A possível ordem de prisão internacional de
Netanyahu que causa alarme no governo de Israel
As autoridades
israelenses estão cada vez mais preocupadas diante da possibilidade de o Tribunal Penal Internacional (TPI)
emitir mandados de prisão contra seus líderes militares e políticos por
suspeita de crimes de guerra.
Alguns relatos sugerem
que o primeiro-ministro, Benjamin Netanyahu, poderia
estar entre eles.
O tribunal, com sede
em Haia, tem investigado as ações de Israel nos territórios ocupados ao longo dos
últimos três anos — e, mais recentemente, as ações do Hamas também. Ele tem o poder de acusar e
julgar indivíduos pelos crimes mais graves no âmbito do Direito Internacional.
No passado, já
emitiu mandados de prisão contra líderes como Vladimir Putin, da Rússia, Muammar Gaddafi, da Líbia, e o guerrilheiro Joseph Kony, de
Uganda.
Netanyahu classificou
a perspectiva de figuras importantes de Israel entrarem na lista de procurados
do TPI como "um ultraje de proporções históricas", acusando o
tribunal de tentar paralisar a capacidade do seu país de se defender.
Mas o fato de ele ter
optado por fazer comentários públicos tão ferrenhos sobre este assunto sugere
que, nos bastidores, tal cenário está sendo discutido ativamente.
Embora o TPI não tenha
confirmado nada, quando o procurador-chefe do tribunal, Karim Khan, visitou
Israel e a Cisjordânia ocupada em dezembro do ano passado, sua mensagem foi
clara.
O advogado britânico
visitou os locais dos ataques do Hamas em vilarejos israelenses perto da cerca
na fronteira com Gaza, pela qual homens armados liderados pelo Hamas irromperam
no dia 7 de outubro.
Também se encontrou
com líderes políticos, e viajou para Ramallah para conversar com as famílias
das vítimas palestinas sobre suas experiências em Gaza e na Cisjordânia.
Ele condenou a
violência sofrida por civis de ambos os lados, e prometeu investigar os
incidentes.
“Todos os
protagonistas devem cumprir o direito humanitário internacional”, esclareceu,
em um comunicado na época.
"Se não fizerem
isso, não reclamem quando meu escritório for obrigado a agir."
Khan disse que os
ataques de 7 de outubro — em que homens armados liderados pelo Hamas mataram
cerca de 1,2 mil pessoas, a maioria civis, e fizeram 253 reféns, segundo
cálculos israelenses — representaram "alguns dos crimes internacionais
mais graves que chocam a consciência da humanidade, crimes que o TPI foi criado
para lidar".
No caso de Israel, ele
enfatizou a obrigação de conduzir sua operação militar em Gaza de acordo com
“parâmetros legais claros que regem o conflito armado”.
Israel foi acusado de
não ter protegido suficientemente os civis durante seus bombardeios em Gaza,
embora insista que toma todas as medidas necessárias para evitar vítimas.
O Ministério da Saúde
do território palestino, administrado pelo Hamas, afirma que mais de 34.500
pessoas foram mortas lá desde o início da guerra, e que muitas eram crianças.
Khan também destacou a
necessidade de a ajuda humanitária chegar
a Gaza, sendo o acesso a alimentos, água e suprimentos médicos um direito
básico para os civis "sem mais demora, e com ritmo e escala".
Também instou o Hamas
a não desviar ou usar indevidamente os suprimentos quando eles chegassem, após
acusações de Israel de que os membros do grupo estavam saqueando caminhões e
roubando ajuda, impedindo-a de chegar à população em geral.
Israel não é membro do
TPI, e afirma que o tribunal não tem jurisdição sobre o país. Mas o tribunal
decidiu que desde 2015 tem jurisdição sobre a Cisjordânia, Jerusalém Oriental e
Gaza, depois de os palestinos terem ratificado o tratado de fundação do TPI, o
Estatuto de Roma, como Estado da Palestina.
Nenhuma democracia no
estilo ocidental teve até agora um mandado de prisão emitido pelo TPI contra
algum de seus líderes. Se isso acontecer com Netanyahu, ele será o primeiro.
