'Ato de quem está perdendo o jogo', diz
analista sobre sanções dos EUA contra a China
Ao impor sanções
contra Pequim em função do conflito ucraniano, Washington escancara que
conflito na Ucrânia tem como objetivo conter o eixo Rússia-China. A Sputnik
Brasil conversou com especialistas para saber se as sanções podem minar a
parceria entre Moscou e Pequim às vésperas do encontro entre Vladimir Putin e
Xi Jinping.
Nesta quarta-feira
(1º), os EUA impuseram sanções contra empresas chinesas de alta tecnologia, por
manterem relações comerciais com a Rússia. De acordo com o Tesouro
norte-americano, as empresas chinesas forneciam componentes utilizados para a
produção de drones e outros materiais bélicos em território russo.
A Embaixada da China
em Washington reagiu, declarando que Pequim continuará a defender "seu
direito legítimo de comercializar com outros países", de acordo com as
regras da Organização Mundial do Comércio e da economia de mercado. O porta-voz
da representação diplomática chinesa, Liu Pengyu, ainda notou que as relações
entre China e Rússia não são "dirigidas contra outros países" e, por
isso, "não devem ser alvo de pressão ou intervenção de terceiros".
O tom dos EUA, no
entanto, foi de confronto: altos funcionários do governo norte-americano
afirmaram terem "alertado" a China sobre a possibilidade de sanções,
que foram aplicadas como resultado da "falta de cooperação" por parte
de Pequim, reportou o jornal The New York Times.
As empresas chinesas –
alvos das novas sanções – são acusadas pelos EUA de fornecerem detectores
infravermelhos, componentes para drones e sensores de pressão usados em mísseis
produzidos na Rússia.
Para o professor da
Universidade de Relações Exteriores da China, Marcus Vinicius de Freitas, a
imposição de sanções contra empresas chinesas mostra que os EUA têm
dificuldades de derrotar a Rússia no campo de batalha.
"O fato de os EUA
terem recorrido às sanções confirma que a Ucrânia não está ganhando a guerra e
que as contraofensivas prometidas por Zelensky não foram bem-sucedidas",
disse Freitas à Sputnik Brasil. "Isso é um enorme embaraço para a OTAN,
que apostou muitas das suas fichas nesse conflito."
Segundo ele, o
conflito ucraniano é "uma guerra contra o eixo Rússia-China", que
desafia a manutenção da hegemonia norte-americana. Nesse sentido, a China
"entende que o pacote de sanções é parte da iniciativa dos EUA de
enfraquecer a emergência de novos atores internacionais."
O doutor em Relações
Internacionais pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e
especialista em China, Diego Pautasso, acredita que Pequim está preparada para
ataques econômicos advindos dos EUA.
"A China vem
sendo objeto de sanções dos EUA desde 2008. E elas não tiveram os efeitos
desejados", disse Pautasso à Sputnik Brasil. "Os EUA continuam tendo
um déficit enorme em relação à China, exportando cada vez mais commodities e
importando bens de alto valor agregado."
Segundo Pautasso, a
China provavelmente seguirá sua política de imposição de contrassanções em
relação aos EUA. A retaliação de Pequim deverá impactar empresas dos EUA
locadas na China, conforme a lei de combate às sanções estrangeiras aprovada em
2021. A legislação prevê punição para pessoas jurídicas que colaborem com a
aplicação de sanções estrangeiras impostas contra a China.
Além do intuito de
minar a parceria sino-russa, as sanções têm o objetivo de conter o
desenvolvimento tecnológico chinês. Em sua cruzada para conter o uso
internacional da tecnologia 5G desenvolvida pela empresa chinesa Huawei, por
exemplo, os EUA acusaram a empresa de violar sanções norte-americanas impostas
contra o Irã.
"EUA estão
determinados a criar constrangimento ao desenvolvimento chinês. E a China está
se capacitando para enfrentar isso: no meio da defesa, com uma capacidade
dissuasória cada vez maior; no meio financeiro, com uma desdolarização cada vez
maior; no institucional, com acordos com um número crescente de países",
disse Pautasso. "Mas os chineses têm clareza de que o caldo vai
entornar."
·
Parceria sino-russa
As sanções
norte-americanas contra empresas chinesas foram adotadas em meio às preparações
para a visita do presidente russo Vladimir Putin à China. Com a medida, a Casa
Branca tem o intuito de minar o desenvolvimento desta parceria, que é vista
como uma ameaça aos interesses norte-americanos.
Os especialistas
ouvidos pela Sputnik Brasil, no entanto, não acreditam que as sanções levarão
Pequim a repensar a sua parceria com Moscou.
"Isso não fará
com que a China mude o seu rumo em relação à Rússia", disse Freitas.
"A parceria entre Rússia e China tem trazido benefícios para os dois
lados, com Pequim acessando petróleo e combustíveis a preço competitivo, e a
Rússia podendo vender seus produtos em um dos maiores mercados consumidores do
mundo."
O professor da
Universidade de Relações Exteriores da China nota a afinidade política entre os
líderes Xi Jinping e Vladimir Putin, que já realizaram mais de 50 encontros de
alto nível nos últimos anos.
