quarta-feira, 1 de maio de 2024

O governo Lula está colhendo o que plantou

O mandatário do governo de turno – função, na prática, no mínimo dividida com o presidente da Câmara – se encontra irritado com seus ministros por conta dos resultados negativos em várias pesquisas de opinião. Há 6 meses que a sua aprovação alterna entre queda, estagnação e fracas oscilações para cima. “Haddad tem que deixar de ler um livro e negociar no Congresso”, disparou Luiz Inácio, em evento no meio deste mês. A julgar por isso, o presidente da república atribui seus recentes fracassos a uma falta de relações com o “centrão” e a direita no Congresso, e nisso ele já está plantando os próximos insucessos.

Luiz Inácio está calculando o seguinte: precisa evitar quedas ainda maiores na popularidade entre as massas populares e de mais apoio entre as classes dominantes locais, pois ambos indicadores representam enfraquecimento político do governo – o que é sempre aproveitado pela oposição e pelos vorazes deputados e senadores para arrancar mais verbas, emendas e ministérios do governo, em troca tão somente de governabilidade. Além disso, Luiz Inácio sabe bem que um governo demasiado frágil será facilmente acossado por crises geradas pelos mesmos conspiradores que estiveram por trás da crise militar de 2022 e por aqueles milhares de galinhas verdes e suas dezenas de milhares ou mais de seguidores bestializados, à espera do chamado para levantar o movimento de massas golpista, ora apenas disperso, no País. Para evitá-los, o governo pretende ceder ao Congresso as mesmas verbas, emendas e ministérios (o que fortalecerá ainda mais Arthur Lira, o presidente-de-fato), mas em troca de aprovar projetos que sirvam a elevar a popularidade entre as massas, sem deixar de, nem no mínimo, atender aos interesses centrais das classes dominantes locais e o imperialismo, e equilibrar-se no governo. Na sua estratégia de mísera governabilidade a que tem sido obrigado, essa é a fórmula mágica do oportunismo.

Mas a desgraça deste governo é que nem ele e nem ninguém pode servir a dois senhores: ao aprovar medidas que sirvam às classes dominantes – por exemplo, fornecendo, como já fez, o maior plano Safra da história, do qual tanto se jacta e aprovando a “reforma tributária” que segue isentando indecentemente o agronegócio de pagar impostos na exportação de grãos –, ele prejudica completa e perversamente as massas populares e gera frustração com seu governo. O encarecimento da cesta básica alimentar, por falta de apoio e de crédito ao campesinato pobre e médio, é consequência da sua política pró-latifúndio; assim como a falência da suposta “reforma agrária” sobre a qual agora tergiversa, com a proposição enganosa de entregar alguns poucos milhares de hectares de terras da União, exatamente para não tocar em um palmo de terra sequer dos grileiros ladrões de terras da União, enquanto mais de cinco milhões de famílias de camponeses pobres sem-terra e de outros tantos milhões delas com pouca terra demandam um pedaço de terra ou aumentar sua pequena propriedade. Também na esfera política não dá para servir a dois senhores: ao persistir em apaziguar os generais e altos oficiais das Forças Armadas e adotar o “esquecimento e silêncio” quanto ao golpe de 1964, o governo, pusilânime, faz tripudiar a causa progressista que clama justiça e condenação para que o golpismo não ameace o País – em total negligência e sem a mínima coerência com a retórica que lhe rendeu popularidade.

O governo sabe bem que ele serve às classes dominantes e não se indispõe com os generais, mas tenta passar a imagem de que é progressista e que serve aos ricos, mas também aos pobres. Aos ricos, oferece as reformas que elevam a exploração dos pobres, o saqueio das riquezas naturais do País ao imperialismo, que destina verbas públicas aos seus negócios em detrimento da Saúde e da Educação; aos pobres, a pose de operário que subiu na vida, as bravatas sentimentalistas e programas assistencialistas corporativizantes (curral eleitoral) e mais uma ou outra medida paliativa, que sequer compensa a alta da inflação, do desemprego, informalidade e precarização na Saúde e Educação públicas. Problemas que só crescem desde antes do primeiro governo do PT e que, agora, este 5º governo do PT aprofunda com seu programa de direita. Na esfera política, oferece aos generais muito dinheiro e esquecimento; e às famílias vítimas do regime militar, oferece mais frustração com a espera pela reabertura da Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos do regime militar.

Não restam dúvidas de que os insucessos do governo, por sua política de conciliação, são tão inevitáveis quanto o aumento, na sua esteira, do poder de Arthur Lira, assim como o crescimento da extrema-direita bolsonarista e do frenesi golpista na caserna. A frustração popular com o governo não é por falta de solicitude sua com a direita, como Luiz Inácio tenta dar a impressão: a frustração popular é porque o governo é de direita, como admitiu até mesmo o insuspeito Zé Dirceu.

•        Na Agrishow, Bolsonaro, Tarcísio e Caiado apontam para eleições de 2026, mas não só

No dia 28 de abril teve início, em Ribeirão Preto (São Paulo), a Feira Internacional de Tecnologia Agrícola em Ação. Conhecida como Agrishow, o evento reúne o “agronegócio” brasileiro em torno de lançamentos de equipamentos agrícolas e tecnologia na produção rural. Ela ocorrerá até o dia 3 de maio e deve reunir mais de 200 mil pessoas, movimentando mais de R$ 14 bilhões.

Logo no primeiro dia, enquanto os representantes do governo federal Geraldo Alckmin e Carlos Fávaro compareciam no de evento de abertura que ocorreu às portas fechadas, a extrema-direita bolsonarista realizou uma agitação para os latifundiários que se reuniram na cidade.

