Como estão os países signatários do BRICS
na 'corrida do urânio'?
Considerada fonte de
energia limpa por não emitir gases poluentes, a energia nuclear tem ganhado
cada vez mais atenção. Donos de grandes reservas de urânio, como estão os
países signatários do BRICS nessa corrida?
Brasil, Rússia, China,
Índia e África do Sul, os primeiros membros do BRICS e que, nessa ordem, dão
nome ao bloco, se destacam, cada um a sua maneira, quando o assunto é energia
nuclear, segundo especialistas ouvidos pelo podcast Mundioka, da Sputnik Brasil.
De acordo com Jorge
Mortean, mestre em estudos regionais do Oriente Médio pela Escola Internacional
de Relações Exteriores da República Islâmica do Irã e doutorando em geografia
humana pela Universidade de São Paulo (USP), o Brasil pode ser considerado como
um país que domina a tecnologia para a produção de energia nuclear.
O próprio
diretor-geral da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA), Rafael
Grossi, em entrevista exclusiva à Sputnik Brasil, ressaltou o potencial
brasileiro, baseado na infraestrutura nuclear existente e avançada com a qual o
país conta.
O Brasil, atualmente,
com as usinas Angra 1 e Angra 2, além de pequenos reatores em São Paulo, Minas
Gerais e Rio de Janeiro, alocados com finalidade de pesquisa e treinamento.
A China, por sua vez,
é quem mais constrói reatores nucleares para a produção de energia no mundo,
conta Thalles Campagnani, engenheiro mecatrônico e mestrando em ciências e
técnicas nucleares na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).
"A China está
construindo reator nuclear numa velocidade muito grande. A China constrói
reatores tradicionais, constrói reatores projetados por outras pessoas, ela
projeta seus próprios reatores, ela constrói reator rápido, constrói reator
térmico, ela está fazendo pesquisa em reatores a tório", resume.
Apesar da potência
apresentada pela China, Mortean coloca Rússia e Índia no mesmo patamar dos
chineses em relação ao domínio para a produção de energia atômica. O nível de
desenvolvimento é tão alto que, conforme relembra o pesquisador, os três países
já realizaram testes com armamentos nucleares e obtiveram sucesso.
A África do Sul também
é um país rico em urânio. Segundo a Associação Nuclear Mundial, o país está
entre os nove principais donos de jazida de urânio no mundo. Mortean conta que
há, inclusive, suspeitas de que os sul-africanos testaram a detonação de uma
bomba nuclear durante a década de 1980. "São suposições", enfatiza.
Irã, o enriquecimento
de urânio e o limiar entre a produção de energia e armamentos
Com a entrada de novos
membros para o BRICS concretizada neste ano, o bloco recebeu Egito, Etiópia,
Arábia Saudita, Emirados Árabes Unidos e o Irã. Este último, enfrenta
preocupações por parte da Agência Internacional de Energia Atômica (AEIEA) e
tem o urânio enriquecido no centro das tensões com os EUA.
Urânio enriquecido
Campagnani explica que
existem dois tipos de urânio-235 e o urânio-238, o primeiro é considerado
físsil, ou seja, pode sustentar uma reação em cadeia de fissão nuclear.
Portanto, este é o favorito por fissionar com nêutrons de qualquer quantidade
de energia.
Entretanto, conforme
lembra o pesquisador, "a cada mil átomos de urânio, sete são o 235, que é
o favorito". O urânio-238, existente em maior quantidade na natureza, além
de necessitar de nêutrons com maiores quantidades de energia para fissionar,
ele produz plutônio.
Nesse sentido, para
produzir energia nuclear sem necessariamente produzir plutônio, os cientistas
aumentam a quantidade de urânio-235, o que é chamado de enriquecimento.
"Enriquecimento
isotópico. Ou seja, a gente está aumentando a quantidade daquele isótopo, o
isótopo urânio-235".
O analista comenta que
há vários processos de enriquecimento, como à laser ou à difusão gasosa, mas o
favorito, que tem um gasto menor de energia para fazer o processamento, é o
enriquecimento por centrifugação.
Nesse exercício, ele
conta que é preciso minerar o urânio e "fazer vários processos químicos
até chegar ao hexafluoreto de urânio, que é o urânio misturado com flúor, ele
vai ficar gasoso e então passa ele na centrífuga", explica, contando uma parte
do processo.
A passagem na
centrífuga é feita repetidas vezes. O pesquisador afirma que é gasto muito
urânio para poder obter uma pequena quantidade de urânio enriquecido.
O urânio-235 é
justamente aquele que tem capacidade explosiva. "Para você conseguir fazer
um dispositivo, um explosivo nuclear, você precisa de muito, muito urânio-235.
Para você produzir uma energia, para você fazer uma usina nuclear, para você
produzir energia com urânio, você não precisa de tanto enriquecimento",
explica Campagnani.
• Urânio e a tensão EUA x Irã
O novo presidente do
Irã, Masoud Pezeshkian foi eleito neste ano sob a promessa de retomar diálogo e
acordo nuclear com Ocidente. Em 2018, o então presidente dos EUA, Donald Trump,
anunciou a decisão de abandonar o acordo nuclear firmado com o Irã, retomando
as sanções contra o país.
Pezeshkian afirmou,
além da perspectiva de retomar o diálogo, que o Irã fora forçado a enriquecer
urânio devido a saída dos EUA do acordo nuclear.
Mortean analisa que
apontar para a ausência de escolhas soa reducionista do ponto de vista
diplomático e que os EUA tem seus interesses estratégicos.
Por outro lado, não se
pode afirmar que o Irã está enriquecendo urânio para fins bélicos. "Na
prática, até agora, não houve provas de que o Irã conseguiu um domínio pleno da
tecnologia nuclear que aponte que o país esteja pronto para testar um armamento".
O especialista encara
esse grande desenvolvimento nuclear no âmbito do enriquecimento de urânio como
a "grande barganha" que o Irã tem diante do atual cenário
geopolítico.
"Se eles concluem
o desenvolvimento dessa bomba e testam com sucesso, eles fecham qualquer tipo
de porta para negociações financeiras que estão por trás dessa ferramenta de
barganha, que é o programa de desenvolvimento nuclear iraniano. Ou seja, a 'ameaça
iraniana' de poder desenvolver, de mostrar ao mundo que eles têm capacidade, de
rapidamente escalar um desenvolvimento de uma arma nuclear faz com que o mundo
pare para escutá-los", avalia.
O pesquisador, que
esteve no Irã entre 2009 e 2012, atesta, a partir de suas vivências no país do
Oriente Médio e acompanhar o setor que o Irã "não desenvolveu a arma, mas
já conseguiram um nível de desenvolvimento tecnológico que lhes capacita para a
produção dessa arma".
Países do BRICS podem
cooperar com o Irã no âmbito da energia nuclear?
Para Mortean, devido à
tensão com os EUA e a priorização dos países em manter boas relações com os
norte-americanos, a cooperação no âmbito da energia nuclear entre os países do
BRICS e o Irã pode não decorrer de forma pujante.
A exceção, segundo
ele, é a Rússia, que já está envolvida nessas relações com o Irã. O
especialista recorda que graças a ajuda dos russos que os iranianos conseguiram
restabelecer suas usinas nucleares após o fim da guerra contra o Iraque nos
anos 1990.
Para Estados Unidos e
União Europeia, principais opositores do programa de desenvolvimento nuclear
iraniano, o envolvimento de outros novos membros poderia "convalidar
qualquer desenvolvimento nuclear iraniano que possa levantar suspeita com
relação aos seus objetivos não pacíficos, digamos assim", comprometeria
outros países que "não querem se envolver com conflitos de qualquer
natureza. Infelizmente, o programa nuclear iraniano arrastaria esses outros
membros nessa direção caso houvesse publicamente uma declaração de apoio",
finaliza Mortean.
<><> Líbia
está estudando adesão ao BRICS para expandir laços com países emergentes, diz
Benghazi
As autoridades do
leste da Líbia estão estudando seriamente a questão da adesão ao BRICS como
parte de uma estratégia econômica comum para expandir os laços com os países em
desenvolvimento, disse o ministro das Relações Exteriores do governo do leste
da Líbia, Abdul Hadi al-Hweij, à Sputnik.
Após a derrubada e o
assassinato do líder líbio Muammar Kadhafi em 2011, a Líbia deixou de funcionar
como um Estado unificado e agora tem dois governos que não se reconhecem um ao
outro.
O primeiro, apoiado
pela ONU e liderado por Abdul Hamid Mohammed al-Dabaib, opera em Trípoli.
O segundo, com poderes
da Câmara dos Representantes da Líbia, tem sede em Benghazi e é liderado por
Osama Hammad.
Al-Hweij acredita que
o BRICS é um bloco econômico importante e apoia a adesão da Líbia à associação.
"Estamos
estudando esse passo como parte de nossa estratégia para fortalecer os laços
econômicos com os países em desenvolvimento e realizar o desenvolvimento
econômico sustentável. [...] Trabalharemos nessa questão, estamos interessados
em participar do BRICS", disse o ministro.
Segundo ele, seu
governo já tomou medidas para alcançar esse objetivo e pretende discutir o
assunto com vários círculos políticos.
Ele acrescentou que a
Líbia pode aderir ao BRICS, pelo menos como um país observador na primeira
etapa.
A Rússia assumiu a
presidência do BRICS em 1º de janeiro deste ano. Nessa data, além da Rússia,
Brasil, Índia, China e África do Sul, entraram no bloco novos países-membros: o
Egito, a Etiópia, o Irã, os Emirados Árabes Unidos e a Arábia Saudita.
Em junho, o
primeiro-ministro da Malásia Anwar bin Ibrahim confirmou a Lula da Silva a intenção
da Malásia de participar do BRICS.
No dia 20 de agosto, o
Azerbaijão solicitou oficialmente sua adesão ao BRICS.
Recentemente, o
assessor presidencial russo Yuri Ushakov confirmou que a Turquia havia se
candidatado a membro pleno do BRICS e que o pedido está sendo analisado.
• e EUA articulam parceria para transição
energética a partir de reservas brasileiras
O solo brasileiro tem
tudo o que é preciso para transição energética, visto que possui reservas de
todos os chamados minerais críticos, essenciais para a produção de baterias
para carros elétricos, turbinas eólicas e painéis solares.
Por sua vez, os
Estados Unidos querem liderar a transição e estão procurando por fornecedores
confiáveis, visto que a China é um dos maiores produtores dos minerais, mas se
encontra em meio a uma "guerra comercial" com Washington.
De acordo com o jornal
O Globo, fatores políticos, econômicos e estratégicos colocam o Brasil em um
espaço confortável na mesa de negociações da cadeia mundial de suprimentos de
minerais críticos. Além dos EUA, o Serviço Geológico do Brasil (SGB) já foi procurado
por pares da China, Alemanha, Reino Unido, Austrália, Canadá, entre outros.
"Temos condições
de oferecer todos os minerais críticos que o mundo precisa, sem exceção. Temos
pelo menos um depósito de cada um desses minerais", disse Valdir Silveira,
diretor de geologia e recursos minerais da SGB.
O fato de ter geração
de energia elétrica majoritariamente de fontes renováveis reforça a pretensão
do Brasil de ser mais do que um fornecedor de matéria-prima, e talvez mais do
que isso, um processador dessas matérias primas e fabricante de bens, mas para
que tal indústria se aqueça, é necessário muitos investimentos.
"Essa temática de
minerais críticos ganhou outra proporção com a discussão da transição
energética no pós-pandemia — afirma Abrão Neto, CEO da Amcham Brasil (Câmara
Americana de Comércio para o Brasil). O CEO acrescentou que "seria uma
relação ganha-ganha" que proporcionaria "ganhos potenciais para a
indústria extrativa e para a indústria de beneficiamento e de produção de maior
valor agregado no Brasil".
Em julho, o secretário
de Estado Adjunto de Recursos Energéticos dos EUA, Geoffrey Pyatt, esteve no
Brasil para "acelerar a cooperação com o Brasil em toda a gama de insumos
energéticos da transição". Na época, Pyatt afirmou que o assunto mais importante
da visita foi a parceria em minerais estratégicos, conforme noticiado.
Brasil e EUA têm um
histórico de mais de três décadas de conversas sobre segurança energética com
assinatura de acordos. Até 2012, foram oito documentos de parceria, muitos com
foco nos biocombustíveis. No entanto, do ano citado até 2023, nenhum novo documento
foi assinado pelos governos, apesar de ter havido uma continuidade das
conversas técnicas entre membros do setor privado, escreve a mídia.
Recentemente, dois
novos acordos de parceria para geração de energia limpa entre Brasil e EUA
foram assinados por ministros. O Ministério das Minas e Energia informou que os
dois países possuem "circunstâncias diferentes", mas têm trabalho em
conjunto para destravar financiamento para mover a transição energética.
A pasta não cita
resultados concretos dos acordos de parceria do passado, mas destaca que
"um dos relacionamentos estratégicos na área de energia" são os
biocombustíveis, tema tratado com o secretário de Estado adjunto
norte-americano em julho.
• Chefe da União Europeia lamenta apoio da
Hungria à iniciativa de Brasil e China para paz na Ucrânia
O chefe da diplomacia
da União Europeia (UE), Josep Borrell, afirmou nesta segunda-feira (30) que a
adesão da Hungria à iniciativa promovida por Brasil e China para a paz na
Ucrânia viola a unidade do bloco, que até então reconhecia exclusivamente a "fórmula
de paz" de Vladimir Zelensky.
"Infelizmente
neste assunto a UE já não tem mais unidade, após uma das suas nações, a
Hungria, ter feito abertamente a escolha de apoiar a iniciativa
sino-brasileira", escreveu Borrell em seu blog.
China e Brasil
publicaram em maio um consenso sobre a resolução política da crise ucraniana em
seis pontos, que recebeu apoio de mais de 110 países. Em meio à Assembleia
Geral da Organização das Nações Unidas (ONU), em Nova York, ocorreu uma reunião
de 15 Estados, incluindo França, Suíça e Hungria, para a formação do grupo
"Amigos da Paz", sugerido pelos dois países do Sul Global.
Em junho, foi
realizada uma conferência sobre a Ucrânia em Buergenstock, na Suíça, para a
qual Moscou não recebeu convite. O Kremlin declarou que buscar opções de saída
para a situação do conflito ucraniano sem a participação da Rússia é
absolutamente ilógico e sem perspectivas.
O comunicado conjunto
ao final da conferência pedia que o controle da usina nuclear de Zaporozhie
fosse devolvido a Kiev e continha apelos pela liberdade de navegação nos mares
Negro e de Azov, além de trocas e liberação de todos os prisioneiros de guerra.
O documento ainda
mencionou a necessidade de diálogo entre todas as partes para encerrar o
conflito. Dos 91 participantes da reunião, apenas 76 apoiaram o comunicado, que
não foi assinado por Armênia, Bahrein, Brasil, Índia, Indonésia, Líbia, México,
Arábia Saudita, África do Sul, Tailândia e Emirados Árabes Unidos.
Posteriormente, Iraque, Jordânia e Ruanda retiraram suas assinaturas do
comunicado.
O presidente da
Rússia, Vladimir Putin, apresentou iniciativas para a resolução pacífica do
conflito na Ucrânia: Moscou se comprometeria a interromper imediatamente os
confrontos e a declarar prontidão para negociações após a retirada das tropas
ucranianas dos novos territórios da Rússia.
Acrescentou que Kiev
deveria renunciar a qualquer intenção de ingressar na Organização do Tratado do
Atlântico Norte (OTAN), assim como garantir a desmilitarização e a
desnazificação do país, que passaria para um status neutro, não alinhado e não
nuclear. O líder russo também mencionou a suspensão das sanções contra a
Rússia.
Após o atentado
terrorista das Forças Armadas da Ucrânia na região de Kursk, Putin também
considerou impossíveis as negociações com aqueles que "atacam
indiscriminadamente civis, a infraestrutura civil ou tentam criar ameaças a
instalações nucleares".
Mesmo assim, as
propostas de paz de Moscou para a Ucrânia, mencionadas anteriormente pelo líder
russo, não foram anuladas. Porém, neste momento, a Rússia não conversará com a
Ucrânia.
Fonte: Sputnik Brasil
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