segunda-feira, 26 de agosto de 2024

Eduardo Nunes: ‘A Espiral do Silêncio nas eleições 2024’

Você já se viu em um ambiente onde uma determinada opinião predomina entre a maioria, mas você tem um entendimento diferente? E, nesse contexto, você decide não manifestar sua posição, com receio, especialmente, de não ser aceito pelo grupo? Esta é chamada Teoria da Espiral do Silêncio, desenvolvida na década de 70 pela cientista política alemã Elisabeth Noelle-Neumann. Ela sugere que, em ambiente onde uma opinião predominante se impõe, indivíduos com opiniões divergentes tendem a silenciar suas vozes, por medo de isolamento social.

O atual cenário político nos EUA e no Brasil, fortemente marcado pela polarização, me fez lembrar dessa teoria e daqueles que não se identificam com nenhum dos dois lados. Nas eleições americanas, a dualidade entre democratas e republicanos é bem mais evidente. Eleitores moderados ou que discordam da linha dura do partido ao qual estão filiados enfrentam pressões internas para conformar-se ou silenciar-se, temendo represálias ou ostracismo. A ascensão de figuras como Donald Trump, por exemplo, reforçou essa dinâmica, onde divergências internas são frequentemente vistas como deslealdade.

No Brasil, embora haja um sistema pluripartidário – com 29 legendas ativas hoje, mas com o poder político concentrado nas mãos de apenas sete legendas –, a polarização não só permaneceu forte desde 2018, mas ganhou tração para as eleições municipais de 2024. A polarização do debate entre esquerda e direita, tanto em temas centrais, como segurança, saúde, emprego e educação, quanto na pauta de comportamento, cria um ambiente onde opiniões moderadas ficam suprimidas. Eleitores que não se alinham com os extremos sentem-se compelidos a se calar, temendo rejeição em seus círculos sociais ou profissionais. Às vezes, por pura preguiça mesmo!

Esse cenário é muito mais propício para o crescimento de candidatos que têm na polêmica a estratégia principal para conquistar o voto do eleitor, como o empresário e autointitulado ex-coach Pablo Marçal (PRTB) na corrida eleitoral pela prefeitura da cidade mais populosa do Brasil, São Paulo. Isso enfraquece o debate, com o espaço sendo preenchido com pirotecnias políticas, factoides eleitorais e performances de palco.

A Espiral do Silêncio nos ajuda a entender um pouco melhor como a polarização molda o comportamento do eleitor moderado nos dias de hoje. Em tempos de polarização extrema, garantir um espaço para o diálogo e a expressão de opiniões divergentes é essencial para uma democracia saudável. Desta forma, o desafio é romper essa espiral, promovendo uma cultura de respeito à pluralidade de ideias em todos os ambientes de discussão.

O ponto nevrálgico talvez seja o enfrentamento visando à revisão dos algoritmos, tão protegidos pelas plataformas digitais, de modo a incentivar a exposição a uma variedade de perspectivas e reduzir o efeito das bolhas ideológicas. Embora a revisão direta não seja viável, uma ação de advocacy por uma regulamentação que obrigue as plataformas a garantir maior diversidade e equidade no conteúdo exibido pode ser uma estratégia eficaz. Além disso, uma moderação ativa em prol de debates respeitosos, com incentivos a comentários construtivos, pode criar um ambiente mais seguro para expressar opiniões divergentes.

Ao estabelecer espaços de diálogo onde todos os pontos de vista são respeitados e considerados, é possível reduzir o medo de represálias por opiniões não convencionais. Dessa forma, talvez seja possível criar espaços mais inclusivos e democráticos.

 

•        A reincidência da banalidade do mal nas eleições de outubro. Por Elisabeth Lopes

A largada das campanhas para as eleições municipais de outubro/24 não deixa de surpreender os eleitores. A presença bizarra de alguns candidatos em quase todos os municípios do país reincide com mais ênfase, embalada pela onda do ridículo, da vulgaridade, da marginalidade, da presença ultrajante nas redes sociais, da inadequada conduta ético-política e do absoluto vazio de conteúdo propositivo.

Entre os bons candidatos merecedores de nosso voto, há os oportunistas com muitos seguidores, a exemplo do desqualificado quadrilheiro, o influenciador Pablo Marçal (candidato à prefeitura da cidade de São Paulo, pelo Partido Renovador Trabalhista Brasileiro-PRTB), há outros que na carona do ex presidente inelegível adotam seu nome em seus registros eleitorais, a fim de conquistarem eleitores fascinados pelo falso Messias, homem do povo devotado a Deus, à pátria e à família (slogan adotado pela Ação Integralista Brasileira, formada em 1932, também denominada de fascismo brasileiro).

