Eduardo Nunes: ‘A Espiral do Silêncio nas
eleições 2024’
Você já se viu em um
ambiente onde uma determinada opinião predomina entre a maioria, mas você tem
um entendimento diferente? E, nesse contexto, você decide não manifestar sua
posição, com receio, especialmente, de não ser aceito pelo grupo? Esta é chamada
Teoria da Espiral do Silêncio, desenvolvida na década de 70 pela cientista
política alemã Elisabeth Noelle-Neumann. Ela sugere que, em ambiente onde uma
opinião predominante se impõe, indivíduos com opiniões divergentes tendem a
silenciar suas vozes, por medo de isolamento social.
O atual cenário
político nos EUA e no Brasil, fortemente marcado pela polarização, me fez
lembrar dessa teoria e daqueles que não se identificam com nenhum dos dois
lados. Nas eleições americanas, a dualidade entre democratas e republicanos é
bem mais evidente. Eleitores moderados ou que discordam da linha dura do
partido ao qual estão filiados enfrentam pressões internas para conformar-se ou
silenciar-se, temendo represálias ou ostracismo. A ascensão de figuras como
Donald Trump, por exemplo, reforçou essa dinâmica, onde divergências internas
são frequentemente vistas como deslealdade.
No Brasil, embora haja
um sistema pluripartidário – com 29 legendas ativas hoje, mas com o poder
político concentrado nas mãos de apenas sete legendas –, a polarização não só
permaneceu forte desde 2018, mas ganhou tração para as eleições municipais de 2024.
A polarização do debate entre esquerda e direita, tanto em temas centrais, como
segurança, saúde, emprego e educação, quanto na pauta de comportamento, cria um
ambiente onde opiniões moderadas ficam suprimidas. Eleitores que não se alinham
com os extremos sentem-se compelidos a se calar, temendo rejeição em seus
círculos sociais ou profissionais. Às vezes, por pura preguiça mesmo!
Esse cenário é muito
mais propício para o crescimento de candidatos que têm na polêmica a estratégia
principal para conquistar o voto do eleitor, como o empresário e autointitulado
ex-coach Pablo Marçal (PRTB) na corrida eleitoral pela prefeitura da cidade
mais populosa do Brasil, São Paulo. Isso enfraquece o debate, com o espaço
sendo preenchido com pirotecnias políticas, factoides eleitorais e performances
de palco.
A Espiral do Silêncio
nos ajuda a entender um pouco melhor como a polarização molda o comportamento
do eleitor moderado nos dias de hoje. Em tempos de polarização extrema,
garantir um espaço para o diálogo e a expressão de opiniões divergentes é
essencial para uma democracia saudável. Desta forma, o desafio é romper essa
espiral, promovendo uma cultura de respeito à pluralidade de ideias em todos os
ambientes de discussão.
O ponto nevrálgico
talvez seja o enfrentamento visando à revisão dos algoritmos, tão protegidos
pelas plataformas digitais, de modo a incentivar a exposição a uma variedade de
perspectivas e reduzir o efeito das bolhas ideológicas. Embora a revisão direta
não seja viável, uma ação de advocacy por uma regulamentação que obrigue as
plataformas a garantir maior diversidade e equidade no conteúdo exibido pode
ser uma estratégia eficaz. Além disso, uma moderação ativa em prol de debates
respeitosos, com incentivos a comentários construtivos, pode criar um ambiente
mais seguro para expressar opiniões divergentes.
Ao estabelecer espaços
de diálogo onde todos os pontos de vista são respeitados e considerados, é
possível reduzir o medo de represálias por opiniões não convencionais. Dessa
forma, talvez seja possível criar espaços mais inclusivos e democráticos.
• A reincidência da banalidade do mal nas
eleições de outubro. Por Elisabeth Lopes
A largada das
campanhas para as eleições municipais de outubro/24 não deixa de surpreender os
eleitores. A presença bizarra de alguns candidatos em quase todos os municípios
do país reincide com mais ênfase, embalada pela onda do ridículo, da
vulgaridade, da marginalidade, da presença ultrajante nas redes sociais, da
inadequada conduta ético-política e do absoluto vazio de conteúdo propositivo.
Entre os bons
candidatos merecedores de nosso voto, há os oportunistas com muitos seguidores,
a exemplo do desqualificado quadrilheiro, o influenciador Pablo Marçal
(candidato à prefeitura da cidade de São Paulo, pelo Partido Renovador
Trabalhista Brasileiro-PRTB), há outros que na carona do ex presidente
inelegível adotam seu nome em seus registros eleitorais, a fim de conquistarem
eleitores fascinados pelo falso Messias, homem do povo devotado a Deus, à
pátria e à família (slogan adotado pela Ação Integralista Brasileira, formada
em 1932, também denominada de fascismo brasileiro).