"É natural que a
China busque ter boas relações com um vizinho nuclearmente armado, que possui
um vasto território e infindáveis recursos naturais", disse Freitas.
"Uma relação de inimizade ou belicosa com Moscou está fora de questão para
Pequim."
O entorno geopolítico
chinês já se encontra em estado bastante tensionado, em função da proliferação
de armas de destruição em massa e da forte presença dos EUA em países do
Extremo Oriente e no mar do Sul da China, lembrou Freitas.
"A grande
desvantagem da China em relação aos EUA do ponto de vista geopolítico é que ela
tem uma vizinhança muito mais complexa, com quatro vizinhos nuclearmente
armados – Índia, Paquistão, Coreia do Norte e Rússia – e ainda a presença de
Coreia do Sul e Japão, que refletem a política norte-americana na região",
declarou Freitas. "A China é um elefante que se move em uma vizinhança
complexa. Então o bom relacionamento com Moscou é necessário."
Por outro lado, as
sanções norte-americanas contra Rússia e China têm surtido efeito contrário do
esperado, expandindo a presença comercial de Moscou e Pequim em países do Sul
Global, disse Pautasso.
"No caso da
China, as sanções não surtem efeito por Pequim não ser dependente do mercado
dos EUA. Pelo contrário, elas têm um efeito rebote ao levar a China a exportar
para outros países, aumentando a sua influência em mais regiões do mundo",
acredita Pautasso.
De fato, a China
passou a comercializar menos com economias do Ocidente, como a União Europeia,
e mais com seus vizinhos da Associação de Nações do Sudeste Asiático, a ASEAN.
"A Europa
empobreceu em função dos efeitos [do conflito ucraniano] no preço dos recursos
energéticos e deixou de ser o principal parceiro comercial da China, que hoje é
a ASEAN", disse Freitas. "A partir do momento que a Europa apontou a
China como seu 'rival sistêmico', Pequim adotou medidas para aumentar o seu
comércio com parceiros do seu entorno geográfico."
Apesar dos resultados
duvidosos, os EUA mantêm sua preferência pela adoção de sanções econômicas
contra a China para frear o seu declínio relativo na arena internacional.
"Essa política
mostra a incapacidade dos EUA de competirem com a China no nível da produção,
da tecnologia e da produtividade. Essas respostas são de quem está perdendo o
jogo e quer levar a bola para casa", concluiu o especialista em assuntos chineses
Pautasso.
No dia 1º de maio, o
Departamento do Tesouro dos EUA anunciou a aplicação de sanções contra mais de
300 pessoas jurídicas, acusando-as de violar sanções unilaterais impostas pelos
EUA contra a Rússia. Além de 21 empresas localizadas na China, a lista inclui
pessoas jurídicas oriundas de países como Bélgica, Turquia, Emirados Árabes
Unidos e Azerbaijão.
¨ Trump e crescente isolacionismo nos EUA 'prejudicaram a
capacidade de dissuasão' da OTAN
Anteriormente, Donald
Trump deu sinais de que não apoiaria os Estados-membros da OTAN (Organização do
Tratado do Atlântico Norte) que não contribuíssem o suficiente para a defesa,
levando a preocupações no seio da aliança.
A ascensão de vozes
"isolacionistas" nos EUA e as recentes declarações de Donald Trump,
ex-presidente dos EUA (2017-2021), minam a OTAN, escreve o jornal
norte-americano The Wall Street Journal (WSJ), citando o chefe do comitê de
política europeia do Parlamento da Alemanha.
"Hofreiter
alertou que a ascensão de vozes isolacionistas nos Estados Unidos, incluindo os
comentários do ex-presidente Donald Trump [...] já prejudicaram a capacidade de
dissuasão da aliança", escreve WSJ.
Trump deu a entender
anteriormente que, caso vencesse as eleições de novembro nos EUA, convocaria
uma cúpula da OTAN em junho de 2025 para discutir o futuro da aliança.
Ele também afirmou que
durante sua presidência o chefe de um "grande país" não identificado
da OTAN lhe perguntou se os EUA forneceriam defesa à aliança no caso de um
"ataque" russo.
Trump, no entanto,
respondeu que não o faria a países da aliança que não contribuem o suficiente
para a defesa. O então mandatário acrescentou que "aprovaria que eles [a
Rússia] fizessem o que bem entendessem".
Os países da UE, a
maioria dos quais também faz parte da OTAN, começaram a discutir cada vez mais
a defesa europeia, padrões comuns, ordens de defesa conjuntas e planejamento
militar em meio aos temores da vitória de Donald Trump na eleição presidencial dos
EUA em novembro de 2024. Também foi proposta a introdução de um novo cargo de
comissário europeu de defesa.
Jens Stoltenberg,
secretário-geral da OTAN, ainda afirmou que a participação dos países da UE nos
gastos militares da aliança atlântica é de apenas 20%.
¨ Diretor russo do FMI: BRICS pode oferecer alternativa se o dólar
entrar em colapso
Os países do BRICS
poderiam fornecer uma alternativa ao dólar americano se o sistema monetário
internacional entrar em colapso.