Os israelenses têm uma
preocupação particular em relação ao estigma e ao potencial isolamento que isso
acarretaria.
Michael Oren foi
embaixador de Israel nos Estados Unidos entre 2009 e 2013. Em entrevista à BBC,
ele aponta para o recente processo aberto pela África do Sul na Corte
Internacional de Justiça (CIJ), que acusou Israel de genocídio contra a
população palestina em Gaza — acusação que Israel nega veementemente.
Em janeiro, o tribunal emitiu uma decisão provisória determinando que Israel tomasse medidas para prevenir atos
genocidas em Gaza, mas não chegou a pedir para que o país interrompesse sua
ofensiva militar.
“Israel saiu
relativamente ileso desse processo, mas o fato de o processo ter sido aberto
significava que Israel havia perdido a batalha”, disse ele à BBC.
"Eles sequer
deveriam ter sido abertos, e certamente é um golpe para a nossa posição
internacional e para a nossa segurança. Porque um país cujos líderes são
acusados de crimes de guerra, é mais vulnerável."
Geoffrey Nice, outro
advogado britânico, liderou o processo contra o ex-presidente sérvio Slobodan
Milosevic por crimes de guerra no Tribunal Penal Internacional para a
ex-Iugoslávia (TPII).
Ele ressalta que as
ações de ambos os lados neste conflito estão no foco do TPI.
“Qualquer investigação
não será apenas das Forças de Defesa de Israel (IDF, na sigla em inglês) e da
liderança política e militar, mas também do Hamas”, disse ele à BBC.
Ele também abordou as
insinuações de que o TPI poderia sofrer pressão política para reconsiderar sua
tomada de decisão.
“Os governos de todo o
mundo, especialmente os governos grandes e poderosos, estão aí para proteger os
interesses dos seus países."
"Então, se eles
veem um julgamento ou uma investigação se aproximando... isso poderia causar
grandes danos à reputação deles como país, e se eles considerarem que podem
interferir no julgamento ou nos processos de investigação para poupá-los desse
dano à reputação, então eles vão fazer isso, porque estão agindo no interesse
do seu país."
O prazo para a emissão
de mandados pode variar — às vezes, pode levar semanas ou até meses, entre o
momento em que o procurador do TPI solicita o mandado, e os juízes o concedem.
Muitas vezes, os
detalhes podem ser mantidos confidenciais, se for considerado que torná-los
públicos diminuiria a perspectiva de uma prisão.
Uma medida assim
contra Netanyahu, seus aliados políticos ou comandantes militares israelenses
também teria implicações práticas.
Por exemplo, afetaria
bastante sua capacidade de viajar, uma vez que os países signatários do
Estatuto de Roma são obrigados a entregar indivíduos com mandados de prisão
contra eles. Mas algumas destas nações ignoraram os mandados do TPI nos últimos
anos.
O ex-embaixador
israelense Michael Oren acredita, no entanto, que o possível impacto acabaria
sendo muito mais amplo — e mudaria a narrativa da sociedade israelense.
"Em geral, [a
sociedade israelense] responde ao amor. Não responde à agressão. Se você quiser
obter concessões dos israelenses, não bata na cabeça deles, abrace-os",
diz ele.
"Todas estas
medidas tendem a mover o pêndulo da política neste país para a direita, e não
para o outro lado. Teria um efeito bumerangue e, em vez de abrir caminhos para
um possível processo diplomático, provavelmente vai restringi-los."
¨ Complexidade em negociações afasta possibilidade do cessar-fogo
em Gaza
O Secretário de Estado
americano, Antony Blinken, se encontrou novamente com o primeiro-ministro israelense
Benjamin Netanyahu nesta quarta-feira (1º), na tentativa de pressionar para que
um acordo para a libertação de reféns e a suspensão dos combates em Gaza
aconteçam.
A análise de Lourival
Sant’Anna, especialista em assuntos internacionais da CNN Brasil, abordou as
complexidades envolvidas nas negociações para um cessar-fogo entre Israel e o
grupo militante Hamas, que controla a Faixa de Gaza.
