quarta-feira, 30 de outubro de 2024

Insultos a Porto Rico em comício de Trump podem beneficiar Kamala na reta final

Donald Trump queria fazer do Madison Square Garden um marco apoteótico de sua campanha e recriar no lendário estádio novaiorquino a atmosfera messiânica que o consagrou candidato republicano em julho na convenção de Milwaukee. Deu errado.

A maré vermelha que inundou neste domingo (27) o território democrata de raízes profundas presenciou um festival de barbaridades racistas e xenófobas, que excederam os limites já normalizados pela torcida republicana.

O discurso de uma hora e 20 minutos do ex-presidente foi ofuscado por um de seus convidados, o comediante e podcaster Tony Hinchcliffe, que aquecia a plateia e, com um bombardeio de estereótipos, buscou ser mais realista do que o rei. Descreveu Porto Rico, lar de 3,2 milhões de cidadãos americanos, como “uma ilha de lixo flutuante”, zombou dos hispânicos, “que adoram fazer bebês”, dos judeus, que são mesquinhos, e dos palestinos, que gostam de atirar pedras.

Hinchcliffe coleciona em sua biografia um histórico de clichês racistas, mas os proferidos no domingo foram um presente para a campanha de Kamala Harris, que estava justamente na Pensilvânia, onde residem meio milhão de porto-riquenhos e tornou-se o mais decisivo dos sete estados-pêndulos.

A vice-presidente dos EUA havia visitado redutos da comunidade em Filadélfia, anunciou uma força-tarefa e incentivos para Porto Rico e criticou o adversário pela má gestão dos estragos causados pelo furacão Maria, em 2017, que deixou três mil mortos.

O domingo transcorria como um rotineiro dia de campanha democrata até Hinchcliffe torpedear o território americano, que não vota para presidente, mas dá a seus cidadãos residentes num dos 50 estados americanos o direito de fazê-lo. O périplo de Kamala passou a fazer sentido.

Celebridades porto-riquenhas reagiram com fúria, enquanto Trump discursava na arena do Madison Square Garden. Com 18 milhões de seguidores, o cantor Ricky Martin escreveu: “É isso que eles pensam de nós. Vote em @kamalaharris.”

Vencedor de três Grammy, o rapper Bad Bunny compartilhou um vídeo de Kamala para seus 45 milhões de seguidores, em que ela criticava a atuação de Trump durante o furacão, seguido por Jennifer Lopez e Luis Fonsi.

A reação negativa veio também de líderes republicanos, especialmente os vinculados à comunidade latina, que tentaram reparar o estrago do comediante. O senador Rick Scott disse que a “piada” de Hinchcliffe fracassou por um motivo. “Não é verdade, não é engraçada. Os porto-riquenhos são pessoas incríveis e americanos incríveis”.

A congressista Maria Salazar, da Flórida, se declarou enojada: “Essa retórica não reflete os valores do Partido Republicano. Porto Rico enviou mais de 48.000 soldados para o Vietnã, com mais de 345 Purple Hearts concedidos. Essa bravura merece respeito. Eduque-se!”

Assim como o comediante, outros oradores no Madison Square Garden reforçaram a retórica de ofensas misóginas e racistas contra Kamala Harris, chamada de anticristo e comparada a uma prostituta. O apresentador de extrema direita Tucker Carlson inventou uma identidade racial para a candidata, chamando-a de “a primeira ex-promotora da Califórnia samoana-malaia e de baixo QI a ser eleita presidente.”

Lotar o Madison Square Garden era uma questão de honra para Trump, que perdeu em seu estado natal em 2016 e 2020 e, na atual campanha, está 15 pontos atrás de Kamala.

Quando o ex-presidente subiu ao palco, seus convidados já tinham feito o trabalho sujo, embora, desta vez o efeito tenha sido o de um bumerangue. Reverberou em um terreno sensível, o da Pensilvânia. A oito dias do dia eleição, conforme resumiu o estrategista David Plouffe, um dos principais conselheiros da vice-presidente, “o momento certo é tudo”.

¨      Como piada ofensiva sobre Porto Rico em comício de Trump pode impactar eleições nos EUA

Uma piada de um comediante em um comício de Donald Trump no domingo (27/10) gerou indignação e acusações de racismo.

O comediante Tony Hinchcliffe chamou Porto Rico de "ilha flutuante de lixo". Hinchcliffe é conhecido pelo podcast Kill Tony, com 1,89 milhão de assinantes no YouTube.

"Muita coisa está acontecendo. Não sei se vocês sabem, mas literalmente existe uma ilha flutuante de lixo no meio do oceano agora. Acho que se chama Porto Rico", disse. A piada foi considerada ofensiva pela comunidade porto-riquenha.

