O que as eleições municipais apontam sobre
os rumos da política no Brasil?
Assim, antes de entrar
na expressão eleitoral mais complexa, vejamos aquelas que apontam um fenômeno
parecido. Como método, adotaremos a análise das capitais dos estados. Quase 1
em cada 4 brasileiros vive nas capitais. A análise das tendências eleitorais
nelas pode, portanto, apresentar sinais dos rumos da política no país.
Considerando apenas
elas, temos 20 prefeitos aptos a se reeleger (ou seja, que estão no seu
primeiro mandato).
Desses, apenas 7 não
estão em primeiro nas pesquisas. Em dez capitais é possível e provável que a
reeleição ocorra ainda no primeiro turno. Assim, é possível, e em muitos casos
muito provável, que em dois terços delas o prefeito seja reeleito. Um número muito
próximo ao de 2008, quando o índice foi o maior nos últimos 20 anos.
Vale a ponderação de
que as chances de reeleição em prefeituras são altas, porque a máquina pública
é usada para conquistar votos. São eleições nas quais as questões clientelistas
são mais fortes, e, de fato, asfaltar ruas adiciona pontos percentuais nas
pesquisas.
Mesmo com essa
capacidade de uso da máquina pública para garantir votos, há momentos
específicos em que nem mesmo quilômetros de recapeamento podem assegurar a
reeleição.
2016 é uma expressão
disso. Foram eleições muito impactadas pela Lava Jato. Foi o prenúncio de
fenômenos mais inesperados, como Witzel e Zema, em 2018. Era o começo de uma
fase em que a palavra “outsider” pululava nas análises políticas.
Agora, é importante
destacar a tendência oposta – sem esquecer a particularidade paulista. Além da
reeleição, são muitas as capitais nas quais as pesquisas são esmagadoras para
quem já está no cargo. Rio de Janeiro, Recife, Salvador, Maceió e Macapá são as
principais.
Esses dados refletem
índices mais gerais de aprovação dos governos municipais. O instituto Ipsos
Public Affairs, por exemplo, apontou que, entre esses prefeitos, a média de
aprovação (ou seja, avaliação de ótimo ou bom) está em 60%.
Além disso, é possível
que o PT volte a duas capitais, Teresina (onde de 47% nas pesquisas) e Goiânia
(com um cenário mais acirrado). Em 2020, o PT ficou de fora de todas as
capitais, o que aconteceu pela primeira vez desde a redemocratização. Goiânia,
em especial, chama mais atenção, sendo uma cidade muito influenciada pelo
agronegócio, com o PT conseguindo, até agora, um bom desempenho - isso sem
contar Boulos, um aliado fiel.
Não é uma recomposição
“espetacular”, mas é um indicativo no quadro geral. Além disso, é uma política
do PT apostar em eleições com aliados para sustentar seu governo, fruto também
das transformações no regime político dos últimos anos.
Considerando isso, ao
que parece, o resultado final deste ciclo eleitoral nas capitais será mais
positivo para partidos do chamado Centrão, com destaque para União Brasil, PSD
e MDB. Todos eles fazem parte da Frente Ampla. Entre esses partidos, há
candidatos apoiados por Bolsonaro, em torno de dez. No entanto, assim como
Nunes, alguns deles são apostas mais “institucionais” de Bolsonaro.
Excluindo São Paulo, o
que as eleições estão apontando é uma tendência de busca pela estabilização da
política depois de anos de governo Bolsonaro e do forte desarranjo produzido
pela extinta Lava Jato. Uma estabilização que não é estrutural, uma vez que
tanto do ponto de vista das forças internas como do cenário internacional são
muitas as tensões que atravessam a situação política.
Trata-se de uma busca
pela estabilização, perseguida por um judiciário com superpoderes, que, após
abrir a caixa de Pandora do bolsonarismo com a prescrição de Lula em 2018,
agora atua para conter não só seu rebento rebelde, mas também seu subproduto.
Em outras palavras, é a tentativa de dar ares de estabilidade em um regime
fortemente abalado pelo golpe institucional de 2016 e todos os eventos
subsequentes a ele.
Fato é que Marçal é
uma severa advertência dessa busca por normalização. Mais do que um fenômeno
isolado, Marçal expressa as contradições orgânicas do país. Soube aproveitar o
espaço eleitoral órfão de uma extrema-direita radicalizada. Talvez tenha perdido
a mão no fustigamento dos seus adversários eleitorais, cujo ápice foi a
cadeirada, que se tornou um símbolo nacional.
No entanto, tudo ainda
é muito incerto, e mesmo os resultados das pesquisas não podem ser levados ao
pé da letra. Em 2022, ainda no primeiro turno, o DataFolha errou em 14 p.p. a
diferença entre Lula e Bolsonaro. A AtlasIntel, a que menos errou entre as grandes,
errou em 9,2 p.p.
Para além do método
específico de cada agência, há vários fatores que entram no debate sobre a
diferença entre os dados das pesquisas e os resultados das urnas. Um deles é o
voto envergonhado, outro são as tendências de voto útil. O primeiro se atribui
a eleitores da extrema-direita que têm vergonha de declarar publicamente seu
voto. O segundo se deve a um fenômeno que ocorre às vésperas do primeiro turno,
que é a tendência de o eleitor migrar de última hora para o candidato que ele
considera “menos pior”, para vencer alguém que ele não deseja que seja eleito.
As duas coisas podem ocorrer, e dependem, em primeiro lugar, da situação
política da eleição.