·
Impasse nas negociações
Israel ofereceu seis
semanas de trégua em troca da libertação de 33 reféns detidos pelo Hamas. No
entanto, o grupo radical exige um cessar-fogo permanente, temendo uma possível
ofensiva terrestre israelense contra seus redutos em Rafah.
Sant’Anna destaca que
o primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, enfrenta pressões internas de partidos ultranacionalistas que
ameaçam derrubar seu governo caso ele aceite o acordo proposto. “Ao negociar
com o Hamas, Netanyahu precisa mostrar uma face agressiva, uma face hostil ao
Hamas, para não cair o governo. Mas ao mostrar essa face hostil, Netanyahu
também dá elementos ao Hamas para desconfiar ou rejeitar esse acordo”, explica.
Por outro lado, a
oposição sinaliza que apoiaria Netanyahu caso sua queda fosse motivada por
essas negociações. “No entanto, Netanyahu sabe que a situação dele ficaria
muito precária, muito instável, depender da oposição em um governo de minoria
para se manter naquela posição”, continuou Sant’Anna.
·
Incerteza sobre paredeiro dos reféns
Outro fator
complicador é a incerteza sobre o paradeiro de alguns dos reféns inicialmente exigidos por Israel. O Hamas admitiu não
conseguir localizar todos eles, possivelmente devido a mortes causadas pelos
bombardeios. “Foi ficando claro para Israel que uma parcela dessas pessoas
[reféns] estaria morta”, completou o analista.
Essa situação levou
Israel a intensificar os ataques, atingindo inclusive familiares de líderes do
Hamas.
Diante desse cenário
complexo, Sant’Anna ressalta que qualquer peça faltante nesse “quebra-cabeça”
pode impedir um acordo definitivo. Apesar do prazo estabelecido por Israel ter
expirado, as negociações seguem em um impasse, com ambos os lados buscando uma
solução satisfatória para encerrar o conflito violento. “O acordo está longe de
estar garantido”, finalizou.
¨
Agências da ONU se preparam para invasão em
Rafah e alertam para “massacre”
Uma invasão israelense
em Rafah colocaria em risco a vida de centenas de milhares em Gaza e seria um
duro golpe para as operações de ajuda de todo o território palestino.
A declaração, feita
nesta sexta-feira (3), é do escritório humanitário da ONU, enquanto a
Organização Mundial da Saúde anunciou planos de contingência para uma incursão.
Israel alertou
repetidamente sobre uma operação contra o Hamas na cidade de Rafah, no sul de
Gaza, onde cerca de um milhão de pessoas estão refugiadas, tendo fugido por meses de bombardeios.
“Poderia ser um
massacre de civis e um golpe incrível para a operação humanitária em toda a
Faixa, porque [a operação] é dirigida principalmente a partir de Rafah”, disse
Jens Laerke, porta-voz do escritório humanitário da ONU (OCHA), numa coletiva
de imprensa em Genebra.
Israel disse que
trabalhará para garantir a retirada segura dos civis de Rafah.
As operações de ajuda
em Rafah incluem clínicas médicas, armazéns abastecidos com suprimentos
humanitários, pontos de distribuição de alimentos e 50 centros para crianças
gravemente desnutridas, disse Laerke.
O OCHA fará todo o
possível para garantir a continuação das operações de ajuda, mesmo no caso de uma incursão, e está estudando como fazer isso,
acrescentou.
Um responsável da
Organização Mundial de Saúde disse no mesmo briefing que tinha sido preparado
um plano de contingência para Rafah, que incluía um novo hospital de campanha,
mas disse que não seria suficiente para evitar um aumento substancial no número
de mortos.
Mais de 34 mil
palestinos já foram mortos em quase sete meses de conflito, segundo o
Ministério da Saúde de Gaza.
“Quero realmente dizer
que este plano de contingência é um band-aid”, disse Rik Peeperkorn,
representante da OMS para o território palestiniano ocupado, através de
videoconferência.
“Isso não impedirá de
forma alguma a esperada mortalidade e morbidade adicionais substanciais
causadas por uma operação militar.”
Fonte: BBC News Brasil/CNN
Brasil
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