sábado, 24 de agosto de 2024

Marçal, o coach, caminha para esfacelar o bolsonarismo e destronar Bolsonaro

Na última década, os chamados “outsiders” na política brasileira foram muitos. A imensa maioria conseguiu apenas orbitar em torno de figuras mais relevantes, conquistando cargos parlamentares, enquanto alguns atingiram protagonismo significativo. João Doria é um dos exemplos, embora hoje esteja fora da vida pública. Já Jair Bolsonaro (PL) é o caso de maior sucesso. O Brasil assistiu à ascensão explosiva do militar medíocre e indisciplinado, assim como deputado bizarro, que agora “rege” praticamente metade do eleitorado nacional, uma horda de lunáticos e desajustados que o vê como um deus, tornando-o o ponto máximo da liderança da extrema direita no Brasil.

Até alguns meses atrás, o coach caricato Pablo Marçal (PRTB), um sujeito com forte apelo nas redes sociais, onde propaga conteúdo fuleiro de autoajuda, que já foi condenado a quatro anos e cinco meses de cadeia por integrar uma quadrilha de fraude a bancos, parecia ser apenas mais um desses seres grotescos que almejam uma vaguinha em algum cargo político. Já tinha tentado ser candidato à Presidência em 2022, mas passou praticamente em branco na empreitada, não fosse pela ligeira fama de trambiqueiro que já tinha à época. Agora, resolveu investir mais forte e ir até o fim como candidato à Prefeitura de São Paulo, embora seja goiano e nunca tenha morado na capital paulista.

Pulando algumas páginas de sua trajetória recente na briga para se cacifar como postulante ao Executivo da maior metrópole do país, o que vemos agora é Marçal em segundo lugar, deixando o prefeito Ricardo Nunes (MDB), candidato oficial de Bolsonaro e do bolsonarismo, para trás e colando na traseira de Guilherme Boulos (PSOL), o candidato da esquerda e do presidente Lula (PT), que lidera a corrida. Mas como isso ocorreu?

Marçal é uma figura histriônica e repugnante. Culpa uma adversária pelo suicídio do pai, chama outro oponente de “cheirador de cocaína” sem ter qualquer razão ou motivo para isso, diz que vai revogar o ensino da teoria da evolução das espécies das escolas municipais paulistanas, que implantará teleféricos para transportar milhões de cidadãos diariamente, e que usará drones para perseguir ladrões pelas ruas de São Paulo. Um amontoado de canalhices e de bobagens. Com isso, a exemplo de Bolsonaro, ele conseguiu protagonismo e conquistou as mentes e corações dos eternos adultos disfuncionais que compõem grande parte do eleitorado e que vivem em busca de um salvador estravagante.

No entanto, o que está gerando um terremoto na atmosfera política brasileira não é esse avanço e protagonismo conquistados com a já batida fórmula do esdrúxulo que rende votos. Uma pesquisa Datafolha divulgada nesta quinta (22), justamente a que mostra Marçal na vice-liderança, expõe outros fatos, estes sim muito mais relevantes: um racha profundo na extrema direita, uma erosão no bolsonarismo e um possível destronamento de Jair Bolsonaro como deus supremo dos fundamentalistas reacionários brasileiros, algo até pouquíssimo tempo impensável.

A sondagem do Datafolha revelou que entre os eleitores de Bolsonaro, que deveriam votar em Ricardo Nunes por ordem do líder-mor, 44% vão optar por Marçal, enquanto apenas 30% escolherão o atual prefeito, como quer o chefe. Já entre os seguidores fanáticos do também bolsonarista Tarcísio de Freitas (Republicanos), que é governador de São Paulo, o fato se repete: 41% desses eleitores querem Marçal no Palácio do Anhangabaú, ao passo que só 28% irão votar em Nunes para um novo mandato. O drama se intensifica ainda mais quando olhamos para os cidadãos de São Paulo que se declaram oficialmente ‘bolsonaristas’.

