Comitiva brasileira propõe à OEA relatoria
de crimes contra democracia e se contrapõe a bolsonarismo
Uma comitiva de
congressistas brasileiros propôs a criação na CIDH (Comissão Interamericana de
Direitos Humanos), vinculada à OEA (Organização dos Estados Americanos), de uma
relatoria sobre crimes contra a democracia, nos moldes de outras subcomissões existentes
no organismo, como povos indígenas e mulheres.
Também foi discutida a
instalação, em separado, de uma comissão de acompanhamento permanente sobre
milícias no Brasil.
Os temas foram
debatidos em uma reunião na manhã de terça-feira (30) em Washington (EUA) entre
a delegação liderada pela senadora Eliziane Gama (PSD-MA), relatora da CPI do 8
de Janeiro, a secretária-executiva da Comissão Interamericana de Direitos Humanos,
Tania Reneaum Panszi, e o relator especial para Liberdade de Expressão, Pedro
Vaca.
Integram a delegação
brasileira o senador Humberto Costa (PT-PE) e os deputados Jandira Feghali (PC
do B-RJ), Henrique Vieira (PSOL-RJ), Rafael Brito (MDB-AL) e Rogério Correia
(PT-MG).
A articulação para a
visita aos EUA vinha sendo feita desde o final do passado pelo Instituto
Vladimir Herzog, que organiza a viagem, motivada pela ideia de trocar
experiências tendo em vista os desafios semelhantes à democracia em ambos os
países.
Os esforços também
acontecem em paralelo a uma ofensiva internacional liderada pelo deputado
Eduardo Bolsonaro (PL-SP), que já esteve na capital americana ao menos duas
vezes neste ano para denunciar uma suposta perseguição política e ataques à
democracia pelo atual governo no Brasil.
A proposta de uma
relatoria sobre crimes contra a democracia não é focada apenas no Brasil,
abrangendo toda a região coberta pela CIDH. Eliziane diz que o próximo passo é
fazer uma provocação, via Congresso e Executivo brasileiros, para que a
organização analise a ideia -para ser implementada, ela depende da chancela dos
demais países membros, disse a senadora.
Foi feito também um
convite para que a CIDH visite o Brasil. Eliziane afirmou ainda que vai
solicitar até agosto uma audiência pública na comissão, que deve ocorrer em
novembro, para debater direitos humanos no país.
Com relação à comissão
sobre milícias no Brasil, Henrique Vieira afirmou que a comitiva deve fazer uma
articulação junto com o Ministério da Justiça e o Itamaraty para propor a
criação desse novo mecanismo.
"Falamos de como
o desenvolvimento das milícias no Rio de Janeiro e a sua expansão para o
conjunto do Brasil é um ataque direto à democracia. A lógica miliciana
interfere diretamente em processos eleitorais, inclusive com violência política
contra eleitos. Marielle Franco, por exemplo, foi assassinada como pano de
fundo em uma ação miliciana", disse o deputado.
Os congressistas
afirmam que também foram questionados pelos representantes da CIDH sobre o
embate recente entre Elon Musk, dono do X (ex-Twitter), e o ministro do STF
(Supremo Tribunal Federal) Alexandre de Moraes.
Segundo Correia, a
comitiva brasileira fez uma defesa do trabalho das cortes no Brasil. "Nós
dissemos que o que foi divulgado foi a decisão, não o processo. Na verdade, o
que o ministro Alexandre Moraes enfrentou foi um processo longo e reiterado de
crimes na plataforma digital", afirmou Feghali .
O tema, no entanto,
não foi abordado na reunião que os parlamentares tiveram durante a tarde com os
deputados democratas Jim McGovern, Greg Casar, Chuy Garcia e Delia Ramirez. Há
duas semanas, o Comitê do Judiciário da Câmara, comandado pelo republicano Jim
Jordan, divulgou um relatório em que expôs decisões sigilosas do ministro do
STF.
O foco do encontro
desta terça foi a articulação entre Brasília e Washington em defesa da
democracia, disseram os participantes. Foram discutidas estratégias de combate
à desinformação, os ataques de 6 e 8 de janeiro e a resposta dada por cada um
dos países, inclusive pelo Legislativo.
Garcia disse que
conversou com os brasileiros sobre os desafios enfrentados por ambos os países,
e questionou se os envolvidos no 8 de janeiro foram responsabilizados pela
Justiça de modo semelhante ao que vem acontecendo com apoiadores de Donald
Trump.
"Nós queremos
criar um movimento internacional, uma articulação internacional para isolar a
extrema direita", afirmou Feghali, destacando a presença de McGovern no
encontro, deputado que barrou uma audiência articulada por bolsonaristas no
Legislativo americano.
O encontro acontece
pouco mais de um mês após a passagem por Washington de uma outra delegação,
liderada por Eduardo Bolsonaro. Na ocasião, o grupo participaria de uma
audiência intitulada "Brasil: Uma crise da democracia, da liberdade e do
Estado de Direito?", a qual foi bloqueada por McGovern, copresidente
democrata do órgão, que desde então se tornou alvo de bolsonaristas.
Nesta terça, porém,
uma nova audiência com a mesma temática foi anunciada para o próximo dia 7, com
a presença do jornalista americano Michael Shellenberger, que divulgou os
arquivos do Twitter relacionados ao Brasil, do CEO da rede conservadora Rumble,
Chris Pavlovski, e do ativista brasileiro Paulo Figueiredo Filho, alinhado ao
bolsonarismo.
O evento está sendo
organizado pelo subcomitê de Saúde Global, Direitos Humanos Globais e
Organizações Internacionais. O copresidente republicano do órgão, Chris Smith,
já recebeu bolsonaristas em Washington e, após o bloqueio da audiência na
Comissão de Direitos Humanos, já havia prometido insistir na realização dela em
outro espaço.
A iniciativa faz parte
de uma ofensiva internacional coordenada por Eduardo Bolsonaro para angariar
apoio a alegações de perseguição e censura no Brasil. Além de visitas
frequentes a Washington -houve ao menos outras duas, em novembro e fevereiro-,
ele esteve no início do mês na Bélgica, em missão ao Parlamento Europeu. O
embate entre Musk e Moraes foi um dos temas centrais das conversas.
• Deputados republicanos dos EUA
reorganizam audiência para discutir suposta ‘crise’ no Brasil
Um subcomitê do
Congresso dos Estados Unidos vai organizar na próxima terça-feira, dia 7, uma
audiência pública para discutir uma suposta crise na “democracia, liberdade e
Estado de Direito” do Brasil. O ativista e jornalista americano Michael
Shellenberger é um dos convidados. Ele ficou conhecido por publicar os chamados
“Twitter Files Brazil” e chamar o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF),
Alexandre de Moraes, de “ditador”.
Outros convidados
incluem o empresário Christopher Pavlovski, criador da rede social Rumble,
usada principalmente por bolsonaristas suspensos em outras plataformas, e o
influencer brasileiro Paulo Figueiredo Filho. A audiência foi convocada pelo
deputado republicano Chris Smith, presidente do subcomitê de Saúde e Direitos
Humanos Globais e Organizações Internacionais, ligado ao Comitê de Assuntos
Internacionais.
Smith tinha proposto
em março uma audiência no Congresso com o mesmo título da que será organizada
na semana que vem. Na época, o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP)
escreveu no X (antigo Twitter) que mais de 50 parlamentares brasileiros
participariam da reunião. Porém, de acordo com o texto divulgado pelo filho do
ex-presidente Jair Bolsonaro, o deputado democrata Jim McGovern teria bloqueado
a organização da audiência.
Parlamentares
bolsonaristas também se organizaram no último mês para ouvir nomes relacionados
ao “Twitter Files”. Em 11 de abril, Shellenberger falou à Comissão de
Comunicação e Direito Digital (CCDD) do Senado brasileiro sobre suas acusações
contra o Judiciário brasileiro. Ele participou em audiência convocada pelo
senador Magno Malta (PL-ES). Na semana passada, deputados bolsonaristas da
Comissão de Segurança Pública aprovaram requerimentos para ouvir o empresário
dono da rede social X (antigo Twitter), Elon Musk.
No começo de abril,
Musk fez uma série de críticas e ataques a Moraes, acusando o magistrado de
censura. Em resposta, o ministro incluiu o bilionário como investigado no
inquérito das milícias digitais por “dolosa instrumentalização” da rede social.
Por trás das acusações
de Musk, está o “Twitter Files Brazil”, uma série de e-mails divulgados por
Shellenberger. São mensagens trocadas entre funcionários do antigo Twitter em
2020 e 2022 relatando e reclamando de decisões da Justiça que determinaram exclusão
de conteúdos em investigações envolvendo a disseminação de fake news.
Alexandre de Moraes
não é diretamente citado nesses documentos. Inicialmente, Shellenberger havia
afirmado que o ministro havia ameaçado processar um advogado do Twitter.
Depois, o americano recuou e admitiu o erro. “Isso está incorreto. Não tenho
provas de que Moraes tenha ameaçado processar criminalmente o advogado
brasileiro do Twitter”, escreveu.
O caso repercutiu
entre trumpistas nos Estados Unidos. Há duas semanas, a ala republicana da
Comissão de Justiça da Câmara dos Representantes dos EUA divulgou um relatório
sobre a suposta “censura do governo brasileiro” ao X (antigo Twitter) e a
outras redes sociais, como Facebook e Instagram. O documento incluía 88
decisões do STF e do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) determinando a retirada
de perfis das plataformas. Muitas delas foram tomadas por Moraes em processos
que tramitam sob sigilo.
De acordo com o STF,
os documentos divulgados pelos deputados dos EUA não eram decisões
fundamentadas que determinaram a retirada de conteúdos ou perfis, mas sim os
ofícios enviados às plataformas para cumprimento da decisão.
• Organizações protestam contra prisão de
jornalista em Cuba por críticas ao regime
Várias organizações
que atuam com direitos humanos vêm se manifestando contra a prisão em Cuba do
jornalista José Luis Tan Estrada. Segundo observadores internacionais, ele foi
detido após publicar na internet críticas ao regime num momento em que a ilha
enfrenta a pior crise econômica em três décadas.
As acusações contra
Estrada não foram especificadas. O jornalista foi capturado na última sexta
(26) e levado ao presídio Villa Marista, em Havana, para onde vão os acusados
de crimes políticos. Segundo seu perfil nas redes sociais, ele tem um blog e é
colaborador de veículos independentes como CubaNet Noticias e Diário de Cuba.
A prisão de Estrada
indica uma estratégia mais ampla do regime para reprimir as vozes dissidentes
após protestos recentes. De acordo com o site Periódico Cubano, a ditadura
intensificou as ameaças e ações contra aqueles que considera sediciosos,
passando a impor penas mais longas a presos políticos. A detenção ainda realça
a tensão crescente entre autoridades e ativistas que criticam as suas
políticas.
Ainda segundo veículos
locais, Estrada participou de uma reunião no final de março com outros
jornalistas e ativistas defensores dos direitos humanos para discutir
estratégias e medidas que poderiam aliviar a crise econômica e promover
reformas democráticas. O Periódico Cubano informou que as medidas incluiriam o
apoio a manifestações pacíficas e a libertação de presos políticos.
Não é a primeira vez
que o jornalista é alvo de repressão em função de sua atividade profissional.
Em novembro de 2022, ele foi demitido do cargo de professor da Universidade de
Camagüey. Nos últimos dias, foi multado por usar as redes para denunciar situações
de abandono e má gestão governamental.
Há duas semanas,
Estrada relatou ter sido multado em 3.000 pesos cubanos (R$ 646,5, na cotação
atual) por violar um decreto usado pelo regime para silenciar críticos.
"[Uma inspetora] me mostrou uma pasta cheia de publicações minhas nas
plataformas Facebook e X, além de curtidas de memes, comentários, curtidas de
outras publicações, memes compartilhados, inclusive algumas do ano passado. De
acordo com a inspetora, eu 'gosto de coisas engraçadas contra líderes'",
escreveu ele nas redes sociais.
Várias organizações
protestaram contra a prisão. Em nota, a PEN internacional, que representa
escritores, pediu a libertação de Estrada e apelou às autoridades cubanas para
que parem com o "assédio às vozes críticas" no país. Já Astrid
Valencia, diretora-adjunta de pesquisa para as Américas da Anistia
Internacional, afirmou que o regime tem medo da liberdade de imprensa.
"Sem liberdade de
imprensa, a auditoria e o escrutínio dos que estão no poder ficam reduzidos.
Portanto, a estratégia dos Estados que violam os direitos humanos é silenciar o
mensageiro", escreveu ela nas redes.
Johanna Cilano,
investigadora da Anistia Internacional, acrescentou que ele foi detido
arbitrariamente. "Denunciar não é crime. Ajudar quem precisa de remédios,
comida ou abrigo não é crime. Mostrar solidariedade, civilidade e
comprometimento não é crime", escreveu ela.
Cuba enfrenta uma
crise econômica quase sem precedentes desde a pandemia, convivendo com escassez
de alimentos, de remédios e de combustível. Famílias ainda relatam falta de
energia -os serviços de fornecimento pioraram em março, quando obras de
manutenção na central termelétrica Antonio Güiteras -a mais importante da ilha,
localizada na província de Matanzas --começaram a provocar cortes de energia.
Os EUA mantêm um
bloqueio econômico contra a ilha há mais de seis décadas. O embargo foi
reforçado nos últimos anos, primeiro durante o mandato de Donald Trump e,
depois, pelo atual presidente, Joe Biden. Em 2021, Washington voltou a incluir
Cuba em sua lista de patrocinadores do terrorismo, uma medida que dificulta
transações comerciais com a ilha e investimentos nela.
Antes raras,
manifestações contra o regime têm ocorrido com cada vez mais frequência em
Cuba. Embora a Constituição de 2019 conceda aos cidadãos o direito de
protestar, uma lei que delineia esse direito está paralisada no Legislativo, o
que faz com que aqueles que decidem ir às ruas fiquem em uma espécie de limbo
legal.
Os protestos que mais
chamaram a atenção desde então ocorreram em 11 de julho de 2021, em meio a uma
onda de atos no país considerada a maior desde a Revolução Cubana, em 1959.
EUA, União Europeia e grupos de direitos humanos criticaram a repressão do regime
aos manifestantes, que foram considerados culpados de agressão, vandalismo e
sedição.
Fonte:
FolhaPress/IstoÉ
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