Geometria
sagrada: no mundo das formas perfeitas
A
humanidade transita há um bom tempo por fronteiras que mexem profundamente com
a vida neste planeta. Organismos geneticamente modificados, clonagens, fissão
nuclear e nanotecnologia são apenas algumas amostras desse poder nunca antes
desfrutado por nós. Mas será que temos o discernimento para usá-lo bem? A
maioria dos exemplos colhidos nos últimos tempos mostra que, embora a ciência
tenha atingido o estágio de manipular muitos dos padrões naturais da vida,
falta-lhe ainda compreendê-los de forma integrada para conduzir essas
manipulações com a devida responsabilidade.
Um ramo
antigo do conhecimento pode dar aos pesquisadores essa perspectiva holística
tão necessária: a geometria sagrada. Conhecida literalmente como “a sagrada
medida da Terra”, a expressão designa os fundamentos arquetípicos espirituais
por trás de obras-primas da arquitetura, mas ela vai muito além disso: suas
aplicações chegam, por exemplo, à física e à medicina. Como lembra um de seus
maiores estudiosos atuais, o médico norte-americano Robert J. Gilbert, todas
elas se baseiam num único princípio: “Tudo tem um padrão, e esse padrão é a
chave para criar um efeito específico.”
Expressão
da natureza
Esses
padrões – entre os quais figuram formatos, modelos, ritmos e proporções –
integram o repertório que permite à natureza expressar-se e, se necessário,
mudar. Ela utiliza, por exemplo, o círculo e a esfera como o invólucro
fundamental para a energia e a consciência, e a forma de vórtice para espalhar
e transmitir energia e consciência de um ponto para outro. Outras formas
frequentes na geometria sagrada são a curva senoidal, a espiral áurea (obtida
pela união de vários semicírculos e presente, por exemplo, no caramujo e na
flor do girassol), os cinco sólidos platônicos, a vesica piscis (“bexiga do
peixe” ou “Olho de Deus”, resultante do encontro de dois círculos e perceptível
no DNA e nas células) e o hipercubo (o cubo quadridimensional).
Segundo
Robert Gilbert, a geometria sagrada oferece uma base sólida não só para o
conhecimento tradicional, mas também para o científico – o que a torna uma
ciência indiscutivelmente holística
São
incontáveis os exemplos dessas formas na arquitetura e na arte de diversas
culturas. O círculo megalítico de Stonehenge, na Grã-Bretanha, as pirâmides
egípcias, a ciência pitagórica das energias vibracionais, os labirintos em
mosaicos dos romanos, a catedral de Chartres, na França, as mandalas e yantras
asiáticas, as pinturas na areia dos índios norte-americanos – todas essas obras
demonstram que seus criadores conheciam os princípios da geometria sagrada.
Segundo
Gilbert, ao estudar padrões e suas interconexões, a geometria sagrada fornece
uma base sólida tanto para o conhecimento científico como para o tradicional.
É, portanto, uma ciência indiscutivelmente holística, capaz de elevar o saber
humano a níveis ainda não alcançados.
Esfera, o
ponto de partida
Nesse ramo
do conhecimento, o ponto de partida é a figura mais simples da criação: a
esfera, o sólido cujos pontos de sua superfície estão todos à mesma distância
de um ponto interior central. Sua representação bidimensional é o símbolo
espiritual clássico do círculo com um ponto no centro. Gilbert observa que a
natureza utiliza a forma da esfera, desde as células do corpo até os planetas,
como o recipiente básico da energia e da consciência. Os mestres construtores
antigos consideravam a rotação do compasso ao redor de um ponto central como
uma recriação ritual da origem do mundo, que estabelecia a primeira fronteira
entre dentro e fora, e a usavam para erguer templos e outros exemplos de
arquitetura sagrada.
A esfera
marca a origem de diversos outros padrões importantes. Entre eles estão cinco
maneiras “perfeitas” de dividir uma esfera em formas tridimensionais totalmente
simétricas (ver quadro abaixo). Com isso, todas as faces desses sólidos
geométricos (ou poliedros) são formadas por polígonos iguais entre si e o mesmo
número de faces encontra-se em todos os vértices. São os sólidos platônicos,
segundo a descrição dos antigos gregos (mas sabe-se que esse conhecimento é ainda
mais remoto – escavações na Escócia mostraram que os povos que ali habitavam
trabalhavam o conceito pelo menos mil anos antes dos conterrâneos de Platão).
Para
Platão, esses sólidos correspondiam aos padrões essenciais da criação física.
Quatro deles – o tetraedro, o cubo, o octaedro e o icosaedro – eram
considerados os padrões arquetípicos por trás dos quatro elementos primordiais
(respectivamente, fogo, terra, ar e água); o quinto, o dodecaedro, era visto
como o padrão por trás do éter, a energia vital dos gregos. Essa importância do
dodecaedro levou Pitágoras e seus discípulos a mantê-lo em segredo, por temer o
poder destrutivo de tal padrão se ele fosse mal utilizado.
Tijolos na
construção do mundo físico
Cerca de
25 séculos depois dos gregos, a ciência moderna revelou que os sólidos
platônicos correspondem aos “tijolos” usados na construção do mundo físico.