A despeito do desgoverno de Bolsonaro ter sido marcado por profundos retrocessos em programas sociais, por posturas irresponsáveis e negacionistas à ciência, durante o enfrentamento da pandemia, o que acarretou o exponencial aumento do número de vítimas pela Covid, apesar das denúncias de inúmeros casos de corrupção no seu governo e no seu próprio âmbito familiar, embora a retirada de direitos, a tentativa de grave golpe à democracia em 8 de janeiro/23, entre outras aberrações que vieram à tona antes, durante e após o fim de seu governo, as cópias fieis do perfil bolsonarista por vários candidatos, maculam ainda mais a fisionomia trôpega e absurda das eleições municipais deste ano.

Esse fenômeno assustador com várias presenças de candidatos caricatos, outros visivelmente sem nenhuma idoneidade moral e ética, reprodutores de ideias fascistas, não é um privilégio do Brasil. Há alguns meses nos surpreendemos com a eleição, pelo povo argentino, de um candidato extremista de direita, que em suas aparições arrasava nas ruas e nas redes sociais ao portar uma motoserra como símbolo de seu programa anarcoautoritário.

Nos Estados Unidos, Donald Trump, candidato pelo partido republicano e seu farto currículo de cometimento de atos ilegais, ainda tem atraído muitos eleitores. Por meses seguidos esteve à frente de Joe Biden na intenção de votos para a presidência do país. Foi necessária uma virada do partido democrata para barrar o crescimento de Trump rumo às urnas. Com a desistência de Biden e a indicação de Kamala Harris para substituí-lo na corrida eleitoral, o cenário vem se modificando para a tranquilidade dos países contrários ao ideário extremista e ameaçador de Trump.

É evidente que as candidaturas atreladas à figura política de Bolsonaro, são motivadas pelas vantagens que possam obter junto às urnas. O país ainda vive uma forte polarização acentuada desde a ascensão do movimento bolsonarista. Há 80 candidaturas que foram registradas com apelidos relacionados ao nome do ex-presidente, tais como: “Negona do Bolsonaro”, “Rafa Apoiadores do Bolsonaro”, entre outras. A legislação eleitoral permite o uso de apelidos para designar o nome do candidato. O filho do ex-presidente, por exemplo, de nome Jair Renan Bolsonaro, candidato a vereador no Balneário Camboriú (SC) pelo Partido Liberal, registrou seu nome apenas como “Jair Bolsonaro”. Com essa medida, o quarto filho da ‘fraude Messias’, ao seguir os passos do pai, aumentará suas possibilidades de ocupar uma das cadeiras na câmara municipal, o que lhe proporcionará vantagens, lucros e uma certa imunidade para seus próximos delitos. Tal pai, tais filhos.

O que falta neste país? Por que temos que conviver com o esdrúxulo na política, com candidatos que buscam o sistema legislativo como profissão, como possibilidade de enriquecimento fácil, ou como forma de turbinar a fortuna suspeita que já possuem. Nada realizam nas principais demandas do povo em educação, saúde, trabalho, segurança, transportes. O propósito desses políticos resume-se a auferir benefícios individuais, a partir da disfuncionalidade do sistema legislativo do país. A continuidade de esquemas conhecidos pelos desvios do dinheiro público em benefício próprio, ou dos demais expedientes ilegais, envolvendo a máquina administrativa acaba se perpetuando no país.

Nesse horizonte acinzentado, o povo acaba sendo onerado duplamente, quando paga seus impostos e quando não recebe o devido retorno em bem estar social pelos oportunistas do legislativo que nada produzem  a exemplo da trajetória política do próprio inelegível, que durante 27 anos só aprovou 2 inexpressíveis projetos, que à viva voz declarou que ocupava um apartamento funcional em Brasília, pago pelo erário público apesar de ter residência própria, para fins que não condiziam com suas atribuições de seu mandato. Ao longo desse tempo inseriu seus filhos e sua ex mulher na política, aliando-se a poderosas milícias do Rio de Janeiro, que submetem os eleitores dos territórios sob seu controle a votarem nos políticos indicados por eles.

Outro aspecto preocupante nas próximas eleições é a presença de candidatos oriundos de partidos suspeitos por irregularidades, a exemplo do candidato Pablo Marçal. Na semana que passou, o Secretário Geral do PRTB, Marcos André de Andrade, pediu à Justiça Eleitoral de São Paulo a suspensão da candidatura de Marçal por irregularidades ocorridas na convenção partidária. Contudo, o pedido de liminar não prosperou. O Juiz eleitoral Antônio Maria Patiño Zorz decidiu rejeitar o pedido, alegando que: “a concessão da liminar pleiteada com a suspensão do registro de candidatura poderá gerar a ausência do nome do candidato na urna eletrônica, o que poderá acarretar perigo de irreversibilidade dos efeitos da decisão, nulidade das eleições para prefeito e realização de novas eleições” (Disponível em: https://www.brasil247)

Situações como esta, criam fissuras que depreciam o devido processo eleitoral. Acarreta também prejuízo à imagem dos demais partidos e de seus candidatos que seguem de modo regular os trâmites das determinações legais do processo eletivo. Os que reúnem condições adequadas para uma legítima e idônea representação do povo, pelo histórico de suas trajetórias, acabam caindo na vala comum. 

