EUA: políticas educacionais de republicanos
e democratas
A educação escolar dos
EUA não é das melhores. Em programas de comparação internacional de estudantes,
como o Pisa, os EUA ficam em uma posição relativa muito abaixo daquela que
seria esperada, considerando sua realidade econômica. Em alguns indicadores
educacionais, a posição dos EUA é próxima daquela observada em países com PIB
per capita igual à metade do norte-americano.
Dadas as condições
materiais daquele país e a existência de escolas e universidades excelentes,
essa situação poderia parecer estranha. Entretanto, a desigualdade social, em
especial a desigualdade na distribuição de renda, parece provocar uma também
grande desigualdade educacional. Isso faz com que coexistam uma educação de
ponta e um enorme desenvolvimento científico e cultural, de um lado, com
péssimos indicadores educacionais, de outro.
Outras características
daquele país que o coloca em uma posição bastante atípica dizem respeito ao
ensino superior. Nos EUA, o ensino superior é majoritariamente público.
Entretanto, apesar de bem menos privatizado do que o ensino superior no Brasil
(um quarto dos estudantes daquele país estão em instituições privadas,
proporção inversa da brasileira, onde um quarto está em instituições públicas),
sua taxa de privatização é mais elevada do que aquela que se observa
tipicamente nos países mais avançados. Outra característica bastante marcante
dos EUA é o fato de que lá o ensino superior público não é gratuito e as
anuidades cobradas são bastante altas, situação bem diferente daquela
tipicamente observada nos países avançados.
·
Como os dois partidos que disputam a
presidência daquele país entendem essa situação e que propostas têm?
Em alguns aspectos, as
diferenças entre os partidos Democrata e Republicano dos EUA são muito
pequenas. Entretanto, nas políticas sociais, não ocorre o mesmo. Nesse aspecto,
o Partido Democrata tem um perfil mais parecido com o da socialdemocracia
europeia, enquanto o Partido Republicano defende valores tradicionais, às vezes
embasados em princípios religiosos. Vejamos alguns exemplos.
O Partido Republicano
defende a não estabilidade de professores e uma política de remunerações que
podem depender de critérios sem relação com o desenvolvimento escolar e
educacional. Por exemplo, o seu atual candidato à Casa Branca entende que a
educação está tomada por “maníacos radicais de esquerda” e isso deve acabar. E,
talvez, para acabar com isso seja necessário acabar antes com a estabilidade de
professores.
Democratas, por sua
vez, reconhecem a importância da estabilidade de professores e da participação
da comunidade (educadores, pais, líderes comunitários e estudantes) na
definição dos projetos educacionais e uma melhor remuneração dos trabalhadores
da educação. Democratas reconhecem que a possibilidade de municípios
complementarem os orçamentos das escolas, inclusive salários, faz com que a
educação nas cidades de maiores rendas per capita seja muito diferente daquela
oferecida aos jovens e às crianças das cidades mais pobres, sendo essa uma
importante fonte das desigualdades educacionais que devem ser superadas.
Republicanos entendem
que a ajuda federal destinada à educação e à saúde de crianças de famílias de
baixa renda hoje existente deve ser eliminada. Outras propostas, ainda, são
transformar despesas públicas com educação em vales (vouchers) que podem ser usados
para pagamento de escolas privadas, e fechar a secretaria de educação, órgão
correspondente ao Ministério da Educação do Brasil.
O Partido Democrata,
por seu lado, afirma entender que educação não é mercadoria e que todas as
crianças e jovens devem ter acesso ao ensino de qualidade controlado pelo setor
público. As desigualdades devem ser enfrentadas por meio de ajudas do governo federal
voltadas às crianças e aos jovens dos segmentos mais desfavorecidos. Democratas
também entendem que recursos públicos devem ser direcionados apenas a
instituições públicas.
Republicanos tendem a
apoiar o ensino domiciliar inclusive subsidiado com recursos públicos.
Democratas, por outro lado, reconhecem a importância do ensino presencial, que
ficou muito clara durante os confinamentos provocados pela covid-19.
Como aqui, outras
pautas invadem a questão educacional nos EUA. Democratas repudiam a proposta de
que professores usem armas nas escolas, um ponto defendido por republicanos;
seria a versão estadunidense das escolas militarizadas? Segundo estes últimos, as
escolas também devem promover os “valores ocidentais”, enquanto democratas
entendem que todas as crianças e jovens devam ser tratados da mesma forma,
independentemente de suas origens nacionais, sexo, identidade de gênero,
religião ou da ausência dela e de outras características pessoais.
Outro ponto importante
a diferenciar os dois partidos é quanto ao financiamento do ensino superior.
Uma prática comum – cobrança combinada com financiamentos para pagar as
anuidades – tem provocado danos bastante importantes. As dívidas estudantis,
quase totalmente federais, estão próximas a dois trilhões de dólares, valor
próximo ao PIB nominal brasileiro de um ano inteiro, o que corresponde a uma
média da ordem de US$ 40 mil por devedor.
