a censura se tornou a nova frente de batalha entre as potências hegemônicas e o Sul Global e como as ações de EUA e Israel afetam a imagem do Ocidente como suposto bastião da liberdade de expressão.

Bruno Lima Rocha, cientista político, jornalista profissional e professor de relações internacionais, destaca a presença da cobertura jornalística em temas que são espinhosos para o Ocidente, como o conflito ucraniano e a ofensiva israelense na Faixa de Gaza.

Ele chama atenção para o impacto gerado pela morte de mais de 100 jornalistas, incluindo profissionais da Al Jazeera, em Gaza.

"É muito impactante, porque o pessoal está cobrindo em Gaza não só de colete azul, mas escrito Press [imprensa] em letras gigantes. Ainda assim as chamadas armas inteligentes de Israel atingem os e as colegas", afirma.

Rocha diz que a censura à Al Jazeera se deu porque as imagens transmitidas das ações de Israel minavam o "discurso moralmente superior" de Tel Aviv e faz um paralelo com a perseguição aos judeus durante o nazismo.

"Você imagina os campos de concentração [nazistas], as câmaras de gás sendo transmitidas em tempo real, é a mesma coisa. Não há como manter hegemonia sem discurso moralmente superior ou hipocritamente com moral superior e creio que isso o Ocidente está perdendo."

Rocha afirma que a hegemonia cultural do Ocidente por vezes afeta as narrativas de profissionais da imprensa, e alerta que "quem não tem o mínimo de treinamento e está sob hegemonia cultural do Ocidente em todos os níveis confunde propaganda com informação e retórica com fato".

"A gente tem uma confusão enorme. Porque, em tese, quem faz mídia e mídia hegemônica nos países ocidentais reproduz o discurso do Departamento de Estado [dos EUA]. Mas tendo mídia contra-hegemônica [...] a gente consegue confrontar com o fato do que é a propaganda de guerra."

·        EUA e países da OTAN promovem 'jornalismo de guerra'

Para João Cláudio Pitillo, professor de história e pesquisador do Núcleo de Estudos das Américas (Nucleas) da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), "não só existe uma guerra de retórica em andamento, como os países da OTAN perceberam que seus veículos de imprensa não são mais os principais formadores de opinião no Sul Global".

"A calamidade que se tornou a guerra da Ucrânia e o massacre israelense em Gaza e agora no Líbano tem feito com que a popularidade dos EUA, França e Inglaterra entre numa espiral de declínio. Porque esses países não se pronunciam contra a guerra, se tornaram fomentadores desse conflito e não conseguem oferecer uma solução nem política nem militar, já que a guerra a qual eles decidiram se somar não consegue vitórias no campo de batalha, muito menos entre as sociedades", afirma.

Ele ressalta que países capitalistas ocidentais nunca defenderam verdadeiramente a liberdade de expressão, e avalia que o que fizeram na realidade foi usar esse conceito como "uma retórica política, que servia muito mais para enquadrar, punir e perseguir países que se opunham à hegemonia desse capitalismo central".

"A política desses países, hoje liderada pela OTAN, é uma política de dupla moral. Aquilo que eles pregam para esses países que são vistos como inimigos, não é seguido internamente. A perseguição aos veículos russos mostra que os EUA têm perdido a batalha pela verdade, estão vendo as suas mentiras não convencerem mais boa parte do mundo."

Na avaliação de Pitillo, o trabalho desenvolvido por veículos como a rede Al Jazeera, Sputnik, HispanTV e agência SANA há anos expõe a hipocrisia da retórica ocidental, desde a invasão do Iraque. Segundo ele, com o avanço da Internet isso ficou ainda mais nítido e hoje elas conseguem massificar o contraponto às mentiras produzidas por EUA e OTAN.

"Os EUA perderam o controle. Por mais que os EUA e os países da OTAN tenham o algoritmo das principais redes sociais trabalhando a seu favor, eles não conseguem mais dominar o trânsito dessas informações que são contra-hegemônicas."

Pitillo acrescenta que as tentativas dos EUA e aliados de "calar canais que hoje têm um trabalho contra-hegemônico mostra que esse trabalho está sendo muito importante, que ele está incomodando".

"Durante muitos anos, esses países tiveram um controle hegemônico da informação [...] E as mídias contra-hegemônicas, que hoje estão situadas nos países do Sul Global, cumprem um papel importantíssimo para mobilizar a opinião da população contra esse uso da informação por parte dos EUA, que lidera essa corrida, como arma. Isso se tornou o jornalismo de guerra", explica.

·        A falsa liberdade de imprensa dos EUA

Hugo Albuquerque, jurista e editor da Autonomia Literária, destaca que os EUA começaram "a usar as grandes redes de hard news como arma política nos anos 90, com a guerra do Golfo, a segunda guerra do Iraque".

"Eles usaram desse artifício sob os auspícios da sociedade de imprensa e da globalização para interferir no mundo. Então claro que os outros países que se desenvolveram na globalização passaram a criar também os seus canais de comunicação estratégica dando a sua visão a respeito dos fatos globais. Isso se tornou uma ameaça porque é óbvio que uma coisa é você falar em globalização e a CNN ou a Fox News ser a grande rede de TV global, que não é global coisa alguma, são redes americanas. Outra coisa é a Rússia, os árabes e os chineses começarem a ter os seus equivalentes da CNN dando a sua perspectiva das coisas", afirma.