Entre eles, 46% afirmaram ao Datafolha que votarão no coach forasteiro condenado, contra 28% que optarão por Nunes. Na prática, são ‘bolsonaristas’ que vão desobedecer abertamente às ordens de Bolsonaro na hora de escolher o prefeito paulistano. Ou seja, Marçal enfraqueceu de forma inequívoca o poder do líder da extrema direita nacional, acostumado a dar as coordenadas e ver o seu “gado” segui-las bovinamente.

Tal fato ficou mais do que comprovado com os últimos acontecimentos nos ambientes político e digital. Bolsonaro vem desesperadamente ordenando a seus eleitores que deixem de apoiar Marçal e entrem imediatamente no barco de Nunes, mas a imensa maioria parece ignorá-lo. Para piorar, o coach tem feito postagens insultando o ex-presidente e seus filhos e, para surpresa de todos, os defensores de tais agressões na extrema direita se avolumam nas caixas de comentários para brigar ao lado do candidato do PRTB, entrando em confronto com os rebentos do líder máximo da seita. Marçal conseguiu o que parecia impossível, que é fazer uma fatia imensa do bolsonarismo se voltar contra Bolsonaro e seus filhos.

Nas redes, Pablo Marçal usa das táticas de guerrilha que levaram Bolsonaro ao estrelato, mas o alvo é o próprio ex-presidente e os demais integrantes do clã. Acostumados sempre a atacar com escatologias seus adversários, eles não conseguem reagir aos deboches e às bobajadas do coach-candidato, que ri e os deixa nitidamente irritados e bufando de ódio. Acredite, usando o bolsonarismo em seu estado bruto, Marçal corrói o bolsonarismo, irrita os bolsonaristas e o próprio Bolsonaro, fazendo-o perder força, poder e protagonismo.

É claro que ainda é muito cedo para afirmar que tal situação seguirá ocorrendo ou se agravará. Entretanto, um fato é certo: há alguém que já está minando o fenômeno do bolsonarismo, o consumindo por dentro, e tirando forças da maior liderança extremista surgida no Brasil nas últimas décadas. Se Marçal triunfar e conseguir proeminência política em nível nacional, o que seria perfeitamente possível caso se torne prefeito de São Paulo, em um ou dois anos o bolsonarismo estará fragmentado e completamente minado para seguir exercendo o poder que tem hoje.

•        Candidatura de Marçal causa racha na extrema-direita

O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e seus aliados mantêm ceticismo quanto ao impacto de Pablo Marçal (PRTB) nas próximas eleições para a prefeitura de São Paulo, apesar de seu crescimento nas pesquisas.

Bolsonaro decidiu manter o apoio à reeleição de Ricardo Nunes (MDB), acreditando na contenção da migração de votos do seu eleitorado.

Aliados do ex-presidente expressam desconfiança em relação a Marçal, citando declarações anteriores contra Bolsonaro e a possibilidade de Marçal fornecer palanque a um adversário em 2026.

Durante a campanha de 2022, Marçal criticou Bolsonaro e Lula, o que foi relembrado e amplamente discutido em grupos bolsonaristas após os debates.

Para contrapor Marçal, Eduardo Bolsonaro (PL-SP) foi escalado para participar ativamente na campanha de Nunes, tentando mitigar a perda de popularidade após um vídeo controverso do prefeito.

A estratégia inclui destacar o oportunismo eleitoral de Marçal e ligá-lo a notícias negativas de membros do PRTB.

Eduardo Bolsonaro também comparou Marçal a figuras como Joice Hasselmann e Alexandre Frota, que se distanciaram do bolsonarismo após serem eleitos.

Em resposta, Marçal defendeu sua posição, alegando que suas críticas foram situacionais e que já reconciliou com Bolsonaro. Apesar das tensões, Bolsonaro elogiou Marçal recentemente, mas reafirmou seu apoio a Nunes, gravando um vídeo de endosso ao prefeito.