O ex-presidente genocida Jair Bolsonaro subiu no carro de som ao lado de um conjunto de crápulas como Ricardo Salles (o ex-ministro do Meio Ambiente, hoje é deputado e inimigo declarado dos povos indígenas), Tarcísio de Freitas (ex-ministro de Infraestrutura e atual governador de SP responsável por recordes de assassinatos policiais em chacinas nas periferias) e Ronaldo Caiado (governador de GO que foi um dos criadores da UDR). Todos eles criticaram o governo de Luiz Inácio e fizeram acenos aos latifundiários presentes.

•        O que falou a extrema-direita?

Durante a passeata realizada no domingo, Bolsonaro relembrou o seu governo e também fez elogios direcionados para Tarcísio de Freitas e Ronaldo Caiado, governadores de SP e GO, tidos como favoritos para a disputa presidencial de 2026. Acenando para Tarcísio, afirmou: “Se eu não voltar um dia, fiquem tranquilos porque plantamos sementes”. Quanto a Caiado, o genocida se referiu da seguinte forma: “Semente velha, mas que tem condições de germinar e dar frutos”.

Principal cotado para ser o substituto de Bolsonaro nas próximas eleições presidenciais, Tarcísio de Freitas embelezou o governo responsável pelo genocídio durante a pandemia, chamando Jair Bolsonaro de “visionário”, criticou os “desmandos do atual governo”. Interessado no espólio eleitoral daquele que hoje está inelegível por conta de agitações golpistas realizadas antes, durante e após as eleições de 2022, Tarcísio destacou que Bolsonaro sempre “valorizou e foi parceiro do agronegócio”. Ele aproveitou a ocasião para anunciar um pacote de R$ 1,4 bilhão de investimentos do governo de SP para o latifúndio. O governador de SP foi criticado por não comparecer na abertura oficial, preferindo ir para a manifestação que foi realizada do lado de fora.

Na realidade, Tarcísio já está em campanha eleitoral para presidente em 2026. Seu governo comprova isso: o crescimento de chacinas nas periferias é um aceno para a extrema-direita nas cidades – numa tática eleitoreira já utilizada por assassinos e terroristas como Wilson Witzel e Cláudio Castro, no RJ. Com a atual a promessa de verbas bilionárias para o latifúndio, Tarcísio indica que quer também selar uma aliança com o latifúndio, sobretudo o paulista, que é responsável por mais exportações anuais num valor acima de 70 bilhões de dólares (representando mais de 20% do exportado pelo latifúndio brasileiro no ano de 2023).

Durante os quatro anos do governo Bolsonaro, a extrema-direita também realizou agitações na Agrishow. Em 2019, a Liga dos Camponeses Pobres denunciou que, ao discursar na abertura do evento latifundista, o genocida pregava abertamente uma guerra no campo enquanto anunciava medidas econômicas que beneficiavam abertamente o latifúndio em detrimento dos milhões de camponeses que amarguravam a miséria no campo, sem acesso à terra.

•        Diante de agitação bolsonarista, Luiz Inácio silencia

Enquanto Bolsonaro, sem ser convidado oficialmente para o evento, fez uma motociata, discursou visando as eleições e agitou sua base de extrema-direita com críticas ao governo, Luiz Inácio decidiu não comparecer pessoalmente, mas sim escalar seu vice-presidente Geraldo Alckmin. Tudo para evitar ser rechaçado pelos latifundiários, que são, hoje, a principal base social do bolsonarismo.

A inauguração oficial do evento (que por ter sido fechada ao público, favoreceu o cálculo de Luiz Inácio) contou, tão somente, com Geraldo Alckmin e Carlos Fávaro. Escalados para representarem a equipe do governo federal na abertura da Agrishow, cumpriram a estratégia de tentar comprar os latifundiários pelo bolso.

O ministro da Agricultura, Fávaro, já ocupou o cargo de vice-presidente da Associação de Produtores de Soja do Brasil. Em abril de 2023, comparou a luta pela terra e ocupações promovidas pelo movimento camponês com a invasão da sede dos três poderes em 8 de janeiro por bolsonaristas.

Ele afirmou que o governo têm se dedicado a investir no setor de máquinas agrícolas: “Ano passado foram R$ 2 bilhões, esse ano será ainda mais”, afirmou o ministro, que também prometeu que as taxas de juros serão ainda menores que o patamar do plano Safra em curso (que variam de 8% a 12%, muito abaixo do que paga o conjunto do povo brasileiro).

No ano passado, o ministro Carlos Fávaro decidiu não comparecer na cerimônia de abertura da Agrishow por ter se sentido “desconvidado” devido à presença de Jair Bolsonaro. Luiz Inácio, então, cortou o patrocínio do BB ao evento, mas logo entregou uma bolada de R$ 363 bilhões ao latifúndio através do Plano Safra. Bolsonaro e os sequazes, naquela ocasião, fizeram o de sempre: agitação de extrema-direita para os latifundiários.

O maior risco do silêncio de Luiz Inácio não é que a extrema-direita atinja as pretensões eleitorais do PT e critique o governo federal. O que está em jogo aqui é uma tarefa fundamental, já assumidas pelas massas de camponeses, quilombolas e indígenas: o combate aos grupos paramilitates do latifúndio – que crescem ano após ano conforme se avolumam as agitações bolsonaristas.

 

Fonte: A Nova Democracia

 

Nenhum comentário: