sábado, 21 de dezembro de 2024

Mudanças climáticas impactam saúde de gestantes, crianças e idosos, alerta OMS

Mulheres grávidas, recém-nascidos, crianças, adolescentes e idosos enfrentam graves complicações de saúde relacionadas às alterações climáticas. É o que alerta uma nova coleção de artigos publicados no Journal of Global Health, no final de maio. O conjunto de estudos é de autoria de especialistas da Organização Mundial da Saúde (OMS) e de acadêmicos de todo o mundo.

coleção, intitulada “Mudanças climáticas ao longo da vida“, reúne evidências científicas disponíveis sobre os impactos na saúde causados por diferentes eventos climáticos nas principais fases da vida. Esses eventos incluem as ondas de calorpoluição atmosférica e desastres naturais, como incêndios florestais e grandes inundações — como as que atingiram o Rio Grande do Sul.

Em conjunto, os estudos mostram que as mudanças climáticas podem levar a complicações graves de saúde e podem ser, muitas vezes, potencialmente fatais. Apesar disso, esses riscos ainda têm sido subestimados, principalmente entre os grupos de maior risco, como crianças, idosos e gestantes.

Os autores dos estudos observaram, por exemplo, que os nascimentos prematuros têm acontecido com maior incidência durante as ondas de calor, aumentando o risco de morte infantil. Segundo a OMS, a cada 1°C adicional na temperatura mínima diária acima de 23,9°C aumenta o risco de mortalidade infantil em até 22,4%.

Além disso, os pesquisadores ressaltam que o calor extremo está associado ao maior risco de ataque cardíaco e dificuldades respiratórias por pessoas mais velhas.

 “Estes estudos mostram claramente que as alterações climáticas não são uma ameaça distante para a saúde e que certas populações já estão a pagar um preço elevado”, afirmou Anshu Banerjee, diretor de Saúde e Envelhecimento Materno, Neonatal, Infantil e Adolescente da OMS. “Embora a sensibilização para as alterações climáticas tenha aumentado, as ações para salvaguardar as vidas das pessoas em maior risco mal arranharam a superfície do que é necessário. Para que a justiça climática seja alcançada, esta situação deve ser corrigida com urgência.”

Principais riscos associados aos eventos climáticos adversos

A coleção de estudo elenca uma série de impactos específicos da saúde física e mental relacionados a eventos climáticos adversos. É o caso de:

  • Temperaturas extremas: associadas a resultados adversos no parto, como nascimentos prematuros e natimortos, além de hipertensão e diabetes gestacional durante a gravidez. As ondas de calor também podem afetar a função cognitiva de crianças e adolescentes, além de aumentar o risco cardiovascular entre os idosos;
  • Poluição atmosférica: aumenta a probabilidade de hipertensão arterial durante a gravidez, baixo peso ao nascer, parto prematuro e atraso no desenvolvimento cerebral e pulmonar do feto. Também aumenta o risco de doenças respiratórias entre crianças e idosos;
  • Desastres naturais: podem ter impactos negativos na saúde física e mental, além de aumentar o risco para doenças diarreicas e desnutrição devido à contaminação da água e à falta de acesso a alimentos causados pelas inundações e secas. Incêndios florestais também podem aumentar os distúrbios respiratórios e as taxas de mortalidade cardiovascular em pessoas idosas.

A OMS afirma que, apesar de as alterações climáticas poderem afetar negativamente toda a população, as consequências podem ser mais graves para grupos de pessoas que necessitam de acesso regular a serviços de saúde e apoio social, como bebês, idosos e gestantes.

“Há uma necessidade urgente de mitigar as alterações climáticas, reduzindo as emissões de gases com efeito de estufa e de construir resiliência climática; tomar medidas específicas que protejam a saúde nestas várias fases da vida e garantir a continuidade dos serviços de saúde para aqueles que estão em maior risco quando ocorrem desastres climáticos”, afirma Anayda Portela, cientista da OMS e autora dos artigos.

A partir da coleção de artigos, o objetivo dos pesquisadores é ajudar os governos a abordarem os riscos e a planejar a tomada de medidas para mitigar os impactos das mudanças climáticas na saúde. Segundo os autores, atualmente, existem poucas medidas adaptadas às necessidades específicas das mulheres, bebês, crianças e adolescentes, assim como pessoas idosas que podem ter restrições de mobilidade e de cognição.

Para os pesquisadores, as medidas devem incluir a preparação de sistemas de acolhimento de crianças, assistência social e educação para eventos climáticos extremos e aumento das temperaturas, bem como o envolvimento de pessoas de todas as idades em ações climáticas.

¨      Estresse por calor pode afetar bebês após nascimento, sugere estudo

O estresse causado pela exposição a temperaturas elevadas, chamado estresse térmico, pode afetar o crescimento do feto durante a gravidez e continuar impactando a saúde do bebê após o nascimento, até os dois anos. A descoberta é de um novo estudo publicado na renomada revista científica The Lancet Planetary Health nesta terça-feira (8).

Esse é o primeiro trabalho a mostrar que o estresse térmico pode afetar o desenvolvimento dos bebês após o nascimento e se soma a evidências anteriores de que as altas temperaturas podem impactar na saúde do feto.

Para chegar às conclusões, a pesquisa examinou dados de bebês e suas mães que foram coletados durante um ensaio clínico na Gâmbia e identificou uma pequena redução no peso ao nascer em relação à idade gestacional para cada aumento de 1 °C no estresse térmico médio diário durante o primeiro trimestre da gravidez.

De acordo com o estudo, nenhum efeito no crescimento relacionado ao estresse pelo calor durante o segundo trimestre foi observado. Além disso, a pesquisa sugeriu que poderia haver um aumento na circunferência da cabeça em comparação ao corpo para a idade gestacional em fetos expostos ao estresse térmico durante o terceiro trimestre, mas esse achado foi menos confiável, segundo os pesquisadores.

As descobertas do estudo mostram, ainda, que bebês de até dois anos que foram expostos a altas temperaturas podem ter pesos e alturas menores para a sua idade. Segundo a pesquisa, as maiores reduções nessas medidas foram observadas em bebês com idade entre 6 e 18 meses que tinham experimentado níveis médios diários mais altos de estresse por calor três meses antes da análise.

De acordo com os pesquisadores, aos 12 meses de idade, os bebês expostos a um valor médio de estresse térmico equivalente a 30°C tiveram maior probabilidade de ter peso reduzido para sua altura e idade, em comparação com aqueles que sofreram estresse térmico equivalente a 25°C. Os resultados foram encontrados em bebês do sexo masculino e feminino.

<><> Como o estudo foi feito?

Os dados do estudo foram coletados originalmente por meio do ensaio clínico randomizado Early Nutrition and Immunity Development (ENID), realizado em West Kiang, na Gâmbia, entre janeiro de 2010 e fevereiro de 2015. Um total de 668 bebês foram acompanhados durante os primeiros 1.000 dias de vida, sendo 329 (49%) do sexo feminino e 339 (51%) do sexo masculino.

Os pesquisadores analisaram a relação entre estresse por calor e crescimento fetal com base em pontuações clinicamente reconhecidas para peso, comprimento e circunferência da cabeça para idade gestacional. Ele também avaliou o efeito do estresse por calor no crescimento infantil com base em pontuações de peso e altura de 0 a 2 anos de idade.

Segundo o trabalho, 66 (10%) recém-nascidos pesavam menos de 2,5 kg ao nascer, considerado baixo peso, enquanto 218 (33%) eram pequenos para a idade gestacional e nove nasceram prematuros.

“Nosso estudo demonstra que as crises interligadas de mudanças climáticas, insegurança alimentar e subnutrição estão afetando desproporcionalmente os mais vulneráveis, incluindo crianças pequenas”, afirma Ana Bonell, professora assistente da Unidade do Conselho de Pesquisa Médica da Gâmbia (MRCG), em comunicado à imprensa.

“Essas descobertas se baseiam em evidências anteriores que mostram que o primeiro trimestre é um período vulnerável à exposição ao calor e é importante que agora consideremos quais fatores podem estar contribuindo para o relacionamento”, acrescenta.

<><> O que é estresse térmico?

O estresse térmico é uma condição caracterizada por condições climáticas que fazem com que a temperatura corporal aumente e não consiga se manter nos 36,5°C ideais para o bom funcionamento do organismo. Um estudo divulgado no ano passado pelo Laboratório de Aplicações de Satélites Ambientais da Universidade Federal do Rio de Janeiro (Lasa/UFRJ) mostrou que mais de 38 milhões brasileiros são expostos ao estresse térmico.

Em matéria publicada anteriormente na CNN, Pedro Chocair, clínico geral e nefrologista do Hospital Alemão Oswaldo, explica que excesso de calor provoca sudorese intensa, dilatação dos vasos periféricos, queda da pressão arterial e suas consequências.

O estresse térmico pode causar sintomas como fadiga, dor de cabeça, dor muscular e manifestações neurológicas, como confusão mental, tonturas e alterações no sono.

No estudo em questão, a tensão por calor foi definida usando o Índice de Clima Térmico Universal, que considera fatores como calor, umidade, velocidade do vento e radiação solar, e atribui uma temperatura equivalente (°C) com um risco associado de desenvolvimento de tensão por calor.

Ao longo do estudo, o nível médio de exposição ao estresse térmico foi de 29,6°C. O máximo diário mais alto foi de 45,7°C e o mínimo diário mais alto foi de 28,9 °C.

“É provável que o estresse térmico possa afetar o apetite, a ingestão e a disponibilidade de alimentos, e também já estamos investigando se pode haver efeitos diretos nas vias celulares e inflamatórias, aumentando a capacidade já reduzida de mães grávidas e bebês de regular sua própria temperatura corporal”, afirma Bonell.

“Precisamos explorar quais populações estão projetadas para sofrer mais estresse por calor e onde pode estar sendo registrada uma queda no crescimento, para que possamos desenvolver medidas eficazes de saúde pública. Com as taxas globais de desperdício infantil permanecendo inaceitavelmente altas e o aquecimento planetário contínuo, essas descobertas devem estimular ações para melhorar a saúde infantil”, completa.

Os pesquisadores enfatizam que mais estudos são necessários para avaliar a relação entre estresse por calor e impactos na saúde em regiões além da Gâmbia. Além disso, os dados disponíveis não continham informações sobre práticas alimentares, infecções maternas ou status socioeconômico, o que também pode impactar o crescimento fetal e infantil.

 

¨      Mortes por calor extremo aumentaram 167% entre idosos nos últimos 33 anos

As ameaças à saúde causadas pelas mudanças climáticas atingiram níveis recordes. Globalmente, em 2023, as mortes relacionadas ao calor extremo entre pessoas com mais de 65 anos aumentaram 167% em comparação aos óbitos de 1990. O dado é de relatório divulgado na última terça-feira (29) pela renomada revista científica The Lancet.

O relatório “The Lancet Countdown sobre Saúde e Mudanças Climáticas” foi produzido em colaboração com a Organização Mundial da Saúde (OMS) e contou com 122 especialistas líderes de 57 instituições acadêmicas e agências da Organização das Nações Unidas (ONU). O documento foi publicado antes da 29ª Conferência das Partes da ONU (COP) e fornece a avaliação mais atualizada das ligações entre saúde e mudanças climáticas.

As mortes relacionadas ao calor em pessoas com mais de 65 anos estão substancialmente acima das expectativas, de acordo com o relatório. Era esperado que, entre 1990 e 2023, houvesse um aumento de 65% nos óbitos caso as temperaturas não tivessem mudado — ou seja, contabilizando apenas as mudanças demográficas.

Do ponto de vista do documento, isso agrava as desigualdades existentes, com o número de dias de calor extremo sendo maior em países com baixo índice de desenvolvimento humano.

“O balanço deste ano das ameaças iminentes à saúde causadas pela inação climática revela as descobertas mais preocupantes até agora em nossos oito anos de monitoramento”, alertou Marina Romanello, Diretora Executiva do Lancet Countdown na University College London, em Londres, em comunicado à imprensa.

 “Mais uma vez, o ano passado quebrou recordes de mudanças climáticas — com ondas de calor extremas, eventos climáticos mortais e incêndios florestais devastadores afetando pessoas em todo o mundo. Nenhum indivíduo ou economia no planeta está imune às ameaças à saúde causadas pelas mudanças climáticas. A expansão implacável de combustíveis fósseis e as emissões recordes de gases de efeito estufa agravam esses impactos perigosos à saúde e ameaçam reverter o progresso limitado feito até agora e colocar um futuro saudável ainda mais fora de alcance.”

Globalmente, pessoas foram expostas a 1.512 horas a mais de altas temperaturas

O relatório também mostrou que, em 2023, a população global foi exposta a, em média, uma alta histórica de 1.512 horas de altas temperaturas, representando um risco moderado de estresse por calor (ou estresse térmico) ao realizar exercícios ao ar livre, como caminhar, andar de bicicleta — um aumento de 27,7% (328 horas) na média anual de 1990-1999.

Segundo o levantamento, o aumento das temperaturas também levou a um recorde de 512 bilhões de horas potenciais de trabalho perdidas globalmente em 2023 (um aumento de 49% acima da média de 1990-1999), com perdas globais potenciais de renda equivalentes a US$ 835 bilhões (cerca de R$ 4,8 trilhões) — equivalente a uma proporção substancial do PIB em países de baixa (7,6%) e média renda (4,4%).

<><> Aumento dos eventos climáticos extremos e doenças relacionadas

Em relação aos eventos climáticos extremos, o relatório mostrou que, na última década (2014-2023), 61% da área terrestre global viu um aumento em eventos extremos de precipitação em comparação com a média de 1961-1990, aumentando o risco de inundações, doenças infecciosas e contaminação da água.

Ondas de calor e secas também se tornaram mais frequentes e foram responsáveis por 151 milhões de pessoas a mais sofrendo de insegurança alimentar moderada a grave em 124 países em 2022, comparando com os números anuais entre 1981 e 2010.

Diante das mudanças climáticas, a disseminação de doenças infecciosas potencialmente mortais também cresceu. De acordo com o relatório, o risco de transmissão de dengue por mosquitos Aedes albopictus aumentou em 46% e Aedes aegypti em 11% na última década (2014-2023) em comparação com 1951-1960. Em 2023, houve um recorde de mais de 5 milhões de casos de dengue em mais de 80 países e territórios.

“Pessoas em todas as partes do mundo estão sofrendo cada vez mais com os efeitos financeiros e de saúde das mudanças climáticas, e comunidades desfavorecidas em nações com recursos limitados são frequentemente as mais afetadas, mas recebem as menores proteções financeiras e tecnológicas”, diz Wenjia Cai, professor e copresidente da Lancet Countdown Working Group 4 na Universidade Tsinghua, na China.

“A adaptação não está conseguindo acompanhar o ritmo das crescentes ameaças à saúde causadas pelas mudanças climáticas e, com os limites da adaptação se aproximando e a cobertura universal de saúde ainda sendo um sonho para mais da metade da população mundial, é necessário apoio financeiro urgente para fortalecer os sistemas de saúde e proteger melhor as pessoas”, completa.

<><> Mortes relacionadas à poluição do ar diminuíram

Apesar do recorde nos riscos à saúde relacionados às mudanças climáticas apresentadas pelo relatório, as mortes causadas por poluição do ar derivada de combustíveis fósseis caíram quase 7%: de 2,25 milhões em 2016 para 2,09 milhões em 2021.

Segundo o relatório, 59% desse declínio é decorrente dos esforços para reduzir a poluição de queima de carvão, demonstrando o potencial benéfico à saúde da eliminação gradual do carvão.

Além disso, a parcela de eletricidade gerada por energias renováveis modernas e limpas quase dobrou em 2021, atingindo 10,5%, em comparação com 5,5% de 2016.

“O progresso em direção a um futuro equitativo e saudável requer uma transformação global dos sistemas financeiros, transferindo recursos da economia baseada em combustíveis fósseis para um futuro de zero emissões”, disse o coautor Anthony Costello, copresidente do Lancet Countdown.

“Para uma reforma bem-sucedida, a saúde das pessoas deve ser colocada em primeiro plano na política de mudança climática para garantir que os mecanismos de financiamento protejam o bem-estar, reduzam as desigualdades em saúde e maximizem os ganhos em saúde, especialmente para os países e comunidades que mais precisam.”

Na visão dos autores, as descobertas apontadas pelo relatório devem forçar uma transformação global dos sistemas financeiros centrada na saúde, transferindo recursos da economia baseada em combustíveis fósseis para um futuro de zero emissões. Isso poderá proporcionar benefícios à saúde e à economia por meio de melhor acesso e segurança energética, ar e água mais limpos, dietas e estilos de vida mais saudáveis e oportunidades de emprego mais sustentáveis.

 

Fonte: CNN Brasil

 

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