Segundo Gilbert, isso pode ser constatado em livros que abordam a Tabela
Periódica dos Elementos. Ele destaca sobretudo um modelo da Tabela Periódica
desenvolvido na década de 1980 por Robert Moon, professor emérito de física da
Universidade de Chicago, no qual todos os elementos – ou seja, tudo existente
no mundo físico – são apresentados nas formas desses sólidos. A conclusão vem
naturalmente, assinala o estudioso: “(…) a essência da criação é a geometria:
mude o número das partes do átomo e o formato configurado resultante muda,
enquanto, alquimicamente, um elemento diferente emerge.”
O
dodecaedro faz algumas aparições intrigantes nos estudos científicos modernos.
Gilbert lembra, por exemplo, a conclusão de pesquisadores russos (descrita no
artigo “Is the Earth a Large Crystal?”, publicado na revista Khimiya i Zhizn,
ou Química e Vida, de dezembro de 1973) de que a crosta terrestre possui um padrão
dodecaédrico – algo que Platão já sugeria em seu tempo, ao afirmar que a Terra,
vista de cima, lembrava uma “bola de couro com 12 lados”.
Outro
detalhe chamativo: na Tabela Periódica de Moon, a forma que contém todas as
outras dentro de si é o dodecaedro, presente no paládio, o elemento 46. Esse
metal branco prateado, pertencente ao grupo da platina, é conhecido na
engenharia química como um catalisador, uma substância cuja presença provoca
determinadas transformações que não a alteram quimicamente no final do
processo.
·
Enigma do paládio
Em 2006, a
revista inglesa New Scientist publicou um artigo sobre um método criado por
pesquisadores da Universidade da Pensilvânia para decompor compostos químicos
letais (por exemplo, o gás nervoso). A novidade estava exatamente na
participação do paládio no processo químico: com ele, as substâncias químicas
letais deixavam de ser perigosas.
Os
descobridores do método não sabiam explicar a razão de seu sucesso. Mas os
estudiosos de geometria sagrada não teriam dúvida em afirmar que ele se deve ao
padrão dodecaédrico de energia vital pura.
Gilbert
retira da Tabela Periódica de Moon outro exemplo rico em ensinamentos. O
urânio, último elemento natural (de número 92), é representado como dois
dodecaedros conectados que estão se destruindo, um processo que origina
radiação nuclear tóxica. (A propósito, todos os elementos acima dele na Tabela
Periódica são artificiais e liberam radiação potencialmente letal.) “Se Moon
está certo”, observa Gilbert, “as modernas armas nucleares e o lixo radiativo
estão diretamente relacionados às manipulações que afetam o padrão central do
dodecaedro – mesmo se os cientistas não estiverem conscientes da conexão”. O
potencial destrutivo de tais manipulações é uma justificativa mais do que
razoável para o segredo com que as escolas espirituais do passado envolviam esse
sólido.
Campo
vastíssimo
No
entanto, se a ciência contemporânea conquistou a capacidade de promover
mudanças nesses padrões sem demonstrar a responsabilidade necessária para
tanto, já é hora de os ensinamentos da geometria sagrada deixarem as sombras.
Afinal, lembra Gilbert, “todos nós seremos tocados em nossas vidas pelo sucesso
ou fracasso global da humanidade em entender a geometria sagrada da matéria e
do espírito”.
E o campo
de estudos é vastíssimo. Padrões de consciência, por exemplo, podem nos ajudar
a entender melhor a natureza, a “alma do mundo”, a própria sociedade e seus
integrantes incomuns, como xamãs e pessoas dotadas de poderes paranormais –
além, certamente, de nos mostrarem um caminho de evolução interior. Padrões
temporais, ou ritmos, estão por trás tanto dos processos circadianos que
influenciam nosso corpo diariamente quanto das grandes eras astronômicas e
astrológicas.
“A
geometria sagrada nos dá insights vitais sobre as bases tanto do espírito como
da matéria, insights que podem ser aplicados em propósitos científicos e
espirituais”, afirma Gilbert. “Ela também nos permite curar a dolorosa divisão
entre a espiritualidade e o entendimento científico, racional que tanto aflige
nossa sociedade moderna e nossa própria alma.” É, enfim, uma poderosa
ferramenta, capaz de unificar o conhecimento fragmentário e disperso que
caracteriza a atual ciência e a impele, de certo modo, a dar tantos passos
nebulosos.
Divisões
da esfera
Os cinco
sólidos platônicos dos gregos e o elemento ao qual estão relacionados
TETRAEDRO
(Fogo)
Quatro
faces triangulares, 6 arestas e 4 vértices.
CUBO ou
HEXAEDRO (Terra)
Seis faces
quadradas, 12 arestas e 8 vértices.
OCTAEDRO
(Ar)
Oito faces
triangulares, 12 arestas e 6 vértices.
DODECAEDRO
(Éter)
Doze faces
pentagonais, 30 arestas e 20 vértices.
ICOSAEDRO
(Água)
Vinte
faces triangulares, 30 arestas e 12 vértices.
Fonte:
Planeta
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