Segundo o
diretor-executivo do Fundo Monetário Internacional (FMI) para a Rússia, Aleksei
Mozhin, os países do BRICS poderiam criar uma unidade de conta que seria
construída sobre as moedas dos cinco países-membros do grupo, incluindo o real
brasileiro, o rublo russo, a rupia indiana, o yuan chinês e o rand
sul-africano.
"Muito está sendo
escrito sobre as deficiências do sistema atual. Além disso, muitas publicações
mencionam o BRICS no que diz respeito a associação oferecer uma alternativa de
pagamento e solução", disse Mozhin.
"A proposta está
sendo discutida. Caso o dólar americano e o sistema monetário internacional
entrem em colapso, será necessário transformar esta unidade de conta do BRICS
em uma moeda real apoiada por mercadorias", disse o representante russo.
¨ Países do G7 deixam de discutir confisco total de ativos russos
por receio de retaliação, diz mídia
Representantes do
Grupo dos Sete (G7) têm afirmado em privado que a questão do confisco total dos
ativos russos já não é mais discutida, escreve o Financial Times.
"Embora a Ucrânia
continue insistindo no confisco completo dos ativos da Rússia, os
representantes do G7 afirmam em privado que este tópico não é mais discutido.
Em vez disso, eles estão estudando maneiras alternativas de extrair proveitos
dos ativos congelados", relata a notícia.
Segundo destaca o
jornal, os países europeus querem ficar longe de tudo que possa afetar seus
próprios ativos, "temendo retaliação".
Temendo pelos próprios
ativos
O jornal relata
também, citando fontes anônimas, que vários países, tais como a Indonésia e a
Arábia Saudita, estão tentando persuadir os países da UE a não confiscar os
ativos russos, pois temem pelo futuro de seus próprios bens no Ocidente.
"Eles estão muito
preocupados", disse um funcionário europeu, acrescentando que a principal
preocupação de tais países é "saber se seu próprio dinheiro está em
segurança".
Após o início da
operação militar especial na Ucrânia, os países do G7 e a União Europeia (EU)
congelaram quase metade das reservas de divisas da Rússia, no valor de cerca de
€ 300 bilhões (R$ 1.65 trilhão). Os países ocidentais têm procurado ativamente uma
maneira de confiscar esses ativos e transferir o dinheiro para Kiev.
O Kremlin declarou que
tais decisões "serão mais um passo na violação grave de todas as regras e
normas do direito internacional". O Ministério das Relações Exteriores da
Rússia chamou o congelamento de ativos russos de "roubo", observando
que essas medidas visam não apenas fundos privados, mas também os ativos
estatais de Moscou.
Como esclareceu o
chanceler russo Sergei Lavrov, em caso de confisco de ativos russos congelados
no Ocidente a Rússia responderá de forma adequada.
¨ Turquia 'está ciente de como Ocidente a atacará' após bloqueio
do comércio com Israel, diz Erdogan
O presidente Recep
Tayyip Erdogan disse nesta sexta-feira (3) que a guerra na Faixa de Gaza
"saiu do controle" devido ao apoio "incondicional do
Ocidente", acrescentando que Ancara está consciente de que será atacada
por sua decisão.
O único objetivo da
Turquia ao suspender o comércio com Israel é forçar Tel Aviv a declarar um
cessar-fogo à sua ofensiva mortal na Faixa de Gaza, acrescentou Erdogan.
"Nosso único
objetivo é forçar o governo [do primeiro-ministro de Israel, Benjamin]
Netanyahu, que saiu do controle devido ao apoio incondicional do Ocidente, a um
cessar-fogo", afirmou o presidente ao se dirigir a membros de um grupo
empresarial nacional em Istambul, segundo a agência turca Anadolu.
Criticando as nações
ocidentais, Erdogan disse esperar que estes países "atacassem" a
Turquia por causa da decisão.
"Estamos bem
cientes de como o Ocidente nos atacará devido às nossas restrições comerciais
contra Israel. Quando for alcançado um cessar-fogo e for permitida ajuda
suficiente em Gaza, o nosso objetivo será alcançado. A ação da Turquia será um
exemplo para outros países [...]. Não buscamos hostilidade ou conflito com
nenhum país da nossa região. Não queremos ver confrontos, sangue e lágrimas na
nossa geografia", complementou.
A guerra na Faixa de
Gaza forçou 85% da população do território a ser deslocada em meio à escassez
aguda de alimentos, água potável e medicamentos, enquanto 60% da infraestrutura
do enclave foi danificada ou destruída, de acordo com a Organização das Nações
Unidas (ONU).
No início do dia,
Erdogan confirmou que na quinta-feira (2) seu governo suspendeu todo o comércio
com Israel, o qual chega a cerca de US$ 9,5 bilhões (R$ 48,16 bilhões).
"Houve um volume
de comércio de US$ 9,5 bilhões entre nós. Ignorando esse volume de comércio,
fechamos a porta", afirmou o mandatário, citado pela mídia.
Fonte: Sputnik Brasil
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