Soma-se a esse panorama nada promissor, o fácil acesso da população a tudo que é publicado nas redes sociais. O influenciador candidato que tem mais seguidores, a exemplo do coach Pablo Marçal, acaba tendo uma repercussão gigantesca e em cascata por meio do compartilhamento frenético de suas postagens, pelas pessoas que o seguem. A partir de publicações estratégicas e mentirosas, destinadas aos seus opositores, o coach vai capturando mais mentes. Nessa dinâmica, os internautas menos preparados na depuração da verdade, contaminados, reverberam a desinformação. Ainda que a Justiça iniba o estrago, este já terá produzido o efeito almejado.

Nessas circunstâncias, o candidato a prefeito da cidade de São Paulo, Guilherme Boulos do Partido Socialismo e Liberdade (PSOL), bem avaliado na intenção de votos pelos eleitores, teve sua reputação atingida por acusações indevidas de Pablo Marçal. Apesar do direito de resposta dada a Boulos pela Justiça Eleitoral, as repercussões foram amplamente danosas à imagem pública do candidato, entre outras consequências graves.

O argumento da “liberdade de expressão” sustentado pelos donos das Big Tech, espaço digital praticamente sem regulação, tem dado margens para propagação de desinformações, levando a população a equívocos inconcebíveis sobre assuntos que dizem respeito, inclusive a própria soberania do país.

Nas palavras do ministro Alexandre de Moraes “não é possível que o setor queira ser o único na história da humanidade a não ser regulamentado”, asseverou também que: “nós que acreditamos no Estado Democrático de Direito precisamos nos unir para garantir uma regulamentação adequada, que garanta a liberdade de expressão, que garanta o chamado livre mercado de ideias, mas com responsabilização, nos termos da Constituição".

O uso das redes como meio de desinformações e destilação de ódio, marcadamente nas eleições de 2018, a ascensão da extrema direita na política, aliada ao campo bolsonarista, a criação do gabinete do ódio, os compartilhamentos de mentiras por perfis falsos, criou o amálgama perfeito para as ilegalidades.

Convém salientar que não se trata de demonizar as redes sociais. Estas têm dado uma enorme contribuição nas comunicações, quando seus usuários respeitam seus frequentadores, com informações comprometidas com a verdade. Entretanto, como referiu o Ministro Alexandre, é inadmissível não possuírem regulamentação.

Influenciar eleitores de modo indevido é um prejuízo irreparável ao povo e ao país em sua totalidade. Enquanto não contarmos com a proteção de uma efetiva regulação das Big Techs, teremos que buscar a verdade em várias fontes, procurando acessar os meios comunicativos com boa reputação. Com base nessa atenta busca evitaremos eleger candidatos nocivos aos princípios democráticos.  

É imprescindível que os eleitores exercitem sua cidadania em plenitude. Por mais que os assediem nas mídias corporativas, ou nas redes sociais, infinitamente de maior alcance, existem meios na própria mídia digital para o desvelamento da realidade. Há canais de TV transmitidos em plataformas online, que realizam um trabalho jornalístico com credibilidade. Sem patrocínio comercial, o engajamento do público ocorre por espontânea associação na condição de membro do canal. Estas mídias desenvolvem um trabalho livre e comprometido com a verdade, como no caso do canal Brasil 247, vencedor do prêmio iBest como melhor canal de política do Brasil pelo voto popular, do canal DCM e do canal ICL, entre outros canais nomeados como alternativos.

Todavia, enquanto houver frações de candidatos financiados pela elite econômica com vultosas fortunas, ao modo do nefasto fascista Pablo Marçal, ou do bolsonarista Sebastião Melo que busca a reeleição à prefeitura de Porto Alegre, embora o desastre absoluto de seu atual mandato, parte do triste e alienado povo brasileiro com vocação para eleger esses candidatos, talvez por identificarem-se com eles, corremos sério risco de serem renovados os desastres, como o que vivemos nos quatro anos de governo do deplorável Messias. 

Apesar dos pesares nem tudo está perdido, há tempo de mudarmos esse panorama. A escolha dos candidatos cabe a nós. Nesse sentido, vamos permitir a reincidência da banalidade do mal nas eleições de outubro? Ou vamos arregaçar as mangas, participando da maneira que for possível das campanhas dos candidatos em quem confiamos. Defendermos as propostas sérias de melhoria da qualidade de vida do povo é praticar de pleno e com consciência crítica a nossa tão esquecida cidadania.

 

Fonte: Alter Comunicação/Brasil 24

 

Nenhum comentário: