Intolerância: Em Salvador, mãe ataca
colégio católico por usar livro de Djamila Ribeiro em sala de aula
A mãe de um aluno do
Colégio Antônio Vieira, em Salvador, publicou em seu Instagram um ataque à
instituição por usar o livro "Pequeno Manual Antirracista", de
Djamila Ribeiro, nas aulas de religião. Para a mulher, é um "absurdo"
uma escola católica utilizar um livro de autora candomblecista. Para ela, a
instituição não deveria "sucumbir a essas ideologias".
“O que esperar de uma
aula de religião em um colégio católico? Não seria apenas a palavra de Deus, o
código canônico, as histórias de virtudes dos mártires, mandamentos? Qual é o
sentido e o objetivo de utilizar uma autora que vem de família de outra religião,
no caso específico candomblé? Existe qualquer conexão com a fé católica?”,
questionou a mulher.
Ao jornal Correio 24
horas, estudantes disseram que as aulas falaram sobre amor, aceitação e
compaixão, e que o combate ao racismo é estudado por meio do livro como exemplo
de ser um bom cristão.
Djamila Ribeiro se
manifestou sobre o caso em seu Instagram. "Sim, sou uma mulher de
candomblé e sempre deixei isso público e notório. Sou uma orgulhosa filha de
Oxóssi com Iansã, e o tempo que eu tenho de iniciada, muitos não têm de vida. A
Constituição de 1988 garante o direito à liberdade religiosa. Isso em nada me
ofende, muito pelo contrário, tenho muito orgulho", escreveu a autora. Ela
ainda parabenizou a escola por trabalhar para "ampliar a conscientização
dos alunos e alunas".
Em nota enviada ao
Correio, o Colégio Antônio Vieira afirmou que "embasado na Lei de
Diretrizes e Bases da Educação Nacional, reconhece a importância de garantir o
respeito à diversidade cultural religiosa do Brasil. Nesse sentido, adotamos
uma abordagem inclusiva que visa transversalizar toda a nossa prática
educativa".
"Para nós, a
educação para as relações étnico-raciais é um imperativo de reconciliação e
justiça. Por isso, incluímos livros e materiais didáticos que abordam essa
temática de forma ampla e contextualizada em nossas aulas de Ensino Religioso.
[...] Importante ressaltar que a fé cristã católica alicerça sua relação com o
mundo no exercício do amor a Deus e ao próximo, manifestado pelo amor-respeito
incondicional à vida e pela promoção da dignidade humana de todas as
pessoas", completou o colégio.
Com a repercussão do
caso, a mãe do aluno apagou a publicação. O Correio não conseguiu contato com
ela, mas o espaço segue aberto para futuras manifestações.
• Como identificar e provar intolerância
religiosa no ambiente de trabalho?
A liberdade de crença
e livre exercício dos cultos religiosos, independentemente da fé individual,
são direitos invioláveis previstos na Constituição Federal brasileira. No
entanto, dados do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania dão conta de
que casos de ataques à fé alheia têm se tornado cada vez mais frequentes no
País, com o aumento de denúncias e episódios de violência registrados.
Entre 2022 e 2023, as
denúncias por intolerância religiosa saltaram de 898 para 1.418 casos. As
violações passaram de 1.175 para 2.124 em um ano. No mercado de trabalho,
profissionais relatam casos de discriminação contra práticas religiosas,
vestimentas e o impedimento do exercício da profissão.
O advogado Giancarlo
Gregorio Terezam, especializado em Direito Trabalhista, explica como a
Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) protege os trabalhadores contra a
discriminação pela fé.
"Assim como o
assédio moral, a intolerância pode vir na forma de 'piadinhas', do impedimento
de que a pessoa pratique sua fé. Obrigar um adventista do Sétimo Dia, que
desempenhou várias funções ao longo da semana, a trabalhar nos sábados pode se
caracterizar como intolerância", exemplifica Terezam.
O especialista explica
que, salvo condições que exigem rigor sanitário e obrigam o uso de equipamentos
de proteção, as vestimentas religiosas não devem ser impedidas no ambiente de
trabalho.
"Se eu não tenho
nenhum motivo e reclamo de um adereço de uma determinada religião de alguém,
pode ser visto como intolerância", acrescenta.
Terezam afirma que, em
casos de discriminação, gravações por vídeo ou áudio ajudam a comprovar
denúncias e violações. Se ocorrer durante o modelo de trabalho remoto ou por
mensagem, por exemplo, a pessoa pode fazer gravações da tela mostrando
insultos, críticas ou rebaixamento de cargos, tendo em vista a fé do
trabalhador.
"Se o denunciante
tem uma gravação ou uma testemunha que ratifique que ela ouve insultos todos os
dias, de uma ou mais pessoas, e que isso torna o ambiente de trabalho tóxico,
pode caracterizar o dano moral, o que escala para um processo trabalhista",
afirma o advogado.
Segundo Terezam, há
três caminhos para quem deseja denunciar casos de intolerância religiosa no
ambiente de trabalho. Na primeira, pelo viés trabalhista, a defesa do
denunciante entra com uma reclamatória, apontando que a situação é
insustentável para o profissional. Daí, tenta-se a rescisão indireta.
"No aspecto
cível, a pessoa poderia tentar uma indenização por dano moral, mas isso já se
resolve na esfera trabalhista. Há, também, o aspecto criminal, pela questão da
própria intolerância. Se a pessoa está sendo, de fato, impedida de trabalhar ou
prejudicada pela sua fé, isso é crime de discriminação", finaliza o
advogado.
A lei nº 9.459/1997
tornou crime a prática de discriminação religiosa. Ela alterou os artigos 1 e
20 da Lei nº 7.716, que trata do crime de racismo, e passa a especificar também
que é crime "praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito
de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional" e que "serão
punidos, na forma desta Lei, os crimes resultantes de discriminação ou
preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional".
Fonte: Correio
Braziliense/Terra
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