A despeito do
desgoverno de Bolsonaro ter sido marcado por profundos retrocessos em programas
sociais, por posturas irresponsáveis e negacionistas à ciência, durante o
enfrentamento da pandemia, o que acarretou o exponencial aumento do número de
vítimas pela Covid, apesar das denúncias de inúmeros casos de corrupção no seu
governo e no seu próprio âmbito familiar, embora a retirada de direitos, a
tentativa de grave golpe à democracia em 8 de janeiro/23, entre outras
aberrações que vieram à tona antes, durante e após o fim de seu governo, as
cópias fieis do perfil bolsonarista por vários candidatos, maculam ainda mais a
fisionomia trôpega e absurda das eleições municipais deste ano.
Esse fenômeno
assustador com várias presenças de candidatos caricatos, outros visivelmente
sem nenhuma idoneidade moral e ética, reprodutores de ideias fascistas, não é
um privilégio do Brasil. Há alguns meses nos surpreendemos com a eleição, pelo
povo argentino, de um candidato extremista de direita, que em suas aparições
arrasava nas ruas e nas redes sociais ao portar uma motoserra como símbolo de
seu programa anarcoautoritário.
Nos Estados Unidos,
Donald Trump, candidato pelo partido republicano e seu farto currículo de
cometimento de atos ilegais, ainda tem atraído muitos eleitores. Por meses
seguidos esteve à frente de Joe Biden na intenção de votos para a presidência
do país. Foi necessária uma virada do partido democrata para barrar o
crescimento de Trump rumo às urnas. Com a desistência de Biden e a indicação de
Kamala Harris para substituí-lo na corrida eleitoral, o cenário vem se
modificando para a tranquilidade dos países contrários ao ideário extremista e
ameaçador de Trump.
É evidente que as
candidaturas atreladas à figura política de Bolsonaro, são motivadas pelas
vantagens que possam obter junto às urnas. O país ainda vive uma forte
polarização acentuada desde a ascensão do movimento bolsonarista. Há 80
candidaturas que foram registradas com apelidos relacionados ao nome do
ex-presidente, tais como: “Negona do Bolsonaro”, “Rafa Apoiadores do
Bolsonaro”, entre outras. A legislação eleitoral permite o uso de apelidos para
designar o nome do candidato. O filho do ex-presidente, por exemplo, de nome
Jair Renan Bolsonaro, candidato a vereador no Balneário Camboriú (SC) pelo
Partido Liberal, registrou seu nome apenas como “Jair Bolsonaro”. Com essa
medida, o quarto filho da ‘fraude Messias’, ao seguir os passos do pai,
aumentará suas possibilidades de ocupar uma das cadeiras na câmara municipal, o
que lhe proporcionará vantagens, lucros e uma certa imunidade para seus
próximos delitos. Tal pai, tais filhos.
O que falta neste
país? Por que temos que conviver com o esdrúxulo na política, com candidatos
que buscam o sistema legislativo como profissão, como possibilidade de
enriquecimento fácil, ou como forma de turbinar a fortuna suspeita que já
possuem. Nada realizam nas principais demandas do povo em educação, saúde,
trabalho, segurança, transportes. O propósito desses políticos resume-se a
auferir benefícios individuais, a partir da disfuncionalidade do sistema
legislativo do país. A continuidade de esquemas conhecidos pelos desvios do
dinheiro público em benefício próprio, ou dos demais expedientes ilegais,
envolvendo a máquina administrativa acaba se perpetuando no país.
Nesse horizonte
acinzentado, o povo acaba sendo onerado duplamente, quando paga seus impostos e
quando não recebe o devido retorno em bem estar social pelos oportunistas do
legislativo que nada produzem a exemplo
da trajetória política do próprio inelegível, que durante 27 anos só aprovou 2
inexpressíveis projetos, que à viva voz declarou que ocupava um apartamento
funcional em Brasília, pago pelo erário público apesar de ter residência
própria, para fins que não condiziam com suas atribuições de seu mandato. Ao
longo desse tempo inseriu seus filhos e sua ex mulher na política, aliando-se a
poderosas milícias do Rio de Janeiro, que submetem os eleitores dos territórios
sob seu controle a votarem nos políticos indicados por eles.
Outro aspecto
preocupante nas próximas eleições é a presença de candidatos oriundos de
partidos suspeitos por irregularidades, a exemplo do candidato Pablo Marçal. Na
semana que passou, o Secretário Geral do PRTB, Marcos André de Andrade, pediu à
Justiça Eleitoral de São Paulo a suspensão da candidatura de Marçal por
irregularidades ocorridas na convenção partidária. Contudo, o pedido de liminar
não prosperou. O Juiz eleitoral Antônio Maria Patiño Zorz decidiu rejeitar o
pedido, alegando que: “a concessão da liminar pleiteada com a suspensão do
registro de candidatura poderá gerar a ausência do nome do candidato na urna
eletrônica, o que poderá acarretar perigo de irreversibilidade dos efeitos da
decisão, nulidade das eleições para prefeito e realização de novas eleições”
(Disponível em: https://www.brasil247)
Situações como esta,
criam fissuras que depreciam o devido processo eleitoral. Acarreta também
prejuízo à imagem dos demais partidos e de seus candidatos que seguem de modo
regular os trâmites das determinações legais do processo eletivo. Os que reúnem
condições adequadas para uma legítima e idônea representação do povo, pelo
histórico de suas trajetórias, acabam caindo na vala comum.