Por um lado, isso
afeta mais duramente os grupos social e economicamente mais frágeis; por outro
lado, reduz ou mesmo anula os ganhos econômicos individuais esperados como
decorrência da frequência de um curso superior. Além disso, a possibilidade de
financiamento para arcar com as anuidades contribui para o aumento destas.
·
Como democratas e republicanos entendem
essa questão?
Parte do Partido
Democrata defende simplesmente o fim das cobranças do ensino superior em
instituições públicas, proposta abraçada por Bernie Sanders em seu programa
quando candidato à Presidência da República. As atuais propostas dos
democratas, reconhecendo a gravidade do problema criado pela cobrança do ensino
superior, são, entretanto, mais modestas, mas defendem a redução das dívidas
estudantis e dos juros dos empréstimos públicos.
A proposta do Partido
Republicano para enfrentar a mesma questão é mais corriqueira: promover escolas
e cursos mais baratos. Esta resposta está de acordo com o fato de que 59% dos
republicanos ou simpatizantes pensam que o ensino superior tem um efeito negativo
para o país. Acabar com ele seria uma possibilidade?
Enfim, tanto lá como
aqui, o entendimento do papel da educação escolar em uma sociedade difere
bastante segundo a posição política e ideológica dos partidos. E, tanto lá como
aqui, a pauta educacional está contaminada pela pauta ideológica.
¨ Estados Unidos: a chance dos democratas com Kamala Harris. Por
Virgílio Arraes
A desistência do
presidente Joe Biden de concorrer à eleição e a sua substituição por Kamala
Harris renovaram a disputa de novembro à Casa Branca. Embora tardia a alteração
dos democratas, seus efeitos fizeram-se sentir logo, ao abater a confiança dos
rivais republicanos, seguros até então da visível fragilidade do primeiro
postulante.
Conquanto a troca de
nome fortaleça a agremiação democrata no plano interno, no externo, ela ainda
não influenciou o andamento de temas preocupantes como o da continuidade das
confrontações no Oriente Médio e no Leste da Europa. Nas duas, a perspectiva é
de alargar o conflito, não de interrompê-lo, a despeito das perdas humanas e
dos custos materiais.
Colocada a dramática
situação, questiona-se a ascendência dos Estados Unidos sobre o destino de seus
aliados. O inquestionável apoio de Washington a Kiev e a Telavive não tem sido
capaz até o momento de favorecê-los de maneira terminante. Em um, a guerra se
estende há mais de dois anos e no outro aproxima-se de um.
Em sendo período de
pleito presidencial, vem à baila com maior intensidade reflexão sobre o papel
dos Estados Unidos na política internacional. Com a vitória na bipolaridade há
três décadas e meia, o país se fixaria como o guardião da ordem capitalista. Assim,
toda tentativa de desestabilizar o sistema aos olhos da Casa Branca deveria ser
contida de imediato. Por isso, o envio de efetivos em largas passadas ao
Iraque, antigo aliado, em 1991.
O ingresso dos
democratas com Bill Clinton no lugar dos republicanos de George Bush a partir
de 1992 não suspenderia o agir belicista ao redor do planeta. A catastrófica
intervenção na antiga Iugoslávia seria um exemplo. A nação considerava-se nas
palavras de Madeleine Albright, titular do Departamento de Estado no segundo
mandato do dirigente, ‘indispensável’.
Com o retorno
republicano, sob a pesada batuta de George Bush Jr., a utilização da força como
ferramenta da política exterior manteve-se e se ampliaria ao promover sem
hesitação dois conflitos: o do Afeganistão na esteira do atentado terrorista de
setembro de 2001 e meses depois o do Iraque no alardeio injustificado de ser
ele detentor de armas de destruição em massa.
A eleição de Barack
Obama aparentava ser a fase de recolha de tropas em solo médio oriental e
cercanias e de reflexão sobre a atuação corroída de Washington desde o
encerramento da rivalidade amero-soviética.
O Nobel da Paz
conceder-lhe-ia no alvorecer da gestão condições para tanto. Seria guardadas as
devidas proporções como na época de Jimmy Carter, ao assumir o país pouco tempo
após a saída dos contingentes do Vietnã. Parte seria implementada pelo governante,
porém, seria insuficiente diante dos anseios da sociedade em prol de mais
diplomacia e menos forças armadas e acarretaria desta forma frustração.
Donald Trump e Joe
Biden não iniciariam guerras de modo direto; todavia, o último se relacionaria
com duas, a despeito de não ter sido o promovedor. Contudo, ele seria, na visão
dos envolvidos, patrocinador de um dos lados e, por conseguinte, com capacidade
de abreviar a duração da contenda.
Na prática, seu
governo leva a prolongá-las, com elevação do sofrimento e da angústia nas áreas
em combate e nas conexas com elas e, ao mesmo tempo, com corrosão do próprio
prestígio perante as demais potências. Portanto, o mundo aguarda com ansiedade
o desfecho do pleito de novembro, uma vez que pode haver a correção de rumo da
política externa.
Fonte: Por Otaviano
Helene, no Correio da Cidadania
Nenhum comentário:
Postar um comentário