•        Datafolha com Marçal: extrema-direita começa a se descolar de Bolsonaro. E isso é mais perigoso

A recente troca de farpas entre Pablo Marçal (PRTB), candidato à Prefeitura de São Paulo, e Jair Bolsonaro (PL), ex-presidente e figura central da extrema-direita brasileira, revela um movimento que muitos já antecipavam: a fragmentação do bolsonarismo e a ascensão de novos líderes que, embora bebam da mesma fonte extremista, começam a se descolar da figura do ex-presidente.

O incidente teve início quando Marçal, que outrora buscava apoio de Bolsonaro, decidiu responder a uma postagem no Instagram do ex-presidente com um elogio disfarçado de alfinetada. A resposta seca de Bolsonaro, “Nós? Um abraço”, foi suficiente para desencadear uma série de réplicas e tréplicas que, longe de prejudicar Marçal, acabaram por reforçar sua imagem pública.

Acabou acusando Bolsonaro de cheirar cocaína, como fez com Guilherme Boulos. Marçal, que já foi chamado de “ex-coach” e hoje se apresenta como empresário e político, parece ter entendido a fórmula para se destacar: rebaixar ainda mais o nível do debate, sem a necessidade de subordinação a Bolsonaro, que abriu a porta para um delinquente ainda pior que ele.

Este episódio marca um ponto de inflexão na extrema-direita brasileira. Durante anos, o bolsonarismo parecia ser um movimento monolítico, com Jair Bolsonaro como sua única face visível. No entanto, a recente pesquisa Datafolha para a Prefeitura de São Paulo mostra que a realidade pode estar mudando. Com Marçal tecnicamente empatado na liderança com Guilherme Boulos (PSOL) e Ricardo Nunes (MDB), surge espaço para outras vozes dentro do espectro fascista, vozes essas que não necessariamente precisam do endosso de Bolsonaro para prosperar.O ex-presidente, que por muito tempo foi o bastião do extremismo no Brasil, começa a se ver isolado por figuras que, embora tenham surgido à sua sombra, agora buscam protagonismo. Marçal, ao transformar um confronto com Bolsonaro em material de campanha, demonstra uma audácia que poderia ser impensável há poucos anos.

Essa independência crescente de Bolsonaro é um fenômeno que pode ter consequências duradouras. A extrema-direita, outrora coesa em torno de um único líder, agora se fragmenta em várias facções, cada uma tentando se destacar com seu próprio discurso. Se, por um lado, isso dilui o poder de Bolsonaro, por outro, pode tornar a extrema-direita mais perigosa e imprevisível. Afinal, sem um líder centralizador, novas lideranças podem surgir, cada uma com sua própria agenda e métodos, tornando o cenário político ainda mais ameaçador.

A pesquisa Datafolha, ao revelar o crescimento de Marçal à frente de Ricardo Nunes, atual prefeito de São Paulo e apoiado por Bolsonaro, é um indicador claro dessa nova realidade. Enquanto Bolsonaro tenta se agarrar ao legado de 2018, novos atores como Marçal avançam rapidamente, ocupando espaço e angariando apoio. E, embora Marçal tente manter alguma ligação com o bolsonarismo, sua reação rápida ao ser rejeitado demonstra que ele está mais do que preparado para seguir seu próprio descaminho, mesmo que isso signifique entrar em conflito direto com o ex-presidente.

Essa dinâmica de conflito interno e crescimento de novas lideranças pode indicar que o bolsonarismo, como movimento centralizado, está com seus dias contados. O perigo agora é que, em seu lugar, cresça uma extrema-direita mais pulverizada, mas igualmente eficaz em mobilizar a população. A política brasileira, assim, pode estar entrando em uma nova fase, em que o perigo não vem de uma única figura, mas de um conjunto diversificado de líderes.

Em suma, a discussão entre Pablo Marçal e Jair Bolsonaro não é apenas um episódio isolado de vaidades políticas. É, antes de tudo, um sinal de que a extrema-direita brasileira está evoluindo – ou, dependendo do ponto de vista, se degenerando – para um novo formato. Esse novo cenário pode resultar em uma direita mais fragmentada, mas também mais resiliente e adaptável, capaz de perpetuar suas ideias e influenciar a política nacional por mais tempo que poderíamos imaginar.

•        Datafolha retrata início da batalha do futuro do bolsonarismo

A mais recente pesquisa Datafolha, realizada entre os dias 20 e 21 de agosto, trouxe dados importantes sobre o cenário eleitoral em São Paulo. Pablo Marçal, autointitulado “coach”, não apenas ultrapassou Ricardo Nunes, atual prefeito, entre os eleitores bolsonaristas, mas também registrou um crescimento significativo de 7 pontos percentuais no eleitorado geral. No entanto, antes de tirar conclusões definitivas sobre o futuro político de Marçal, é crucial considerar o contexto em que esses números foram colhidos e o que eles realmente representam.

De forma geral, Marçal cresceu sete pontos desde o início de agosto, e esse avanço foi mais intenso entre os grupos mais identificados com o bolsonarismo: na faixa etária de 35 a 44 anos (de 16% para 32%), na faixa de 45 a 59 anos (de 7% para 19%), entre evangélicos (de 18% para 30%), entre eleitores de Jair Bolsonaro na eleição de 2022 (de 29% para 44%) e entre aqueles que se declaram bolsonaristas (de 25% para 46%). Esses dados refletem que, embora Marçal tenha ampliado sua base, esse crescimento está fortemente concentrado em segmentos que tradicionalmente já apoiam Bolsonaro.

Contudo, é importante ressaltar que o eleitorado da capital paulista tende a ser mais progressista e menos suscetível à influência bolsonarista. Nas eleições de 2022, por exemplo, a cidade de São Paulo elegeu Lula para a presidência, enquanto Bolsonaro perdeu na capital. Além disso, Fernando Haddad, candidato do PT ao governo do estado, venceu na capital paulista, enquanto Tarcísio de Freitas, candidato apoiado por Bolsonaro, foi derrotado. Esses resultados indicam uma tendência progressista entre os eleitores da capital, o que pode representar um desafio adicional para a campanha de Pablo Marçal.

Um ponto crucial que não pode ser ignorado é que essa pesquisa foi realizada antes de o conflito entre a família Bolsonaro e Pablo Marçal atingir seu ápice. Nos últimos dias, a tensão entre ambos escalou, com a família Bolsonaro intensificando suas críticas contra Marçal. Como a pesquisa Datafolha foi conduzida antes desses acontecimentos, ela não captura o impacto total que esse conflito poderia ter no desempenho de Marçal nas urnas.

Além disso, se a campanha bolsonarista realmente se concentrar em atacar Pablo Marçal e apoiar Nunes, e se o eleitorado geral de Bolsonaro se mostrar fiel ao ex-presidente, isso pode representar um grande problema para a campanha de Marçal. Até o momento, sua campanha parece fortemente alicerçada nos votos bolsonaristas, sendo esses essenciais para uma eventual virada rumo ao segundo turno.

No entanto, nenhuma das pesquisas atuais, incluindo esta do Datafolha, indica que Marçal esteja em posição de garantir uma vaga no segundo turno, considerando o contexto atual e o cenário eleitoral. O verdadeiro teste para Marçal será verificar como sua campanha, e a campanha contra ele liderada pela família Bolsonaro, se desdobrará nas próximas semanas.

Portanto, é preciso aguardar as próximas pesquisas para medir o impacto completo desses eventos. Somente assim será possível avaliar se Marçal conseguirá manter sua posição ou se seu crescimento se limitará aos simpatizantes de Bolsonaro. O fator Bolsonaro ainda será crucial para determinar os rumos desta eleição e o destino político de Pablo Marçal.

 

Fonte: Fórum/O Cafezinho/DCM

 

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