A oito dias das eleições americanas, o comentário gerou reações entre republicanos e democratas.

Kamala Harris condenou a piada. Ela também foi alvo de outro comentarista na abertura do comício de Trump.

Dois republicanos da Flórida, Estado que possui uma expressiva população porto-riquenha, criticaram a piada.

A parlamentar americana Maria Elvira Salazar disse estar "enojada" com o "comentário racista". Ela afirmou na rede social X, antigo Twitter, que isso não reflete os valores do Partido Republicano e lembrou que milhares de porto-riquenhos servem nas Forças Armadas.

O senador Rick Scott declarou que "a piada foi um fracasso: não é engraçada e não é verdadeira". Ele acrescentou que "os porto-riquenhos são pessoas incríveis e americanos incríveis".

O comediante posteriormente defendeu seu material. "Essas pessoas não têm senso de humor", escreveu ele no X em resposta às críticas da deputada democrata Alexandria Ocasio-Cortez.

Ele acrescentou: "Amo Porto Rico e tiro férias lá. Fiz piadas sobre todos… assistam à apreserntação completa".

Ocasio-Cortez, que tem família em Porto Rico, disse que os comentários de Hinchcliffe foram "extremamente desagradáveis".

O governador de Porto Rico, Pedro Pierluisi, criticou as piadas do comediante e pediu que os americanos de origem porto-riquenha "mostrem a força do nosso povo nas urnas e todos os dias".

Representantes de Trump declararam que a piada "não reflete" as opiniões da campanha ou do ex-presidente.

·        Por que o voto dos porto-riquenhos importa?

Porto Rico é um território dos EUA, mas seus habitantes não podem votar na eleição presidencial. A ilha não possui votos no colégio eleitoral, mas seus residentes podem participar das primárias presidenciais.

No entanto, há uma grande diáspora espalhada pelo país que possui esse direito. E tanto Kamala Harris quanto Donald Trump têm buscado apelar para os porto-riquenhos que vivem no continente.

Como nativos de um território dos EUA, os porto-riquenhos que se mudam para o continente americano podem fazê-lo livremente, sem a necessidade de visto. Eles possuem cidadania estatutária e podem portar passaportes americanos.

Caso um porto-riquenho se mude para um Estado dos EUA e se registre para votar, ele terá o direito de participar das eleições.

Segundo o último censo de 2021, pelo menos 5,8 milhões de porto-riquenhos viviam nos EUA, representando cerca de 9% da população latina.

Há cerca de 36 milhões de eleitores latino-americanos aptos a votar este ano nos EUA, segundo o Pew Research Center.

Esse grupo geralmente compõe uma parte essencial da coalizão do Partido Democrata, com 59% dos latinos tendo votado em Joe Biden em 2020.

A Flórida abriga a maior comunidade, com 1,2 milhão de porto-riquenhos, seguida de perto por Nova York, com uma população de 950 mil.

No entanto, as repercussões das piadas de Tony Hinchcliffe podem ser mais relevantes na Pensilvânia — um Estado decisivo que pode pender para qualquer dos lados — onde vivem 450 mil porto-riquenhos.

·        Como o episódio pode impactar as eleições?

Os eleitores latinos em geral são uma grande minoria em vários Estados decisivos. Na Pensilvânia, eles somam cerca de 615 mil pessoas, segundo o Pew Research Center.

No Arizona, onde Trump lidera por uma pequena margem nas pesquisas, prevê-se que 855 mil latinos votem.

A repercussão da piada de Hinchcliffe ocorre no momento em que republicanos e democratas intensificam seus esforços para atrair eleitores latinos nos últimos dias desta campanha.

Comentários como este sobre Porto Rico podem ser um problema para Trump.

Uma das maiores celebridades latinas do mundo, o rapper porto-riquenho Bad Bunny compartilhou um dos seus vídeos de campanha de Kamala Harris nas redes sociais.

O artista divulgou materiais da campanha de Harris falando sobre a ilha, suas propostas para ajudar a população local e suas críticas sobre como Trump lidou com o furacão Maria durante sua Presidência, quando a tempestade mortal matou quase 3 mil pessoas em 2017.

Uma fonte próxima a Bad Bunny confirmou à emissora CBS News, parceira de notícias dos EUA da BBC, que isso representava uma declaração de apoio a Harris, quebrando sua longa tradição de não se envolver em questões políticas.

No domingo, Harris apresentou políticas voltadas para ajudar a população de Porto Rico e, além de Bad Bunny, recebeu apoio de Jennifer Lopez.

Já a equipe de Trump está tentando reduzir danos após a piada de Hinchcliffe.

O correspondente da BBC News para a América do Norte, Anthony Zurcher, afirmou em análise que o comício do republicano no Madison Square Garden foi programado para ser uma demonstração de força na reta final da campanha presidencial.

Segundo a CBS News, um assessor da campanha manifestou frustração pelo fato de que as declarações do comediante estão ofuscando a mensagem de encerramento pretendida pelo ex-presidente.

"Trump tem tentado atrair os eleitores latinos — especialmente os homens — nestas eleições, e as pesquisas indicam que ele tem conquistado avanços entre esse eleitorado, tipicamente democrata", disse Zurcher.

Esta não é a primeira vez que a campanha de Trump está relacionada a comentários controversos feitos por um apoiador.

Em setembro, a ativista conservadora Laura Loomer — que estava viajando com o ex-presidente — fez comentários depreciativos nas redes sociais sobre a ascendência indiana de Kamala Harris.

Na época, Trump afirmou discordar de suas declarações, mas disse que ela "tinha o direito de dizer o que quisesse".

Faltando apenas oito dias para a eleição, cada incidente de campanha ganha um peso maior.

"As notícias mais recentes, sejam boas ou ruins, marcam as preocupações dos eleitores quando vão às urnas", lembra Zurcher.

No entanto, os republicanos têm conseguido avançar entre o eleitorado latino, especialmente entre membros da comunidade cubano-americana.

Naquela eleição, Donald Trump aumentou sua parcela de votos entre eleitores hispânicos para 38% — em comparação com os 25% que os republicanos receberam nas eleições legislativas de 2018.

Por isso, os comentários feitos no comício de domingo ganharam tanta importância.

Alexandria Ocasio-Cortez incentivou os eleitores latinos na Pensilvânia a assistirem aos trechos do comício. Enquanto isso, Trump rapidamente repudiou os comentários.

 

¨      Incêndios em urnas de votação aumentam preocupação sobre impacto de teorias da conspiração em voto por correio nos EUA

Duas urnas de votação foram incendiadas em Washington e em Oregon, nos Estados Unidos, nesta segunda-feira (28), e reacenderam preocupações de que teorias da conspiração estejam motivando ataques ao processo eleitoral, a uma semana da eleição, marcada para 5 de novembro.

As caixas servem para a coleta de votos, depois são recolhidas pelo serviço de correios e levadas a centros de votação. Centenas de votos foram destruídos nos ataques de segunda. O FBI está investigando o caso. As autoridades estão analisando imagens de vigilância enquanto tentam identificar os responsáveis.

Veja o que se sabe sobre o que aconteceu, como as regras e medidas de segurança sobre as urnas de voto antecipado variam em todo o país e como as teorias da conspiração sobre eleições minaram a confiança em seu uso:

<><> O que sabemos sobre os incêndios?

A polícia disse que dispositivos incendiários causaram os incêndios nas caixas de coleta em Portland e Vancouver. As autoridades afirmaram que evidências mostraram que os incêndios estavam conectados e que também estavam relacionados a um incidente de 8 de outubro, quando um dispositivo incendiário foi colocado em outra caixa de coleta em Vancouver.

Tim Scott, diretor de eleições do Condado de Multnomah, disse que seu escritório estava planejando entrar em contato com os três eleitores cujos votos foram danificados em Portland para ajudá-los a obter substituições.

Em Vancouver, centenas de votos foram perdidos em uma caixa de coleta no Fisher’s Landing Transit Center, quando o sistema de supressão de incêndio da caixa não funcionou como deveria. Greg Kimsey, auditor do Condado de Clark, disse que a caixa foi esvaziada pela última vez às 11h de sábado. Eleitores que depositaram seus votos lá depois disso estão sendo incentivados a entrar em contato com o escritório para obter um novo.

Na outra, em Portland, Oregon, um sistema de supressão de incêndio parece ter funcionado para conter as chamas, limitando o número de votos danificados a três.

O escritório aumentará a frequência com que coleta os votos e mudará os horários de coleta para a noite, para evitar que as caixas de coleta fiquem cheias durante a noite, quando o vandalismo é mais provável.

Kimsey descreveu o incêndio suspeito como “um ataque direto à democracia”.

<><> Quando e onde as caixas de coleta podem ser usadas?

As caixas de coleta têm sido usadas por anos em estados como Colorado, Oregon, Utah e Washington, onde os votos são enviados a todos os eleitores registrados.

Elas ganharam popularidade em 2020 durante a pandemia de Covid-19, à medida que os oficiais eleitorais buscavam opções para eleitores que queriam evitar locais de votação lotados ou estavam preocupados com atrasos na entrega pelo correio.

No total, 27 estados e o Distrito de Columbia permitem caixas de coleta de votos, de acordo com dados coletados pela Conferência Nacional de Legislaturas Estaduais. Outros seis não têm uma lei específica, mas permitem que comunidades locais as utilizem.

A localização pode variar amplamente. Em algumas comunidades, elas estão localizadas dentro de prédios públicos, disponíveis apenas durante o horário comercial. Em outros lugares, estão do lado de fora e acessíveis a qualquer hora, geralmente com vigilância por vídeo ou alguém observando.

Problemas esporádicos ocorreram ao longo dos anos.

Em 2020, algumas caixas de coleta foram atingidas por veículos, e uma em Massachusetts foi danificada por incêndio criminoso. Nesse caso, a maioria dos votos era legível o suficiente para que os eleitores fossem identificados e pudessem receber substituições. Uma caixa de coleta também foi incendiada no Condado de Los Angeles em 2020.

<><> Como a segurança delas deve ser feita?

A Agência de Segurança Cibernética e Infraestrutura dos EUA aconselha os oficiais eleitorais estaduais e locais a colocar as caixas de coleta em áreas convenientes e de alto tráfego que sejam familiares aos eleitores, como bibliotecas e centros comunitários.

Se as caixas de coleta não tiverem pessoal, devem ser seguradas e trancadas o tempo todo, localizadas em áreas bem iluminadas e monitoradas por câmeras de vigilância, segundo a orientação. Muitas estão fixadas no chão, são vigiadas por câmeras ou confinadas a prédios públicos durante o horário comercial, onde podem ser monitoradas.

<><> Como as teorias da conspiração contribuíram para as preocupações em torno das urnas?

As caixas de coleta de votos estiveram em evidência nos últimos quatro anos, sendo alvo de teorias da conspiração da direita trumpista —que afirmava falsamente que eram responsáveis por uma fraude eleitoral maciça em 2020.

Um filme desacreditado chamado “2,000 Mules” amplificou as alegações, expondo milhões a uma teoria infundada de que uma operação de coleta de votos estava depositando votos fraudulentos em caixas de coleta à noite.

Uma pesquisa da Associated Press com autoridades eleitorais estaduais em todo os EUA descobriu que não houve problemas generalizados associados às caixas de coleta em 2020.

A paranoia sobre as caixas de coleta continuou nas eleições de meio de mandato de 2022, quando vigilantes armados começaram a aparecer para monitorá-las no Arizona e foram restringidos por um juiz federal. Este ano, o grupo conservador True the Vote lançou um site que hospeda transmissões ao vivo de cidadãos em caixas de coleta em vários estados.

Em Montana, onde uma importante corrida para o Senado dos EUA está na cédula, os republicanos recentemente aproveitaram uma alegação infundada de manipulação de caixas de coleta para arrecadar dinheiro com dúvidas sobre o processo eleitoral.

<><> Como os estados reagiram desde a eleição de 2020?

Legisladores republicanos (mesmo partido de Trump) em vários estados buscaram apertar as regras em torno da votação pelo correio após a eleição de 2020, e grande parte de seu foco foi no uso de caixas de coleta de votos.

Seis estados baniram as caixas: Arkansas, Mississippi, Missouri, Carolina do Norte, Carolina do Sul e Dakota do Sul, de acordo com pesquisas do Voting Rights Lab, que defende o acesso expandido à votação.

Outros estados restringiram seu uso. Isso inclui Ohio e Iowa, que agora permitem apenas uma caixa de coleta por condado, de acordo com o Brennan Center for Justice.

No Condado de Fulton da Geórgia, que inclui Atlanta e tem mais de 1 milhão de residentes, 10 caixas de coleta de votos estão disponíveis para a eleição presidencial deste ano. Isso é uma queda em relação a 38 quatro anos atrás, sob uma regra de emergência provocada pela pandemia. É o resultado de uma reforma eleitoral pelos republicanos da Geórgia em resposta às falsas alegações do ex-presidente Donald Trump sobre uma eleição roubada.

No total, 12 estados proíbem caixas de coleta ou não as listam como um método aprovado para devolver um voto, de acordo com dados coletados pela Conferência Nacional de Legislaturas Estaduais. Outros cinco estados não têm uma lei estadual e não utilizam caixas de coleta.

As caixas de coleta já foram usadas por anos em Wisconsin, um dos campos de batalha presidencial deste ano, mas o apoio a elas se dividiu ao longo das linhas ideológicas desde 2020. Em Wausau, o prefeito conservador removeu a única caixa de coleta da cidade, uma ação que está sob investigação pelo Departamento de Justiça do estado. A caixa de coleta foi devolvida e está em uso novamente.

 

Fonte: g1/BBC News Mundo/AP

 

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