Soma-se a esse
panorama nada promissor, o fácil acesso da população a tudo que é publicado nas
redes sociais. O influenciador candidato que tem mais seguidores, a exemplo do
coach Pablo Marçal, acaba tendo uma repercussão gigantesca e em cascata por
meio do compartilhamento frenético de suas postagens, pelas pessoas que o
seguem. A partir de publicações estratégicas e mentirosas, destinadas aos seus
opositores, o coach vai capturando mais mentes. Nessa dinâmica, os internautas
menos preparados na depuração da verdade, contaminados, reverberam a
desinformação. Ainda que a Justiça iniba o estrago, este já terá produzido o
efeito almejado.
Nessas circunstâncias,
o candidato a prefeito da cidade de São Paulo, Guilherme Boulos do Partido
Socialismo e Liberdade (PSOL), bem avaliado na intenção de votos pelos
eleitores, teve sua reputação atingida por acusações indevidas de Pablo Marçal.
Apesar do direito de resposta dada a Boulos pela Justiça Eleitoral, as
repercussões foram amplamente danosas à imagem pública do candidato, entre
outras consequências graves.
O argumento da
“liberdade de expressão” sustentado pelos donos das Big Tech, espaço digital
praticamente sem regulação, tem dado margens para propagação de desinformações,
levando a população a equívocos inconcebíveis sobre assuntos que dizem
respeito, inclusive a própria soberania do país.
Nas palavras do
ministro Alexandre de Moraes “não é possível que o setor queira ser o único na
história da humanidade a não ser regulamentado”, asseverou também que: “nós que
acreditamos no Estado Democrático de Direito precisamos nos unir para garantir uma
regulamentação adequada, que garanta a liberdade de expressão, que garanta o
chamado livre mercado de ideias, mas com responsabilização, nos termos da
Constituição".
O uso das redes como
meio de desinformações e destilação de ódio, marcadamente nas eleições de 2018,
a ascensão da extrema direita na política, aliada ao campo bolsonarista, a
criação do gabinete do ódio, os compartilhamentos de mentiras por perfis falsos,
criou o amálgama perfeito para as ilegalidades.
Convém salientar que
não se trata de demonizar as redes sociais. Estas têm dado uma enorme
contribuição nas comunicações, quando seus usuários respeitam seus
frequentadores, com informações comprometidas com a verdade. Entretanto, como
referiu o Ministro Alexandre, é inadmissível não possuírem regulamentação.
Influenciar eleitores
de modo indevido é um prejuízo irreparável ao povo e ao país em sua totalidade.
Enquanto não contarmos com a proteção de uma efetiva regulação das Big Techs,
teremos que buscar a verdade em várias fontes, procurando acessar os meios
comunicativos com boa reputação. Com base nessa atenta busca evitaremos eleger
candidatos nocivos aos princípios democráticos.
É imprescindível que
os eleitores exercitem sua cidadania em plenitude. Por mais que os assediem nas
mídias corporativas, ou nas redes sociais, infinitamente de maior alcance,
existem meios na própria mídia digital para o desvelamento da realidade. Há canais
de TV transmitidos em plataformas online, que realizam um trabalho jornalístico
com credibilidade. Sem patrocínio comercial, o engajamento do público ocorre
por espontânea associação na condição de membro do canal. Estas mídias
desenvolvem um trabalho livre e comprometido com a verdade, como no caso do
canal Brasil 247, vencedor do prêmio iBest como melhor canal de política do
Brasil pelo voto popular, do canal DCM e do canal ICL, entre outros canais
nomeados como alternativos.
Todavia, enquanto
houver frações de candidatos financiados pela elite econômica com vultosas
fortunas, ao modo do nefasto fascista Pablo Marçal, ou do bolsonarista
Sebastião Melo que busca a reeleição à prefeitura de Porto Alegre, embora o
desastre absoluto de seu atual mandato, parte do triste e alienado povo
brasileiro com vocação para eleger esses candidatos, talvez por
identificarem-se com eles, corremos sério risco de serem renovados os
desastres, como o que vivemos nos quatro anos de governo do deplorável
Messias.
Apesar dos pesares nem
tudo está perdido, há tempo de mudarmos esse panorama. A escolha dos candidatos
cabe a nós. Nesse sentido, vamos permitir a reincidência da banalidade do mal
nas eleições de outubro? Ou vamos arregaçar as mangas, participando da maneira
que for possível das campanhas dos candidatos em quem confiamos. Defendermos as
propostas sérias de melhoria da qualidade de vida do povo é praticar de pleno e
com consciência crítica a nossa tão esquecida cidadania.
Fonte: Alter
Comunicação/Brasil 24
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