sexta-feira, 3 de maio de 2024

Moro diz que CNJ está gastando “dinheiro público inutilmente” para investigar seus abusos

O senador Sergio Moro defendeu no Conselho Nacional de Justiça (CNJ) que a Corregedoria está “despendendo dinheiro público inutilmente” para investigar decisões tomadas pelo ex-juiz da Lava Jato, que é suspeito de ter participado de um esquema para “desviar” recursos de multas aplicadas na operação, com o intuito de atender aos “interesses privados” dos próprios agentes públicos.

Na defesa prévia de Moro, obtida pela reportagem, os advogados afirmam que o ex-juiz abandonou a magistratura há 5 anos para ser ministro de Estado e, por isso, não pode mais ser investigado no CNJ. Convicto disso, Moro escreveu um bilhete duro à Corregedoria quando foi intimado a prestar esclarecimentos ao CNJ. 

Moro é alvo de uma representação disciplinar no CNJ que pode evoluir ou não para PAD (processo administrativo disciplinar). Mas diante do volume de provas encontrado pela Corregedoria, nada impede que o plenário do CNJ decida recomendar à Procuradoria-Geral da República a instauração de processo na esfera penal contra o hoje senador.

Limitando-se a tratar do assunto no CNJ, a defesa prévia susta que se a representação disciplinar for levada adiante, será “impossível a aplicação de qualquer penalidade administrativa e disciplinar ao reclamado de maneira absolutamente retroativa”. Moro ainda provocou o CNJ, dizendo que deveriam ter agido antes, quando os fatos a respeito da Fundação Lava Jato foram tornados públicos.

“Ao se prosseguir com procedimento claramente sem utilidade quanto à figura do ora Reclamado (na medida em que, por esta Reclamação, ele não poderá sofrer sanção disciplinar ou mesmo ser declarado inelegível), essa Corregedoria Nacional de Justiça estaria despendendo dinheiro público inutilmente, revelando um caráter persecutório de cunho arbitrário, à margem do interesse público que deveria

pautar a atuação de todos os agentes que atuam em prol do Estado”, defendeu Moro.

•        Entenda o caso

Moro é alvo de representação disciplinar instaurada de ofício em setembro de 2023 pelo corregedor Luís Felipe Salomão, após uma correição extraordinária na 13ª Vara Federal de Curitiba ter identificado “gestão caótica” de bilhões de reais angariados pela Lava Jato a partir de multas aplicadas em acordos de leniência e delação premiada aos réus e empresas investigadas.

A correição descobriu que Moro abriu o procedimento secreto para receber dinheiro dos réus da Lava Jato e devolver boa parte à Petrobras depois que tomou ciência de que a empresa seria processada nos EUA, entre o final de 2014 e meados de 2015.

O ex-procurador Deltan Dallagnol, por sua vez, além de ajudar os agentes dos EUA na ação contra a Petrobras, negociou veladamente junto aos procuradores americanos a devolução de parte da multa bilionária que foi aplicada à Petrobras anos mais tarde, em 2018.

A representação disciplinar envolvia também a juíza Gabriela Hardt, que deu seguimento ao método Moro de receber e distribuir os recursos das multas. Ela também sucumbiu à pressão do time de Deltan Dallagnol para homologar um acordo bilionário entre os procuradores e a Petrobras, para criar a famigerada Fundação Lava Jato com mais de 2 bilhões de reais oriundos de parte da multa que a petroleira pagou aos EUA.

Em 16 de abril, o plenário do CNJ decidiu acolher pedido de Salomão e desmembrar a representação e julgar Hardt primeiro, deixando Moro para segundo momento.

Salomão chamou o esquema de “cash back”, ou seja, durante vários anos, Moro e os procuradores de Curitiba “devolveram” dinheiro para a Petrobras a título de “reparação” pelos prejuízos que ela teria sofrido com a corrupção descoberta pela Lava Jato. E, anos mais tarde, a Petrobras aceitou depositar mais de 2 bilhões de reais na fundação privada idealizada por Dallagnol para promover ações políticas e sociais.

•        Atos jurisdicionais e prescrição

Segundo Moro, todas as decisões que ele tomou na 13ª Vara foram estritamente “atos jurisdicionais”, ou seja, atos que podem ser realizados pelo juiz de acordo com sua “consciência”, sem interferência ou retaliação do CNJ. No mérito, ele alegou ao CNJ que não há crimes nas condutas apuradas.

Além disso, sustentou que a pretensão punitiva prescreveu porque ele deixou de ser juiz há 5 anos. A lei, por outro lado, diz que a contagem da prescrição começa no momento em que o CNJ toma conhecimento dos fatos. De toda forma, Moro alega que não cabe punição retroativa na esfera administrativa.

“(…) cabe aqui esclarecer que o Reclamado não foi aposentado no cargo de juiz federal, de modo que nem mesmo eventual cassação de aposentadoria seria cabível no caso concreto. Assim, não há qualquer sanção disciplinar cabível por aplicação do poder disciplinar ou corretivo do CNJ (…). Tomando como exemplo as sanções mais graves, não pode o ora Reclamado ser colocado em disponibilidade, nem aposentado compulsoriamente ou demitido, pois desde 19/11/2018 já não integra mais os quadros do Poder Judiciário.”

>>> O que diz a defesa prévia de Sergio Moro ao CNJ:

1- Que o CNJ não tem mais competência para julgá-lo, pois agora é senador;

2- Que os atos descritos na representação são todos estritamente “atos jurisdicionais”, ou seja, que o juiz tem direito de praticar sem sofrer retaliação, pois o CNJ não isso está fora do alcance do colegiado, seja sob ótica administrativa ou disciplinar;

3 – No mérito, que a pretensão punitiva prescreveu e que “não houve qualquer infração disciplinar aos deveres estabelecidos para os magistrados.”

 

•        Ministério Público pede condenação de ministro de Lula por abuso de poder em eleição

 

Uma representação do Ministério Público Eleitoral em Alagoas concluiu pela condenação do ministro de Transportes, Renan Filho, e do governador de Alagoas, Paulo Dantas, ambos do MDB, por suposto abuso de poder econômico nas eleições de 2022.

O parecer da procuradoria conclui que houve uso da máquina pública com fins eleitorais na implementação, no apagar das luzes de 2021, de um programa de incentivos financeiros para manutenção na escola de alunos de ensino médio, com bolsas e premiações.

O órgão também pede a condenação do ex-secretário de Educação de Alagoas e atual deputado federal, Rafael de Brito (MDB-AL).

Procurados pela reportagem, todos negam irregularidades.

O documento é de segunda-feira (29) e foi levado ao TRE (Tribunal Regional Eleitoral) do estado.

Segundo a investigação, o governo de Alagoas burlou regras para iniciar pagamentos ainda em dezembro de 2021 em uma tentativa de escapar da legislação que veda o início da oferta de benefícios como esse em ano eleitoral.

O programa, segundo argumenta o documento, seria de caráter gratuito, exigindo-se tão somente o preenchimento de requisitos pelos beneficiários --não havendo, assim, contrapartidas, o que poderia configurar exceção à vedação prevista em lei.

A conclusão é pela inelegibilidade e cassação do diploma de Paulo Dantas e Rafael Brito. A Renan Filho, somente a inelegibilidade.

Renan Filho, hoje ministro do governo Lula (PT), era governador quando a manobra apontada foi realizada. Paulo Dantas assumiu o governo em maio de 2022, quando Renan Filho se licenciou para a eleição, e manteve os pagamentos ao longo do ano.

O programa batizado de Escola 10 foi uma das bandeiras eleitorais de Renan ao Senado, Brito à Câmara e Dantas ao governo, cargos para os quais foram eleitos. Renan Filho está licenciado enquanto é ministro. O Ministério Público afirma que as condutas impactaram no resultado eleitoral.