Ele sublinha que isso demonstra o quanto a "história de liberdade de imprensa e globalização dos Estados Unidos é falsa".

"O que a gente está vendo agora em jogo, como eles não têm como disputar a narrativa, eles estão eliminando os canais que dariam uma visão alternativa do mundo. Por isso, lançam sanções, cortam sinal. É um fato curioso no mundo, mas o que está em jogo é uma luta dos EUA para manter essa hegemonia unipolar e eles, junto com seus aliados, estão jogando com todas as armas que têm. Uma delas é cortar canais, o sinal, sancionar grupos de mídia, contradizendo todo o discurso de liberdade imprensa", conclui.

<><> Kremlin denuncia 'caçada' a correspondentes russos feita pelas Forças Armadas ucranianas

Os correspondentes de guerra russos são alvo de tentativas premeditadas de assassinato por parte das Forças Armadas ucranianas, que não poupam meios para atingir esse fim, disse o porta-voz do Kremlin, Dmitry Peskov.

Em uma declaração nesta segunda-feira (30), o porta-voz revelou que "os nossos correspondentes trabalham em condições de grande perigo, são alvo de tentativas premeditadas de eliminação. As Forças Armadas ucranianas não poupam meios para atingir esse fim e, a julgar por tudo, abriram uma caçada a muitos dos nossos repórteres heroicos", destacou Peskov à mídia russa.

O porta-voz presidencial apelou a todos os correspondentes de guerra para que sejam "extremamente cuidadosos".

O embaixador russo nas Nações Unidas em Genebra, Gennady Gatilov, lembrou ao gabinete do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos (ACNUDH) que desde 2014, nas mãos do regime ucraniano, muitos repórteres russos perderam a vida, e instou o órgão a condenar "a caça aos jornalistas desencadeada por Kiev".

¨      ONG Repórteres Sem Fronteiras é um 'braço de mídia da OTAN', afirma pesquisador

A ONG Repórteres Sem Fronteiras (RSF) é essencialmente "um braço de mídia da OTAN [Organização do Tratado do Atlântico Norte], um braço de mídia do Ocidente coletivo", disse nesta segunda-feira (30) à Sputnik o pesquisador do Instituto de Estudos Europeus Stevan Gajic.

Isso explica por que a RSF tem pressionado a União Europeia para que repreenda a Sérvia por abrigar os escritórios das mídias russas Sputnik e RT, afirmou ele.

A organização publicou um projeto intitulado "Monitor da Propaganda" para "travar uma batalha para promover o jornalismo confiável". Ela acusa a Sputnik e a RT de espalharem "desinformação" e "narrativas do Kremlin" nos Bálcãs.

"Isso é uma pura projeção freudiana. Eles estão acusando os outros do que eles mesmos estão fazendo", disse Gajic sobre as alegações de "propaganda russa".

"Onde estava o Repórteres Sem Fronteiras quando a Rádio Televisão da Sérvia foi bombardeada, em 1999, e quando 16 funcionários da TV foram assassinados a sangue frio? Não há credibilidade em pessoas como essas, que não agiram quando deveriam", frisou o pesquisador.

As narrativas da RSF e de outros sobre a Sputnik e a RT serem silenciadas têm o objetivo claro de "anular qualquer tipo de informação vinda do outro lado, para calar, silenciar todos que não estão de acordo com a narrativa da OTAN. E isso é especialmente problemático para a OTAN e para essas organizações fantoches, como jornalistas do Repórteres Sem Fronteiras, em tempos de guerra", enfatizou Gajic.

Quanto às alegações da RSF sobre a RT espalhar "narrativas do Kremlin" na Sérvia, Gajic destacou que "o sentimento pró-russo entre os sérvios não tem nada a ver com o Kremlin, e tudo a ver com Washington e a OTAN".

"Os sérvios agora são mais militantes pró-russos porque estivemos em uma guerra contra a OTAN, e na verdade a OTAN estava conduzindo e ainda está conduzindo uma agressão híbrida contra nós. Acho que isso fala muito sobre a falsidade das premissas e das conclusões [feitas pela RSF]. Você pode ver quão irrealistas são essas pessoas e o quanto elas estão completamente desconectadas da realidade, e como não estão realmente fazendo uma pesquisa profunda para entender o que está acontecendo e como isso acontece", resumiu Gajic.

¨      Estados Unidos trabalham para evitar novo 6 de janeiro após as eleições presidenciais, diz governo

Em 6 de janeiro de 2021, apoiadores do ex-presidente Donald Trump, que havia perdido o pleito para Joe Biden, atacaram o Capitólio durante uma tentativa de golpe contra os resultados eleitorais na época.

O governo dos Estados Unidos realiza esforços neste ano para evitar outro evento histórico como o motim de 6 de janeiro, que ocorreu em 2021 e desafiou os resultados da eleição presidencial no país. É o que contou nesta segunda-feira (30) o subsecretário de Inteligência do Departamento de Segurança Interna, Kenneth Wainstein.