Além desses, é sabido
por pesquisas que uma parte significativa do eleitorado (o DataFolha estimou
12% em 2018) decide no dia da eleição. Por fim, é uma prerrogativa básica
interpretar que os institutos não são neutros e que podem operar interesses
próprios – ainda que tudo isso seja um cálculo muito milimétrico, pois quanto
mais o instituto erra, mais ele perde credibilidade e, portanto, recursos.
Tomando como
referência o agregador de pesquisas, que faz a média de todas, temos um cenário
em que Nunes tem 25%, Boulos 24% e Marçal 21%. Com uma margem de apenas 4 p.p.
entre o primeiro e o terceiro, é preciso considerar que nenhum cenário de
segundo turno pode ser descartado.
É importante
acompanhar se pode ocorrer um fenômeno de desidratação dos votos no fim da
eleição sobre as candidaturas de Tabata e Datena. Caso isso aconteça, a
migração de votos poderia favorecer, em primeiro lugar, Boulos, mas também
Nunes, já que a menor parcela tem chance de ir para Marçal.
É um fato a moderação
do tom de Marçal, o que indica que a “freada” (e, em alguns lugares, queda) nas
pesquisas tem uma correspondência. Ao mesmo tempo, pelo estilo agressivo, pode
haver voto envergonhado em Marçal? Não podemos descartar. Os vídeos de campanha
apontam para apoio orgânico e entusiasmado, algo que nem Boulos nem Nunes
conseguem. Isso pode gerar um efeito contágio no dia das eleições, sobre o
eleitorado que decide de última hora? Sim, mas ninguém pode garantir.
Como não poderia
deixar de ser, uma análise mais profunda só se concretiza com as urnas abertas.
Até lá, o único veredito inquestionável é que, enquanto a extrema-direita
renova seus tons de radicalização, aqueles que se declaram de esquerda adotam o
caminho da permanente moderação e adaptação à ordem das coisas.
Como disse o professor
Lincoln Secco, em um debate recente que fizemos sobre a importância de Gramsci
na atualidade, o que falta é uma alternativa política que se rebele contra a
“institucionalização da esquerda”.
• Guia das eleições municipais 2024
Falta pouco para o
primeiro turno das eleições municipais deste ano, que ocorre no domingo de 6 de
outubro.
Os eleitores vão às
urnas para escolher prefeitos, vice-prefeitos e vereadores nas 26 capitais
brasileiras e nas outras mais de 5,5 mil cidades do país.
O segundo turno, caso
necessário, acontece no último domingo do mês, dia 27 de outubro, somente nas
cidades com mais de 200 mil eleitores.
Com base
principalmente em materiais informativos divulgados pelo Tribunal Superior
Eleitoral (TSE) e pelos Tribunais Regionais Eleitorais (TREs), a BBC News
Brasil responde abaixo a perguntas sobre as eleições deste ano.
<><> Como
votar nas eleições?
É importante se
preparar com antecedência não só para escolher bem seus candidatos, mas também
para saber seu local de votação. É possível descobrir isso no site do TSE ou no
aplicativo e-Título. Os TREs também oferecem atendimento presencial e por telefone
ao público.
O TSE estimula que o
eleitor leve junto consigo para a urna uma colinha eleitoral com os números de
seus candidatos.
<><> Com
quantos anos posso votar?
Já pode votar quem tem
16 e 17 anos, mas nesses casos, o voto é facultativo. A partir dos 18 anos, o
voto é obrigatório. Essa regras valem para idades atingidas na data da votação.
O voto também é
facultativo aos maiores de 70 anos e aos analfabetos.
<><> Posso
votar em outra cidade?
Todo eleitor tem seu
domicílio eleitoral, que na prática, é um município. Não é possível estar
vinculado a mais de um domicílio eleitoral ao mesmo tempo.
Nas eleições
municipais não há possibilidade de voto em trânsito, como ocorre nas eleições
para presidente da República e governador.
Portanto, quem não
estiver no seu domicílio eleitoral e não puder votar deverá justificar a
ausência no dia da votação.
<><> Posso
votar com o RG?
De acordo com o site
do TSE, o eleitor que souber seu local de eleição pode votar apenas com um
documento oficial com foto, sem exigência do título de eleitor.
Com ou sem título em
mãos, são aceitos como documento oficial com foto: carteira de identidade,
passaporte, carteira de categoria profissional reconhecida por lei, certificado
de reservista, carteira de trabalho ou carteira nacional de habilitação.
Também é possível usar
o e-Título. Mas essa possibilidade só é válida se a sua foto aparecer no
aplicativo. Caso não esteja aparecendo, não será considerado válido para votar.
Certidões de
nascimento e casamento não valem como documento para votar.
<><> Posso
usar o celular na hora do voto?
O eleitor não poderá
ingressar na cabine de votação portando celular, máquinas fotográficas e
filmadoras. Caso descumpra essa regra, pode ter de pagar multa de até R$ 15 mil
e ser preso. Nada de selfies ou gravações do voto na urna, portanto.
<><> Se eu
votar só para um dos cargos em disputa, meu voto é invalidado?
Não. Cada voto é
contabilizado separadamente e um não invalida os demais.
<><> Qual
a diferença entre voto branco e nulo?
Não há diferença entre
voto branco e voto nulo para a contagem dos votos, ambos são excluídos da
totalização dos resultados.
O eleitor vota em
branco quando pressiona a tela branca da urna eletrônica e confirma. Já o voto
nulo ocorre quando há erro de digitação. Se o eleitor digitar um número que não
corresponda a partido ou candidato, o voto é anulado.
<><>
Quando sai o resultado das eleições?
Como a votação é feita
por meio da urna eletrônica, o processo de apuração é relativamente rápido.
A apuração começa a
ser divulgada a partir das 19h de Brasília.
Fonte: Esquerda
Diário/BBC News Brasil
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