O documento da Procuradoria não se debruça sobre a efetividade ou qualidade da política pública, mas, sim, nas supostas irregularidades na implementação.

"É fácil perceber que houve verdadeiro atropelo nas etapas orçamentárias de execução da despesa (empenho, liquidação e pagamento) para culminar no pagamento (execução financeira) dos benefícios, tudo com o fim de fazer transparecer que o programa "Bolsa Escola 10" teria execução orçamentária em 2021", diz trecho do parecer.

A lei que criou o programa é de 10 de dezembro de 2021. Para que ele estivesse em execução neste mesmo ano, e assim configurasse ação já em andamento, o governo de Alagoas acelerou os pagamentos a alunos. As transferências ocorreram entre os dias 24 e 30 de dezembro, em valor total de R$ 18 milhões.

Os agentes de investigação apontam, no entanto, que houve burla às previsões legais para liberação de recursos. Não houve empenho em alguns dos pagamentos e todos não passaram pelas fases de liquidação e ordem de pagamentos.

Há também empenhos, que são a primeira fase da execução orçamentária, anteriores a seu respectivo processo administrativo. "Vê-se claramente que o governo do estado de Alagoas lançou mão de expedientes administrativos irregulares com o fim principal de afastar a incidência da conduta vedada", diz o parecer.

Além disso, é apontado que o governo alterou, sem previsão legal anterior, o escopo do programa. Ampliou-se para todos os alunos de ensino médio, embora a lei previa que só estudantes em situação de vulnerabilidade deveriam ser atendidos --posteriormente, a legislação foi atualizada para que o programa se tornasse universal.

"Para o Ministério Público Eleitoral, portanto, a partir do que consta nos autos, restou plenamente configurada a conduta vedada", diz o texto do Ministério Público alagoano, "uma vez que Renan Filho, enquanto Governador de Alagoas, permitiu o uso promocional do programa social em benefício de pré-candidatos, bem como Paulo Dantas e Rafael Brito autorizaram/fizeram uso promocional em favor de suas próprias candidaturas, da distribuição de incentivos financeiros aos alunos da rede pública estadual de ensino em ano eleitoral."

Em nota, Renan Filho, Paulo Dantas e Rafael Brito argumentam que o Escola 10 não pode ser configurado como iniciativa de "distribuição gratuita de bens, valores ou benefícios por parte da Administração Pública".

Segundo nota do governador de Alagoas e do deputado Rafael Brito, "o programa estabelece contrapartidas que devem ser cumpridas pelos estudantes para terem direito ao recebimento" dos valores previsto pela política.

"O programa Escola 10 é uma política de Estado de enfrentamento à evasão escolar, com condicionantes de desempenho. Portanto, não se trata de um programa de doação", diz nota de Renan Filho.

O MPE-AL, por sua vez, entende que o programa exige o cumprimento de requisitos, como frequência escolar, e isso não poderia ser entendido como contrapartidas.

O projeto de Alagoas prevê aos jovens que retornam à escola um pagamento de R$ 500, contanto que estejam com o ciclo vacinal completo. Além disso, há uma bolsa mensal de R$ 100 caso haja frequência mínima de 90% nas aulas e premiação de R$ 2.000 aos concluintes.

A política de Alagoas foi uma das que inspiraram o governo Lula a criar o Pé-de-Meia, que também prevê bolsas e poupança para alunos do ensino médio. É uma das principais aposta da gestão na área da educação.

Renan Filho (MDB) também é alvo de outra iniciativa do Ministério Público, que já pediu cassação de seu diploma. Conforme o documento enviado ao TRE-AL (Tribunal Regional Eleitoral de Alagoas), Renan foi beneficiado pelo uso indevido da máquina pública nas eleições de 2022 por intermédio do programa do governo estadual Pacto Contra a Fome, de distribuição de cestas básicas.

 

Fonte: Jornal GGN/FolhaPress

 

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