"Provavelmente haverá alguns que tentarão agir por conta própria para tentar perturbar o processo eleitoral após o dia da eleição. Claro, vimos isso em 6 de janeiro, e muitos esforços estão sendo feitos para garantir que isso não aconteça novamente este ano", declarou.

Wainstein enfatizou que os norte-americanos têm o direito de contestar os resultados de uma eleição nos EUA se tiverem dúvidas sobre a correção do voto.

De acordo com o Departamento de Justiça dos EUA, desde 6 de janeiro de 2021, mais de 1.488 indivíduos foram acusados em quase todos os 50 estados dos EUA por crimes relacionados ao motim no Capitólio, e quase 550 desse total respondem por criminalmente por agredir ou obstruir as forças de segurança dos EUA.

No dia 6 de janeiro de 2021, após a derrota do então presidente dos EUA, Donald Trump, um grupo de seus apoiadores invadiu o Capitólio dos EUA na tentativa de interromper a contagem dos votos do Colégio Eleitoral pelo Congresso.

<><> Em discurso, Zelensky admite que linha de frente está 'muito, muito difícil' para tropas ucranianas

Vladimir Zelensky afirmou que o cenário para suas tropas na linha de frente do conflito é "muito, muito difícil" e que as forças ucranianas têm que fazer tudo o que podem durante o outono europeu.

Nesta segunda-feira (30), o líder ucraniano comentou a situação de suas tropas à Reuters.

"Relatórios sobre cada um dos nossos setores de linha de frente, nossas capacidades, nossas capacidades futuras e nossas tarefas específicas. A situação é muito, muito difícil", disse Zelensky, em um discurso noturno em vídeo, referindo-se a uma reunião de mais de duas horas e meia com seus principais comandantes.

Também nesta segunda, o Ministério da Defesa da Rússia informou que unidades do agrupamento de tropas russo Tsentr (Centro) libertaram o povoado de Nelepovka, na República Popular de Donetsk (RPD).

O analista político britânico Anatol Lieven, em um artigo para o portal UnHerd, disse hoje que os políticos ocidentais reconhecem cada vez mais que o conflito na Ucrânia só pode ser encerrado por meio de negociações e de um acordo com a Rússia.

"A Ucrânia não pode expulsar […] a Rússia de […] nenhum território. […] Pelo contrário, agora é o Exército ucraniano que está recuando lentamente em Donbass", afirmou Lieven, conforme noticiado.

¨      Boris Johnson acusa Macron de usar a crise migratória para 'punir' o Reino Unido pelo Brexit

O ex-primeiro-ministro do Reino Unido, Boris Johnson, acusou o presidente francês Emmanuel Macron em seu livro intitulado "Unleashed" (Liberto) de usar a crise migratória indocumentada que assolou o Reino Unido nos últimos anos para "punir" Londres por optar por sair da União Europeia (UE).

"Parecia pelo menos possível para mim que ele [Emmanuel Macron] estava usando o problema como arma [...] e discretamente permitindo que os migrantes passassem em números suficientes para enlouquecer o público britânico e minar um dos fatos mais importantes do Brexit — que tínhamos retomado o controle de nossas fronteiras", disse Johnson no livro citado pelo The Times em um artigo publicado nesta segunda-feira (30).

A maioria dos migrantes indocumentados chega ao Reino Unido da França pelo canal da Mancha, e Paris está supostamente permitindo que isso "enlouqueça o público britânico", acrescentou Johnson. Ele também afirmou que Macron "acreditava que o Reino Unido deveria ser punido pelo Brexit" e pode ter usado a crise dos pequenos barcos para fazer isso.

No entanto, Johnson conseguiu se "vingar" do líder francês ao persuadir os Estados Unidos a fazer o pacto de submarino nuclear no âmbito do AUKUS com o Reino Unido, em 2021, fazendo com que a Austrália abandonasse um possível acordo de compra de submarinos da França.

Imigrantes sem documentos geralmente buscam qualquer oportunidade de entrar no Reino Unido e solicitar o status de refugiado, que fornece acesso a suporte financeiro e programas sociais. As autoridades do Reino Unido gastam vários milhões de libras por dia em acomodações para refugiados em hotéis. Mais de 25.000 imigrantes sem documentos chegaram ao Reino Unido pelo canal da Mancha desde o início de 2024, de acordo com dados do Ministério do Interior.

Em 2016, 51,8% dos eleitores do Reino Unido escolheram encerrar a filiação do país à UE, enquanto 48,1% votaram para permanecer na união. Em 31 de janeiro de 2020, o país finalmente deixou o bloco após 47 anos de filiação. O período de transição durou até 31 de dezembro de 2021, durante o qual o Reino Unido não era mais um membro do bloco, mas permaneceu sendo um membro do mercado único e da união aduaneira da UE. Londres e Bruxelas conseguiram negociar um acordo de comércio e cooperação durante esse período.

 

Fonte: Sputnik Brasil

 

Nenhum comentário: